Samarco diz que não há provas de que lama vista em Abrolhos seja de Mariana

Patricia Faermann
Jornalista, pós-graduada em Estudos Internacionais pela Universidade do Chile, repórter de Política, Justiça e América Latina do GGN há 10 anos.
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Da Agência Brasil

Um dia após o Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e dos Recursos Naturais Renováveis (Ibama) divulgar a identificação de uma mancha de sedimentos na região do Arquipélago de Abrolhos, no sul da Bahia, a Samarco, empresa responsável pelo rompimento de uma barragem de mineração em Mariana (MG), alega que não há qualquer comprovação técnica de que o material observado na região de Abrolhos seja proveniente do acidente na Barragem de Fundão. 

Em nota, a Samarco informou que a empresa tem acompanhado o comportamento da pluma de turbidez que chegou ao oceano, mobilizou equipes e coletou amostras que serão avaliadas em laboratório. “Dados sobre a direção de ventos e intensidade de marés registrados nos últimos dias apontam para uma probabilidade muito baixa de deslocamento da pluma de turbidez do litoral de Linhares até o Arquipélago de Abrolhos.” diz a nota. A barragem se rompeu no dia 5 de novembro do ano passado.

Segundo a empresa, existem outros fatores que podem ter influenciado a movimentação de sedimentos na região costeira do Espírito Santo e sul da Bahia. “[Houve] o registro de fenômenos climáticos que ocasionaram, nos últimos dias, a formação de ondas no litoral entre 1,5m e 2,5m que provocaram ressuspensão natural de sedimentos outros que não têm relação com o ocorrido na Barragem de Fundão”, diz a nota.

Os técnicos do Ibama que sobrevoaram a área discordam da avaliação da empresa. Segundo a presidente do instituto, Marilene Ramos, os especialistas avaliam que a mancha não é compatível com o que costuma aparecer na região. A coleta das primeiras amostras foi feita ontem (7) e os resultados devem sair em até dez dias. Segundo o Ibama, a pluma tem uma parte com grande concentração de sedimentos que ocupa cerca de 392 quilômetros quadrados, e uma parte mais diluída que ocupa 6.197 quilômetros quadrados.

Nessa semana, fenômenos climáticos no Oceano Atlântico levaram a mudanças de correntes marítimas que causaram a movimentação da pluma de sedimentos, que estava concentrada próxima à foz do Rio Doce, no município de Linhares (ES). A pluma de turbidez chegou até a areia das praias da região, o que levou a Secretaria de Meio Ambiente do município a interditar a orla para banho desde ontem.

Peritos reforçam alerta sobre falhas na fiscalização e manutenção de barragens
 

Cerca de 20 peritos criminais federais estão participando das investigações da Polícia Federal sobre o rompimento de uma barragem de rejeitos da mineradora Samarco, no dia 5 de novembro do ano passado, no município de Mariana, em Minas Gerais. Trabalho similar foi feito em 2003 na cidade mineira de Cataguases, onde, em 29 de março daquele ano, rompeu-se uma barragem com resíduos industriais sob responsabilidade da Indústria Cataguases de Papel.

Na época, o Laudo 1.362/2003, do Instituto Nacional de Criminalística (INC), identificou como causas do acidente problemas como a falta de manutenção e de fiscalização e o excessivo prolongamento da vida útil da barragem, o que resultou em um processo erosivo da obra. Segundo o laudo, a barragem tinha sido edificada em 1990 com uma estrutura provisória, que deveria durar apenas dois anos.

De acordo com a Associação Nacional dos Peritos Criminais Federais (APCF), caso os alertas feitos pelos peritos – em especial os relativos à falta de fiscalização – tivessem sido ouvidos pelas autoridades, a tragédia ocorrida em Mariana poderia ter sido evitada, uma vez que é o poder público o responsável pela fiscalização de outras barragens.

