Francisco Celso Calmon
Francisco Celso Calmon, analista de TI, administrador, advogado, autor dos livros Sequestro Moral - E o PT com isso?; Combates Pela Democracia; coautor em Resistência ao Golpe de 2016 e em Uma Sentença Anunciada – o Processo Lula.
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É possível esperar coerência da Veja?, por Francisco Celso Calmon

Fará jornalismo investigativo e trará ao conhecimento da sociedade os atores e produtores desse Estado miliciano, que se alojam também no governo bolsonaro? 

É possível esperar coerência da Veja?

por Francisco Celso Calmon

A revista Veja, edição do dia 5 de julho,  em parceria, pela primeira vez, com o The Intercept, trouxe ao leitor revelações comprometedoras do ex-juiz Sergio Moro e seu comparsa  Dallagnol (as torres gêmeas da Vaza-jato), e em seu editorial declarou que, apesar de ter tratado o Moro como um herói nacional, enaltecendo-o várias vezes em suas capas, nessa edição reconhece que a conduta do ex-juiz da Lava Jato não ocorrera em conformidade com a lei. 

Em sua “Carta ao Leitor”, expondo as suas razões pela mudança, afirma que “a revista tomou conhecimento da conduta antiética e imprópria de Moro na Lava Jato, e que é, portanto, a responsabilidade jornalística da revista revelar e expor – não esconder ou justificar – essa conduta. Mas os diálogos que publicamos nesta edição violam o devido processo legal, pilar fundamental do Estado de Direito — que, por sinal, é mais frágil do que se presume, ainda mais na nossa jovem democracia. Jamais seremos condescendentes quando as fronteiras legais são rompidas (mesmo no combate ao crime). Caso contrário, também seríamos a favor de esquadrões da morte e justiceiros. Há quem aplauda e defenda este tipo de comportamento, reação até compreensível no cidadão comum, cansado de tantos desvios éticos. Mas como veículo de mídia responsável não podemos apoiar posturas como essa. Um dia, o justiceiro bate à sua porta e, sem direito a uma defesa justa, a pessoa é sumariamente condenada” (Grifo meu).

A famiglia bolsonara é admiradora e defensora do sistema de milícia, que se assemelha ao do chamado crime organizado.

Em 2008, como deputado federal, Bolsonaro defendeu as milícias: “Elas oferecem segurança e, desta forma, conseguem manter a ordem e a disciplina nas comunidades. É o que se chama de milícia. O governo deveria apoiá-las, já que não consegue combater os traficantes de drogas”. Em 2018 Jair Bolsonaro volta a enaltecer as milícias.  “Naquela região onde a milícia é paga, não tem violência.”

Vejam que o Bolsonaro em 2008 defendia que o governo deveria apoiar as milícias. Atualmente ele é governo!

Em 2015 a juíza Daniela Barbosa é agredida por milicianos presos durante uma inspeção no Batalhão Especial Prisional no Rio. Flávio Bolsonaro defende os milicianos.

“Raimunda Veras Magalhães e Danielle Mendonça da Costa da Nóbrega. As duas mulheres são o elo entre o senador eleito Flávio Bolsonaro e o grupo miliciano Escritório do Crime, um dos mais poderosos do Rio. O grupo é também suspeito de envolvimento no assassinato de Marielle Franco e Anderson Gomes… Segundo o jornal O Globo, Raimunda e Danielle são, respectivamente, mãe e mulher do capitão Adriano Magalhães da Nóbrega, vulgo Gordinho, tido pelo Ministério Público do Rio de Janeiro como uma das lideranças do Escritório do Crime. As duas foram lotadas no gabinete do então deputado estadual Flávio na Assembleia Legislativa do Rio, mas o filho do presidente diz não ter sido responsável pelas nomeações. […] Além do suposto envolvimento no assassinato de Marielle e Anderson, o grupo é acusado de extorsão de moradores e comerciantes, agiotagem, pagamento de propina e grilagem de terras. Flávio Bolsonaro, quando deputado, homenageou os envolvidos com “menção de louvor e congratulações” (site Fórum).

A famiglia Bolsonaro tem ligações estreitas com as milícias. As milícias formam o braço armado do poder paralelo a serviço da economia ilícita.

À margem da economia capitalista lícita há uma outra economia, a qual compreende desde a plantação da matéria-prima, passando pelo seu processamento e industrialização, até a comercialização das drogas ilegais; agrega a isso o tráfico de armas, mulheres, bebês e órgãos humanos. 

Assim como o Estado de Direito garante o capitalismo legal, há um poder paralelo que garante a economia ilegal. No capitalismo legalizado o Estado é o detentor da força, das armas, da violência, no capitalismo marginal o poder da força está nos que detém sobretudo as armas e o poder financeiro.

No capitalismo legalizado a concorrência se dá pela competição de preços e pela corrupção, na economia ilícita se dá para além disso, pelas armas.

Esse “estado paralelo”, mais primitivo e bárbaro do que o Estado legal, se estrutura por uma força armada composta por milícias, as quais dão sustentação as suas atividades marginais nos territórios sob seu domínio, bem como, o controle  da vida social e política daqueles espaços, estabelecendo códigos de conduta à população desprotegida. Aliado ao poder bélico e por conta da ausência do Estado legal, dota àquelas populações de assistencialismo, por um lado, e, por outro, de um código penal punitivista e atroz.  No social, além do assistencialismo, investe na cultura e no esporte, explorando potencialidades e angariando a gratidão quase devota.

Na política, esse poder paralelo atua na escolha de lideranças para ocupar cargos em entidades representativas e também nas instituições do Estado de direito, seja no Legislativo, Executivo ou no âmbito da Justiça, incluindo as polícias. 

