Balanço do golpe V, por Guilherme Scalzilli

por Guilherme Scalzilli

O poder da mídia

Os grandes veículos de comunicação participaram de duas maneiras no projeto golpista: dando unidade narrativa à pauta do impeachment e atuando como agentes coercitivos sobre os parlamentares que o materializaram.

A primeira estratégia pode ser resumida na construção de certo catastrofismo antipetista centrado em temas fortes como a corrupção, a crise econômica e o estelionato eleitoral. Em todos os casos, seguiu-se um padrão de conciliar o viés tendencioso do noticiário com o opinionismo ativista, alimentados mutuamente por enunciados comuns.

O moralismo seletivo, o terror econômico e a inédita preocupação com os eleitores criaram uma simbologia meritória para o impeachment. A ideia era amenizar o caráter fisiológico e hipócrita do golpe, dando enredo ao teatro salvacionista dos parlamentares. A falsa base jurídica do processo, com o suposto aval do STF, teve função similar.

A segunda estratégia lidou com a face propagandística do amplo empreendimento público e privado das passeatas pelo impeachment. Ali as corporações midiáticas empenharam todas as suas ferramentas mobilizadoras: divulgação de agendas, pautas temáticas, entrevistas com organizadores, artigos deles próprios, incentivos diversos.

O sucesso do projeto exerceu influência óbvia nos votos pelo impeachment, sob o rótulo enganoso “vontade popular”. Mas a pressão teve também um viés chantagista, pois mostrou o poder destrutivo da mídia contra seus desafetos. Muito do apoio ao golpe no Congresso brotou do receio de uma exposição negativa de quem o rejeitasse.

A imprensa funcionou como elo interinstitucional para a agenda golpista. Constituiu o mais valioso agente do impeachment fora do Legislativo, permitindo às outras esferas um grau de interferência que elas não poderiam exercer de maneira direta, por limitações técnicas, legais e mesmo éticas.

Não por acaso, o grande beneficiário dessa atuação foi o antipetismo judicial, que assumidamente calca sua estratégia na instrumentalização da mídia. A aliança dos veículos com a Lava Jato conheceu desvios clandestinos, amiúde francamente ilegais (e impunes), que produziram alguns dos momentos decisivos do golpe.

Tal arranjo de interesses aponta para um viés conspiratório que derruba as falsas aparências de “normalidade democrática” do impeachment. O oportunismo fisiológico de senadores e deputados foi o reflexo previsível do conluio imoral que já havia naturalizado o arbítrio junto à opinião pública.

http://guilhermescalzilli.blogspot.com.br/2016/11/balanco-do-golpe-v.html

 

A série “Balanço do golpe”:

Introdução

A base

As ruas

O papel do Judiciário

Redação

6 Comentários

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  1. Réplica ao artigo “O poder da midia”
    Houve golpe legislativo e parlamentar, conduzido pelo Supremo. Se houve golpe é porque foi cometido algum ilícito constitucional. Houve o julgamento do governo, segundo rito determinado pelo Judiciário, que abrageu as duas casas legislativas e resultou em condenação por crime de responsabilidade, comprovado por testemunhas, funcionárias do próprio governo, havendo motivação provada, contra a qual só poderia haver uma sanção possível. A nota desoladora foi dada pelo Presidente do STF ao fatiar a punição, em descumprimento à constituição, consierado, aí sim, um golpe no estado de direito.

  2. O balanço tá tão bão, que o

    O balanço tá tão bão, que o pessoal tá tudo na rede aproveitando! Estamos nos referindo a aqueles que deveriam estar nas linhas de frente contra a ditadura e sumiram… são os políticos tidos como não golpistas, artistas anti ditaduras e ícones de todos os setores da sociedade brasileira que lutam pela democracia… É fóra temer minha gente! com éssa ditadura o Brasil não serve ao seu povo!

  3. Uma questão ao articulista.
    Porque a unidade da mídia? Porque não houve dissidências entre os veiculos de comunicação? De fato, houve um momento em que o veículo do Edir de Macedo não parecia alinhado com o golpe e de uma hora para outra abandonou o governo Dilma. É óbvio que houve uma pressão aí. Quem foi o agente dessa pressão? A ABERT? Os grandes anunciantes? Quem me responde?

  4. Se tem alguma coisa de boa

    Se tem alguma coisa de boa nesta confusão toda é que dela é possível tirar duas lições para o futuro:

    1. Agora a esquerda sabe quem são seus verdadeiros inimigos: grandes empresários, sistema financeiro, meios de comunidação conservadores, judiciário e Polícia Federal;

    2. Não há acordo possível com essa gente. Se a esquerda quer vencer deve destruí-los a qualquer custo.

    Que se aprenda de uma vez que com conservadores não há diálogo possível. Devem ser vistos como inimigos. Sempre.

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