Lava Jato alimenta América Latina contra Lula e Petrobras

Patricia Faermann
Jornalista, pós-graduada em Estudos Internacionais pela Universidade do Chile, repórter de Política, Justiça e América Latina do GGN há 10 anos.
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Jornal GGN – Se de um lado, o ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva angaria esforços de organizações e veículos internacionais contra os abusos da Operação Lava Jato, por outro, a imprensa brasileira reserva apoio e munições jurídicas para países vizinhos, como Peru e Chile, atuarem contra a Petrobras, em dupla jogada para encurralar a condenação de Lula.
 
Os efeitos da Operação Lava Jato ganharam repercussão por todo o mundo, desde que o magistrado da Vara Federal do Paraná e comandante das primeiras investidas contra o esquema, Sérgio Moro, passou a dominar os holofotes da imprensa brasileira.
 
Em março de 2015, por exemplo, o El País da Espanha trazia a coluna de Gustavo Gorriti adiantando passos que estariam por vir no cenário da Lava Jato: “quando se vê o dramático mural narrativo que traçam as evidências e confissões dos delatores qualificados e quando o crescente e já numeroso elenco de corruptos se calça em atores do poder político e empresarial, o inédito alcance deste caso histórico não só resulta assombroso, como também se torna inevitável perguntar como o Brasil enfrentará as consequências funcionais da verdade”, dizia o jornalista.
 
Gorriti foi o jornalista peruano que desvendou as investigações contra o terrorismo no Peru, principalmente o grupo conhecido como “Sendero Luminoso”. Á época escrevendo para a revista Caretas, foi posteriormente perseguido pelo golpe de Estado de Alberto Fujimori, em 1992, sequestrado pelo exército peruano.
 
Passou pelos jornais La República, La Prensa do Panamá, nomeado presidente do Instituto de Imprensa e Sociedade (IPYS), colaborador frequente do The New York TImes e Los Angeles Times, e atualmente integra o Consórcio Internacional de Jornalistas Investigativos (ICIJ), o mesmo dos casos Swissleaks, Panamá Papers, Bahamas Papers etc.
 
Gustavo Gorriti dirige o IDL-Reporteros, um meio online de jornalismo investigativo sustentado pelo Instituto de Defesa Legal, uma ONG aparentemente ligada a direitos humanos e governabilidade. Ainda escreve para o El País, atuando em uma cobertura de temas políticos da América do Sul, Central e Caribe.
 
Neste tabuleiro, diante do que ocorria no país vizinho, em março do ano passado Gorriti destacou: “a ação do caso Lava Jato está dirigida, até agora, por um seleto grupo de juízes, procuradores e delegados que investigam, acusam e julgam uma parte crucial da liderança empresarial e política da nação”. 
 
Mas assim como o domínio da grande imprensa tornou-se a porta-voz das ações dos investigadores da Operação Lava Jato dentro do Brasil, os mesmos veículos foram os responsáveis por difundir as informações a grandes veículos e jornais parceiros no exterior.
 
Assim, em julho de 2015, o IDL-Reporteros seguiu a linha de apuração dominada no Brasil e entrevistou o advogado de Ricardo Pessoa, um dos principais delatores à época, para saber os reflexos do esquema denunciado nas delações junto ao país latino. 
 
A entrevista gerou o especial “Rashomón na Lava Jato“, que aponta o suposto envolvimento da ex-primeira dama do Peru Nadine Heredia, esposa de Ollanta Humala, nas relações econômicas com a UTC e as empresas investigadas na Lava Jato. 
 
Era a primeira brecha de notícias internacionais apontando a mira de outros países contra as empresas brasileiras investigadas. A próxima reportagem viria em janeiro deste ano, desta vez, contra a OAS na matéria “Como a OAS contrabandeou dólares ao Peru… e como os recuperou depois“. 
 
E, expondo a falta de coincidências no próprio trajeto desenhado por Sérgio Moro para as investigações, o IDL-Reporteros sob a supervisão e caneta de Gustavo Gorriti, trouxe a mais recente mira contra a Odebrecht, na publicação “Arbitragens a la Odebrecht“, em setembro de 2016. 
 
Até então, as denúncias faziam conexões com casos de investigações locais antigos e até com as revelações trazidas com as grandes bases de dados descobertas no Panamá Papers e com outros big datas do Consórcio Internacional de Jornalistas Investigativos (ICIJ).
 
Mas, ao contrário da já evidente atuação da equipe de Sérgio Moro e procuradores do Ministério Público Federal (MPF) nos Estados Unidos, fornecendo materiais para o país ter o poder de processar a estatal brasileira Petrobras, as fronteiras da Lava Jato na América Latina paravam nos diários regionais. 
 
