Pegada ecológica: discutindo os limites do crescimento econômico

 

Por Almeida

Há um limite para o crescimento da economia. O homem é criatura da natureza, não pode viver fora dela ou fugir de suas regras. A atividade produtiva é realizada no mundo natural, onde não se verificam processos de crescimento perpétuo, pois como diz o texto do artigo abaixo, “senão os girassóis cresceriam até as nuvens e teríamos porquinhos da índia de mais de 400 quilos”. Existe a crença idealista, reforçada pelo capitalismo, e também por ideologias do chamado socialismo real, que separa o homem da natureza, o coloca no ápice da evolução e concebe a natureza como um objeto de sua exclusiva posse e domínio. Para tais crentes, poderíamos, com conhecimento e engenho por eles idealizados, prosseguir crescendo indefinidamente, fazer algo que a natureza não comporta. Há um horizonte para o crescimento máximo da economia, para além do qual não existem recursos materiais suficientes para sustentá-lo, o engenho humano também possui limites, embora a imaginação seja ilimitada. Mais, existem restrições do esgotamento de fontes energéticas, de águas, de solos e outros recursos, que nos levarão a um futuro decrescimento econômico, a uma queda das atividades produtivas.

A humanidade está nos dias atuais em nítido desequilíbrio com a natureza, nossa pegada ecológica sobrepassa a capacidade da Terra, no atual ritmo a tragédia é inevitável. Em algum momento terá de haver adequação para a sustentabilidade.  As nações têm impactos ecológicos diferentes, mas não se trata apenas de conflitos entre nações, pois no interior dessas também são diferentes as pegadas ecológicas das classes sociais. O capitalismo só funciona com crescimento econômico perpétuo, sua história mostra que: se a economia estanca, ele entra em crise; se retrocede, vira a catástrofe da depressão. Do ponto de vista ecológico, o capitalismo é insustentável, pois se baseia em algo que não pode ser verificado num mundo finito, o crescimento permanente e ilimitado; são muitos os desequilíbrios que vem provocando, algumas regiões do mundo já vivenciam o colapso. A riqueza está criada, trata-se de redistribui-la, aplicá-la em um novo sentido para o desenvolvimento humano. Segue o artigo para reflexão e debate.

da Rede Castor Photo

As pegadas ecológicas – Quando a eco-economia assume o neoliberalismo

20/4/2015, [*] Robert Hunziker – Counterpunch
The Ecological Footprint – Eco Economics Takes on Neoliberalism
Traduzido por Emex (que nos ajuda do Canadá).
Enviado pelo pessoal da Vila Vudu

Milton Friedman, economista estadunidense (1912-2006), autoproclamado herdeiro de Adam Smith, usou o termo neoliberalismo num ensaio, “Neoliberalismo e suas perspectivas”, em 1951. Desde então, o mundo se inclinou neste sentido, a começar com o Chile, como experiência de laboratório de “Chicago Boys” sob o olho vigilante do infame ditador General Augusto José Ramón Pinochet Ugarte, presidente de 1974 a 1990. E o mundo nunca mais foi o mesmo.
Hoje em dia, o neoliberalismo reina supremo através dos oceanos, o controle dos fundamentos da economia passa do setor público para o setor privado com limitada interferência governamental, quanto menor melhor; impõem-se os livres mercados, o livre comércio geral, sucessivas desregulamentações bem como o regime de arrocho para as massas (Grécia e Espanha são os maiores movimentos de resistência a isso hoje em dia).

Com o neoliberalismo, o Mercado determina praticamente tudo. Visto de outro ângulo, o mundo se tornou uma gigantesca esfera mercantilizada girando em torno do sistema solar, enquanto o mercado determina preços para cada coisa, com exceção da biosfera, de fato, uma grande exceção.

Faz algum sentido, determinar preços para cada coisa, menos para a biosfera? Já que tudo, do trigo à viagem espacial, é determinado pelo mercado, por que não a atmosfera, os oceanos, o solo? O que deixa a biosfera fora do reino do mercado?

No fim das contas, a sobrevivência do mais apto é tão velha quanto a natureza, e o neoliberalismo, na prática, determina “a sobrevivência do mais apto econômico”, espelhando o comportamento da natureza. No entanto, o que acontece na vida real é que o neoliberalismo é o mais baixo abutre econômico, graças ao qual os ricos acumulam cada vez mais a custa dos que recebem cada vez mais baixos salários, cada vez menos benefícios e têm sua autoestima esmagada. O que poderia ser pior?

