Bitcoin é bolha, mas não é pirâmide, por Jeroen van de Graaf

Lourdes Nassif
Redatora-chefe no GGN
[email protected]

Bitcoin é bolha, mas não é pirâmide

por Jeroen van de Graaf

Resposta a “As criptomoedas e os crimes contra a economia popular e Salve se das criptomoedas enquanto é tempo por Luis Nassif”

Caro Nassif,

Eu concordo que Bitcoin não tem lastro, não é dinheiro, e vive uma bolha. Ainda, existem muitas cripto-moedas tentando copiar a mesma idéia, cujo único objetivo óbvio é enriquecer seus criadores. No entanto, também existem cripto-moedas mais sérias, que não são bolha. Ethereum é um bom exemplo. Não vou elaborar isso agora, mas quem pensa que Bitcoin representa todas as cripto-moedas está muito enganado. Neste sentido considero os títulos dos seus artigos, que se referem a “cripto-moedas”, genéricos demais; eles deveriam se restringir a Bitcoin apenas.

Quanto a Bitcoin, eu não concordo que é pirâmide ou crime contra a economia popular, como você disse repetidamente. Para ser um crime, tem que ter um autor, um responsável. Quem seria neste caso? “Satoshi Nakamoto”? A casa de câmbio que compra e vende Bitcoins? Ou simplesmente o próprio consumidor, que entra num negócio que ele não entende direito?

Já em 2012 o BCE determinou que Bitcoin é legal

Vale a pena ler integralmente o relatório sobre Bitcoin de 2012(!) do Banco Central Europeu [1], uma autoridade cuja reputação no mínimo se compara à de Paul Krugman e Nouriel Roubini. A página 22 (pdf: 23) do relatório é dedicada à justificativa teórica de Bitcoin, referindo-se à escola austríaca, que se posiciona contra “fiat money” em favor do padrão de ouro. Voltarei ao papel de ouro mais tarde.

A questão se Bitcoin é uma pirâmide (“Ponzi scheme”) é extensivamente discutida na página 27 (pdf: 28). No terceiro parágrafo, diz que, em teoria, não existe um organizador central que pode minar (burlar) o sistema Bitcoin e desaparecer com os fundos, condição necessária para ser um “Ponzi scheme” . Mas admite, no parágrafo seguinte, que existe uma assimetria de informação, devido à alta complexidade do sistema Bitcoin, e portanto é um esquema financeiro de alto risco. Ou seja, entre por sua própria conta e risco.

Seguindo esta linha, o Banco Central da Holanda decidiu que Bitcoin não é dinheiro, e a Autoridade Financeira decidiu que não é produto financeiro. Em maio de 2014 a justiça holandesa determinou que o Bitcoin deve ser tratado como se fosse um metal precioso, como ouro ou prata [2]. Em outras palavras, é um meio de troca, mas não é dinheiro. Desses metais o mercado determina um valor, e Bitcoin não é diferente.

Bitcoin é permitido no Japão, EUA e Europa

Observe que existem casas de câmbio para Bitcoin no mundo inteiro, em legislações muito atentas a essas novas tecnologias. Por exemplo, o documentário Banking on Bitcoin do Netflix (que todo mundo deve assistir) mostra como as autoridades financeiras de Nova York explicitamente permitiram Bitcoin e seus casas de câmbio.

Portanto, a observação que eu faço é que todos os países europeus, os Estados Unidos, e Japão chegaram ao consenso que Bitcoin em si é legal. A preocupação deles, como mencionado no relatório do BCE e recentemente repetido no G20, é com suas transferências não-rastreáveis, incentivando sonegação de impostos, pagamentos de drogas, lavagem de dinheiro etc. Mas repare, quando o FBI fechou Silk Road em 2013, ele poderia ter fechado Bitcoin também. Mas optou para deixá-lo aberto, preferindo tolerar e entrar com legislação, ao invés de lidar como uma reencarnação de Bitcoin 2.

E agora você me diz que é ilegal? Então, será que todas estas pessoas e autoridades estão erradas e que você tem razão? Com quais argumentos? Recorrer a Krugman ou Roubin não adianta. Krugman disse que Bitcoin é uma bolha (concordo) mas não que é ilegal [3]. Nouriel Roubin vai além, dizendo que o blockchain também é uma bolha (tendo a concordar) mas tampouco disse que Bitcoin é ilegal. Na verdade, nos EUA a questão da legalidade de Bitcoin já foi decidida alguns anos atrás, como Krugman e Roubin bem sabem.

Qual é o valor do Bitcoin?

Então, qual é o valor de Bitcoin? Antes de responder, deixe-me fazer mais perguntas:

Qual é o valor de um quadro de Van Gogh? Qual é o valor de uma tulipa negra?

