Wilson Ferreira
Wilson Roberto Vieira Ferreira - Mestre em Comunição Contemporânea (Análises em Imagem e Som) pela Universidade Anhembi Morumbi.Doutorando em Meios e Processos Audiovisuais na ECA/USP. Jornalista e professor na Universidade Anhembi Morumbi nas áreas de Estudos da Semiótica e Comunicação Visual. Pesquisador e escritor, autor de verbetes no "Dicionário de Comunicação" pela editora Paulus, e dos livros "O Caos Semiótico" e "Cinegnose" pela Editora Livrus.
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Globo despacha William Waack para tirar a lama das próprias mãos, por Wilson Ferreira

por Wilson Ferreira

Assim como no episódio do assédio sexual do ator José Mayer (naquele momento a Globo fez o cast feminino da casa vestir uma camiseta estampada “Mexeu com uma mexeu com todas”), da mesma maneira prontamente a emissora despachou William Waack depois da repercussão de um antigo vídeo no qual o jornalista fazia afirmações racistas em tom de galhofa enquanto aguardava para entrar ao vivo. Fosse em outros tempos, episódios como esses entrariam para o folclore da história dos bastidores televisivos.  Quem armou essa cilada contra William Waack levou em conta o atual contexto delicado da Globo: depois de seu jornalismo de guerra nos últimos anos ter dado visibilidade e repercussão à direita raivosa (aquela que vê o “politicamente correto” como “conspiração comunista”) para acirrar a crise política que culminaria no impeachment, agora a emissora tenta limpar suas mãos da lama que estrategicamente revolveu por anos. Disse em nota que é “visceralmente contra o racismo”. A Globo tenta ignorar de forma tautista a patologia psíquica que ajudou a incitar, da mesma maneira como até hoje tenta provar que nada teve a ver com a lama da ditadura militar que ajudou a esconder. 

Nesse momento há um movimento de manada, uma atmosfera de revanche e linchamento contra o jornalista (ou ex) da TV Globo William Waack depois do episódio do vazamento de uma gravação antiga, feita durante a cobertura das eleições nos EUA – com a Casa Branca ao fundo, Waack aparece ao lado do diretor do Instituto Brasil do Wilson Center, Paulo Sotero. Os dois esperam o momento de entrar ao vivo até serem incomodados por uma insistente buzina alguns andares abaixo na rua.

“Tá buzinando por quê, seu merda do cacete? Não vou falar quem é… é preto… É coisa de preto”, fala Waack em tom de galhofa, enquanto o constrangido Sotero deixa escapar uma gargalhada. 

É tido e sabido que William Waack é um dos jornalistas mais odiados, seja dentro da própria emissora (não costumava tratar com, digamos, cavalherismo o “baixo clero” jornalístico da casa) ou fora dela – nos últimos anos fez parte da linha de frente da polarização política que culminou no golpe, desde que em 2005 apresentou o Jornal da Globo em frente ao Congresso Nacional para repercutir a crise do mensalão.

É evidente que Waack foi o pivô de uma armação típica daquelas em que o peixe sempre morre pela boca. Na atmosfera nacional dos últimos anos em que a grande mídia (capitaneada pela própria Globo) açodou o conservadorismo até chegar ao protofascismo para criar o clima propício para o desfecho do impeachment, jornalistas como Waack e Augusto Nunes se colocaram ao lado de próceres como Alexandre Frota, Constantino e Diogo Mainardi para desancar o chamado “politicamente correto” – para eles, uma agenda esquerdista que deveria ser banida do País.

 

No topo da cadeia alimentar

Surfando na onda do neoconservadorismo incorreto, sentiram-se à vontade para arroubos como, por exemplo, o de Boris Casoy ridicularizando garis ao vivo em um telejornal da Band ou Mainardi mandando o desafeto Reinaldo Azevedo “dar a bunda”, em rede social.

E como podemos perceber no vídeo vazado, Waack estava bem à vontade e confortável como estivesse em terra conquistada, no topo da cadeia alimentar política, sem ameaças, como um capitão que venceu a guerra e colhe os louros da vitória.

