Eurípedes e a ciclópica imprensa na Operação Lava a Jato

Em sua peça O Ciclope, Eurípedes (480 aC – 406 aC) explorou um tema cultuado pelos seus conterrâneos gregos e que nós, distantes 24 séculos dele, consideramos mitologia. A peça, portanto, não diz para os leitores atuais o que dizia aos leitores da época em que foi encenada pela primeira vez. A liberdade que temos para interpretar o texto de Eurípedes é certamente maior do que a daqueles que estavam mergulhados na sociedade à que o drama se destinava originalmente.

Não é segredo que, com o apoio da imprensa, FHC queria privatizar totalmente a Petrobrás quando foi presidente da república. Isto felizmente não lhe foi permitido. O ressentimento dos tucanos é evidente e explica porque eles, que também se beneficiaram muito da corrupção na Petrobrás e até a  possibilitaram (foi FHC e Gilmar Mendes que criaram as brechas jurídicas que facilitavam as negociatas sujas e duvidosas dentro da empresa), usam a investigação da Lava a Jato para tentar privatizar nossa petrolífera.

A Petrobras sempre foi objeto de orgulho nacional, quer porque garante nossa independência energética e possibilita ao país desenvolver com independência todas suas potencialidades econômicas, militares e tecnológicas, quer porque financia projetos esportivos, culturais e educacionais e irriga os veículos de comunicação com sua generosa verba de comunicação. Em razão ter se transformado num objeto de culto, a Petrobras sempre se sentiu segura de si e demonstrou esta segurança em público. Somente agora, sob intenso e malicioso ataque diário de jornalistas e telejornalistas pautados pelo PSDB, a companhia demonstra alguma fragilidade.

Na peça de Eurípedes, Ulisses revela ao público seu plano da seguinte maneira:

“Quiero disuadirlo de ese banquete diciéndole que no debe compartir el vino com los cíclopes, sino regalarse solo, y cuando se duerma, vencido por el licor, cogeré cierta estaca de olivo que hay en la caverna, y afilando su extremo com mi espada, lo pondré al fuego, y cuando se encienda, lo introduciré por la frente del Cíclope y abrasaré su único ojo. Como el que traba la trablazón de una nave y mueve el taladro con las dos correas, así haré girar el tízon en el ojo brillante del Cíclope y quemare su pupila.” (Eurípedes, Obras Dramáticas, Librería “El Ateneo” Editorial, Colección Clásicos Inolvidables, Buenos Aires, Argentina, 1951)

Ulisses obviamente consegue realizar seu intento. E ao fim da peça, o Ciclope lamenta seu destino:

“!Ay, ay de mí! Cúmplese un oráculo según el cual tú habías de cegarme al volver de Troya. Pero también predijo que serías castigado vagando largo tiempo por la mar.” (Eurípedes, Obras Dramáticas, Librería “El Ateneo” Editorial, Colección Clásicos Inolvidables, Buenos Aires, Argentina, 1951)

O pequeno e astuto Ulisses pretende derrotar o monstruoso Ciclope privando-o da razão e, depois, da visão. O gigantesco e poderoso filho de Poseidon com a ninfa Teosa conhece a profecia e, ao invés de  evitar seu destino, segue a trama que foi fiada para ele pelas Moiras. O tema desta tragédia  de Eurípedes é, portanto, a inevitabilidade do destino.

Os fatos recentes sugerem que a Petrobrás pode estar sendo prejudicada pelo PSDB como o Ciclope foi cegado por Ulisses. Menos evidente, porém, será o resultado da tragédia diariamente encenada com a ajuda da imprensa. Como Ulisses perdido no mar sem reencontrar sua amada Ítaca, o PSDB já está vagando há mais de uma década sem conseguir chegar ao Palácio do Planalto. Nada indica que o partido de FHC conseguirá fazer isto destruindo a si mesmo ao destruir a empresa que ajudou a corromper.

Ulisses não poderia fazer outra coisa. Ele estava predestinado a cegar o Ciclope e a ficar muito tempo perdido no mar antes reencontrar Ítaca. O retorno dele à terra natal ocorre, mas não porque ele quer nem quando ele deseja. Em política brasileira, porém, não há predestinação. O PSDB pode até conseguir cegar um olho da Petrobrás, mas isto não quer dizer que a companhia não tenha outros olhos ou que ela deixará de ser pública. A queda de Dilma Rousseff não é certa. Mais incerto ainda é o retorno do PSDB ao poder. O drama incitado pelos tucanos não terminou e ainda pode virar dramaticamente contra eles.

Na peça de Eurípedes o Coro impulsiona a tragédia e convida a platéia à reflexão:

“Bienaventurado el que se embriaga con el grato licor de la uva, tan dulce en los festines, estrechando en sus brazos a su joven amigo y guardando en su lecho bella y tierna amiga, mientras sus cabellos brillan perfumados, y canta: ?Quién me abrirá la puerta?” (Eurípedes, Obras Dramáticas, Librería “El Ateneo” Editorial, Colección Clásicos Inolvidables, Buenos Aires, Argentina, 1951)

O povo brasileiro tem sido um Coro silencioso. Ele já se manifestou nas urnas em favor de Dilma Rousseff. Se for convocado a se manifestar novamente nas ruas, a porta aberta pelo PSDB poderá ser totalmente escancarada pelo PT. E então, os jornalistas e telejornalistas que agora se embriagam neste doce festim tucano que tem sido a Operação Lava Jato acabarão não nos braços de uma jovem Petrobras privatizada e sim aprisionados numa dinâmica imprevisível e destrutiva.

