A ‘barriga’ intencional da ‘Folha’, por Luciano Martins Costa

Lourdes Nassif
Redatora-chefe no GGN
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do Observatório da Imprensa

LULA E A IMPRENSA

A ‘barriga’ intencional da ‘Folha’, por Luciano Martins Costa

Uma das grandes preocupações de teóricos do jornalismo após a criação da internet era o conflito potencial entre a ambição da notícia exclusiva e a nova realidade da mídia universal. Como conseguir um “furo” jornalístico se qualquer um que tiver acesso à rede mundial de computadores pode dar uma notícia em primeira mão?

Esse fantasma se materializou com o predomínio das redes sociais e o avanço dos telefones celulares.

O “furo” jornalístico é um troféu valioso demais para ser colocado em risco por um desmentido imediato na rede global de comunicação. Por outro lado, uma informação incorreta pode afetar a credibilidade de um veículo de comunicação, ainda com mais gravidade se ela se espalhar o suficiente para influenciar um grande número de pessoas antes de ser revelada como fraude.

Por isso, as redações dos melhores jornais do mundo investiram em três recursos para minimizar o risco das “barrigadas” – os “furos” falsos.

O primeiro recurso é contar sempre, entre os editores, com profissionais experientes, capazes de contextualizar qualquer notícia e questionar sua verossimilhança. Entre meados dos anos 1980 e o final dos 90, por exemplo, O Estado de S. Paulo tinha uma equipe de editores executivos que praticavam nas reuniões da primeira página o que se chamou de “dessacralização da notícia” – ou seja, cada editor especialista era desafiado a fundamentar a pauta que oferecia como destaque, em linguagem que pudesse ser entendida por um leigo.

O segundo recurso, e igualmente eficaz, é contar com um planejamento da pauta e processos de seleção de prioridades que mantenham a equipe em alerta para pontos obscuros em informações primárias.

O terceiro, e mais importante, é a própria alma do jornalismo: a dúvida. Ela se resume na pergunta desconfiada: “E se…?”

Evidentemente, ninguém vai esperar, por exemplo, os atestados de óbito, para afirmar que os passageiros de um avião que explodiu estão todos mortos, mas ainda assim a praxe é esperar por uma informação oficial para fazer essa afirmação.

E se, contra todas as probabilidades, for encontrado um sobrevivente?

Sem querer, querendo

Nenhum desses cuidados primários foi tomado pela redação da Folha de S.Paulo, na quinta-feira (25/6), ao noticiar, em sua edição digital, que o ex-presidente Lula da Silva havia ingressado com pedido de habeas corpus preventivo, na Justiça do Paraná, para não ser preso como acusado na Operação Lava-Jato.

A notícia original foi publicada às 11h25. Cinco minutos depois, uma nota colocada apressadamente dizia: “Erramos – Não foi Lula que pediu habeas corpus preventivo; ação foi de consultor sem ligação com o ex-presidente”.

A pequena nota corretiva foi substituída muito tempo depois, às 15h07, por outro “Erramos”, que informava: “Versão anterior da reportagem ‘Habeas corpus preventivo pede que Lula não seja preso na Lava Jato’ informou incorretamente que o pedido de habeas corpus havia sido feito pelo ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva” (ver aqui).

O título, o texto e a chamada na home page do portal foram corrigidos, mas a versão original já corria pelas redes sociais, impulsionada por uma equipe a serviço do senador Ronaldo Caiado (DEM-GO).

Mesmo com os sucessivos atentados ao bom jornalismo que fazem a rotina da imprensa brasileira, difícil acreditar que a redação da Folha de S. Paulo tenha cometido um mero erro técnico, uma “barrigada”.

Foi mais do que incompetência: foi resultado de um empenho do jornal em criminalizar o ex-presidente da República, no rastro de um processo que começa a incomodar alguns dos mais renomados juristas do país, por uma sucessão de decisões tidas como arbitrárias.

O viés condenatório da Folha pode ser percebido na versão atualizada às 15h32 de quinta-feira, na qual se lê que “segundo o Instituto Lula, qualquer cidadão pode impetrar o habeas corpus”. O correto e honesto seria dizer, simplesmente, que “o pedido de habeas corpus pode ser feito em nome de terceiros por qualquer cidadão”, como saiu na edição de papel na sexta-feira (26/6) – porque essa é a norma legal, não a “opinião” do Instituto Lula.

