No dia do voto de Celso de Mello, jornais paulistas apertam o cerco

Lourdes Nassif
Redatora-chefe no GGN
[email protected]

Jornal GGN – Os jornais paulistas trazem sua contribuição ao cerco para que o ministro Celso de Mello vote contra os infringentes. Cada um, Estadão e Folha, faz de seu jeito, para levar o mensalão ao final, “lavando a honra da pátria e ao fortalecimento das instituições democráticas”.

A Folha joga a crítica no colo do paulistano. Pesquisa do Datafolha dá cores à manchete: “Em SP, maioria rejeita a abertura do mensalão”, que “revela que 55% são contra novo julgamento; 79% querem prisão imediata”. Ainda na manchete, indicação de que a pesquisa mostra que 41% consideram o trabalho do tribunal ruim ou péssimo, e só 21%, bom ou ótimo. Vamos à pesquisa.

O Datafolha ouviu 719 pessoas, com margem de erro de 4 pontos para mais ou para menos. Diz a matéria que  “pouco mais da metade dos entrevistados, 55%, é contra o reexame dos casos”. Daí discorre sobre o caso, informando os passos do STF, com a expectativa do voto de Celso de Mello. E volta à pesquisa, dizendo que 50% acredita que Mello será favorável à nova análise e pouco mais de um terço, ou 34%, que será contra.

Esta é a matéria. Daí vem a análise e a pergunta que não quer calar: “como pode a grande maioria dos paulistanos defender a prisão imediata aos condenados do mensalão se ao mesmo tempo boa parte deles prefere voto favorável do ministro Celso de Mello pela reabertura dos julgamentos?”. E responde: que o emaranhado jurídico que se transformou não encontra fácil solução entre ministros do STF e gera muitas dúvidas na população. E, esclarece que há baixa taxa de conhecimento em relação à nova etapa dos trabalhos do STF.

Sobre a conclusão de baixa taxa de conhecimento sobre o tema, leia-se que a população não tem a menor ideia do que significa a aceitação de embargos infringentes e poucos se julgam bem informados. Leia-se também, desta vez nas entrelinhas: será que a imprensa cumpriu seu papel de informar? E também aí está o Datafolha se explicando: “é claro que não se pode projetar sobre toda a população a posição de um subconjunto de peso quantitativo tão residual”. Mas este parágrafo serve para assoprar antes de apontar para o fato de que a maioria considera o desempenho do STF ruim/péssimo ou regular.

E, na coluna de Mônica Bergamo, a constatação de que a pressão da mídia está fazendo mal aos servidores do gabinete de Celso de Mello. Os servidores estão irritados, ele os acalma dizendo que pressão nenhuma o fará mudar seu voto. Só não diz qual será, aponta a colunista.

Estadão vem com a capa quase neutra, onde coloca em evidência o discurso da presidente Dilma Rousseff na posse do procurador-geral da República, Rodrigo Janot. A manchete, “Dilma pede ‘serenidade’ e ‘imparcialidade’ da Justiça” carrega em indução, com aspas críticas em fala ponderada. A matéria centra a página inicial, com foto privilegiando o tema, em que Dilma aparece muito séria, o jornal inicia o texto afirmando que discurso chega na véspera do desempate de Celso de Mello no julgamento do Estadão. Termina a chamada de capa com fala de Gilmar Mendes, que no dia anterior defendeu fixação de prazo para julgamento caso o recurso seja aceito, para que o processo “não fique solto” e não vire “pizza”.

Acima da matéria principal, a notícia de que a presidente cancelou viagem aos EUA devido à espionagem. Ao lado, duas notícias afeitas ao governo de Dilma: CGU aponta que pedetistas receberam a verba do trabalho, partido do ministro Dias, com denúncias do ex-presidente da Juventude do partido; e para a entrega de cargos ao governo por parte do PSB, antecipando-se ao Planalto e se dizendo “constrangido com ameaças”. A capa deu seu recado. E o miolo trouxe três quartos de página com prevalência de infográfico, já dado anteriormente, com réus, crimes e penas, e de como ficariam caso os embargos fossem aceitos.

Passeando pelas páginas de opinião e editorial, Estadão faz elegia ao fortalecimento do STF com a negativa de aceitação dos infringentes, sob pena de enfraquecimento ou não das instituições republicanas. Traz a máxima “o STF pode consolidar o alento de esperança no fim da impunidade dos poderosos”. E vai discorrendo, elogiando a atuação de Celso de Mello até agora e afirmando que caso aceite os embargos infringentes o STF será objeto de profundo descrédito ou, caso não aceite, consolidará a percepção de que não é uma instituição como as outras, “fortalecendo-se, desta forma, a democracia”. E lembra aos leitores do Supremo de que a eventual aceitação traz o grave risco “de um enfraquecimento institucional da democracia”.

