O perfume da discórdia, por Luciano Martins Costa

Patricia Faermann
Jornalista, pós-graduada em Estudos Internacionais pela Universidade do Chile, repórter de Política, Justiça e América Latina do GGN há 10 anos.
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Por Luciano Martins Costa

Do Observatório da Imprensa

Uma campanha publicitária da rede de lojas O Boticário para o Dia dos Namorados causa enorme repercussão nas redes sociais há dez dias e ganha espaço nos principais jornais do país na quarta-feira (3/6). O filme “Casais” já teve mais de 1,15 milhão de visualizações no canal Youtube e gerou mais de 40 mil citações espontâneas no Twitter, o que significa que a mensagem ganhou vida própria e passou a transcender o conteúdo publicitário original.

É bastante possível que a propaganda venha a impulsionar as vendas de cosméticos e perfumes da maior empresa varejista do setor, mas o mais interessante aqui é analisar as causas e efeitos da grande polêmica que tem produzido.

Uma das primeiras reações registradas nas redes sociais foi a tentativa de boicote de representantes de igrejas denominadas neopentecostais, mas uma onda de defensores do anúncio praticamente abafou a reação dos conservadores. A peça de propaganda, exibida em larga escala, inclusive nos horários de maior audiência da televisão, mostra casais heterossexuais e supostamente homossexuais se presenteando com produtos de O Boticário e se abraçando carinhosamente.

Segundo os jornais, os dirigentes da empresa estavam conscientes de que a iniciativa poderia provocar reações contrárias, levando-se em conta a onda de conservadorismo que tem caracterizado recentemente as relações sociais no Brasil.

Desde a campanha eleitoral de 2010, quando a mídia deu grande destaque a manifestações de líderes de seitas religiosas discutindo propostas como a da descriminalização do aborto e a oficialização do casamento entre pessoas do mesmo sexo, a onda conservadora tem sido amplificada e manipulada por órgãos da imprensa. Essas escolhas da mídia são utilizadas como instrumento político de pressão contra o governo federal, bem como contra personalidades e intelectuais que defendem publicamente certas bandeiras progressistas.

Inserida nesse contexto como uma cunha, a campanha de O Boticário obriga milhões de pessoas a tomarem uma posição pública e clara sobre a questão da diversidade sexual e mostra que o perfil médio do brasileiro é de mais tolerância do que se imagina quando se observa o barulho de pastores, padres e outros agentes do obscurantismo.

Arriscando o futuro

A progressão das manifestações nas redes digitais revela que os indivíduos cuja visão de mundo impele a uma condenação liminar da homossexualidade se expressam mais rapidamente: até o começo da noite de terça-feira (2/6), os que condenavam a mensagem publicitária eram a maioria nas redes digitais.

Natural: a palavra irrefletida sai mais facilmente da boca.

Mas no último registro dos jornais, feito pela Folha de S. Paulo no fechamento da edição de quarta-feira (3), os números de “curtir” e “descurtir” no Youtube mostravam uma virada no jogo, com uma maioria de 211,4 mil clicadas a favor do anúncio contra 155,7 mil, contra.

Observe-se que a iniciativa de condenar a peça publicitária foi estimulada por alguns movimentos organizados por lideranças religiosas, que vinham convocando seus seguidores a assistir ao vídeo e clicar na opção negativa. Aos poucos, porém, a própria divulgação impulsionada pelos que condenam a mensagem provocou o engajamento espontâneo da parte do público que considera legítimo o relacionamento amoroso entre pessoas do mesmo sexo.

O movimento levou a empresa anunciante a mensurar o efeito da campanha, com uma pesquisa sobre as reações dos consumidores, mas o resultado só deverá ser conhecido após o balanço das vendas do Dia dos Namorados.

O episódio traz importantes lições para observadores da cena social e, ainda mais valiosas, para os analistas dos campos comunicacional e político. A primeira delas é a constatação de que a fração conservadora da sociedade brasileira tornou-se mais ativa e barulhenta, mas não representa necessariamente a maioria. A segunda é que, embora demore mais para se manifestar, a parcela mais progressista acaba dando a última palavra.

