Mídia antimídia, onde está o jornalismo?, por Pedro Augusto Pinho

Lourdes Nassif
Redatora-chefe no GGN
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Mídia antimídia, onde está o jornalismo?
 
Pedro Augusto Pinho

O brilhante Paulo Moreira Leite, com seu meio século de experiência jornalística, recorda, na TV 247, um fato emblemático: o “Massacre de Volta Redonda”.

Reavivando a memória. Dia 7 de novembro de 1988. Metalúrgicos da Companhia Siderúrgica Nacional (CSN) iniciam uma greve e ocupam a Usina Presidente Vargas (UPV), em Volta Redonda (RJ). Em 9 de novembro, tropas do Exército invadiram a empresa. Três trabalhadores morreram a tiros (Carlos Augusto Barroso, 19 anos; Valmir Freitas Monteiro, 22 anos; William Fernandes Leite, 23 anos). Outras 31 pessoas ficaram feridas.

Presidia o Brasil José Ribamar Ferreira de Araújo Costa, conhecido por José Sarney, por 20 anos membro da Aliança Renovadora Nacional (ARENA), partido de sustentação dos governos militares, o qual dirigiu até sua transformação em Partido Democrático Social (PDS).

A imprensa procurava proteger os cardeais da ditadura e as Forças Armadas. Quando a redação levou à editoria da revista o título da reportagem, a direção trocou-o por “Tragédia de Volta Redonda”.

Após um período de censura externa, a imprensa no Brasil passa a ocultar fatos públicos, como as manifestações pelas Diretas Já, a realizar a censura interna.

Trabalhei, quando estudante universitário (anos 1960), em jornais e na televisão dos Associados, de Assis Chateaubriand, e no Correio da Manhã. Vi a chegada da censura e do Ato Institucional nº 5 (AI 5). Nada se assemelha a esta imprensa oligopolista, dessas seis famílias que dominam agora a mídia convencional brasileira.

Mas seu poder está sendo vencido pela tecnologia. E isso nos remete a outra questão; fundamental para soberania e para construção da cidadania brasileira.

A geração mais nova, nem falo de meus netos, mas de minha filha, não lê jornais, revistas, nem assiste noticiário de televisão. Seus instrumentos de comunicação são as redes sociais, suas informações estão nos jornais virtuais, facebook, twitter e no google.

Quando escrevo sobre a construção da cidadania – e não por ser ideia minha, mas pelo que analisam os pensadores da escola crítica do século XXI – apresento os três eixos deste projeto: existência, consciência e vocalização.

São termos que conduzem à necessidade de garantir a sobrevivência dos habitantes do Estado Nacional, a sua formação integral, referidas por mim como letramentos, e à expressão plural, com multiplicidade de receptores.

Como é evidente, as tecnologias da informação e da comunicação (TIC) desempenham o papel fundamental.

A associação da soberania com a cidadania, entre outras matrizes, se dá no desenvolvimento destas TICs.

Não discorrerei sobre as exigências da área de energia, aeroespacial, médica, vou me ater à comunicação humana, entre humanos e com as instituições humanas.

Engana-se ou pretende enganar quem não veja a enorme rejeição dos brasileiros ao golpe. À repressão, alia-se a surpresa de ver se amesquinhar, envergonhar-se todo dia, um poder que deveria estar acima das paixões, agir como sempre se disse: como juiz, sinônimo de isenção.

Reflita a caro leitor. Você vive absoluta insegurança, que a das ruas é quase nada diante de seus atos que podem ser anulados ou criminalizados, sem que houvesse prévia legislação, sem que eles fossem “defesos por lei”, como devem ter aprendido todos os magistrados de Tribunais, inclusive do Supremo Tribunal Federal (STF).

Vejamos o caso concreto e surpreendente ocorrido na sexta-feira, 17/08/2018.

“O Comitê de Direitos Humanos da Organização das Nações Unidas (ONU) emitiu um comunicado, pedindo que o Brasil “tome as medidas necessárias para garantir que Lula possa exercer seus direitos políticos enquanto estiver na prisão, como candidato às eleições” deste ano. O comitê cita especificamente “acesso à mídia e a membros de seu partido político” e pede que o Brasil “não impeça que ele dispute as eleições presidenciais de 2018 antes de decididos todos os recursos judiciais” pendentes.

Em nota o Escritório do Alto Comissariado de Direitos Humanos das Nações Unidas explica que o comitê que assina o pedido sobre Lula é formado por peritos independentes. É composto por 18 especialistas de diferentes países e, atualmente, nenhum deles é brasileiro. Sem carreira na diplomacia, os integrantes do comitê são eleitos para mandatos de quatro anos, pelas nações signatárias do Pacto Internacional sobre Direitos Civis e Políticos (o Brasil é uma delas), levando em consideração suas competências na área.  Esses peritos não são considerados representantes de seus países.