Estadão dedica três páginas à questão da espionagem e ao cancelamento da viagem de Dilma aos EUA, com análises de vários setores se medida é boa ou não para o país. Meia página à questão do ministro do Trabalho e a auditoria do CGU, que comprovou repasse de verbas ao PDT. Uma página vai para o Mais Médicos e para melhor avaliação de estudantes de medicina no Brasil, ao lado de meia página com pesquisa que demonstra que o ensino superior cresceu menos em 2012.

Lourdes Nassif

Redatora-chefe no GGN

13 Comentários

Deixe um comentário

O seu endereço de e-mail não será publicado. Campos obrigatórios são marcados com *

  1. “…55% são contra novo julgamento”

    A velha aritmética socorre a um leitor medianamente atento: 6/11 – o resultado que se consolidará hoje sobre o cabimento dos recursos infringentes, corresponde justamente a , 55% * do plenário!!!

    Se para um lado ou para outro, a mensagem é politicamente inequívoca: o plenário está dividido exatamente como os entrevistados no universo pesquisado…

     

    *54,54545454544%, que, seguindo uma regra trivial de arredondamento, corresponde aos 55%.

  2.  
     
    Já disse em outra

     

     

    Já disse em outra oportunidade que Celso de Mello foi transformado num verdadeiro sacrificador

    http://ajusticeiradeesquerda.blogspot.com.br/2013/09/celso-de-mello-e-o-sacrificio-ritual.html

    Ele está entre duas opções bastante distintas.  Ele pode acelerar a implantação do Estado de Direito, permitindo aos odiados réus petistas terem direito a um recurso que todos os outros réus tiveram, têm e terão se não forem petistas. Pode também nos fazer voltar ao tempo em que dominava a “tradição personalista” herdade da cultura Portuguesa e Espanhola  sobre a qual Francisco Weffort escreveu as seguintes palavras:

     

    “Marcando nítidas diferenças com a cultura dos países que se formaram além-Pirineus, os hispânicos valorizavam as pessoas dando menor importância “à verdade das coisas, fundada em uma lógica impessoal”. Não é difícil reconhecer nessa valorização da pessoa a gênese do “homem cordial” dos escritos de Sérgio Buarque de Holanda sobre as origens do Brasil. Encontra-se aí a raiz fundamental da  subvalorização das normal e das leis, típica da cultura brasileira e hispano-americana em geral. Daí também que os jesuítas discipulos do espanhol Inácio de Loyola, tenham inventado o casuísmo que, como as subculturas do ‘jeitinho brasileiro” (ou do ‘arreglo’ argentino), do golpismo, do caudilhismo (e dos ‘pronunciamentos'(, é tão frequente até os dias atuais na política ibero-americana. Baseado não em princípios gerais mas em interesses e circunstâncias particulares, o casuísmo foi visto pelo francês Blaise Pascal, católico jansenista e anti-jesuíta, como um sinal de imoralidade.” ( (ESPADA, COBIÇA E FÉ – As origens do Brasil, Editora Civilização Brasileira, 2012, p. 70).

     

    A imoralidade tem sido a regra no STF. Há bem pouco tempo Gilmar Mendes concedeu dois HCs ao banqueiro criminoso Daniel Dantas (um deles com evidente supressão  de instância). Depois, o então Presidente do STF passou a perseguir de maneira sistemática e cruel o Delegado da PF que realizou a operação que resultou na prisão do banqueiro e o  Juiz da Justiça Federal em São Paulo que havia determinado a prisão dele. O casuísmo destas ações afirmativas de Gilmar Mendes em favor de seu protegido no passado em tudo se equivalem ao seu casuísmo neste momento. Ontem ele exigiu a rejeição dos Embargos Infringentes por Celso de Mello, dizendo que o STF não pode ser uma pizzaria (http://ultimosegundo.ig.com.br/politica/2013-09-17/stf-nao-e-tribunal-para-ficar-assando-pizza-diz-gilmar-mendes-sobre-mensalao.html ), como se ele mesmo não fosse o maior pizzaiolo tucano da história daquele Tribunal.

     

    Celso de Mello pode endossar o casuísmo tradicional gilmariano ou fortalecer o Estado de Direito dando um basta à tradição do casuismo, segundo o qual alguns réus (os mais iguais) são intocáveis e outros (menos iguais) podem ser linxados ilegalmente pelo Judiciário porque assim deseja a imprensa. Qualquer que seja, o voto dele hoje será um divisor de águas, pois ou avançaremos para a validade de normas gerais abstratas aplicáveis a todos os réus ou permaneceremos eternamente presos à nefasta tradição da aplicação das regras jurídicas com base no casuismo. 