O capitalismo marginal e sua estrutura de poder interagem com o capitalismo e a estrutura legal do Estado de direito. Não apenas na superestrutura política, mas também na base econômica, na oferta e demanda dos produtos de uma e de outra produção, e, particularmente, no mercado financeiro.

O governo bolsonarista, aplicando a receita do Consenso de Washington, desregulamenta a economia, abre espaço favorável ao capitalismo de desastre, e o “estado paralelo” ganha mais força para a “ordem e segurança” de uma sociedade devastada, cujas leis e normas constitucionais  já não imperam para todos, e o poder das armas legais e ilegais se constituirão como a guilhotina que pendula sobre os que se opõe à marcha da crueldade protofascista do golpismo com STF e tudo.

Haverá coerência da revista Veja e irá combater as milícias e seus apoiadores e protetores? Fará jornalismo investigativo e trará ao conhecimento da sociedade os atores e produtores desse Estado miliciano, que se alojam também no governo bolsonaro? 

A nós, defensores da democracia, não nos cabe esperar, cabe resistir de forma criativa, mais contundente e continuada.

Quem mandou matar Marielle, cadê o Queiroz, quem banca Adélio Bispo?

Francisco Celso Calmon é Advogado, Administrador, Coordenador do Fórum Memória, Verdade e Justiça do ES; autor do livro Combates pela Democracia (2012) e autor de artigos nos livros A Resistência ao Golpe de 2016 (2016) e Comentários a uma Sentença Anunciada: O Processo Lula (2017).

 

Francisco Celso Calmon

Francisco Celso Calmon, analista de TI, administrador, advogado, autor dos livros Sequestro Moral - E o PT com isso?; Combates Pela Democracia; coautor em Resistência ao Golpe de 2016 e em Uma Sentença Anunciada – o Processo Lula.

8 Comentários

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  1. Não adianta sonhar, ficar fantasiando, delirar. Não há incoerência nas ações das pessoas – nomináveis, com endereço certo e conhecido – que editam e participam dessa revista, “Veja”. Todas as suas iniciativas promovem a destruição do estado democrático de direito. Todas. Impossível não notar a diferença entre a foto de Moro levemente alterando o equilíbrio da balança e as milhares de fotos escatológicas de Lula, Dilma, Dirceu. Leve-se ainda em consideração que há quem sinta-se bem sabendo que Moro promove aquela destruição e se sente melhor ainda por Moro fazê-lo à margem da lei. Afinal o objetivo das pessoas que publicam a revista é lassear a ordem democrática. Seria ingenuidade imaginar que a exposição pública dos crimes que vem sendo cometidos pelos golpistas – dentre eles, os integrantes e alinhados à Lava Jato – resultariam em defesa do Direito. A defesa do Direito só é possível através das instituições e essas estão tomadas.

    Não basta os golpistas, depois da extrema violência física, moral e psicológica praticada, terem vencido essa batalha, não basta a iniciativa privada lastreada no dólar ter sequestrado o que é público, é preciso que cantem sua vitória para intimidar e calar algum defensor da Democracia. E esse canto é justamente esse denuncismo. Não fosse assim, a revista não o faria.

    Àqueles que desejam a deposição dos golpistas é necessário, a meu ver, assumir que o golpe foi dado, que essa batalha foi perdida: ganhou o privado sobre o que é público. Partindo desse ponto uma nova construção de um sociedade civilizada fica mais fácil, a gente para de dar tiro a esmo, no escuro, e mira em quem nos está prejudicando: o capitalismo.

    Já que não aprendemos da primeira vez, em ’64, estamos repetindo o erro e, de novo, amargando os males que criamos para nós mesmos. Que desta vez sirva de lição definitiva: capitalismo só é possível quando rigorosamente regulado pelo estado. Fora disso, seremos nós, adeptos da Democracia, sempre prejudicados. Sempre.

    Construir leva tempo; destruir é rapidinho.

  2. Se publicar os crimes que os golpistas estão cometendo ameaçasse o golpe, as pessoas que editam essa revista Veja – bem como as que dirigem outras empresas privadas de comunicação em massa -, não os publicaria. Como disse, tal publicidade nesse momento, em que as pessoas à frente das instituições estão cooptadas, serve como reforço ao golpe e não como meio de combatê-lo.

    É cedo para o combate frontal, não tem como arrancá-los da administração das instituições sem ferir as próprias instituições. Não tem como recuperar o que foi destruído. O que se pode fazer é trabalhar para criar condições para construir de novo a Democracia que os dirigentes e subalternos apoiadores do golpe irreversivelmente destruíram.

    Que sirva de lição: dirigentes e subalternos de empresas privadas cuidando do que é público, nunca mais.

  3. Notar que a suposta “adesão” da Veja à vazajato e a um suposto resgate da Justiça nesta nossa (?) colônia geoeconômica lhe deu o acesso aos vazamentos e consequente possibilidade de entregá-los a quem precisar, seja no Brasil, seja fora. Duvido muito que Glenn não saiba disso e tenha balanceado os riscos. Não tenhamos dúvidas que a Veja não é amiga do Brasil, mas apenas do braZil.
    Fato é que o editor-chefe da Veja foi mudado depois dessa “adesão” e agora é ver o que acontece.

  4. Mas a veja patentear a nojeira e sujeira do Moro e Dalangnol foi algo excelente. Não temos duvida da ilegalidade desse ministro da injustiça. A derrubada do Bolsonaro, Moro, ECT, se dara mais pelo braço forte do tudo ( Deus ) Quando os homens abusam Ele entra em cena. Pode até demorar mais a queda é certissima. A malandragem está GRANDE.

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