Há uma maneira melhor, um foco mais nítido encontrado dentro da economia ecológica, que amarra a imagem em seu conjunto, as externalidades destacadas dos mercados, bem como tudo dentro de mercados, integrando assim, importantes externalidades ao sistema de mercado, por exemplo, os limites biofísicos.

Neste ritmo, ao invés de contestar as tendências do capitalismo, que nunca cedem, é melhor juntar-se à festa reconfigurando o neoliberalismo como uma eco-economia em que o capital natural é um auxiliar do trabalho e do capital humanamente produzido.

A terra é um planeta finito com um capital natural finito; violar limites naturais pode trazer grandes transtornos, de grandes dimensões, levando a batalhas cruéis e guerras em larga escala.

A pegada ecológica

A pegada ecológica pode ser representada como a área agregada de terra e água em várias categorias ecológicas reivindicadas pelos participantes nesta economia para produzir todos os recursos de seu consumo, e para absorver todos os seus restos gerados numa base contínua, usando a tecnologia corrente. Mathis Wackernagel e William E. Rees, Perceptual and Structural Barriers to Investing in Natural Capital: Economics from an Ecological Footprint Perspective, Ecological Economics  20, May 28, 1996.

Economistas ecológicos reconhecem que as sociedades industriais dependem para sobreviver não apenas do trabalho e do capital humanamente produzido, mas também do capital natural. (Wackernagel and Rees).

Por exemplo, uma floresta ou uma indústria pesqueira podem ser capazes de fornecer uma colheita perpétua ano após ano. A floresta ou o estoque de peixes são o capital natural; a colheita sustentável é a renda natural.

No entanto, o capital natural não é simplesmente um inventário de recursos. Ele é constituído de todos os componentes da ecosfera, inclusive da cadeia estrutural de relações que torna a vida possível. O capital natural é definido por Sir John Richard Hicks, economista britânico, 1904-1989; o capital natural hicksiano produz a renda natural hicksiana, que é o nível de consumo que pode ser sustentado de um a outro período sem redução da riqueza natural, ou seja, constitui a chave do sucesso eco-econômico.

Nosso problema é que o capital que tanto nos esforçamos em manter intacto é apenas o capital humanamente produzido. A categoria “capital natural” não é levada em conta. De fato, essa categoria é excluída por definição na medida em que se define o capital como meios de produção (humanamente) produzidos. Herman E. Daly, et al, For the Common Good: Redirecting the Economy Toward Community, the Environment, and a Sustainable Future, Beacon Press Books, 1994.

Estudando a formação de capital natural, estimativas de suas pegadas ecológicas e sua apropriada capacidade de carga, podemos ter uma indicação da sustentabilidade do nível de consumo segundo a disponibilidade de produção ecológica.

Por exemplo, a média individual em um país industrializado requer o equivalente a 2-5 hectares (5-12 acres) de terra produtiva para sustentar o consumo de materiais derivados do fluxo de recursos contidos em bens e serviços. No entanto, há apenas 1.5 hectares per capita de terra produtiva no planeta (World Resources Institute).

Há pois um hiato de sustentabilidade, o qual ajuda a explicar porque em vez de um fluxo sustentável de capital natural temos em curso um esgotamento de capital natural. De fato, cálculos brutos

(…) sugerem que a pegada ecológica de todas as nações industriais conta por menos de 20% da população mundial, o que vai muito além da disponibilidade de terras ecologicamente produtivas no planeta Terra” (Wackernagel and Rees).

Em outras palavras, 20% da população mundial consomem 100% do capital ecologicamente produtivo do planeta, além do qual o capital natural entra em déficit. Isso ajuda a entender porque 2.7 bilhões de pessoas vivem com US$ 2 (dois dólares) por dia (fonte: Banco Mundial), o equivalente a uma ida diária ao Starbuck, ou quase isso.

Isso não é simplesmente possível… que cada pessoa continue a consumir nos atuais níveis industriais sem riscos de esgotamento irreversível de recursos e colapso da biosfera. (Wackernagel).

Globalização e interesses próprios, ambos consagrados e encorajados pelos princípios do neoliberalismo, são fatores dominantes no esgotamento do capital natural, pondo em evidência um defeito da economia de mercado, em que a “mão invisível” de Adam Smith efetivamente maximiza bem-estar material em um ambiente natural ilimitado, mas se torna uma força de destruição em um sistema finito como a ecosfera.