     

     

     

     

     

  3. Celso de Mello entre o

    Celso de Mello entre o casuísmo e o Estado de Direito
    Por Fábio de Oliveira Ribeiro

    Já disse em outra oportunidade que Celso de Mello foi transformado num verdadeiro sacrificador dos petistas:
    http://ajusticeiradeesquerda.blogspot.com.br/2013/09/celso-de-mello-e-o-sacrificio-ritual.html

    Ao proferir seu voto hoje ele ficará entre duas opções bastante distintas. Ele pode acelerar a implantação do Estado de Direito, permitindo aos odiados réus petistas terem direito a um recurso que todos os outros réus tiveram, têm e terão se não forem petistas. Pode também nos fazer voltar ao tempo em que dominava a “tradição personalista” herdade da cultura Portuguesa e Espanhola, sobre a qual Francisco Weffort escreveu as seguintes palavras:

    “Marcando nítidas diferenças com a cultura dos países que se formaram além-Pirineus, os hispânicos valorizavam as pessoas dando menor importância ‘à verdade das coisas, fundada em uma lógica impessoal’. Não é difícil reconhecer nessa valorização da pessoa a gênese do ‘homem cordial’ dos escritos de Sérgio Buarque de Holanda sobre as origens do Brasil. Encontra-se aí a raiz fundamental da subvalorização das normal e das leis, típica da cultura brasileira e hispano-americana em geral. Daí também que os jesuítas discípulos do espanhol Inácio de Loyola, tenham inventado o casuísmo que, como as subculturas do ‘jeitinho brasileiro” (ou do ‘arreglo’ argentino), do golpismo, do caudilhismo (e dos ‘pronunciamentos’), é tão frequente até os dias atuais na política ibero-americana. Baseado não em princípios gerais mas em interesses e circunstâncias particulares, o casuísmo foi visto pelo francês Blaise Pascal, católico jansenista e anti-jesuíta, como um sinal de imoralidade.” (ESPADA, COBIÇA E FÉ – As origens do Brasil, Editora Civilização Brasileira, 2012, p. 70).

    A “tradição personalista” e o casuísmo explicam porque a imoralidade tem sido a regra no STF. Há bem pouco tempo o Ministro Gilmar Mendes concedeu dois HCs ao banqueiro criminoso Daniel Dantas, um deles com evidente supressão de instância acarretando firme reprovação dos especialistas em Direito (http://www.conjur.com.br/2008-jul-15/soltura_dantas_tipico_supressao_instancia). Depois, o então Presidente do STF passou a perseguir de maneira sistemática e cruel o Delegado da PF que realizou a operação que resultou na prisão do banqueiro e o Juiz da Justiça Federal em São Paulo que havia determinado a prisão dele. 

    O casuísmo destas “ações afirmativas” de Gilmar Mendes em favor de seu réu-protegido no passado em tudo se equivalem ao seu casuísmo vingativo neste momento. Ontem ele exigiu a rejeição dos Embargos Infringentes por Celso de Mello, dizendo que o STF não pode ser uma pizzaria (http://ultimosegundo.ig.com.br/politica/2013-09-17/stf-nao-e-tribunal-para-ficar-assando-pizza-diz-gilmar-mendes-sobre-mensalao.html ). A ausência de ética de Gilmar Mendes é tamanha que ele veio a público tentar impor seu ponto de vista como se ele mesmo não fosse o maior pizzaiolo tucano da história daquele Tribunal.

    Celso de Mello pode hoje endossar o casuísmo gilmariano ou fortalecer o Estado de Direito dando um basta à “tradição personalista”, segundo o qual alguns réus (os mais iguais) são intocáveis apesar da Lei e outros (os réus menos iguais) podem ser linchados ilegalmente pelo Poder Judiciário porque assim deseja a imprensa. Qualquer que seja, o voto dele hoje será um divisor de águas, pois ou avançaremos para a validade de normas gerais abstratas aplicáveis a todos os réus igualmente ou permaneceremos eternamente presos à nefasta tradição da aplicação das regras jurídicas com base no casuísmo luso-espanhol herdado dos tempos da Colônia.

  4. jornais paulistas

    Boa análise

    Confirma a previsibilidade da postura dos veículos da “mídia nativa” como diz Mino Carta. Acabou-se completamente a surpesa. Até a tentativa de neutralidade se dissolve em aspas. Para alguns veículos não tem mais jeito. Perderam o conhecimento de criar notícia para além da opinião de seu próprio senso comum. Acabou o “mojo”.