Qual é o valor de um grama de ouro? Qual é o valor do Empire State Building? Qual é o valor daquela chácara no meio da mata? Como se diz em holandês: é o que o tolo paga. Ou seja, é o mercado que decide . Como disse o relatório do BCE: “[Bitcoin’s] exchange rate with respect to other currencies is determined by supply and demand and several exchange platforms exist.”

Uma diferença óbvia é que ouro e prata têm uma realização física, enquanto Bitcoin é apenas uma sequência de bits. Mas isso é um argumento? O negócio da Google e Facebook também é “apenas” uma sequência de bits. Um documento assinado digitalmente com um certificado digital da ICP-Brasil também é “apenas” uma sequência de bits. E por outro lado, aposto que a grande maioria das pessoas que negociam ouro, nunca sequer viu uma barra do ouro na vida. Eles simplesmente negociam documentos, promessas. E se esses são digitais, sequências de bits.

Vale lembrar que, no passado, a humanidade usou vários objetos como dinheiro: conchas, pedras, contas, colares etc. (como Pato Donald já sabia [4] :-). O caso dos Yap seja talvez o caso mais curioso — o seguinte vídeo no YouTube faz uma analogia interessante com Bitcoin: [5]. Também vale a pena ler o artigo do prêmio Nobel Friedman que, além de citar o dinheiro dos Yap, cita uma transação de ouro entre França e os EUA em 1933 (antes do Bretton-Woods e o “fiat money” de 1971), no qual o ouro não foi transportado mas ficou em Fort Knox, num armário separado com uma etiqueta: “Ouro da França” [6 , final de pg. 2 ].

Como o valor de ouro é sujeito aos caprichos do mercado, o Bitcoin também é. Concordo que Bitcoin é especulação de alto risco. É uma bolha? Sim. É volatil? Sim. É tolice? Sim, porque a grande maioria das pessoas nem entende o que é Bitcoin, mas quer entrar somente porque o valor está subindo, o que faz a valorização subir ainda mais. Repito: entre por sua própria conta e risco.

Mas não vejo onde está a pirâmide ou o crime contra a economia popular. Se pessoas optam por comprar ações numa empresa que não dá certo e levam prejuízo, eles também não podem reclamar no Procon. E apostar na MegaSena também é permitido, enquanto as chances de perder são bem maiores que no Bitcoin. Se amanhã, ao invés de comprar Bitcoin, todo mundo comprasse ouro, o valor de ouro também subiria para patamares atmosféricos, mas você não reclamaria, provavelmente. Seria uma bolha, mas não uma pirâmide, estou certo? Já houve este tipo de reclamação, de que o preço do ouro do mercado não tem relação com a realidade [7]. Então, em termos económicos, onde exatamente está a diferença intrínseco entre ouro e Bitcoin (além da volatilidade atual do Bitcoin, claro)? Eu não consigo ver.

Conclusão

Resumindo: observando outros países onde Bitcoin é um fenômeno há mais tempo, chego a conclusão que neles Bitcoin é considerado legal. Então não consigo entender como você chega à conclusão que seria um crime contra a economia popular.

Um abraço,

Jeroen van de Graaf

 
Lourdes Nassif

Redatora-chefe no GGN

8 Comentários

Deixe um comentário

O seu endereço de e-mail não será publicado. Campos obrigatórios são marcados com *

  1. .

    O texto é muito bom e objetivo.

    Eu acho que há alguns pontos que não devem ser ignorados. Por exemplo, acusar o bitcoin de incentivar o crime ou lavagem de dinheiro. O crime e lavagem de dinheiro existem há séculos e continuará existindo por séculos. Eles são praticados através das moedas FIAT e continuará assim, pois em última instância, quem negocia com tais volumes de dinheiro precisa em algum momento de alguma moeda FIAT, por conseguinte de algum banco, que são, estes sim, os principais canais de lavagem. O Bitcoin é para criminosos apenas um porto temporário para seus navios carregados. Qualquer movimentação suspeita tem obrigatoriamente que passar por uma instituição financeira. Ninguém compra milhões em armas ou drogas e deixa o valor ‘dormindo’ em forma de Bitcoins.

    Sobre o lastro, considero que o lastro do Bitcoin seja as moedas FIAT, pois a grande maioria dos usuários utilizam estas moedas, tanto para comprar, como para vender a criptomoeda, com a diferença que podem fazer isso em alguns minutos, sem precisar de sair de casa e com muito menos burocracia do que comprar ou vender ouro, ações, etc. Nos tempos do cheque bancário, um cheque podia ser passado entre mil mãos até ser finalmente tranformado em dinheiro, o lastro era o dinheiro depositado na conta de quem assinou. Com o Bitcoin é semelhante.