Mas esse comitê tem autoridade para emitir recomendações aos países que assinaram o pacto, segundo estabelece o artigo 40 do próprio acordo. Além disso, segundo o primeiro  protocolo opcional do texto, também assinado pelo Brasil, o comitê “tem competência para receber e examinar comunicações provenientes de indivíduos sujeitos à sua jurisdição que julguem ser vítimas de uma violação (…) de qualquer dos direitos enunciados no Pacto”.

O Brasil ratificou o pacto em 1991 e o protocolo opcional em 2009. Portanto, reconhece formalmente as atribuições do comitê” (transcrição da Agência Lupa, texto de Cristina Tardáguila, Chico Marés e Clara Becker, 23.ago.2018).

Algum “jornalão”, alguma rede de televisão ou revista a caminho da extinção, desculpe a rima, mas é parte da solução, divulgou, e com a clareza da Agência Lupa, o que estava sendo decidido a respeito do candidato preferido em todas as prévias que conste seu nome? Não, não e não.

E o ínfimo STF, por um de seus membros, ainda contesta o comunicado por não possuir “efetividade jurídica alguma”. Mereceu do embaixador e ex-secretário geral do Itamaraty, Samuel Pinheiro Guimarães, a observação: “”Não sei se o ministro é especialista em Direito Internacional, talvez se lesse um pouco mais poderia chegar a melhores conclusões”.

E o jornalismo oligopolista e familiar, como no poema de Castro Alves: “Calado Ficou… Mudos, quedos …. neste momento”.

Há cada dia mais evidências que o golpe de 2016 foi planejado, organizado e patrocinado pelo sistema financeiro internacional, a banca, como abrevio, e, sendo um poder absolutamente venal e corruptor, nada mais natural que comprasse seu novo parceiro: o judiciário, que não ousa mais se chamar justiça.

A qualificação do golpe de jurídico-midiático se torna perfeita e, certamente, assim será consignado na história.

Temos, então, um grave problema. Coonestar a ditadura na qual vivemos, que se disfarça de democrática, “com as instituições funcionando”. Ou denunciá-la.

Não tenho respostas, mas aguardo dos mais sábios e autênticos patriotas.

Pedro Augusto Pinho, avô, administrador aposentado 

 

 

Lourdes Nassif

Redatora-chefe no GGN

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  1. MÍDIA ANTIMÍDIA, ONDE ESTÁ O

    MÍDIA ANTIMÍDIA, ONDE ESTÁ O JORNALISMO?

    UMBERTO ECO in NÚMERO ZERO responde: PARA CHANTAGEAR:

    “Um grupo de redatores, reunido ao acaso, prepara um jornal. Não se trata de um jornal informativo; seu objetivo é chantagear, difamar, prestar serviços duvidosos a seu editor” (apresentação da edição brasileira, 2015)

    Assim dito por Umberto Eco:

    “- O Comendador quer entrar para o clube de elite das finanças, dos bancos e, quem sabe, dos grandes jornais. O instrumento é a promessa de um novo diário disposto a dizer a verdade sobre todas as coisas. Doze números zero, digamos 0/1, 0/2, e assim por diante, impressos em pouquíssimos exemplares reservados que o Comendador vai avaliar e depois dará um jeito para que sejam vistos por pessoas que ele lá sabe. Quando o Comedador demonstrar que pode pôr em dificuldades aquilo que se chama clube das eleites das finaças e da política, é provável que o clube de elite lhe peça para parar com essa idéia, então ele desiste do Amanhã e consegue licença para entrar no clube de elite. Suponhamos, só para dar um exemplo, que apenas uns dois por cento de ações de um grande diário, de um banco, de um canal de televisão importante.

             Assobiei:

             – Dois por cento é muito! Ele tem dinheiro para um empreendimento desse tipo?

             – Não seja ingênuo. Estamos falando de finanças, não de comércio. Primeiro você compra, depois vê que o dinheiro para pagar aparece.

             – Entendi. E também que a experiência só vai funcionar se o Comendador não disser que no fim o jornal não vai sair. Todos deverão acreditar que as rotativas estão tinindo de impaciência, digamos…

             – Claro. Que o jornal não vai sair o Comendador não disse nem a mim, eu simplesmente desconfio, ou melhor, tenho certeza. E os nossos colaboradores não vão poder saber disso (…)”

    ECO, Umberto. Número Zero: tradução de Ivone Benedetti, 3a. edição, Rio de Janeiro: Editora Record, 2015, p. 27/28

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