A campanha de O Boticário levanta uma outra vertente, esta de interesse especial para as empresas de comunicação: o risco de se aliar a grupos de opinião extremamente conservadores.

Engajada numa longa cruzada contra todas as políticas progressistas, desde a inauguração dos primeiros programas sociais, a mídia tradicional vem dando espaço e holofotes para o que existe de mais retrógrado no espectro ideológico, ajudando a tirar do anonimato figuras virulentas que radicalizam o embate político.

Num primeiro momento, como se vê, tais forças reacionárias fazem muito barulho, mas no longo prazo predomina a reflexão mais ponderada.

Cada vez mais identificada com o obscurantismo, a imprensa está comprometendo seu próprio futuro.

Patricia Faermann

Jornalista, pós-graduada em Estudos Internacionais pela Universidade do Chile, repórter de Política, Justiça e América Latina do GGN há 10 anos.

18 Comentários

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  1. *

    Se vai boicotar O Boticário, deixe de lado também Facebook e Apple

    Gil Alessi, El País

    http://brasil.elpais.com/brasil/2015/06/02/politica/1433264063_080082.html

    O primeiro passo é sair do Facebook. Sim, se você quer boicotar empresas que defendem direitos dos homossexuais vai ter que deixar a rede social de lado. Ela é uma das 379 empresas que assinaram um documento entregue à Suprema Corte dos Estados Unidos em março pedindo o fim da proibição do casamento gay. Não procure a lista das signatárias no Google: o buscador mais popular da Internet também está entre elas. Deixar de usar produtos da O Boticário, que lançou na semana passada uma campanha do Dia dos Namorados com casais homossexuais trocando presentes, parece fácil comparado a abandonar a sua timeline e ficar sem os likes.

    O vídeo da marca de cosméticos, com pouco mais de 30 segundos, foi ao ar na TV aberta e no canal da empresa no YouTube. Alguns internautas criticaram as cenas de afeto – um abraço – entre casais gays, e pediram um boicote à marca. O Boticário reagiu divulgando uma nota onde afirma que a campanha busca “abordar com respeito e sensibilidade a ressonância atual sobre as mais diferentes formas de amor. Independente de idade, raça, gênero ou orientação sexual”.

    Então se você optou por boicotar o Facebook, ainda pode contar com Twitter certo? Errado. O microblog também assinou o documento entregue à Suprema Corte. Bom, que tal deixar as redes sociais de lado um pouco e descontrair jogando videogames? Se você quer boicotar as companhias pró-LGBTs, fique longe da franquia Fifa e da série The Sims, já que a Eletronic Arts, responsável pelos produtos, é a favor do casamento igualitário. Mas quem precisa de videogames na era dos smartphones? A não ser que você tenha um iPhone ou um celular com sistema operacional Android ou um Windows Phone. Neste caso, se livre dos aparelhos: Apple (o presidente da empresa, Tim Cook, é gay assumido) e Microsoft também assinaram a carta, e o Android é da Google.

    Para o boicotador de verdade, calças Levis e produtos da Nike também estão vetados. Inclusive aquela camisa da seleção brasileira que vez ou outra sai do armário para ir a manifestações contra a corrupção e contra o Governo. Acostume-se também ao sabor dos refrigerantes Dolly: tanto a Coca-Cola quanto a Pepsico, fabricante da Pepsi, assinaram a lista. O café no Starbucks e o sorvete da Ben & Jerrys também terão que ser deixados de lado. E nem pense em pagar nada disso com seu cartão de crédito Visa ou do Citibank.

    Viajar para a Disneylândia também não pode: a empresa responsável por Mickey & companhia é signatária do documento. Mesmo se não fosse, o boicotador sério jamais poderia ir para o mundo da fantasia a bordo de um avião da United Airlines, Delta ou American Airlines: todas apoiam o casamento gay. E nunca a passagem de avião pode ser adquirida com desconto no site de compras coletivas Groupon. Se deixar de consumir todas estas marcas parecer triste e der vontade de chorar, não seque as lágrimas com lenços de papel Kleenex: a fabricante deles, Kimberly-Clarck, também é a favor do casamento gay.

  2. Então, senhora …

    que medo é esse?