As trapalhadas que se seguiram apenas aumentaram a repercussão da notícia – e para muitos cidadãos fica a impressão de que Lula da Silva está na iminência de ser colocado na cadeia – o que não é verdade, porque ele nem sequer é investigado.

Os outros jornais alimentam essa versão ao publicar textos ambíguos – por exemplo, o Estado de S. Paulo diz que Lula “nega que seja o autor do pedido” – frase que não se justifica depois que o impetrante do habeas corpus admitiu ter agido por conta própria.

O episódio dá razão aos impertinentes que chamam aquele jornal de “Falha de S. Paulo”.

 

Lourdes Nassif

Redatora-chefe no GGN

20 Comentários

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  1. Interessante que a BOVESPA caiu acentuadamente

    ontem liderada por Petrobras ON e PN, exatamente com base nessa barriga intencional.

    Mas a nossa CVM nem se manifesta.

    Mais uma prova que todas nossas “instituições” não funcionam para o bem público, mas somente para o(s) ben(s) de uma casta, bem encastelada nelas de maneira quase hereditária. E com a proteção (no sentido que Don Corleone tinha) da meia duzia de “famílias” donas da mídia corporativa.

    1. Exatamente!
      Quem investiu na

      Exatamente!

      Quem investiu na Patrobrás pode ter perdido por muito dinheiro com esse boato criminosamente propagado pela Folha. No entanto nem CVM, nem qualquer investidor esboçou a mínima reação.

      Na ânsia de derrubar o “comunsta” Lula, a Folha está atingindo mortalmente os capitalistas….

      Vá entender esse povo……

       

  2. Errar é humano?!

    A desculpa esfarrapada da Folha resume-se na máxime: errar é humano.

    Agora, pelo visto, o desmentido não desmentiu.

    Poderíamos dizer – se não houve intenção inteligente de manipular – que permanecer no erro é burrice.

    Ora, no caso já se vê que não há nenhunha burrice.

    Então….

  3. O que resta…

    Para mim, o que resta do episódio é mais um erro de digitação. Erraram o nome do senador: em vez de “i”, deveria ser “g”.

  4. O furo, a barriga, a imunidade e o desespero.

    O suposto “erro jornalisitico” foi uma atitude politica, afinal FOLHA, ESTADAO, GLOBO e similares estão imunes

    e sao endeusados até por aqueles que sofrem cotidianamente em suas manchetes , linhas e entrelinhas.

    Parecem com alguem que está sumindo na areia movediça com uma metralhadora em punho a disparar para todos os lados.

  5. Já fui assinante.

    Já fui assinante. Felizmente, faz tempo que desintoxiquei. Acho divertido quando o telemarket liga oferecendo assinatura desse panfleto que um dia quis ser jornal…

  6. Segundo o MPF, o “crime” de Lula: dar palestras

    Pois se preparem pois vai ter café no bule, não vamos ficar parados vendo esse pais ser destruir por esse bando de ratos incrustados nas Instituições e amparados por uma midia bandida e por um Congresso dominado pelo que de pior há na politica nacional e que não pensam noutra coisa senão f…a todos nós com essa tática da terra arrasada.

    [video:https://www.youtube.com/watch?v=RNEN9eTWAtk%5D

  7. Os jornazistas tupinquins só


    Os jornazistas tupinquins só colocaram o rabinho entre as pernas quando, por causa da Copa, tiveram o lixo que são confrontado com a qualidade do jornalismo praticado nos paises civilizados. Quando os jornalistas estrangeiros foram-se embora eles voltaram a ser o que sempre são: bandidos travestidos de jornalistas, se bem que esses coitados apenas cumpre ordens do patrão, se são mandados pra cobrir algum escandalo que envolva PT corre prá lá pq cumprem ordens, já prá noticiar a roubalheira no atacado de tucanos, como não são mandados, o povo nem fica sabendo. Lixo esse jornalixo.