    Existem hoje mais de 400 criptomoedas e até empresas criam suas moedas digitais e aí estão muitos abusos e trapaças. Isso contudo, ocorre em qualquer setor da economia, seja indústria, comércio e serviços. É aí que reside o papel das autoridades financeiras de controlar e proibir, como fez a China no último ano com os ICOS de moedas digitais.

    O Bitcoin tem grandes inimigos nos bancos e empresas de cartão de crédito ou pagamentos digitais, como Paypal. Com o Bitcoin o procedimento é mais rápido e simples, sem agiotagem de taxas, o que ataca um negócio trilionário no mundo financeiro.

    Só existem 21 milhões de Bitcoins. Não é possivel aumentar esta quantidade, nem falsificar. Destes, estima-se que cerca de 16,5 milhões estão em circulação.  Portanto, quem quer bitcoin tem que se submeter à lei da procura e oferta. Este é um dos motivos da volatilidade. Talvez um dos principais. Por outro lado, você pode negociar, comprar ou vender Bitcoins já com pequenas quantias, a partir de 100 reais, o que facilita e até democratiza a moeda e a faz atraente como pequeno investimento. 

    Eu acho que o fato de ser 1) uma moeda universal, coerente com o mundo digital, pois permite diretamente , de forma digital, negociar neste dito universo digital, 2) por ser descentralizada e segura de falsificações, 3) por ser accessível através de celular, tablet, PC ou laptop, 4) por facilitar transações rápidas entre dois pontos de qualquer lugar do mundo e 5) por ter a aura de se desprender do controle oficial dos Estados e governos, o Bitcoin atrai uma grande massa de pessoas, seja por quais forem os motivos, para comprar, vender, investir, trapacear, enganar, o que não a faz no mundo digital, diferente da vida real.

  2. Ab absurdo

    Prezado sr. Van de Graaf,

    Lamento discordar do seu ponto-de-vista acerca do crime que envolve o bitcoin. Há uma falácia, posto que o inventor do bit coin realmente não cometeu crime, seria o mesmo que acusar o fabricante de uma faca, de ser criminoso. O crime se dá pelo uso do bitcoin. O que Nassif percebeu, é que o bitcoin como algumas outras criptomoedas, vêm sendo utilizadas em esquemas de piràmedes milionárias. Da mesma forma que o boi gordo, a tulipa foram utilizadas em esquemas de bolhas especulativas. Logo, sua defesa do bitcoin carrega o defeito lógico da falácia, posto que a premissa é falsa. O bitcoin é legítimo, mas a forma que vem sendo utilizada, não. Além disto, não há invenção que não esteja sujeita ao escrutinio ético. A doce ilusão de que a ciência é neutra, foi largamente empregada por empresas que fizeram experiências em humanos e outras espécies animais. A ciência não é neutra e seu uso pode e deve ser questionado. Há crime sim, na utilização das criptomoedas. A própria escassez e uso dos equipamentos para “garimpagem” constituem em ameaça à privacidade, ao domínio da propriedade, ao consumo insensato de energia e, principalmente, como fonte de especulação econômica. Cripto moedas não foram criadas com nobres objetivos. Não carregam a edulcorada visão de que substituirão o dinheiro. Não constituirão nova ordem mundial, que não seja a cobiça, a febre de ouro, que tanto devastou o planeta. Menos pretensão e mais compreensão sobre a extensão dos fenômenos. As ferramentas são neutras, o seu uso, feliz ou infelizmente, não.

  3. Falou..Falou.. e a conclusão …

    Falou..Falou.. e a conclusão é a mesma que eu já sabia, pois empre ouvi do meu avô !

    Não entre nessa .. como dizia meu avô: só é seu o que tem (palpável, tocável) em suas mãos, ou naquilo em que pisa em cima (mas, defendendo com um BOM RIFLE dependurado detrás da JANELA ou da PORTA) .. !

    O que está voando por aí (Papéis titulados em Ouro, Ações, etc.), PARECE SEU mais NÃO É .. (isso se chama: “HIPNOTISMO de MERCADO” e os caras são bons nisso!) … pois, no primeiro ventinho: ihhhh … “E O VENTO LEVOU” !!

    E vem aí um VENDAVAL dos FORTES (pra botar furacão envergonhado) com um COLOSSAL CRASH GLOBAL (quem disse isso hoje foi o “GREENSPAN (ex-FED)” e segundo ele: “A COISA VAI SER FEIA” ..!!.. e o CRASH, ainda ressaca de 2008, não é do BITCOIN e nem de CRIPTOMOEDAS..!!

    Disse Alan Greenspan, 91 anos, à Bloomberg TV: “Há DUAS BOLHAS, uma do mercado de ações e outra do mercado de títulos”,

    CONCLUSÃO:

    Ou seja, “NÃO SEJA TOLO”, em holandês(é o que o tolo paga) e nem em TUPINIQUÊS !