    Tem alguém ameaçando a senhora aí? O apelo à igualdade ameaça a senhora ?

    Sinta-se então ameaçada. Porque não tem volta.

    A vida não se passa dentro de nossas casas apenas.

    Ela é o MUNDO, somos o que somos.

    Deixe quieto, vai ver a senhora e seus filhos nem se sentiram tão ameaçados assim !

    A senhora é homossexual, bissexual ou tem outras orientações sexuais na família que não essa a que a senhora chama de tradicional. Não. Então, pronto, senhora. Deixe disso.

    Respeito a senhora e peço que respeite os outros com suas orientações de gênero, identificações de gênero etc.

    Suave, senhora, suave !

     

  3.  Acho lamentável  esse tipo

     Acho lamentável  esse tipo de gente usar o rótulo cristã como escudo ou justificativa para a sua intolerância.

    O cristo continua sendo cricificado diariamente por alguns que se dizem cristãos.

  4. Sugiro a quem discorda do

    Sugiro a quem discorda do conteúdo do comercial do Boticário que construa um abrigo, do tipo antinuclear, e se enfurne por lá, com seus filhos e demais parentes, para o resto da vida, sem televisão, internet, rádio ou qualquer outro meio de comunicação e mídia. Não esqueçam de levar o Malafaia e outros do gênero menos votados….

    O mundo mudou para o bem maior da humanidade.

    Os direitos de todos os seres humanos são iguais perante as leis de Deus e dos homens.

    A diversidade de gêneros e a liberdade de opção sexual são reconhecidas e apoiadas pela maioria dos habitantes do mundo.

    Parabéns a empresa  Boticário pela coragem e ousadia de fazer esse comercial, que aliás é muito bonito e bem feito.

     

     

  5. Bipolar…

    (Atenção: a frase contem alguns parêntesis jornalísticos 🙂 )

    Acho gozado como alguns movimentos levam um tempão reclamando da (suposta) falta de visibilidade para logo a seguir, quando esta lhe é dada, passarem a reclamar da (suposta) superexposição.

    Vai entender…

  6. Sabe o que ameaça a família?

    Sabe o que é imoral e ameaça a família, minha senhora?

    Os dignos pais de família cristãos que frequentam prostíbulos onde se prostituem garotas menores de idade.

    As pias senhoras cristãs que pulam a cerca quando acham que não tem ninguém vendo (nem a Duquesa da Cornualha escapou dessa: http://bit.ly/1Q76TvV).

    É esse povo, podre de iniquidade por dentro, e que por fora bota crucifixo no cordão e vai pra Igreja rezar, comer hóstia e beijar o anel do padre. Ou então vai dar dinheiro pro pastor pagar o aluguel do canal de TV onde ele prega morte aos gays.

    Esse povo que se acha dono da verdade é que ameaça a família – inclusive a minha, que não vê o menor problema na propaganda do Boticário.

    Se não gostam não comprem. Podem andar fedidos à vontade. O mau-cheiro vai combinar com o que vai pelas mentes e almas de vocês!

  7. E o medo de se descobrir homo ou bi?

    Fui ver o comercial e nada de mais. Céus, as pessoas ainda hoje se preocupam com a vida sexual dos outros! Lembrei agora de Mulholland Drive e do filme Frida Kahlo, nos dois as mulheres se envolvem sensualmente e sexualmente. Filmes intensos, lindos e que nos incomodam (a mim não pelo envolvimento das mulheres). Essas pessoas precisam sair da frente das novelas e programas policiais e viver! 

    E no fim das contas, não fosse a fôrma, poderiamos todos amar os dois sexos!

  8. Roberto Carlos será ouvido em

    Roberto Carlos será ouvido em audiência pública do STF sobre a proibição ou não de biografias não autorizadas. Por isto, resolvi sacanear ele (censor de biografias) e o Malafaia (censor de perfumes) numa série de mensagens pelo Twitter. 

     

     O quer ser dono de sua história. O crê ser dono de Jesus. Ambos fazem rir sem ser comediantes.

    O não te dará o céu meu bem… se você comprar “O Boticário” também.

    te dará o céu meu bem… . Mas não te dará o direito de escrever ou ler biografias.

