Coronavirus, desmatamento e fogo na Amazônia, por Philip Martin Fearnside e Lucas Ferrante

A época da quarentena corresponde, até agora, a meses chuvosos quando há relativamente pouco fogo e desmatamento na Amazônia.

do Amazônia Real

Coronavirus, desmatamento e fogo na Amazônia

por Philip Martin Fearnside e Lucas Ferrante

Várias reportagens recentes na imprensa brasileira e internacional alegam que há uma explosão de desmatamento e fogo na Amazônia devido ao coronavírus. No entanto, os atuais dados de satélites durante a quarentena no Brasil trazem mensagens mistas sobre esse efeito.

As afirmações sobre grandes aumentos de desmatamento são geralmente baseadas em dados para os meses de janeiro e fevereiro, e algumas até incluem dados desde agosto de 2019, mas a quarentena devido ao coronavírus só começou em 11 de março de 2020.

Usar meses antes da quarentena confunde o “efeito Bolsonaro” com o “efeito coronavírus”.

O número de fogos diminuiu em 98,7% quando são comparados os dados de 2020 e 2019 do programa Queimadas, do INPE, para o período de 11 de março a 10 de abril.

Já para o desmatamento, houve um aumento de 29,9% quando são comparados os dados do sistema DETER, também do INPE, para o período de 01 de março a 01 de abril nos dois anos.

A época da quarentena corresponde, até agora, a meses chuvosos quando há relativamente pouco fogo e desmatamento na Amazônia. Os dados para meses na época chuvosa costumam variar bastante de um ano para outro, e esses meses têm pouco peso nos números totais para o ano.

É bom lembrar o exemplo dos primeiros meses do governo Bolsonaro em 2019, quando o Presidente sempre respondia a críticas sobre seus retrocessos ambientais com um discurso se vangloriando do fato que os números de desmatamento eram menores no seu mandato do que no ano anterior.

Como se sabe, a partir de maio de 2019, com o começo da época mais seca, tanto o desmatamento quanto a frequência de fogo se explodiram na Amazônia, justamente devido às ações anti-ambientais do governo Bolsonaro. Da mesma forma que ocorreu com o efeito Bolsonaro em 2019, separar o efeito coronavírus de outros efeitos sobre os números de desmatamento e fogo é incerto quando só temos dados da época chuvosa.

A lógica para o aumento da destruição como resultado do vírus é sólida, dada a paralização praticamente total da fiscalização e da aplicação de regulamentos sobre o desmatamento.

A presunção de impunidade que acompanha isso pode resultar em aumentos substanciais tanto nos fogos como no desmatamento quando os meses mais secos começarem a partir de maio.

A imagem que abre este artigo mostra queimadas e desmatamento em Novo Aripuanã, no sul do Amazonas (Foto: Marcella Haddad/Cáritas/31/08/2019)

Lucas Ferrante  é Doutorando em Biologia (Ecologia) no Instituto Nacional de Pesquisas da Amazônia (INPA). Tem pesquisado agentes do desmatamento, buscando políticas públicas para mitigar conflitos de terra gerados pelo desmatamento, invasão de áreas protegidas e comunidades tradicionais, principalmente sobre Terras indígenas e Unidades de Conservação na Amazônia ([email protected]).

Philip Martin Fearnside é doutor pelo Departamento de Ecologia e Biologia Evolucionária da Universidade de Michigan (EUA) e pesquisador titular do Instituto Nacional de Pesquisas da Amazônia (Inpa), em Manaus (AM), onde vive desde 1978. É membro da Academia Brasileira de Ciências. Recebeu o Prêmio Nobel da Paz pelo Painel Intergovernamental para Mudanças Climáticas (IPCC), em 2007. Tem mais de 600 publicações científicas e mais de 500 textos de divulgação de sua autoria que estão disponíveis aqui.

Redação

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