    “COMPRE CHÁCARAS no meio da MATA, pise em cima a vontade … PLANTE ÁRVORES e abrace-as com entusiasmo de quem “NÃO é TOLO”..!

    E o PLANETA AGRADECE ! 

  4. Salve-se do capitalismo enquanto eh tempo
    As cripto-moedas estao na ordem do dia da imprensa. Na GGN, apenas nos últimos dez dias, o assunto foi pautado, que eu saiba, pelo menos 5 vezes. Hoje mesmo, já são quatro matérias nesse sentido. De acordo com o próprio Luz Nassif, referindo-se ao seu texto recente sobre as “moedas escondidas”, o tema provoca uma enorme discussão.

    As investigações históricas de Laum até Le Goff, citadas por Robert Kurz (“Dinheiro sem valor – Linhas gerais para a transformação da crítica da economia política, 20. O sacrifício e o regresso perverso do arcaico”), contextualizadas pelo autor, “ignoradas tanto pela chamada ciência económica como pelo marxismo, e que também nas ciências históricas se mantiveram marginais até à data ”, assim esclareceram sobre a genealogia da moeda (dinheiro):

    “O que era o dinheiro pré-moderno? começou por ser o gelt, o sacrifício aos deuses, que originalmente foi um sacrifício humano. Com este gesto pagava-se uma “culpa” ou, melhor dizendo, cumpria-se um “dever” para que o Sol voltasse a nascer todos os dias, para ser possível a alimentação no “processo de metabolismo com a natureza” (Marx), talvez para afastar ou atenuar as desgraças e os golpes do destino, etc. Esta “objetualidade do sacrifício” simbólica, mas necessariamente material, percorreu, em primeiro lugar, um espectro histórico de metamorfoses, de substituições. Mas não substituições de Deus, como Bolz opina e Benjamin poderia dar a entender, mas substituições da própria vítima: desde os seres humanos jovens de uma rara excelência ou especial beleza, passando pelo gado bovino ou cavalar e outros animais sacrificiais, substituídos posteriormente pelas representações simbólico-materiais desses animais na forma de bolos ou hóstias, até ao metal precioso e à moeda cunhada. A estrutura deste “dever sacrificial” foi, em seguida, transferida sob múltiplas formas para as inter-relações sociais das pessoas, mas com isso não foi de modo algum “secularizada”; pelo contrário, a relação social (imanente) foi derivada da relação (transcendente) com Deus e constituída como estrutura complexa de “deveres” tanto pessoais como institucionais, de acordo com o exemplo da objetualidade do sacrifício. Isto não tinha nada a ver com uma economia ou um modo de produção no sentido do “trabalho abstracto” e das relações de valor.

    Ora, em que consiste o salto qualitativo no estatuto do dinheiro que, sob a forma de um processo, se desenvolveu desde a chamada protomodernidade com base nas condições da crise religiosa e da revolução militar? O aspecto fulcral profundamente irracional ou até “insano” consiste no facto de a velha objectualidade do sacrifício, por esse reacoplamento a si própria se ter transformado num movimento de fim-em-si abstracto e, justamente, se ter substituído assim ao poder transcendente. O sacrificado ao mundo dos deuses transformou-se ele próprio em quase-deus. Do ponto de vista de qualquer religião, só podemos estar aqui perante uma enorme blasfémia. Mas a religião não era nenhum mero sistema de crenças, mas uma relação de reprodução transcendentemente ancorada no “processo de metabolismo com a natureza” e nas relações sociais. Na medida em que se convertia num fim-em-si terreno em processo, a objectualidade do sacrifício era desvinculada da referência à transcendência divina e gradualmente, com ela, também a totalidade da reprodução. O que restou foi a expressão material da objectualidade do sacrifício que, afinal, já alcançara a forma de moeda ainda no seu antigo sistema de referência.”

    Os artigos recentes e seus comentários, todos ricos em informações e algumas especulações divergentes sobre as moedas-escondidas, permitem confirmar que o assunto está longe de se constituir em um consenso.

    Ou muito me engano em meu empirismo ou a unanimidade desses artigos comungaram pelo menos no ponto comum, mais ou menos “escondido”, de que o capitalismo é o destino natural do homem e assim seguirá, “ad eternum”.

    Ao que tudo indica, portanto, as moedas-escondidas teriam chegado para executar o moto-contínuo de sua reinação sobe a terra, quer se goste ou não delas.

    Desses artigos, o que mais chamou minha atenção, particularmente, foi o do Nader Amadeu, “Como chegaremos à idade das trevas em uma geração”. Especificamente, a passagem em que o autor antevê as consequências distópicas do “anarcocapitalismo”, termo, aliás, não utilizado na matéria em apreço.