    Quando o usar “O Boticário” vestindo um o liberará as biografias?

    Vai ser uma quando o usar um perfume gay e o permitir biografias dele.

    Se cantasse como o teria mais fiéis. Por ser censor como o pastor, o rei perdeu admiradores.

    O proibiu “O Boticário”. O quer proibir biografias. Não respeito ambos

    Em 100 anos ninguém lembrará das músicas de . Muitos lembrarão, contudo, que ele censurou seus biógrafos.

    Em visita ao o rei cantará contra a liberdade dos escritores: “Eu sou terrível, vou lhe dizer…”

    O tremendão, amigo de fé irmão camarada , ficaria com tremedeira caso alguém fizesse uma biografia dele?

    Dizem que o quer escrever sua biografia. Ele já é um grande censor. Não sei se ele será um grande escritor.

    Durante a jovem guarda era maneiro. O calhambeque dele enguiçou e enferrujou quando ele proibiu uma biografia.

    Depois que proibiu uma biografia dele o morreu de fato e de direito. Ele perdeu mais de 1 milhão de amigos.

     

  9. E os “jênios” vão reclamar no


    E os “jênios” vão reclamar no “Reclame Aqui” ….

    Deixa essa gente expor seus preconceitos e suas ignorãncvias. Isso é ótimo. O sol é o melhor desinfetante.

    O efeito que provocam é exatamente o contrário.

    Só dá Boticário agora…

    Parabéns´a agência de publicidfade.

    Perceberam o momento que atravessamos e foram precisos no recado.

  10. Ponto para O Boticário

    Conseguiu. Eu não tenho certeza, mas a dois anos na mesma época, não foi um comercial onde o “filho” compartilhado por casal “separado” tenta uní-los novamente com produtos dessa marca? Ainda não vi o atual, mas esse “mais antigo” era muito bem feito e de grande qualidade. A técnica, tática e método ao que tudo indica vêm funcionando pois otários manipuláveis encontra-se em todo lugar.

  11. O anúncio é tao “inocente”… Essa gente tem m* na cabeça mesmo!

    Ocorre apenas uma troca de presentes e um beijo, haja moralismo hipócrita para ver uma ameaça nisso.

  12. Eu vi a propaganda e achei

    Eu vi a propaganda e achei muito bonita.

    Não tenho namorado nem namorada, mas fiquei com vontade de comprar um perfume .

    Ô atraso !!!

  13. Trocando em miúdos ahahahhah

    Trocando em miúdos ahahahhah Natura é  a empresa que queria ser O Boticário. De uma “briga interna” saiu uma sócia e fundou Natura. Aí TERMINAM as semelhanças.

    BOTICÁRIO tem um público mais exigente, e produtos de melhor qualidade.

    NATURA prefere o nincho POPULAR, inclusive em política: Malafaia/Marina/Natura TUDO A VER! Acho que Malafaia está ganhando alguma coisa para tentar desviar clientes de uma empresa, para outra. ahahahahah Mas o tiro está saindo pela culatra.

    Vou renovar o meu estoque de creme hidratante da Boticário. 😛

  14. Cinismo é alguém boicotar o

    Cinismo é alguém boicotar o Boticário, por uma campanha linda e delicada. Mas não pedir BOICOTE PARA A CAMPANHA “VAI VERÃO (mostrando a b* de uma mulher em “close”) VEM VERÃO (mostrando os seios, também em close) onde a maioria da população é de mulheres. ESSA AUTO-REGULAÇÃO É UMA PIADA MESMO.  

  15. Boicota essas tambem

    Se vai boicotar o Boticário pela propaganda que apóia gays, vai ter que boicotar muitas outras empresas também. 

    Google, Apple, Microsoft, Motorola,  Intel,  lenovo, dell  – que computador ou celular ela vai usar?

     

    Vejam o site que fizeram no Tumblr

     

    http://aproveitaeboicota.tumblr.com

  16. Alias….

    Essa daí  não deveria usar nenhum tipo de computador ou celular ou outro dispositivo com processador eletrônico 

    Esses aparelhos não existiriam sem o trabalho do matematico Alan Turing

     

    Que era um ATEU HOMOSSEXUAL.

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