Seja quem for o “Edward Snowden” de dentro da Globo que conseguiu ter acesso às imagens e vazá-las, foi capaz de destruir o jornalista desafeto em pleno voo, no auge da arrogância.

Mas os cálculos dessa eminência parda que atingiu mortalmente Waack certamente levaram em conta o atual contexto tautista (tautologia + autismo) em que a Globo vive depois de uma década atuando como oposição política explícita aos governos lulopetistas: depois de anos pegando pesado e dando espaço a tudo de mais baixo que podia ser reunido às hostes da oposição (da bancada de Bala, Boi e Bíblia do Congresso até simpatizantes da intervenção militar e histeria anticomunista do anti politicamente correto), agora tenta se desvencilhar dessa agenda que ajudou a criar.

Assim como até hoje a emissora luta para desassociar sua história com a do apoio ao golpe de 1964 e da ditadura militar brasileira.

Por isso, ato reflexo, a Globo teve que largar na estrada o fiel oficial ferido mortalmente. 

Augusto Nunes: “punhado de frases sem importância”

Isenção politicamente correta

Em outras palavras, nesse caso a questão principal não é o boquirroto William Waack, por mais que se satisfaça o doce sabor siciliano da vingança – o sabor de um prato que se come frio. 

Assim como no caso do assédio sexual do ator José Mayer a uma figurinista terceirizada da emissora (prontamente a Globo fez o cast feminino da casa vestir camisetas com dizeres “Mexeu com uma mexeu com todas”), da mesma forma prontamente a Globo rifou Waack para provar sua isenção politicamente correta. 

E tentar limpar das mãos a lama que teve que revolver nos últimos dez anos.

Talvez na defesa do amigo de guerra feita pelo apresentador do Roda Viva da Cultura e colunista da Veja e rádio Jovem Pam, o jornalista Augusto Nunes, esteja a origem da contradição tautista da Globo por trás desse episódio:

“Não é surpreendente que por um punhado de frases sem importância, ele vire alvo de seitas repulsivas:  os politicamente corretos, os fanáticos extremistas, os perdedores congênitos, os patrulheiros esquerdopatas, os cretinos fundamentais e os idiotas em geral”.

É dessa “incorreção política” (a visão do racismo como “frase sem importância”) que a Globo tenta agora se livrar, depois de estrategicamente instiga-la em passado recente. 

Rapidamente a Globo se livrou do ator José Mayer: o politicamente correto tautista

Efeito colateral

Nesses últimos anos de oposição política, a Globo colheu como efeito colateral o choque entre a agenda comercial e o papel de oposição política assumido conjunturalmente diante da inépcia da oposição parlamentar.

 

Wilson Ferreira

Wilson Roberto Vieira Ferreira - Mestre em Comunição Contemporânea (Análises em Imagem e Som) pela Universidade Anhembi Morumbi.Doutorando em Meios e Processos Audiovisuais na ECA/USP. Jornalista e professor na Universidade Anhembi Morumbi nas áreas de Estudos da Semiótica e Comunicação Visual. Pesquisador e escritor, autor de verbetes no "Dicionário de Comunicação" pela editora Paulus, e dos livros "O Caos Semiótico" e "Cinegnose" pela Editora Livrus.

10 Comentários

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  1. No tempo do velho Marinho a
    No tempo do velho Marinho a Globo era especialista em sentir a hora certa de pular de um barco para outro quando sentia que o primeiro podia começar a fazer água. Este episódio parece ser um exemplo de uso dessa estratégia de sobrevivência global. Os ex funcionarios deram uma oportunidade de ouro para a globo jogar o contrapeso de Lord Waack pela amurada do barco. E ainda fizeram pose prá foto como moderninhos anti racismo.

  2. “Disse em nota que é

    “Disse em nota que é “visceralmente contra o racismo””:

    DOIS ANOS DEPOIS.