    Anarcocapitalismo, ou capitalismo sem Estado, é a consequência óbvia do capitalismo que, valendo-se em larga escala da capacidade tecnológica – cripotgrafia, a exemplo do “Blockchain” – de esconder “não só todo nosso dinheiro mas também uma inúmera gama de ativos (ações, bens, imóveis, títulos de propriedade, registros, documentos e dados pessoais)” (Nader Amadeu), leva o Estado da asfixia ao encolhimento e, “in extremis”, à extinção. Isso porque tais ativos escondidos têm a capacidade de serem transacionados pelos proprietários, produtores, prestadores e consumidores sem intermediações. A rigor, necessitariam apenas de uma rede mundial de computadores, seja ela qual for no futuro. Assim o Estado, por meio das instituições que regula – bancos, notadamente – se vê tolhido da possibilidade de aferimento das trocas de titularidade de ativos e consequente da cobrança dos impostos que incidem sobre essas trocas.

    Os elementos fortes que creio haverem sido desconsiderados nas previsões apocalípticas do Nader Amadeu, assim como também desconsiderei de forma muito mais tosca em comentário igualmente apocalíptico anteriormente postado sobre o assunto, foram dois.

    O primeiro diz respeito ao fato de que, na sociedade de mercado, o único e último LASTRO de qualquer moeda, o único meio de geração de valor real é o trabalho humano. Isso é elementar, apesar de constatar cada vez mais esquecido. Esse LASTRO se dá pela apropriação, por parte do capitalista, da mais valia que expropria do trabalhador.

    Antes comentar mais sobre este “primeiro ponto”, contudo, peço licença ao leitor paciente para a reprodução ilustrativa, a seguir, da única passagem (fragmento) de Karl Marx, na qual ele fala sobre o fato de o uso das máquinas representarem uma contradição insanável do capitalismo, condutora, portanto de seu fim e propiciadora de sua superação. Tal fragmento sobre as máquinas o que pode ser estendido, sem maiores reparos, ao atual estágio de desenvolvimento tecnológico da informática e sua congênere, a robótica, aplicados ao trabalho, realidade histórica contemporânea evidentemente inexistente ao tempo de Marx:

    “A troca do trabalho vivo pelo trabalho objectivado, quer dizer, a manifestação do trabalho social sob a forma antagónica do capital e do trabalho, é o último desenvolvimento da relação do valor e da produção baseada no valor. O pressuposto desta relação é – e continua sendo – que a massa de tempo de trabalho imediato, a quantidade de trabalho utilizada, representa o fator decisivo da produção de riquezas. Ora, à medida que se desenvolve a grande indústria, a criação de riquezas depende cada vez menos do tempo de trabalho e da quantidade de trabalho utilizada, e cada vez mais do poder dos agentes mecânicos postos em movimento durante a duração do trabalho. A enorme eficiência destes agentes, por sua vez, não tem qualquer relação com o tempo de trabalho imediato que custa a sua produção. Depende, antes, do nível geral da ciência e do progresso da tecnologia, ou da aplicação dessa ciência à produção. (O desenvolvimento das ciências – entre as quais as da natureza, bem como todas as outras – é, certamente, função do desenvolvimento da produção material). A agricultura, por exemplo, torna-se uma simples aplicação da ciência do metabolismo material e o modo mais vantajoso da sua regulação para o conjunto do corpo social. A riqueza social manifesta-se mais – e isto revela-o a grande indústria – na enorme desproporção entre o tempo de trabalho utilizado e o seu produto, assim como na desproporção qualitativa entre o trabalho, reduzido a uma pura abstração, e o poder do processo de produção que ele controla. O trabalho já não surge tanto como uma parte constitutiva do processo de produção; ao invés, o homem comporta-se mais como um vigilante e um regulador face ao processo de produção. (Isto é válido não só para a maquinaria, como também para a combinação das atividades humanas e o desenvolvimento do intercâmbio humano). O trabalhador não mais introduz a matéria natural modificada (em ferramenta) como intermediário entre si e a matéria; antes introduz o processo natural – transformado num processo industrial – como intermediário entre si e toda a natureza inorgânica, dominando-a. Ele próprio coloca-se ao lado do processo de produção, em vez de ser o seu agente principal. Com esta transformação, não é o tempo de trabalho realizado, nem o trabalho imediato efetuado pelo homem, que surgem como o fundamento principal da produção de riqueza; é, sim, a apropriação do seu poder produtivo geral, do seu entendimento da natureza e da sua faculdade de a dominar, graças à sua existência como corpo social; numa palavra, é o desenvolvimento do indivíduo social que aparece como a pedra angular da produção e da riqueza. O roubo do tempo de trabalho de outrem sobre o qual assenta a riqueza atual surge como uma base miserável relativamente à base nova, criada e desenvolvida pela própria grande indústria. Logo que o trabalho, na sua forma imediata, deixe de ser a fonte principal da riqueza, o tempo de trabalho deixa e deve deixar de ser a sua medida, e o valor de troca deixa portanto de ser a medida do valor de uso. O trabalho excedente das grandes massas deixa de ser a condição do desenvolvimento da riqueza geral, tal como o não-trabalho de alguns poucos, deixa de ser a condição do desenvolvimento dos poderes gerais do cérebro humano. Por essa razão, desmorona-se a produção baseada no valor de troca, e o processo de produção material imediato acha-se despojado da sua forma mesquinha, miserável e antagônica, ocorrendo então o livre desenvolvimento das individualidades. E assim, não mais a redução do tempo de trabalho necessário para produzir trabalho excedente, mas antes a redução geral do trabalho necessário da sociedade a um mínimo, correspondendo isso a um desenvolvimento artístico, científico, etc. dos indivíduos no tempo finalmente tornado livre, e graças aos meios criados, para todos. O capital é em si mesmo uma contradição em processo, [pelo fato de] que tende a reduzir o tempo de trabalho a um mínimo, enquanto, por outro lado, coloca o tempo de trabalho como a única medida e fonte de riqueza. Assim que, diminui o tempo de trabalho na forma necessária para aumentá-lo na sua forma excedente; coloca portanto, o trabalho excedente, em medida crescente, como uma condição – questão de vida ou de morte – para o necessário. Por um lado, o capital convoca todos os poderes da ciência e da natureza, assim como da cooperação social e intercâmbio social, com o fim de tornar a criação de riqueza independente (em termos relativos) do tempo de trabalho empregado nela. Por outro lado, o capital necessita de utilizar o tempo de trabalho como unidade de medida das gigantescas forças sociais entretanto criadas desta maneira, e para as confinar dentro dos limites requeridos para manter o valor já criado como valor. As forças de produção e as relações sociais – dois aspectos diferentes do desenvolvimento do indivíduo social – aparecem ao capital como meros meios, e não são para ele mais que meios para produzir apoiando-se na sua base limitada. Na verdade, contudo, elas são as condições materiais para rebentar com essas mesmas bases. “Uma nação é verdadeiramente rica quando em vez de 12 horas se trabalha apenas 6. Riqueza não é dispor de tempo de trabalho excedente” (riqueza efetiva), “mas de tempo disponível, para além do usado na produção imediata, para cada indivíduo e para toda a sociedade”. [The Source and Remedy, etc., 1821, p.6.]

