“Estabelecer limites à imprensa brasileira não seria censura, mas justiça”

Cintia Alves
Cintia Alves é graduada em jornalismo (2012) e pós-graduada em Gestão de Mídias Digitais (2018). Certificada em treinamento executivo para jornalistas (2023) pela Craig Newmark Graduate School of Journalism, da CUNY (The City University of New York). É editora e atua no Jornal GGN desde 2014.
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Sugerido por Bruno DF

UnB: Imprensa: regular para democratizar

Por Alexandre Pereira da Rocha

Lord Acton, historiador britânico do século 19, certa vez disse: “o poder tende a corromper, o poder absoluto corrompe absolutamente (…)”. Essa assertiva é oportuna para refletir sobre a atual situação da imprensa brasileira. Note-se, a imprensa é uma espécie de poder, quando imaginada como fiscal de outros poderes, por exemplo: legislativo, executivo e judiciário. Nesta condição, necessariamente ela tem de ter limites, caso contrário pode se corromper. Mas como estabelecer limites à imprensa sem ser censura?

Esse dilema não é particular da imprensa brasileira. Por quase todos os países do mundo a imprensa tem conquistado espaço, sendo que ora é reconhecida, ora é reprimida. No geral, seu avanço equivale ao desenvolvimento de um dado Estado ou sociedade. Isso por que imprensa livre é sinônimo de liberdade e democracia. O oposto, de repressão e autoritarismo. Dessa forma, limites arbitrários à imprensa são classificados como censura, algo que é próprio de sociedades atrasadas e autoritárias.

Numa análise superficial, cogitar limites à imprensa se confunde com censura. Por outro lado, quando se observa o setor da comunicação brasileiro, constata-se que, em muitos casos, as notícias originadas dele se tornaram moedas de troca entre aqueles que disputam os poderes. Com efeito, fatos escusos operados nos bastidores dos variados ramos dos poderes públicos ou privados não são levados ao conhecimento coletivo com o fim de informar, mas são barganhados por editorialistas, articulistas e jornalistas com o propósito de concentrar poder. Nestas circunstâncias, o estabelecimento de limites à imprensa não seria censura, mas justiça.

É necessário aclarar de qual imprensa está se falando, porquanto no Brasil por mais que haja inúmeros meios de comunicação, o domínio do setor está nas mãos de poucos. A imprensa aqui abordada é aquela instrumentalizada pelos grandes grupos de mídia, que de maneira oligopolista, controlam a informação, o entretenimento, a propaganda. Esse tipo de mídia geralmente atua em sintonia com os detentores de poderes econômicos, políticos, sociais, culturais; assim, conjugadamente eles têm condições de definir padrões, comportamentos e mentalidades de parcela expressiva da população.

No Brasil, após duas décadas de ditadura, a imprensa despontou como uma das principais ferramentas da sociedade civil para a construção da democracia. No entanto, muito da liberdade necessária para o exercício da imprensa tem se mesclado com valores dos poucos que controlam os meios de comunicação. Ora, sem regras claras, não são os interesses públicos que prevalecem, mas os daqueles que estão na dianteira do mercado de notícias. Por isso, o então ministro do Supremo Tribunal Federal, Joaquim Barbosa, certa vez declarou: “a falta de normas só serve ao mais forte, a quem tem o poder, a quem tem o dinheiro (…)”.

Mesmo assim, o mais tênue manifesto de regulamentação das mídias tem sido rechaçado pelos donos da comunicação como sendo medidas de cerceamento da liberdade de imprensa. Com efeito, o Brasil da era democrática não dispõe de um marco regulatório do setor de comunicação, isto é, de um conjunto de legislações e agências capazes de orientar publicamente o exercício da liberdade (e do poder) de imprensa. Outros países, por exemplo, Estados Unidos, França, Inglaterra, têm estabelecidos regulações para esse setor sem perder de vista o norte democrático.