Esta semana, novas reportagens denotam a possibilidade das ações jurídicas extrapolarem a ponte Brasil-EUA. Além das empreiteiras nacionais reconhecidas pela representatividade e importância na economia brasileira, é a delação de Léo Pinheiro, vazada aos veículos latinoamericanos, que é encaminhada como ferramenta para os possíveis danos à Petrobras.
 
A champanhe que não estourou” revela mensagens de textos dos celulares de Léo Pinheiro, ex-presidente da OAS, apontando o envolvimento do prefeito de Lima, Luis Castañeda, nos contratos que supostamente foram utilizados para corrupção dentro da Petrobras.
 
A reportagem conta com um forte intermediador: é assinada por jornalista da IDL-Reporteros, juntamente com o brasileiro Guilherme Amado, de O Globo, assim introduzida: “— Escolhe o dia, o lugar e a marca da champanhe. Estou muito agradecido. Você é uma grande maestra — disse José Adelmário Pinheiro Filho (o Léo Pinheiro), então presidente da construtora brasileira OAS, a uma advogada peruana em uma mensagem de texto enviado desde o celular no dia 12 de novembro de 2014, para celebrar o que parecia ser o resultado de uma negociação exitosa no Peru”.
 
“Não chegaram nem a estourar a garrafa, nem a beber a champanhe. Dois dias depois desta mensagem, Pinheiro foi capturado pela Polícia Federal do Brasil durante a sétima fase da Operação Lava Jato, denominada Juízo Final”, continuou.
 
Seguindo: “A OAS teria pagado, por ordem do empresário, cerca de 30 milhões de reais para se beneficiar com contratos da Petrobras. Entre os beneficiários da propina estaria o ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva, quem recebeu, segundo os investigadores, R$ 3.738.738,07 [mais de 1 milhão de dólares]”.
 
Em uma mesma reportagem dividida em três partes, o jornal com a colaboração de O Globo acusa o atual prefeito de Lima, a Petrobras e Lula. Como esperado, o material serviu de base para o CIPER, o Centro de Jornalismo Investigativo do Chile, também parceiro da ICIJ, para recuperar das mensagens de Léo Pinheiro o que poderia envolver o país nos contratos fraudulentos da Petrobras, junto a Lula.
 
“O CIPER teve acesso a milhões de mensagens de texto do principal executivo condenado por corrupção da construtora OAS no Brasil. Os diálogos dão conta de sua preocupação pelos milionários investimentos no Chile, seu protagonismo na produção da visita de Lula em 2013, ocasião em que o ex-presidente apoiou Michelle Bachelet. Os equilíbrios políticos eram um tema sensível para a OAS que tinha uma relação próxima com Marco Enríquez-Ominami, quem lhe facilitou um jato privado. Nas mensagens, também figura Giorgio Martelli, apontado pelo financiamento ilegal da campanha de Bachelet”.
 
Marco Enríquez-Ominami foi candidato presidencial em 2009 pelo Partido Progressista (PRO), acusado por crimes tributários ao facilitar a emissão de comprovantes e documentos falsos para a campanha eleitoral. Já Giorgio Martelli coletou recursos para a campanha de Bachelet em 2005 e também foi o operador da campanha de Eduardo Frei Montalva, em 2009.
 
Para esse outro grande recorte de publicação chilena, o Centro que se denomina investigativo não trouxe informações além das mensagens de texto de Léo Pinheiro, para apurar a extensão das veracidades do conteúdo das trocas de mensagens.
 
Por fim, as duas publicações que foram divulgadas esta semana devem trazer novos capítulos por outros países da América Latina. Isso porque, além do Chile e do Peru, as mensagens apontam desdobramentos de informações contra o ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva e contratos irregulares da Petrobras também no Uruguai e na Argentina.
 
Patricia Faermann

Jornalista, pós-graduada em Estudos Internacionais pela Universidade do Chile, repórter de Política, Justiça e América Latina do GGN há 10 anos.

2 Comentários

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  1. Uma indisfarçável Operação Condor- Fase II

    Prezados leitores,

    Lendo esta reportagem notamos as 20 digitais do império estadunidense e uma insdisfarçável Operação Condor-Fase II, engendrada com países latino-americanos, para tentar salvar o capitalismo da crise irremediável em que ele se encontra há duas décadas e de forma mais aguda pelo menos desde 2008.

  2. America latina

    Vi em um vídeo que, em um dos últimos encontros mundiais, quando Michel Temer começou a falar, vários representantes da America Latina deixaram o salão. 

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