  5. “como pode a grande maioria

    “como pode a grande maioria dos paulistanos defender a prisão imediata aos condenados do mensalão se ao mesmo tempo boa parte deles prefere voto favorável do ministro Celso de Mello pela reabertura dos julgamentos?”

    Segundo o que se depreende do texto a maioria dos paulistanos ACHA que o Celso de Mello vai votar pela reabertura, mas o autor já deduziu que PREFERE…

    Bela tentativa…

  6. …. precisamos urgente de um

    …. precisamos urgente de um plebiscito nacional !!!     as classes F, E, D e C que mantem os salarios e pensoes de todo o judiciario tem o direito de se manifestar.

  7. Uma dúvida: em outro ‘crime’

    Uma dúvida: em outro ‘crime’ ( não este, dos infrigentes ) do julgamento, os senhores supremos afirmaram que o BV pertencia ao Banco do Brasil, e não a agência de publicidade.

    Pois bem. Pode um juiz de 1ª instância condenar qualquer publicitário, mesmo os famosos de SP, de ter surrupiado o cliente, que pode ser a Ford, a Coca Cola, ou outro grande anunciante?

    O Ramón e o Cristiano Paz vão mofar no xilindró por 20 anos.

    Li aqui no blog hà alguns dias uma frase célebre, não lembro o autor, mais ou menos assim: qualquer injustiça contra um, é uma ameaça à todos.

  8.  
    CELSO DE MELLO O DECANO.

     

    CELSO DE MELLO O DECANO. ELE TAMBÉM MATA NO PEITO E…vai pra galera.

    Para os que imaginavam que no supreminho somente o Fux batia uma bolinha maneira. Vejamos um trechinho do que diz o Doutor Saulo, a respeito do talento ludopédico do supremo atleta, digo, juiz, no seu livro “Código da Vida”, Ed. Planeta, 8ª edição, 2007
    Orlando

    — “Doutor Saulo, o senhor deve ter estranhado o meu voto no caso do Presidente.

    — Claro! O que deu em você?

    — É que a Folha de S. Paulo, na véspera da votação, noticiou a afirmação de que o Presidente Sarney tinha os votos certos dos ministros que enumerou e citou meu nome como um deles. Quando chegou minha vez de votar, o Presidente já estava vitorioso pelo número de votos a seu favor. Não precisava mais do meu. Votei contra para desmentir a Folha de S. Paulo. Mas fique tranqüilo. Se meu voto fosse decisivo, eu teria votado a favor do Presidente.

    Não acreditei no que estava ouvindo. Recusei-me a engolir e perguntei:

    — Espere um pouco. Deixe-me ver se compreendi bem. Você votou contra o Sarney porque a Folha de S. Paulo noticiou que você votaria a favor?

    — Sim.

    — E se o Sarney já não houvesse ganhado, quando chegou sua vez de votar, você, nesse caso, votaria a favor dele?

    — Exatamente. O senhor entendeu?

    — Entendi. Entendi que você é um juiz de merda! Bati o telefone e nunca mais falei com ele.”

  9. Decisão sobre a Ação Penal 470

    O julgamento do suposto “Mensalão”, essa mácula que a história desnudará, mais ainda, o voto que decidirá ou não a aceitação dos embargos infringentes, já não me aflige neste momento. Vamos, de agora em diante, lutar sim pelo julgamento desse monstro pavoroso chamado mídia, a abominável, evidentemente.

  10. Decisão sobre a Ação Penal 470

    O julgamento do suposto “Mensalão”, essa mácula que a história desnudará, mais ainda, o voto que decidirá ou não a aceitação dos embargos infringentes, já não me aflige neste momento. Vamos, de agora em diante, lutar sim pelo julgamento desse monstro pavoroso chamado mídia, a abominável, evidentemente.

  11. Pesquisa DataFalha

    Se a pesquisa da Folha estiver correta, vamos economizar as fortunas que se gastam anualmente com os tribunais, juízes, promotores e advogados. Qualquer assassinato, estupro, roubo, desvio de verbas, depredação, xingamento, calúnia e difamação, marca-se hora pela internet. O cidadão entra com login e senha e pronto, vota na absolvição ou condenação, considera tal ou qual procedimento legal ou ilegal. Uma pena que há  Há 1880 anos houve um julgamento parecido. Como a internet não funcionava direito e nem todos tinham computador, chamaram a turba, digo, o povo à praça. Votaram pela condenação de Jesus Cristo. Eis que centenas de anos depois descobrem que o Cristo era inocente. Não adiantava pedir desculpas ao Pai d’Ele, o Filho já havia sido torturado pelo DOI-CODI romano e morto na cruz. Os Brilhantes Ustra da época viraram heróis e o Cristo foi enxovalhado. Ah, nem precisamos ir tão longe na Geografia e na História. Basta lembrar o famoso “Caso dos Irmãos Naves”, no interior de Minas no século passado. Dois irmãos foram condenados pela morte de inimigo. Quinze anos de cadeia depois, o “morto” apareceu vivinho na cidade, para o “sincero” arrependimento dos que os humilharam e condenaram.