“Tornamos pública essa preocupação com a falta de manutenção e fiscalização de tais obras, por meio de nossa revista institucional, que foi enviada a várias autoridades dos Três Poderes”, disse à Agência Brasil o presidente da APCF, André Morisson. “Em artigo sobre deslizamentos e desabamentos, alertamos que os administradores públicos estavam delegando a terceiros a responsabilidade sobre a boa qualidade das obras e que, apesar dessa delegação, o poder público não está livre da obrigação de bem fiscalizar os contratos e sua execução, pois quem contrata mal também responde solidariamente pelos ônus”, acrescentou o perito.

Morrison lembrou que, no caso de Cataguases, os peritos conseguiram evitar o rompimento de outra barragem da mesma empresa, que apresentava problemas semelhantes aos da que havia se rompido. O alerta foi repassado às autoridades por meio da Informação Técnica nº 122/03-do INC, o que resultou no esvaziamento e no reforço da barragem, antes que a situação se agravasse.

De acordo com o presidente da APCF, esta é mais uma das facetas preventivas que a perícia criminal tem, mas que são pouco conhecidas pelas autoridades e pela própria sociedade, apesar de sua relevância. “Naquele incidente, afortunadamente não houve mortes e os danos ambientais, interrupção de pesca e de abastecimento e deslocamento de famílias. Mas foi estipulada, por meio de uma ação civil, a maior condenação judicial por dano ambiental da história do Brasil, para a época, totalizando R$ 140,644 milhões em indenizações”, acrescentou Morrison.

Bem mais complexa do que o trabalho feito em Cataguases, a perícia de Mariana conta com  especialistas nas mais variadas áreas: geologia, engenharia de minas, química ambiental, biologia, medicina veterinária, geoprocessamento, engenharia florestal e engenharia civil. Morrison informou que os trabalhos em Mariana incluem a análises dos sedimentos e efluentes da represa, da mortandade de animais, da extensão dos danos à vegetação ciliar atingida pela lama de rejeitos e o  exame dos procedimentos de licenciamento ambiental do empreendimento.

Uma parceria com pesquisadores da Universidade Federal do Espírito Santo (Ufes) e da Universidade de Vila Velha está ajudando os peritos a identificar a correlação e a compatibilidade da composição mineralógica de amostras de água e sedimentos colhidas pelos pesquisadores ao longo do Rio Doce e no mar com amostras de sedimentos ainda presentes na cratera da barragem do Fundão, colhidas pelos peritos. Pesquisadores da Ufes colheram também sedimentos lançados pelo rio no mar, com uso de um navio oceanográfico da Marinha.

Contatada pela Agência Brasil, a Polícia Federal informou que este caso é de sua competência porque, além de envolver subsolo e minérios, que são bens da União, o acidente em Mariana jogou dejetos em um rio federal. A previsão é que o inquérito seja concluído em meados de fevereiro, mas há possibilidade de o prazo ser dilatado caso haja necessidade de mais diligências.

 

Patricia Faermann

Jornalista, pós-graduada em Estudos Internacionais pela Universidade do Chile, repórter de Política, Justiça e América Latina do GGN há 10 anos.

9 Comentários

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  1. lama

    Nassif,

    Para o Ibama afirmar que os sedimentos detectados provém do acidente da Samarco, que atingiu o oceano pela foz do rio Doce, a cerca de 400 quilômetros de distância de Abrolhos, é porque está de posse de relatórios técnicos cujos resultados analisados por peritos são indiscutíveis.

    1. Eh isso, Alfredo!
      Nao ha

      Eh isso, Alfredo!

      Nao ha razao nenhuma no mundo pra Samarco confessar que a lama eh dela em um caso criminal -e eh criminal.  Basta ao governo provar isso, eh papel dele.

  2. Dessa história toda

    O que eu quero saber mesmo é se vão punir o poder público pela falta de fiscalização.

    Pagamos todos os anos um trilhão de reais de impostos, entre outras coisas, para que o(s) governo(s) mantenham órgãos fiscalizatórios que evitem que sejamos roubados ou surpreendidos por tragédias provocadas pela ação de agentes econômicos.

