Zé Eduardo, a vida interiorana de um líder da geração de 68, por Luis Nassif

Serra foi a Bragança em campanha, ao lado de Orestes Quércia. Marcou uma conversa com Zé Eduardo e ficou horas falando mal de mim. Depois, saiu e, no dia seguinte, veio a ordem, destituindo Zé Eduardo do comando do PSDB de Bragança. E eu e o Zé nãos nos víamos há pelo menos 7 anos.

Morreu meu ex-cunhado José Eduardo de Aguirre. Figura interessante, que conheci em fins dos anos 60. Formou-se em direito pela PUC-Campinas e teve atuação política expressiva junto à União Estadual dos Estudantes. Ligado ao padre Narciso, Zé Eduardo tornou-se um dos gurus da geração Campinas na política que, mais tarde, deu Orestes Quércia, José Roberto Magalhães Teixeira e Lauro Péricles Gonçalves (ex-prefeitos de Campinas). Isso me foi dito, anos depois,por alguns deles, ressaltando a importância intelectual de Zé Eduardo em sua formação. Nas eleições da UNE (União Nacional dos Estudantes) tornou-se um dos eleitores de José Serra.

Quando Serra voltou do exílio, foram as conversas com Zé Eduardo que me fizeram acreditar e apostar no novo quadro. Nem eu, nem o Zé, tínhamos ideia maior sobre seu caráter.

Formado, passou a advogar em Bragança Paulista, sua cidade. E entrou para a política estimulado pelo amigo Magalhães Teixeira, o Grama, mas sem abandonar Bragança. Em uma cidade conservadora, ele sempre foi um ponto de racionalidade e resistência. E jamais perdeu a perspicácia política. Tinha ótima capacidade de observação e muita segurança sobre conceitos jurídicos, conforme suas observações para mim no período agudo do impeachment. 

Poderia ter sido um grande advogado em qualquer grande centro; preferiu a sua cidade. E lá, viveu intensamente os prazeres do interior, o gosto pela boa prosa, as piadas sutis, os trotes familiares.

Em minha primeira viagem a Bragança, início de namoro com a futura esposa, levei um garrafão de vinho – que ganhara em um sorteio – para seu avô, seu Vitório Suppione, um italiano resmungão. Zé Eduardo deu-lhe um porre de vinho, ligou o gravador e passou a explorar seus preconceitos de italiano-velho:

– E aí, Vitório, sua neta namorado um turco mineiro!

E o velho Vitório, embriagado:

– Turco mineiro é ladrão de cavalo.

Depois, ligava o gravador na frente do avô e rolava de rir.

Os “causos” familiares – sempre pela boca do Zé Eduardo – eram de morrer de rir. Na guerra, seu Vitório conseguiu sintonizar uma rádio aliada. Sempre que um navio aliado era afundado, tocava uma música fúnebre. E ele comemorava. Aí, vizinhos foram dedurá-lo ao prefeito como quinta coluna. O prefeito em exercício, seu Oswaldo, o Tato, era da família, cunhado de Vitório. E ia na casa para pedir mais discrição de sua parte.

A melhor história foi, durante a guerra, a invasão do Circolo Italiano pelos brasileiros. Arrebentaram a porta, armados de paus e pedras, viram um retrato na parede e veio a palavra de ordem:

– Pau no bigodudo do retrato!

Era o Duque de Caxias.

Até 2010, Zé Eduardo foi um lutador solitário do PSDB em Bragança. Em 2010 aconteceu o episódio, que ele me relatou pelo telefone. Havia campanha presidencial e eu estava empenhado em uma frente minúscula de resistência a Serra – depois que caiu a ficha sobre o monstro que ajudei a construir.

Serra foi a Bragança em campanha, ao lado de Orestes Quércia. Marcou uma conversa com Zé Eduardo e ficou horas falando mal de mim. Depois, saiu e, no dia seguinte, veio a ordem, destituindo Zé Eduardo do comando do PSDB de Bragança. E eu e o Zé nãos nos víamos há pelo menos 7 anos.

Zé Eduardo me contou a história do seu jeito, morrendo de rir da atitude de Serra.

Hoje descansou.

Luis Nassif

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