Nesse cenário, o que tem ocorrido com frequência é a ocupação da imprensa brasileira para defesas ideológicas e ortodoxas de alguns poucos iluminados. É fato. Nos principais meios de comunicação, em vez de informação se difundem ímpetos dos que à frente do poder de imprensa. Esses agem irresponsavelmente advogando por seus interesses ou daqueles que os financiam como isso fosse pauta coletiva. Pior. Esses também sufocam mídias alternativas e pontos de vistas distintos.

A imprensa é poder, logo ela tem ter limites. Isso não é censura. É regulamentação. Sob os holofotes da democracia é necessário analisar se o poder da imprensa brasileira está servindo para tornar mais livre a pluralidade de pensamentos humanos, caso contrário, é por que está se corrompendo absolutamente. Destarte, discutir uma regulamentação do setor de comunicação poderia ser caminho para efetiva democratização da imprensa brasileira.

* Alexandre Pereira da Rochaé doutorando em Ciênciais Sociais no Centro de Pesquisa e Pós-graduação sobre as Américas (CEPPAC), da Universidade de Brasília. Tem Graduação e Mestrado em Ciência Política pela UnB. Experiência na área de Ciência Política, com ênfase em política brasileira, teoria geral do Estado, administração pública, partidos políticos, legislativo, segurança pública, violência, criminalidade, polícia, estudos comparados.
 

Cintia Alves

Cintia Alves é graduada em jornalismo (2012) e pós-graduada em Gestão de Mídias Digitais (2018). Certificada em treinamento executivo para jornalistas (2023) pela Craig Newmark Graduate School of Journalism, da CUNY (The City University of New York). É editora e atua no Jornal GGN desde 2014.

6 Comentários

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  1. A Imprensa não é estatal, mas

    A Imprensa não é estatal, mas tem potencia suficiente para submeter a vontade dos administradores públicos burlando, assim, a soberania popular da qual deriva o poder que eles exercem. Isto basta para que a Imprensa sofra algum tipo de controle. 

     

    1. O problema é quem define o

      O problema é quem define o “”algum tipo de controle””, em democracias não se tentou descobrir mas dou um palpite, que tal “”conselhos populares” formados por “movimentos sociais””?

      1. Me contentaria

        Caro André, eu me contentaria com uma legislação análoga à aquele país “comunista” velho conhecido seu… A Grã Bretanha!

        Um abraço.

        1. Absolutamente nada a ver. Não

          Absolutamente nada a ver. Não há nenhum “”controle de imprensa” no Reino Unido, foram criadas regras VOLUNTARIAS para a defesa de pessoas atingidas pela midia, regras essas decorrentes das gravações do News of the World.

          A Inglaterra é onde nasceu a imprensa de opinião e seria impensavel achar que lá fariam qualquer coisa remotamente parecida com “”Ley de Medios”.

          1. Ué…

            André, eu disse que poderíamos utilizar um arcabouço parecido com o deles na questão da imprensa, quem falou em “Ley de Médios” foi você… Embora eu seja contra a propriedade cruzada a muitos anos, uma característica da lei argentina (e bem impedida em minha opinião).

            Um abraço.

  2. > A imprensa é poder, logo

    > A imprensa é poder, logo ela tem ter limites.

    A imprensa tem limites. Chama-se Código Penal. Refiro-me, evidentemente, ao conteúdo do que a imprensa divulga. Calúnia, difamação e injúria são já tipificados. Se os abusos cometidos não são devidamente punidos, a bomba cai no colo do Judiciário. Falta o direito de resposta, evidentemente. Mas isso nada tem a ver com o que alguns grupos entendem como “regulamentação da mídia” ou, num colonialismo cultural bem vira-lata, “Ley de Médios” (no Brasil não se fala espanhol mais do que se fala inglês).

    Óbvio que se deve punir abusos, mas o fato é que isso passa longe de ser algo fácil, principalmente quando envolve análises que são subjetivas. Alega-se por aqui uma campanha persecutória da grande mídia contra o governo “popular e progressista”. Pra mim, um dos milhões de brasileiros sem-poder, isso é um evidente exagero, mas pra quem está no poder real (que é o político) parece ser matéria de fato. É o poder que se diz perseguido que vai bater o martelo sobre se está sendo perseguido ou não?

     

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