    Se o(s) governo(s) assim não o faz(em), os responsáveis que gastam nosso dinheiro dizendo que fazem, tem que ser punidos. E neste caso, não adiantam penas pecuniárias ao(s) governo(s), pois estas serão pagas também com nosso impostos. Há que ser penas pessoais, dentre as quais eu conheço uma chamada privação de liberdade.  

  3. Vcs tem que serem justos com a Samarco
    Transitou em julgado?

    Se não, vc está sendo vil em acusar inocentes .

    E tem mais, e vi um especialista da Globo dizer que ” como a lama não era tóxica e foram encontrados metais pesados no Rio, é óbvio que a lama revolveu a calha do rio para trazer a tona Os metais pesados.”

  4. “Samarco diz que não há

    Samarco diz que não há provas de que lama vista em Abrolhos seja de Mariana

    entonces

    IBAMA deve diligentemente traduzir a notícia “técnico-científica” de que lama tóxica da SAMARCO-VALE não é da SAMARCO-VALE para a linguagem culta mundo animal e comunicar à comunidade de corais, fitoplâncton, zooplâncton e a toda cadeia alimentar da biodiversidade de Abrolhos, inclusive aos Homo sapiens que por lá habitam e por lá aparecem, que a lama tóxica que chegou por mar e pode lhes trazer problemas estomacais, manchas na pele, má-formação mutante e até destruição e morte da biota não é a lama tóxica miraculosa da SAMARCO-VALE-IBAMA!

    sei lá! de onde surgiu esse mar de lama tóxica no paraíso ambiental preservado do Mar de Abrolhos…

    [ desconfio de que seja um descarregamento noturno clandestino extraterrestre de lama tóxica cósmica bem lá no Mar de Abrolhos…]

  5. Ficar discutindo mais o quê

    Ficar discutindo mais o quê com essa empresa

    mal carater e seus advogados?

    Ela não vai ressarcir ninguém, não vai pagar

    nada e tudo ficará como dantes no quartel

    de abrantes.  E pensar que o Bermudes nem

    ainda entrou no rôlo.  Vai dar nada. Já disse

    isso aquí no primeiro dia.

  6. Confie: aA PF apura o crime ambiental, confia
    Nassif, a presidente do Ibama, Marilene Ramos, e a ministra do Meio Ambiente, Isabella Teixeira, ambas da UFRJ, estão recorrendo à mesma UFRJ para avaliar a tragédia de Mariana – que já previu a completa ressurreição do rio Doce em abril próximo e agora vai analisar a água de Abrolhos para saber se a lama que vem invadindo o arquipélago, oriunda da foz do rio Doce, pertence mesmo à Samarco – a mineradora que recobriu de boias flutuantes toda a foz e adjacências do Doce para coletar os resíduos, como se os mesmos fossem de petróleo. Ao invés de recorrerem às agências do Sisnama (Sistema Nacional de Meio Ambiente) para enfrentar a situação – valendo-se da experiência de instituições como a Cetesb, que há mais de 40 anos vem combatendo grandes despejos de produtos químicos no mar, com a ajuda do Instituto Oceanográfico da USP e outras entidades especializadas na questão -, ambas recorreram à impoluta Polícia Federal e sua Associação Nacional dos Peritos Criminais Federais para analisar e apurar a extensão dos males deflagrados pelo tsunami de lama tóxica da Samarco, que continua coletando para o Governo as amostras de água que irão determinar a procedência dos poluentes que estão aos poucos turvando as águas de Abrolhos e matando seus bancos de corais (tal como o biólogo André Rusch havia previsto aqui no blog há dois meses). Em síntese, o Governo federal despreza especialistas e instituições com renome internacional em poluição de mineradoras e impactos em ecossistemas frágeis e preciosos como é o caso de Abrolhos para entregar à PF o assunto. Só falta o juiz Moro avocar para si o julgamento desse crime ambiental, uma vez que a lama marrom-avermelhada da Samarco pode, pela teoria do domínio dos fatos, ser de autoria do PT…

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