A “mão invisível” do mercado ROUBA o trabalhador

Como agravante, a “globalização” considera o mundo como infinito, o que ele não é. Além disso, infelizmente, a humanidade não pode socorrer o capital natural.

A eco-economia busca: (1) escala sustentável, (2) justa distribuição de recursos, e (3) eficiente alocação destes. (Robert Costanza, Gund Professor of Ecological Economics, Univ. of Vermont, at Yale School of Management, Interview, May 2010).

Mas o neoliberalismo não se mede pelos padrões de Costanza; ele antes instiga um modus operandi de terra arrasada, dirigido por implacáveis forças do lucro pelo lucro, esquecendo escalas sustentáveis ou justa distribuição de recursos, bem como sua eficiente alocação.

O resultado do padrão laser de focalização extrema nos lucros é que sempre há vitoriosos e vencidos, o que evidencia a falha do neoliberalismo em reconhecer a escala finita do planeta. Limites biofísicos deveriam restringir certas atividades, como por exemplo, a pesca industrial por arrasto (banida, mas ainda alternativamente praticada), já que as redes se estendem por mais de 30 milhas, apreendendo todo tipo de criatura do capital natural que encontram pela frente.

Além do mais, o neoliberalismo não leva em conta a justa distribuição da renda. Mas, como provam pesquisas, quanto mais desigual for a renda, menos produtiva será a economia. Quanto a isso, a teoria econômica dominante põe ênfase no “ter mais”, fiel à ideia de que há um “mais” a ser distribuído. No entanto, a teoria do efeito multiplicador da riqueza dos mais ricos não passa de um mito. Prova disso é o 1%, que captura e acumula montantes de capital desproporcionais (é por isso que eles são chamados o 1%), criando grupos concorrentes dentro da sociedade, colocando esta em conflito consigo mesma.

Um exemplo de externalidade social: a compra de uma grande casa para competir com outras grandes casas tem o efeito cascata de provocar outras compras de grandes casas (é preciso ter mais que o vizinho); um excesso leva a outro e logo precisa-se trabalhar duro para manter um nível de vida crescente que vai além dos limites naturais. Quando isso acontece, a qualidade de vida em geral piora, ao invés de melhorar.

CONSUMISMO

Para conter a compulsão ao consumismo insaciável da “compra pela glória”, uma externalidade social que esgota o capital natural, Robert Frank, um economista de Cornell, sugere um imposto progressivo sobre o consumo. Enquanto o luxo custaria mais, o investimento em itens socialmente produtivos seria isento de impostos.

Sob a teoria da sustentabilidade, por exemplo, a sustentabilidade, Wal-Mart consistiria em 100% de energias renováveis, zero desperdício e venda de produtos socialmente e ambientalmente sustentáveis. Imagine a quantidade de mercadorias inúteis que seriam eliminadas em lojas que adotassem essa redução de escalas.

Na natureza, as coisas não crescem para sempre, senão os girassóis cresceriam até as nuvens e teríamos porquinhos da índia de mais de 400 quilos. Muito pelo contrário, o crescimento alcança um “estado estacionário”, as coisas ficam pequenas. Se as economias seguissem o curso da natureza, a compensação aos estágios de crescimento seria alcançar o estado estacionário, como todos os sistemas naturais. Isso significaria o fim da competição impiedosa, o crescimento pelo crescimento; alternativamente, passar-se-ia da cooperação à colaboração para um estado estacionário de desenvolvimento, uma ecosfera sustentável.

Uma solução contra os princípios do neoliberalismo selvagem é a empresa pública de bens comuns, como imaginada por Elinor Ostrom, “Prêmio Nobel de economia” de 2009 (1933-2012), Governing the Commons, Cambridge University Press, 1990, que demonstra como a propriedade coletiva pode ser exitosamente administrada por associações de usuários, fazendo da atmosfera um bem com direitos de propriedade em favor da comunidade global. Quem quer que danificasse a propriedade global seria multado, o que forneceria justificação legal para taxas sobre o carbono, que seriam usadas para pagar dividendos a todos os proprietários (isso também foi defendido pelo doutor James Hansen, um líder da pesquisa sobre o aquecimento global), o que também ajudaria a resolver a questão da distribuição de recursos. Adicionalmente, criar-se-iam empresas públicas de oceanos, empresas públicas de bacias hidrográficas, etc..

