Por causa da live bacana sobre o SUS, ontem, não foi possível fazer o Boletim com detalhes. Mas quero comentar duas notas breves e marcantes da edição do JN.

A primeira é: “Desemprego sobe para 13,8% em julho e bate recorde histórico”. É a taxa mais alta desde 2002, atingindo 13 milhões de desempregados. A população subutilizada, que pode trabalhar mais horas, mas não consegue trabalho, subiu 14,7%. Há mais de 32 milhões de pessoas nessa situação. O que implica, obviamente, que essas pessoas que “poderiam trabalhar mais mas não conseguem” têm menos renda – ninguém trabalha mais apenas por prazer, certo? As pessoas trabalham porque precisam pagar boletos. Não é todo mundo que tem amigo que toma pra si todas as contas, de plano de saúde a mensalidade da escola do filho.

Pois bem, pra tratar esse assunto muito ruim, o JN gastou 22 segundos de sua preciosa edição de quarta-feira, geralmente recheada de perfumaria. Vinte e dois segundos pra dimensionar o caos de um pais com mais de 13 milhões de desempregados e com um enorme contingente de subempregados. No quadro projetado na tela, a construção referencial é interessante: “população subutilizada”. Ou seja, ao que parece, a população tá lá mas ninguém sabe muito como utilizar. A questão é apenas de “subutilização” mesmo. Nada mais profundo.

A segunda nota/matéria, na sequência é: “Economia brasileira cria 249.388 empregos com carteira assinada em agosto”. Num fundo bem neutro, azul e suave, Bonner citou o fato, satisfeito, dizendo que isso mostra sinais de reação da economia.

A nota, obviamente, foi maior que a anterior – teve 32 segundos. Resumindo, mostra que há sinais de reação, que apesar dos pesares, a economia reage. Balela. É reflexo talvez da abertura pós-pandemia, em alguns setores. Não dá pra tomar isso como “reação da economia”. Mas está lá posto, neutralizando o feito ruim da nota anterior grave sobre o desemprego.

Modalizar o lado ruim e fingir que a economia dá sinais de reação é a forma de sustentar Guedes, o Chicago Boy, o rapaz do mercado, o cara das facções neoliberais predatórias e das reformas. Isso reconfigura o cenário, o dado real, e o conta de outra forma, mais amena. Simbolicamente, pra se ter a dimensão do dado real desemprego, uma coisa é você ver imagens de pessoas nas ruas procurando emprego, sem esperança. Outra, bem diferente, é vc ver um quadro projetado na tela sendo explicado pela Renata Vasconcellos.

Na minha tese, dediquei umas páginas pra mostrar essas construções da economia em momentos históricos diferentes – com Dilma, Temer e Bolsonaro. As estratégias todas para destacar aspectos ruins quando a economia estava boa e esconder problemas quando a  economia estava um caos. Cenários reconstruídos que recontam realidades. E reconfiguram percepções.

Isso, amigos, é construção de desinformação.