O judiciário como ferramenta de censura, por Marcelo Auler

Brasil ocupa a 104ª posição no ranking mundial de liberdade de imprensa, de acordo com a organização Repórteres sem Fronteiras
 
Marcelo Auler
 
Jornalismo nas Américas: “a censura (no Brasil) tem sido prática recorrente”
 
Ao compartilhar aqui o texto escrito pela jornalista Heloisa Aruth Sturm no site Journalism in the Americas, destaco que muito embora o eixo principal da reportagem seja a censura que este blog vem sofrendo, ela mostra que, no Brasil, as proibições ditadas pelo judiciário, não são fato isolado. Há, porém, um “esquecimento” dos fatos passados.
 
Ninguém mais comenta, por exemplo, a censura imposta judicialmente a O Estado de S. Paulo, desde julho de 2009, a pedido da família Sarney. Ela impediu o jornal paulista de noticiar a operação policial que investigou Fernando Sarney, filho do senador José Sarney. Mais grave é que o caso, prestes a completar sete anos, está no Supremo Tribunal Federal (STF). Aguarda julgamento.
 
Cita ainda a proibição sofrida pela ONG Repórter Brasil de divulgar notícias sobre um resgate de trabalhadores em condições análogas às de escravo. Levantamento feito pelo Centro Knight para o Jornalismo nas Américas mostra que, somente entre 2012 e 2013, o país registrou 25 casos em que os tribunais foram utilizados como instrumentos de censura.
 
Trata-se, como temos insistido por aqui, de um cerceamento a um direito constitucional do cidadão, qual seja, o de receber informações livres, sem censura. Assim sendo, a questão transcende às 10 matérias que o blog foi obrigado a suspender por decisões do 8º e do 12º Juizados Especial de Curitiba, a pedido dos delegados federais da Lava Jato Erika Mialik Marena e Maurício Moscardi Grillo.  A censura via judiciário, tem se tornado prática e, por isso, merece ser combatida por todos. Abaixo a reportagem do site mantido pelo Centro Knight para o Jornalismo nas Américas da Universidade do Texas em Austin (EUA).
 
(Ao abordar a censura a este blog, o site mantido pelo Centro Knight para o Jornalismo nas Américas da Universidade do Texas em Austinalerta para outros veículos ou instituições que também foram alvo de proibições judiciais. O seja, a censura é recorrente.)
 
Blog JORNALISMO NAS AMÉRICAS
Jornalista brasileiro luta contra censura judicial imposta durante Operação Lava Jato
 
Por Heloisa Aruth Sturm
 
O jornalista carioca Marcelo Auler está lutando na Justiça contra uma medida autoritária imposta pelos próprios tribunais: a censura prévia. Ele está impedido de publicar críticas à atuação da Polícia Federal, além de informações sobre supostas irregularidades ocorridas durante as investigações policiais relacionadas à operação Lava Jato. As decisões judiciais foram proferidas em caráter liminar, sem que tenha sido concedido direito de defesa ao jornalista.
 
Para Marcelo Auler, trata-se de uma ameaça não só ao seu trabalho jornalístico, mas à imprensa brasileira como um todo.
 
“É o jornalismo que está em jogo. As pessoas têm todo o direito de entrar na justiça e reclamar do que eu escrevi, e eu tenho a obrigação de provar que o que eu escrevi é verdade. Isso eu faço, isso eu não me incomodo de fazer. Eu tenho provas de tudo o que escrevi. Pode até se discutir se tem questão de interpretação ou não, o que não pode é censurar.”
 
Por determinação de dois Juizados Especiais de Curitiba, dez reportagens tiveram que ser retiradas de seu blog e futuras publicações sofrem censura prévia.  A primeira decisão, proferida em 30 de março pelo juiz Nei Roberto de Barros Guimarães, atendeu ao pedido da delegada federal Erika Mialik Marena e determinou a suspensão de duas matérias publicadas em março deste ano, na qual Auler menciona o envolvimento da delegada no vazamento de informações sobre a Operação Lava Jato.
 
A segunda decisão, proferida pela juíza Vanessa Bassani, determina a retirada do ar de oito matérias publicadas entre novembro de 2015 e abril deste ano, que mencionam a atuação do delegado Maurício Moscardi Grillo  (Trecho que o blog está impedido de transcrever).
 
A decisão judicial ainda proíbe a publicação de futuras reportagens, determinando que o jornalista “se abstenha de divulgar novas matérias em seu blog com conteúdo capaz de ser interpretado como ofensivo ao reclamante” (neste caso, o delegado Moscardi).
 
Marcelo Auler afirma que está recorrendo das decisões, e que o próximo passo será ingressar com uma reclamação junto ao Supremo Tribunal Federal, já que as decisões judiciais colidem com posicionamento anteriormente emitido pelo STF.
 