Um interessante estudo de caso de comparação/contraste de alocação de recursos é o derretimento financeiro de 2008, quando trilhões foram gastos para salvar a finança, ou seja, Wall Street, bancos comerciais e grandes seguradoras. Por que não gastar trilhões em futuro sustentável, com uma taxa de consumo ecológico para complementar o imposto sobre a renda e promover um financiamento ecologicamente sustentável? Se gastamos trilhões provenientes dos impostos para salvar Wall Street, por que não fazemos o mesmo pela ecosfera, que é a estrutura básica, a única existente,  sobre a qual o neoliberalismo se desdobra para fazer seja o que for.

Ao final de tudo, acredita-se que num mundo em que a degradação da natureza não mais seja livre de taxas, em que cartões de crédito não garantam impunidade, os produtos sustentáveis vão custar menos, conquistar mercado e se tornar rentáveis. Ninguém deveria tirar proveito da degradação do capital natural. No entanto, é o que está acontecendo agora.
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[*] Robert Hunziker é mestre em História Econômica pela De Paul University; escreve artigos para várias publicações incluindo o Counterpunch; mora em Los Angeles e pode ser contactado no endereço: [email protected]

Fonte: http://redecastorphoto.blogspot.com.br/2015/04/as-pegadas-ecologicas-quando-eco.html

Redação

10 Comentários

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  1. É claro que o crescimento não

    É claro que o crescimento não é infinito, mas também é claro que ainda estamos muito distantes dos limites do crescimento.

    Grande parte da população mundial ainda vive em condições sub humanas. Se não houver crescimento e inclusão eles irão continuar nessa situação.

    O que a turma sugere, sem crescimento ? Expropriações de quem tem para quem não tem ?

    1. Amigo,
      Não existe “limite”

      Amigo,

      Não existe “limite” para o crescimento. O crescimento tende ao infinito. O fato de populações humanas viverem em codições subhumanas não tem absolutamente nada a ver com crescimento. Se fosse assim, índio estaria em situação milhões de vezes pior de quem vive em uma favela. Não é assim, é?

      Você deu já uma ótima sugestão, tirar de quem tem muito para quem tem pouco, equalizar as coisas. Agora boa sorte com isso.

      Abraço.

      1. Cumé qui é!!? Não há limites?

        Você acha possível empilhar, por exemplo, cem bilhões de criaturas humanas sobre a Terra?

        O fato de populações viverem em condições sub-humanas tem tudo a ver com o modelo de crescimento que está aí, que é o crescimento destinado para poucos e sonegados para os demais. Não significa que se trocar o modelo de crescimento, podemos ter um modelo de crescimento constante  e sem limites.

    2. Sei: deixar o bolo crescer, para depois distribuir.

      Esse papo é velho, Daniel, mas tão velho que o autor hoje se arrepende da frase. É papo de que não quer distribuir nada, do mais rançoso conservadorismo. Você reconhece que o crescimento é finito, mas saberia dizer em que ponto atinge a finitude? Esse ponto teria resiliência ou sustentabilidade para prosseguir? Se não tiver, o que se faria depois quando a produção começar a retroceder? A economia e a sobrevivência dos seres humanos não se move pela imaterialidade, nas ficções numéricas dos neoclássicos, nem estão assentadas puramente nas relações políticas das classes sociais, elas precisam da base material da natureza.

      O bolo solou, é impossível estender o padrão médio de consumo de recursos da natureza dos países ricos, para o resto da humanidade. Se apenas os chineses tivessem o padrão médio dos cidadãos dos EUA, nós todos deveríamos descer da Terra e deixar para eles todos os recursos planetários, e mesmo assim os recursos estariam esgotados em poucas décadas.

      Por exemplo, se o consumo de petróleo per capita mundial fosse igual ao dos EUA, a produção mundial deveria ser mais de 420 milhões de barris diários. Esse valor jamais será atingido, as mais otimistas previsões, e bota otimismo nisto, falam em 120 milhões em 2040 e depois viria o declínio inexorável das fontes, até seu esgotamento final. Os pessimistas apontam com realismo para valores bem menores, com o máximo atingido na presente década. Detalhe importante: Não temos substituto com a mesma eficiência e versatilidade para o petróleo. Mais, não há no horizonte a possibilidade de que alcancemos tal substituição, mesmo em 2040.