    A natureza não produz máquinas, locomotivas, caminhos-de-ferro, telégrafos, etc. Estes são produtos da indústria humana; materiais naturais transformados em órgãos da vontade humana sobre a natureza, ou da participação humana na natureza. Eles são órgãos do cérebro humano, criados pela mão humana; o poder do conhecimento objetivado. O desenvolvimento do capital fixo indica até que ponto o conhecimento social geral se tornou uma força produtiva imediata, e, portanto, até que ponto, as condições do processo da própria vida social está sob o controlo do intelecto geral e foi transformado de acordo com ele. Até que ponto as forças produtivas sociais foram produzidas, não só sob a forma de conhecimento, mas também como órgãos imediatos da prática social, do processo vital real.”

    A atual inflação das moedas fiduciárias ou “fiat”, reflete o adiantamento, por parte da economia de mercado, de valores reais a serem supostamente apropriados sob a forma de mais valia do trabalho humano futuro a prazos estratosféricos, cada vez mais próximos do infinito sob a forma de crédito.

    Ao mesmo tempo, isso embute e reflete a incapacidade crescente do mercado poupador de mão de obra de gerar valores reais. Mesmo em um país atrasado como o Brasil, vivemos em um mundo no qual o trabalhador, gerador de mais valia e consumidor, substituído pelas máquinas (informática, robótica), vai se tornando, de maneira crescente, cada vez mais obsoleto, sendo por isso inevitavelmente descartado pela própria economia de mercado que engendra a inutilidade do trabalho.

    Portanto e retomando o fio da meada, o primeiro ponto que creio haver sido desconsiderado por Nader Amadeu é o fato de que a ampliação do uso da estratégia dos ativos-escondidos pela economia de mercado é incapaz de deter o avanço das contradições que conduzem ao fim do capitalismo.

    Isso merece ser aprofundado, admito. Contudo, creio que tudo leva a crer que o fenômemo em si dos ativos-escondidos aponta em direção oposta aos meros “novos caminhos” para a “eterna” sociedade de mercado. Ao contrario, é mesmo um sintoma de seu fim.

