Nuvem escura no horizonte, por Luciano Martins Costa

Patricia Faermann
Jornalista, pós-graduada em Estudos Internacionais pela Universidade do Chile, repórter de Política, Justiça e América Latina do GGN há 10 anos.
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Do Observatório da Imprensa

Estado de S. Paulo reproduz, na edição de quinta-feira (23/4), reportagem da revista inglesa The Economist sobre as perspectivas de crescimento da computação em nuvem. O tema central é a queda progressiva dos preços de armazenamento de dados, ao mesmo tempo em que cresce exponencialmente a capacidade e a operacionalidade desses sistemas. Um olhar no horizonte mostra que a gestão de redes de computadores remotos é um dos setores da tecnologia que mais crescem, junto com a comunicação móvel.

O que isso tem a ver com a imprensa como a conhecemos?

Tem tudo a ver, em pelo menos dois pontos cruciais: primeiro, o tráfego instantâneo de informações numa rede complexa de computadores manda para o arquivo morto os sistemas centralizados de gestão que caracterizam as empresas de mídia noticiosa; segundo, o sistema transforma o núcleo da atividade jornalística em mercadoria que pode ser servida por qualquer tipo de empresa que possua os programas de gestão remota de dados.

Um olhar para o horizonte próximo mostra que será necessário trocar grande parte dos programas utilizados na coleta, edição e publicização de material jornalístico, porque a maioria dos sistemas multiplataforma foi construída com a lógica da mídia impressa.

Não é tarefa simples adequar esses conjuntos de softwares para gerenciar textos, imagens e sons de maneira integrada entre unidades computacionais localizadas em várias partes do planeta. Há quem diga que esse salto tecnológico equivale ao processo de troca dos sistemas de mainframespelas redes de computadores pessoais, que gerou altos custos e grande endividamento nas empresas jornalísticas na década de 1990.

No Brasil, onde as corporações de mídia enfrentam dificuldades financeiras e se veem obrigadas a cortar empregos às dezenas, esse desafio só poderá ser enfrentado com o suporte do Estado – e aí o leitor atento pode imaginar o quanto ajudaria ter em Brasília um governo disposto a abrir os cofres do Tesouro, como aconteceu em passado recente.

Parece, portanto, haver uma conexão entre a crise financeira das grandes empresas de comunicação, a perspectiva de aumento dos custos devido a uma acelerada mudança na tecnologia de informação e comunicação, e certo esforço que fazem os jornais para substituir os inquilinos do Palácio do Planalto antes da próxima eleição presidencial regulamentar.

Demissões em massa

O contexto diz que jornalistas serão sempre essenciais, mas empresas jornalísticas do tipo que conhecemos se tornam obsoletas. Como se sabe, o setor vem sendo obrigado a reduzir severamente os postos de trabalho: no dia 6 de janeiro, houve mais de 30 demissões em jornais do interior paulista, cinco das quais na sucursal da Folha de S. Paulo em Ribeirão Preto, que foi fechada; nos dois dias seguintes, o Estado de Minas demitiu mais de uma dezena de jornalistas e o Globo cortou uma centena de funcionários, entre os quais 30 jornalistas; em março, a TV Bandeirantes mandou embora 30 profissionais; e neste mês de abril o Estado de S. Paulo cortou 100 postos de trabalho, o SBT demitiu 40 e a Folha começou um corte que, segundo o Sindicato dos Jornalistas, já passou de 50.

Esse cenário tecnológico precisa ser compreendido no contexto mais amplo do mercado, onde também não há boas notícias para a mídia tradicional. Na primeira semana deste mês, a revistaMeio e Mensagem publicou entrevista (ver aqui) do britânico Miles Young, presidente mundial da rede Ogilvy, que pertence à WPP, o maior conglomerado de publicidade e comunicação do planeta, na qual ele anunciava uma mudança radical no negócio: as antigas agências de propaganda estão se transformando em produtoras de conteúdo, ou publishers, e começam a contratar jornalistas.

Na mesma quinta-feira (23), a Folha de S. Paulo publica entrevista na qual o sorridente diretor de negócios da TV Globo, Willy Haas, diz que a emissora ainda acredita na força da propaganda, motor da TV aberta, apesar da crescente concorrência de outras telas, como as do computador, dos tablets e dos smartphones, além do crescimento dos serviços de vídeo sob demanda, como o Netflix. Ao comemorar seus 50 anos de existência, afirmou, a emissora considera que precisa inovar para concorrer com as novas mídias.

Acontece que, embora se beneficie com 40% do bolo publicitário da TV no Brasil, tendo faturado em 2014 a montanha de R$ 16,2 bilhões, com um lucro líquido de R$ 2,4 bilhões, a Globo não está imune às dificuldades que se avolumam.

Um exemplo: como lembra o jornalista Adalberto Marcondes, o que aconteceria se mudassem as regras que beneficiam a mídia, com uma separação clara entre jornalismo e entretenimento?

Patricia Faermann

Jornalista, pós-graduada em Estudos Internacionais pela Universidade do Chile, repórter de Política, Justiça e América Latina do GGN há 10 anos.

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