      O capitalismo é um sistema econômico que não se propõe a distribuir riqueza, ele foi feito para ganhar dinheiro e concentrar a riqueza nas mão dos detentores do capital. Toda forma de redistribuição da riqueza é realizada pela política, e ao deixarmos entregue à ganância capitalista, sem contraponto da política, o que assistimos é o que está aí, o ‘espetáculo’ neoliberal, onde “não há alternativa” (“There Is No Alternative”, o Princípio TINA de Margareth Thatcher) e o 1% leva a metade do que é produzido pelos demais.

      Entenda, distribuir qualquer coisa, de forma equilibrada, é retirar de onde elas estão mais concentradas, para onde estão escassas. O capitalismo também distribui, de forma desequilibrada, concentrando tudo nas mãos de poucos. Parafraseando o Bill, é a política, estúpido, que promove a redistribuição igualitária. É impossível fazer redistribuição sem tirar de “quem tem”. O “ter”, Daniel, não é um direito divino, que possa se colocar acima dos homens e da sobrevivência da humanidade. Todos nós nascemos sem nada, nus, sem bolsos onde enfiar as mãos, a propriedade dos meios de produção é uma criação relativamente recente, nos cinquenta mil anos de história do H. sapiens sobre a Terra. Logo a humanidade terá de se confrontar e resolver o dilema entre o “ter” e o “ser”, pois como a propriedade privada está estabelecida, o “ter” hoje ameaça o “ser”, o sobreviver da humanidade.

        1. Olá, Dani.

          Eu coloquei o texto, conforme as palavras finais de minha apresentação: para reflexão e debate; não siginifica que tenho inteira concordância com ele, mas acho interessante exposição para uma abordagem inicial do problema.

          Fiz uma observação para fugir da “armadilha”, que muitos levantam para defender a proposta de crescimento contínuo, as desigualdades entre as nações, para prosseguir na rota desenvolvimentista. Ela procura esconder a questão real, não se trata de desigualdades apenas entre nações, mas de desigualdades entre classes sociais.

          É óbvio que devemos reduzir os padrões dos países ricos, mas há uma observação a fazer, tal redução não pode atingir, como observa Carlos Taibo, uma viúva que recebe uma pensão de 500 euros mensais na Europa. Nosso país possui enormes bolsões de miséria, mas simultaneamente, em São Paulo se registra a segunda maior frota de helicópteros depois de Nova York; há o que decrescer aqui. Na África existem muitos países miseráveis, o governo de um deles patrocionou uma escola de samba no carnaval carioca; há o que decrescer na África, não me venham dizer que a cleptocracia do lugar tem de ser preservada.

          O capitalismo não suporta nenhuma contração da atividade econômica, é uma constatação histórica e objetiva, basta analisar as situações em que isto aconteceu. O sistema funciona para promover a acumulação, sua lógica é o do crescimento contínuo, quando isto não acontece, entra em crise profunda. O capitalismo é ecologicamente insustentável.

          O estado estacionário só é possível sobre base de recursos renováveis ou recicláveis, mas entenda que a reciclagem nem sempre é possível de se realizar de modo repetido em muitos ciclos, os recursos recicláveis sofrem perdas a cada ciclo e se dispersam pela natureza. O estado estacionário tem limites para se estabelecer, pela impossibilidade de haver reciclgem cem por cento, além disso é preciso definir qual é o nível estacionário em que se pode obter tal condição. Eu prefiro usar o conceito de resiliência, capacidade de recuperação, no lugar do conceito de estado estacionário ou de sustentabilidade. Sem resiliência não há sustentabilidade, não há nenhuma possibilidade de estado estacionário.

          Não vejo contradição da proposta do eco-socialismo com a noção de decrescimento econômico. O socialismo tem de ser também ecologicamente sustentável, ou terá o destino do capitalismo, a barbárie como alternativa. Não vejo o decrescimento apenas como uma proposta, será um fato inevitável diante do esgotamento de recursos naturais, principalmente energéticos, que acabarão causando o declínio econômico. O decrescimento tem de ser acompanhado de uma resposta política, de reorganizar a sociedade em torno de novos paradigmas, de uma economia racionalmente planejada, portanto socialista, para tais fins, e enfrentar a contração econômica inevitável, como uma economia solidária e voltada para cuidados dos seus cidadãos, isto não é incompatível com a proposta socialista, pelo contrário.