    Isso porque, ao supostamente substituir a força de trabalho humano pelo “quantum” da energia despendida para o acoplamento de valor às moedas escondidas, de acordo com os pressupostos da economia de mercado, que a criptografia aplicada não pretende substituir mas sim potencializar, anula assim qualquer possibilidade de LASTRO para tais moedas.

    Em última instancia, inflacionado ou não, fiduciária ou não, talvez seja preciso repetir até a exaustão para que os “esquerdistas” seduzidos pelo sujeito automático do capitalismo compreendam, o verdadeiro LASTRO do dinheiro é o trabalho morto – mais valia do trabalho apropriado no passado – que ele escamoteia. Portanto, jamais a “energia” será capaz de substituir tal premissa básica do capitalismo, o fundamento em si do tal “mercado”, e jamais as moedas assim geradas terão qualquer valor real em sua composição.

    O segundo ponto entendo como sendo o mais importante, porque condicionado e não determinado em termos de desenvolvimentos históricos lógicos, como o débâcle inevitável do capitalismo devido as suas contradições intrínsecas, como bem previu Marx. Alguém ainda duvida que estamos assistindo ao asselvajamento da sociedade de mercado a olhos vistos?

    Este segundo ponto é o porvir possível.

    Ora, Nader Amadeu não considerou seriamente que, quando o mercado deixar cada vez mais de cumprir suas promessas, no “espaço de uma geração” como diz o titulo de seu artigo, seguirá aumentando a massa de descontentes e não apenas o número de fascistas dispostos a se tornarem milicianos apoiadores de micro-estados, a surgirem feito pipocas feudais como meio de assegurar a opressão dos despojados e a manutenção deles ao largo da catástrofe prenunciada.

    Eis o campo de atuação que cada vez mais se abrirá para movimentos organizados coletivistas, para a atuação política de pensamentos solidários contrapostos à barbárie que se avizinha. É possível imaginar, ainda, o papel relevante que provavelmente passarão a desempenhar os movimentos identitários com bases nacionais residuais, herdeiros dos antigos estados, não mais com escopo competitivo e, portanto reacionário, pois isso, a competição, é inerente à sociedade de mercado com prazo de validade vencido.

    É razoável imaginar que a disputa deixará de ser a de todos contra todos, passando a ser entre fascistas de um lado e massas desvalidas de outro. Não haverá mais a possibilidade factível e objetiva de cooptação de tais contingentes populacionais, cuja superioridade numérica aos fascistas arregimentados pelos “senhores” será avassaladora, pois não haverá o que ser prometido em troca.

    O mais provável, portanto, é que os que ainda se dedicarem à concentração de riquezas e recursos naturais em detrimento da esmagadora maioria sejam expropriados e combatidos. Eles provavelmente fenecerão aniquilados, pois será impossível o monopólio das armas em uma tal perspectiva, no qual os recursos naturais e os meios de produção se encontram espalhados em escala mundial. O conhecimento para a exploração de tais instrumentos e recursos também é um patrimônio humano cada vez mais socializado.

    Face ao longamente exposto, creio ser preciso que as forças progressistas, sobre as quais fatalmente recairão as responsabilidades de uma tal superação, comessem a abrir os olhos e reassumam suas antigas bandeiras históricas.

    O tempo de uma geração passa ligeiro. O comunismo capitalista de estado é história; a social democracia se mostra incapaz de deter a perda crescente de direitos das massas, antes sendo facilmente cooptada pelo mercado. Em um mundo onde o capitalismo chega ao fim, a saída emancipadora talvez seja ANARCOCOMUNISMO.

    Salve-se do capitalismo enquanto é tempo.

  5. “Quem seria neste caso?

    “Quem seria neste caso? “Satoshi Nakamoto”? A casa de câmbio que compra e vende Bitcoins? Ou simplesmente o próprio consumidor, que entra num negócio que ele não entende direito?”

    Simplesmente perfeito. Isso que as pessoas ainda não conseguiram encontrar. O culpado que vai ser preso. É tipo o triplex, que ora não tem dono, ora tem dois donos simultâneamente.

    Na minha opinião, as únicas pessoas que devem ser presas são as que prometem x% de lucro, como aqueles malucos da Empiricus que já foram processados por várias coisas e fazem umas previsões bem mirabolantes na área economica…

     

    O resto do texto também é um primor. É incrível como as pessoas dão valor ao ouro, apenas porque é físico e ‘tangível’. Me lembrou quando cientistas descobriram um planeta de diamante (http://gizmodo.uol.com.br/o-maior-diamanete-do-universo-e-na-verdade-um-planeta/). Se trouxéssemos todo o diamante daquele planeta para a Terra, o diamante deixaria de ter o valor enorme que tem hoje em dia, porque seria tão comum quanto sal ou areia.

    O que falar do Facebook, que é ‘só um site’, mas vale mais de $500 bilhões?