De acordo com o ministro aposentado do STF, Carlos Velloso, a decisão da juíza Bassani é uma violação ao que está previsto na Constituição. “A censura prévia deixou de ter vigência no país e passou a ser inadmitida constitucionalmente com a Constituição Federal de 1988, porque antes havia brechas legais que a autorizavam. Portanto, faz quase 28 anos que a prática é vedada no Brasil”, afirmou Velloso ao site Consultor Jurídico (leia aqui e aqui)
 
A advogada Márcia Mialik Marena, representante dos delegados federais, não atendeu aos contatos feitos por este blog. Em nota enviada ao jornal Folha de S. Paulo, ela afirmou que os delegados respeitam o jornalismo investigativo, independentemente se positivos ou negativos em relação à Operação Lava Jato.
 
Ela afirmou ainda que Auler, “mais do que criticar, passou a, reiteradamente, acusá-los de crimes, sem que tenham, em momento algum de sua trajetória profissional, respondido procedimento disciplinar ou criminal.”
 
Entidades jornalísticas emitiram notas de repúdio às decisões judiciais. A Associação Brasileira de Jornalismo Investigativo afirmou que a proibição de publicar futuras reportagens é uma medida grave, “que configura censura prévia – medida inconstitucional e incompatível com uma democracia plena”.
 
Segundo a Associação Brasileira de Imprensa, as medidas judiciais representam um “perigoso precedente”, já que recorrem a mecanismos de controle da expressão do pensamento característicos da ditadura militar. “Na visão da ABI, as autoridades que se sentiram ofendidas pelo blog dispõem de outros instrumentos legais para se socorrerem das acusações a elas endereçadas, sem a necessidade de vivificar procedimentos de caráter autoritário que se acreditavam sepultados para sempre com o fim do regime de 1964”, diz o comunicado da entidade
 
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6 Comentários

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  1. O judiciário….

    Não nos esqueçamos que a mídia age também como ferramenta de censura. A quase totalidade da mídia nacional sempre foi contrária ao pensamento da direita. E sempre fez o possível para não discutí-lo., nem dar liberdade para expô-lo. Na nossa ditadura do politicamente correto nunca houve opoirtunidade para o debate. Até hoje, o debate nacional é pautado por nós estamos certos, então tudo que é contrário, só pode estar errado.  O Judiciário revelando esta face da consciência nacional, mostra como não temos ainda a dimensão do que seja democracia.

    1. A quase totalidade da mídia

      A quase totalidade da mídia nacional sempre apoiou o coronelismo colonialista. Que, pela sua truculência e desejo de concentração dos poderes político e econômico, estão bem mais próximos da “direita” do que da “esquerda”, mais próximos do autoritarismo do que da democracia. Não chega a ser capitalistas mas está, a tal mídia, a anos-luz de distância de algo parecido com “esquerda” e socialismo.

  2. É lamentável saber que o lado…

    “…que se acreditavam sepultados para sempre com o fim do regime de 1964”,

    1964 não está supultado, o que ele estava era em hibernação e, agora, foi trazido ao cenário por químicos do mal que se assenhoraram dele como Temer, Serra & demais súcias.

    Sabemos que a luta é titânica para o bem e o direito se recomporem com o fim de restabelecer a liberdade para todos, principalmente a de poder dizer e saber a verdade, em lugar de só a voz de lá que denigre quem quiser sem nenhum impedimento.

  3. Censura prévia PODE?
    As denúncias de Marcelo Auler são muito específicas: mostrar um investimento numa “churrasqueira gourmet” ao mesmo tempo em que a PF reclamava falta de recursos, grampo sem autorização judicial e por aí afora. Em vez de responder às denúncias os policiais solicitaram e obtiveram (?!?!?!) censura às matérias. Como pode isso? Que país é esse??

  4. O ‘CALA-BOCA’ VAI BEM, OBRIGADO, por Elio Gaspari

    (do Globo, de hoje)

     

    “O litígio que envolve a delegada federal Erika Marena e seu colega Maurício Moscardi contra o blogueiro Marcelo Auler pôs na vitrine a jurisprudência caótica em que está a liberdade de expressão no país.

    Eles pediram, e obtiveram, sentenças dos juízes Nei Roberto Guimarães e Vanessa Bassani mandando que Auler tirasse de seu blog oito reportagens sobre a ação da Polícia Federal na Lava-Jato.

    A coisa fica feia quando se lê que a doutora Bassani determinou que o jornalista se abstivesse de publicar textos “com conteúdo capaz de ser considerado ofensivo ao delegado”. Como um pobre cristão pode descobrir o que se pode considerar ofensivo ao doutor Moscardi, ela não explicou.

    Dias depois a juíza procurou esclarecer. Auler deveria se “abster de divulgar novas matérias (…) com a capacidade de caluniar ou difamar a pessoa do reclamante e que digam respeito aos mesmos fatos tidos como inverídicos”. Fica faltando polir o significado de “capacidade de caluniar”, bem como o de “fatos tidos como inverídicos”. Há a calúnia e a mentira, fora daí, tudo é poesia.

    Durante a ditadura, as ordens da censura eram claras. Tipo assim: “nenhuma referência, contra ou a favor, de Dom Helder Câmara”.

    A ministra Cármen Lúcia enganou-se quando disse que “cala-boca já morreu”.”

     

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