  8. Impertinente

    O ja popular colunista Luciano Martins Costa, chamou de impertinentes aqueles que ha muito tempo acusam a Falha de ser PIG e o PIG de falhar dia sim outro também. Eh verdade Luciano, somos por vezes bem impertinentes em nossas demandas e reclamações. E ainda bem, ja viu como anda a vida la fora?!  

  9. E a ombudsman da folha não

    E a ombudsman da folha não diz nada?

    Aonde se viu publicar o desmentido na seção “erramos”?  Cadê a seção “Mentimos”?

  10. Jornaleco, e de 3ª categoria

    Esse jornaleco e outros da mesma estirpe estão com os dias contados, torço para que chegue logo esse momento, pois não merecem apoio de espécie alguma. E viva a internet que nos libertou desses penas alugadas e lacaios de quem paga mais.

  11. O que esse jornal vende tem

    O que esse jornal vende tem leitor certo: o que, mesmo sabendo ser no mínimo imprecisões jornalísticas e no máximo mentiras deslavadas, gosta de ler. Pouquíssima gente procura nesse jornal – bem como no OESP, na revista Veja ou nos veículos da Globo – senão algo que lhes confirme suas crenças. Ou pelo menos aquilo em que querem acreditar. Mesmo porque se procurar algo diferente disso não vai encontrar.

    É uma pena que essas empresas não produzam mais jornalismo…

  12. Será que o proceder de

    Será que o proceder de Ronaldo Caiado nesse episódio pode ser classificado como “indecoroso”? Falta de decoro parlamentar costumava cassar o mandato do cabra… bons tempos, lembra?

  13. Luis Nassif,

    Faz pouco tempo voce fez uma elogia a um editorial da Folha que, aparentemente, criticava Eduardo Cunha. Tivemos a ilusão de que a Folha estava tentando entrar na linha, e deixar de ser um boletim estudantil  do movimento secundarista   ( que me perdoem os estudantes do ensino medio, não merecem essa comparação com so bandidos da Folha de São Paulo). Ledo engano. A maldade desse jornal é  tanta, e irresponsabilidade e mediocridade é tanta, que fica dificil até difícil analisar essa patologia. É coisa para especialistas. 

  14. Reformaram o sítio eletrônico

    Reformaram o sítio eletrônico do Observatório da Imprensa e lá os leitores (como eu e o Renato Lazzari) não conseguimos mais postar comentários. A versão televisiva do OI, há alguns meses, não passa de beija-mãos e de entrevistas bajulatórias (a série foi iniciada com Fernando Rodrigues e Chico Otávio); na ocasião alertei Alberto Dines, mas não adiantou. O sítio eletrônico do OI deve decair como aquilo que é objeto dele: a mídia comercial.

    Luciano Martins Costa é dos mais argutos e críticos observadores da imprensa. Ler e ouvir as análises dele é um bálsamo para o corpo e para a “alma”. Há mais de seis meses não leio, ouço ou vejo qualquer noticiário da mídia comercial. Passo em frente às bancas e ignoro solenemente jornais e revistas ali expostos; nem aqueles expostos de forma mais agressiva, em cavaletes, atraem minha atenção. Não ouço e não vejo emissoras comerciais de rádio e tv. E nem por isso fico desinformado, pois existe a internet e sua infinidade de canais informativos.

  15. As falsidades da Folha não

    As falsidades da Folha não tem fim. Ficha Falsa da Dilma. HC Falso do Lula. A única coisa que não falha na Folha é a Falsidade.

  16. Cada vez mais comum em nosso pobre país
    Cada vez mais comum em nosso país, em nosso pobre país.”Esse tipo de jornalismo é muito “grave”! Triste jornalismo da “Falha” de São Paulo.”O título, o texto e a chamada na home page do portal foram corrigidos, mas a versão original já corria pelas redes sociais, impulsionada por uma equipe a serviço do senador Ronaldo Caiado (DEM-GO).Mesmo com os sucessivos atentados ao bom jornalismo que fazem a rotina da imprensa brasileira, difícil acreditar que a redação da Folha de S. Paulo tenha cometido um mero erro técnico, uma “barrigada”.Foi mais do que incompetência: foi resultado de um empenho do jornal em criminalizar o ex-presidente da República, no rastro de um processo que começa a incomodar alguns dos mais renomados juristas do país, por uma sucessão de decisões tidas como arbitrárias”.”

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