    Em outro post um leitor disse que não acredita no Bitcoin porque não pode pagar a passagem de onibus com ele. Ora, eu também não posso pagar a passagem em dólar, mas isso não significa que o dólar não vale nada.

    A ‘bolha bitcoin’ explodir depende da aceitação (ou não) da moeda, seja nas lojas virtuais ou na passagem do ônibus. Depois disso ninguém vai discutir o ‘preço justo do bitcoin’, assim como não se discute o ‘preço justo do dólar’, contanto que seja o suficiente para suprir suas necessidades com o seu salário.

     

    PS: Me deixa triste que os ‘progressistas do blog’ estejam negativando todos os comentários que não são do Nassif, apenas por negativar. É incrível como as pessoas levam tudo pelo lado ideológico (com sua opinião já pré-formada e inflexíveis), em vez de debater idéias, como o próprio Nassif falou que era a intenção dos posts…

  6. BITCOIN É BOLHA, MAS NÃO É

    BITCOIN É BOLHA, MAS NÃO É PIRÂMIDE … uhhh, sei (tem jeitão de…)!

    PODE NÃO SER CRIME POR FALTA DE LEGISLAÇÃO ESPECÍFICA,.. uhhh,..sei (pois tá TRAVESTIDO de …)..!

    MAS QUE É FRIA .. Ah ISSO É …(golpe, esperteza e picaretagem global) NÃO TENHO a MENOR DÚVIDA (chamem do que quiserem: BITCOIN .. TOLINHO, BOBÃO, etc)!

    Pô,… AGORA TÁ ASSIM (d+) … voce acessa a Internet, entra em um site qualquer e “CHOVE” ANÚNCIOS ENTUSIASMADOS FALANDO MARAVILHAS (em bom Português) para “vender” o peixe (podre) do BITCOIN e em seguida VEM a OFERTA da “maravilha”: “COMPRE AGORA o MELHOR INVESTIMENTO do MUNDO: bitcoin” e pague direto com seu CARTÃO de CRÉDITO (é bandidagem D+ não acham !).

    QUANDO o MILAGRE é GRANDE, DESCONFIE do SANTO !

    SOU CONTRA as EXPLICAÇÕES dadas aqui neste ARTIGO pois deixou no ar, um viés de “LEGALIDADE ao BITCOIN” porque nos Estados Unidos, Japão, Israel, etc… foram liberados como “algo” LEGAL.

    So What ?

    Se eles SÄO PICARETAS, problema deles… (é só lembtrar a PICARETAGEM LEGAL do Tio SAM que explodiu em 2008,.. né) que derrubou meio mundo e agora vai ter CRASH novamente pela RESSACA, RESCALDO de 2008 !

    É PRECISO DIZER CLARAMENTE que BITCOIN é coisa “parida” por ESPERTALHÕES como algo “ENGANA TROUXAS”..!

    A única coisa que CONCORDO com o ARTIGO é que: “ENTRA QUEM QUER POR CONTA e RISCO” .. mas precisa deixar claro que BITCOIN é PICARETAGEM, GOLPE FINANCEIRO … puro e simples!

    E no meu entendimento é CRIME .. se falta LEGISLAÇÃO para tal, mesmo assim continua sendo CRIME (conceitualmente)…!

    É mais ou menos como VOCE COMPRAR através de FOTOS uns “pedaços de noites de cama” com a MULHER mais linda do mundo, mas NUNCA ter VISTO a “RAINHA em CARNE e OSSO” não podendo APALPAR a BELDADE !

    Vive de ilusão quem quer .. eu PREFIRO pegar aqui na minha mão … o que está VOANDO POR AÍ, nunca será meu !!

    SIMPLES ASSIM !

  7. O bitcoin não é uma bolha

    Bolha é quem investe em bitcoins.

    Claro que é uma opinião personalíssima e que portanto, pode merecer o absoluto respeito apenas  de quem a emitiu.

    E essa pessoa, jamais investiria seu suado dinheirinho no que chama de ridícula, imoral e doentia especulação.

    A máxima “quem não trabalha, não come” é que tem mantido a natureza em atividade, o mundo girando , e tudo o que nele há.

    Aos jovens especuladores que investem em bitcoins que desejam suas aposentadorias antes de começarem a trabalhar  a gente só pode dizer:

    Quer descansar, trabalhe primeiro.

    Aos remanescentes e crédulos provectos que investem suas aposentadorias e rendimentos em bitcoins a gente diz:

    “nunca é tarde para ter prejuízo” mas as vezes pode ser muito tarde recompo-los.

     

       

Você pode fazer o Jornal GGN ser cada vez melhor.

Apoie e faça parte desta caminhada para que ele se torne um veículo cada vez mais respeitado e forte.

Seja um apoiador