          A ficha que ainda não caiu para os eco-socialistas, assim como para a maioria dos socialistas, é que o fenômeno, não a proposta política, do decrescimento econômico é inevitável. Até o começo da Era Industrial, as economias cresciam em virtude do crescimento populacional e da expansão desta sobre novos territórios. No começo do século XIX, as maiores economias do mundo se situavam nos países mais populosos, a China e a Índia, pois a produção era fundada basicamente na energia do trabalho humano e de animais. O que alterou de lá para cá foi o uso intensivo de recursos energéticos de origem fóssil, que pode susbstituir e potencializar a energia do trabalho humano.

          Quando os eco-socialistas, como Michael Löwy, miram para os efeitos da queima dos hidrocarnonetos, eles apontam para a fumaça sem enxergar o fogo, não enxergam corretamente o motivo das chamas. Quando a fogueira diminuir, a produção irá desabar, pois não há substitutos, com a mesma versatilidade e eficiência dos combustíveis fósseis, que representam quase 90% da energia primária consumida. Repito, o fenômeno do decrescimento economico é inevitável, trata-se  de construir propostas para enfrentá-lo. Tanto os decrescentistas quanto os eco-socialistas convergem para propostas de superação do capital, vamos parar de picuínhas e frescuras de vaidades intelectuais afetadas. A palestra de Carlos Taibo demonstra o que estou falando:

          [video:https://www.youtube.com/watch?v=xopPWI6Mom8%5D

          Você pode aqui ==> (Baixar) o livro Decrescimento, Crise e Capitalismo, Estaleiro – 2010, de Carlos Taibo.  

          Um abraço.

           

    1. É exatamente o contrário.

      Segundo o conservadoríssimo economista Kenneth Boulding: “Qualquer um que acredita ser possível crescer de maneira exponencial e perpétua num mundo finito, ou é um maluco, ou é um economista”.

      Em palavras mais diretas, a “”ciência”” econômica que crê em crescimento ad æternum é coisa de M.A.L.U.C.O. A história da sociedade industrial vem se mostrando uma completa insensatez, não é à toa que nesse período se registra as guerras mais destrutivas já verificadas, genocídios foram industrializados e armas capazes da destruição da própria humanidade foram desenvolvidas, com arsenais acumulados para realizar a tarefa mais de uma vez, quando uma só basta. A alienação sobre a finitude dos recursos planetários faz parte dessa marcha da insensatez.

      Toda segurança alimentar do população mundial está baseada em petróleo, quando se sabe que tal recurso não dura para sempre e deverá alcançar seu auge produtivo no horizonte de uma década. Para cada caloria que ingerimos, dependemos de outra de petróleo e, mesmo com o atual nível de extração de óleo, cerca de um bilhão de seres humanos sobrevivem em insegurança alimentar, passam fome. Há sensatez em tal sistema econômico?

  2. Parabéns. Seu texto é para

    Parabéns. Seu texto é para guardar e divulgar. O que não compreendo é como tanta gente bem informada, políticos, intelectuais, tem tanta dificuldade para entender essa questão básica: os recursos naturais são finitos. É a realidade, nua e crua. Qualquer população de seres vivos em nosso planeta está sujeita a essa regra básica: crescem até atingir seu limite de suporte regido pelos recursos disponíveis em cada ecossistema. Atingido, ocorrem mortes e a população diminui. É um dos conceitos mais básicos da ecologia. A sociedade humana tem mecanismos para driblar esse limite, utilizando recursos poucos explorados de partes remotas ou de dificil acesso do planeta, por exemplo. Mas o limite continua existindo. É só uma questão de tempo. O que o sistema capitalista faz é acelerar o processo.

    1. Obrigado pelas palavras.

      As pessoas não gostam de discutir sobre sua finitude, realmente é um tema desagradável. Mas quem atinge a maturidade não pode se abster de refletir, em algum momento, nem que seja breve, e quanto mais maduro, mais se faz necessário a reflexão, sobre o nosso destino inevitável. Outro tema desagradável, principalmente para os que os têm muito, é a redução dos padrões de conforto e consumo, ninguém abre facilmente a mão de privilégios.

      A sociedade as vezes reage como pessoas imaturas, os interesses, espelhados em ideologias, a impulsionam para tanto. Prevalece não só marcas de imaturidade, mas crenças em esperanças fundadas em irracionalidade e a insensatez alienada, de que se trata de uma marcha para o colapso da atual civilização. Estamos perto de um ponto de não mais retorno, em que não teremos mais recursos, para uma transição de uma saída civilizada. Algumas reações, expressas abaixo nos comentários desta postagem, comprovam o que estou dizendo.

      Um abraço.

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