Interpretei os eventos envolvendo a Petrobrás à luz da peça de Eurípides. Fiz isto apenas por um motivo: mostrar que falta aos jornalistas brasileiros erudição e imaginação para apresentar o escândalo de forma diferente ao respeitável público. O que mais tem me escandalizado neste momento não é a investigação policial, que seguirá seu curso natural até ser endossada ou descartada pelo Judiciário, e sim a autotransformação do jornalismo, uma atividade que deveria ter algum refinamento cultural, em atividade policialesca.

Os policiais não devem pensar e escrever como jornalistas. Os jornalistas brasileiros, todavia, só tem conseguido pensar e escrever como policiais. Diariamente estamos expostos à decadência cultural do país. E aqueles que deveriam ver e criticar esta decadência são justamente os que a produzem como se estivessem predestinados a fazer isto. As Moiras teceram para a imprensa um destino semelhante ao de Polifemo?  

 

 
Fábio de Oliveira Ribeiro

10 Comentários

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  1. Este é o my way dos politicos

    Este é o my way dos politicos do PSDB. Desviar o holofote para o problema da Petrobras, enquanto isso, materia da Gazeta do Povo de Curitiba, alega que o Parana, governado por Beto Richa no segundo mandato esta quebrado, nao paga professores e fornecedores.

  2. Tarefa ingrata

    É uma tarefa ingrata procurar por erudição em empresas que vivem de distribuir material de qualidade prá lá de duvidosa, como as novelas e os programas estilo “BBB”.

  3. Conhecimento geral é tudo!

    Fábio, parabéns pelo excelente texto!

    De minha parte, porém, nem cobro erudição; me satisfaria se os profissionais de comunicação demonstrassem apenas conhecimento geral, que é o mínimo para quem pretende falar em público. 

  4. Operação política: o circo está mais uma vez armado

    O que mais me estranha é que com tantas pessoas e empresas tão próximas aos demotucanos, nada aparece contra eles. O tucano Paulo Costa foi colocado por FHC na direção da empresa. Youssef é amigo íntimo de Álvaro (esqueci 6 milhões) Dias e cria desse partido. Corrupção na Petrobras sempre existiu, mas foi no governo FHC onde ela atingiu seu maior nível: o caso REPSOL, plataformas superfaturadas que afundavam, tentativa de doação da empresa por 15bi e por aí vai. Uma das explicações para a blindagem aos membros desse partido está em as investigações estarem sendo conduzidas no QG da polícia tucana do Paraná, pela justiça tucana, com delatores tucanos, assessorados por advogados tucanos e narrada como uma novela pela  imprensa marrom tucana. O circo está mais uma vez armado, e os palhaços são os Home Simpsons do Bonner e o público que ainda acredita nessa nossa mídia. 

  5. Herança Maldita

    Paulo Costa e Youssef, que estão no centro do furacão, são tucanos e operam para tucanos. O primeiro foi colocado na direção da Petrobras pelo paladino FHC, já o segundo, é amigo de Álvaro (esqueci que tinha 6milhões) Dias e cria tucana, sempre operou para esse partido. Vale lembrar, que todas essas empresas que estão sendo investigadas cresceram na base de muita fraude e propina nas gestões tucanas. Corrupção sempre existiu na Petrobras, mas ela atingiu níveis alarmantes no desgoverno FHC. O que vemos são resquícios disso, mais uma herança maldita dessa corja.

  6. Mais investigações!

    Acho interessante que a Lava Jato já tenha alcançado tantos setores da Petrobras e não se tenha ouvido nenhuma menção à “generosa verba de comunicação” da empresa.  Antigos rumores sugerem que são cerca de 500 milhões por ano, gastos com um cartel de agências especializadas em contratos com sobrepreço  dos anúncios e outras coisinhas mais. Se a Lava Jato não esclarecer esses pontos, creio que os representantes da base governistas poderiam incluir o tema na CPI que a oposição está emplacando na Câmara. Seria bom para acabar com os boatos e, talvez, com a CPI.

  7. A PETROBRAS, é maior que os

    A PETROBRAS, é maior que os dois podres poderes juntos o LEGISLATIVO, e o JUDICIARIO, nao servem  mai para o POVO BRASILEIRO, tem que ser extinto, extipardo da Sociedade? Se tivessemos uma CORTE DE JUSTIÇA, nada disso estaria acontecendo e viveriamos em PAZ, mas temos um PODRE JUDICIARIO, MPF PODRE, PGR CORRUPTADO, Policia FEDÊ…..RAL imunda, um montao de pobre de direita, entao temos que aguentar os corruptos e corruptores politicos que nem o AECIO, SERRA, CUNHA, ALVARO, BETO RICHA, ALCKMIN, FHC e etcs, mais a REDE ROUBO querendo e clamando por mais dinheiro publcico para encher os seus bolsos!!! Fora os artista de momentos tipo Joaquim Barbosa, Ayres de Brito, Yves Granda, Moro, Elen Gracie, Fux, Weber todos querendo o flash da REDE ROUBO!!!

  8. Cego

    Cíclope é quem ainda defende estatismo de empresas que funcionam bem privatizadas depois de tudo que já aconteceu na Petrobrás…. que tal uma olhada na Embraer, nas Teles, na Vale?

  9. ótima interpretação – esses

    ótima interpretação – esses polifemos midiáticos vivem em

    cavernas obscuras do maniqueísmo mais escroto. 

    ou pior, numa visão fundamentalista, visão de mundo única,

    a deles, os polifemos horrorosos.

    ulisses é o herói múltiplo, das várias possibilidades polissemico…

    universal.

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