  12. Um breve comentário sobre os desdobramentos da AP 470

    Um breve comentário sobre os desdobramentos da AP 470

     

    Muito são os comentários, post’s e escárnios acerca da condenação daqueles chamados mensaleiros.

     

    Vejo fotos, tiradas ímpares e até algumas perdoáveis imbecilidades. Mas o que de fato não se vê, é como a indignação da população – aí eu incluo aqueles que levantam bandeira por condenação, postam fotos, discutem em mesas de bar e et cetera –  está intimamente relacionada a indignação transmitida pelo apresentador da TV, do programa que assistem. Indignação essa que não é propriamente um senso de justiça e sim o desejo de ver punido aquele que, por diversas razões, excluiu esse ou aquele do jogo corrupto, do enriquecimento rápido, sem causa, criminoso. O que é preocupante.

     

    Em noticiários, é comum o clamor por justiça, quando de fato o é por vingança. Nos roubam, nos matam, nos humilham, vão de encontro a interesses de uns, sepultam pretensões de outros e por essa razão se quer o troco e não a justiça.

     

    Mas a população – eu e você – esquece que o cenário desenhado pelos telejornais é o espelho de nossa conduta como cidadão.

     

    A exemplo o episódio da “importação de médicos”. Seus representantes foram “as ruas” em defesa de um corporativismo criminoso. Estes mesmo representantes de classe fecham os olhos para uma grande parcela de servidores públicos médicos – seus associados- que por princípio moral viciado, roubam, matam e humilham[1] população a quem deveriam servir. Estes mesmos cidadãos médico se dizem enojados com a “corrupção que assola o país”.

     

    Poderia citar como exemplo advogados públicos que pensam apenas em seus interesses, trabalhadores que se valem de falsos atestados médicos, aqueles que fraudam o INSS, a doméstica que furta do empregador, o engenheiro que se omite diante de irregularidades, enfim.

     

    Então não se busca justiça. Se busca o troco. O troco por não ter participado e lucrado com esquemas criminosos patrocinados pelo alto escalão de governos.

     

    Não poderia dizer que o brasileiro é essencialmente corrupto, ou corrupto por sua natureza, mas posso afirmar, até porque estou inserido neste contexto, tratar-se de um povo com convicções morais duvidosas. Independentemente de sua condição sócio cultural, etnia, credo, cor, raça e et cetera.

     

    No íntimo da maioria, justiça está relacionada a ingenuidade. O justo é ingênuo. Oportuno até mencionar a famosa frase de Rubem Braga onde diz que “de tanto ver triunfar as nulidades; de tanto ver prosperar a desonra, de tanto ver crescer a injustiça. De tanto ver agigantarem-se os poderes nas mãos dos maus, o homem chega a desanimar-se da virtude, a rir-se da honra e a ter vergonha de ser honesto”.

     

    O brasileiro tem vergonha de ser honesto. Honestidade é tolice diria o outro. O honesto não permite antecipação de julgamentos e nós a todo momento rogamos por essa antecipação. O honesto não limita direitos, não expõe ao ridículo quem quer que seja, a exemplo a “bandeira da redução da maioridade penal”, um completo absurdo simplória e eleitoreiramente levantada por um ser humano de baixíssimo nível moral. O honesto não propagandeia o que não sabe ou o que não tem certeza. O honesto não burla a lei, não viola as regras. O homem honesto exalta a ampla defesa e o contraditório no seu mais alto grau. O homem honesto não se vinga, ele é justo.

     

    Nesse caminho, os jornais diariamente bombardeiam a população com o desejo por justiça. E você acredita.

     

     

     

     

     

     

     

     


    [1] Aquele que se ausenta quando deveria trabalhar, submete o paciente a humilhação da espera, agrava sua condição de saúde podendo o levar a morte e frauda a administração posto que recebe pelo serviço não prestado

     

Você pode fazer o Jornal GGN ser cada vez melhor.

Apoie e faça parte desta caminhada para que ele se torne um veículo cada vez mais respeitado e forte.

Seja um apoiador