    E a rede golpe ainda posa de “heroina” politiamente correta por causa disso…  Eh como se o video tivesse caido do ceu e explodido no colo deles…

  3. REDE GLOBO

    A rede Globo é a sucursal da bandidagem, mas como podemos vê nos episódios da copa do mundo de 2002 e da manção de parati, O judiciário e Ministério público, os guardam e os protegem de toda e qualquer possível punição…

  4. JOSÉ MAYER E WILLIAM WAACK

    1. O Grupo Globo é a principal incubadora da “direita elegante” e por isto sempre se vê em apuros quando um dos seus é apanhado com maus modos.

    3. São os bons modos que garantem legitimidade aos “elegantes” da direita. Por isto William Waack deve receber alguma punição. Nada muito severo, claro, a final das contas ele é um patrimônio da casa.

    4. Assim, Waack deve receber o mesmo tratamento dado a José Mayer: um tempo de geladeira, seguido de uma volta discreta ao proscênio, até tudo voltar a ser como antes.

    5. Waack é um dos principais expoentes da “direita elegante”, aquela direita que jamais se diz de direta. Bem educados e “moderninhos”, eles, fofos, dizem não haver mais esta coisa de direita e esquerda, que isto é coisa do passado.

    6. Sendo moderninhos, eles abominam a homofobia, a misoginia, a excessiva criminalização do uso de drogas etc… Isto os torna “elegantes”, diante da direita “tosca” de um Jair Bolsonaro.

    7. Esta “modernidade”, evidentemente, não tolera maus modos… Por isto, Waack vai ter que pagar algum pedágio. Faz parte…

    8. Contudo, esta modernidade “elegante” está sempre a serviço da agenda neoliberal, da demonização da política, do Estado e dos movimentos populares, e do linchamento moral da esquerda.

    9. Para a “direita elegante”, estar a serviço da agenda neoliberal, da demonização da política, do Estado e dos movimentos populares, e do linchamento moral da esquerda não lhes fazem ser de direita. Nada disto, Eles, uns fofos, são apenas gente bem informada, racionais… Só isto.

    10. Como é “elegante” a “direita elegante”, né mesmo?

    11. Daí o seu constrangimento em ver um dos seus revelar que, por trás da “elegância” de fachada, o que há mesmo é a velha “deselegância” da casa grande, isto é, ódio racial e de classe.

     

     

     

  5. Análise precipitada

    Assim como Nassif  e outros, que estão contemporizando ou aliviando para william waack, Wilson Ferreira escreveu esta análise de forma precipitada, presumindo que alguém do alto comando global, quiçá o próprio ali kamel ou alguém por ele indicado, tenha vazado as declarações racistas de william waack para que a globo possa se redimir do nazifascismo e do ódio que usou nao últimoa 12 anos, para derrubar os governos petistas e criminalizar a Esquerda e seus líderes.

    Pouco depois de Luís Nassif e Wilson Ferreir escreverem suas crônica em “contra-corrente”, foram divulgados os nomes das pessoas que vazaram as declarações racistas de wiliam waack: não foram figurões nem chefões, mas dois negros que atuavam como operadores de equipamentos e auxiliares na produção.

    Quero ver se Nassif e Ferreira farão a revisãodas análises precpitadas.

  6. Jornalistas
    Para além da vocação inquestionável do Nassif para o jornalismo , sem dúvida do primeiríssimo time , competentíssimo no que faz , recordo apenas a frase síntese de Joe Pulitzer : ” Jornalista não tem amigo “.

  7. Jornalistas
    Para além da vocação inquestionável do Nassif para o jornalismo , sem dúvida do primeiríssimo time , competentíssimo no que faz , recordo apenas a frase síntese de Joe Pulitzer : ” Jornalista não tem amigo “.

  8. “…enquanto o constrangido Sotero deixa escapar uma gargalhada”

    Alguém constrangido ri? Desculpa, mas, convenhamos, passou pano legal pro cara, né?

    Um abraço.

  9. Resta ao Waack fazer desse limão uma limonada

    Waack, a cor da da pele nada significa. O Caráter e a personalidade de alguém não tem relação com a cor da sua pele.

    Internalize isso e parte para uma vida com menos preconceitos.

    Me solidarizo a você, se é que você aceita a minha solidariedade, já que minha pele não é branca, é preta.

    Solidariedade também é coisa de preto.

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