“Passamos do oligopólio à desintermidiação”, diz diretor do El País

Por wilson yoshio.b…

Da Época

Gumersindo Lafuente: “A internet colocou o jornalismo e os jornalistas em um novo lugar”

O diretor do El País afirma a ÉPOCA que os profissionais da comunicação estão hoje em um ambiente “mais expostos, mais complicado e mais comprometido”

LUCAS HACKRADT

El País é um dos principais jornais da Espanha, um dos maiores da Europa e faz parte de um grupo de cinco veículos de comunicação europeus e dos Estados Unidos que têm investido pesado na internet nos últimos anos. Em 2010, Gumersindo Lafuente (@sindolafuente) assumiu a direção do jornal. Entusiasta da web, Lafuente optou por realizar diversos investimentos na versão online do diário, priorizando-a e mostrando que, mesmo com tantos anos de tradição impressa, o El País está pronto para a era digital.

O diretor enxerga muitas oportunidades nesta nova era da comunicação, mas mais obrigações para aqueles que trabalham com as notícias. “A internet colocou o jornalismo e os jornalistas em um novo lugar, mais exposto, mais complicado e mais comprometido”, afirmou a ÉPOCA.

Para Lafuente, a revolução na forma de se trabalhar com comunicação na internet se deu a partir do momento em que a rede ofereceu aos usuários as ferramentas para tornarem a navegação mais interativa e participativa. A preocupação com as mídias digitais é tamanha que, no início deste ano, o El País de Lafuente criou um blog do qual podem participar jornalistas de todo o mundo, de diferentes realidades, para analisar os rumos que a comunicação social está tomando. O El País também tem sua própria rede social: Eskup.

 Divulgação)

O diretor do jornal espanhol El País, Gumersindo Lafuente. “Passamos do oligopólio à desintermidiação quase total, e hoje somos imprescindíveis nas relações entre os poderes e temos aí os cidadãos reivindicando nosso papel.” (Foto: Divulgação)

ÉPOCA – Poderia falar um pouco sobre o blog Periodismo con Futuro?

Gumersindo Lafuente – É um blog de reflexões sobre o presente e o futuro do jornalismo. Nós o abrimos para a participação de profissionais de todo o mundo, pois queremos saber o que está acontecendo em outros lugares – e preferimos que isso seja contado pelos próprios protagonistas das mudanças.

ÉPOCA – E o que se descobriu até agora? O que mudou no jornalismo?

Lafuente – A internet colocou o jornalismo e os jornalistas em um novo lugar, mais exposto, mais complicado e mais comprometido. Esse lugar está cheio de oportunidades, mas também tem nova obrigações. Passamos do oligopólio à desintermidiação quase total, e hoje somos imprescindíveis nas relações entre os poderes e temos aí os cidadãos reivindicando nosso papel minuto a minuto. Esse novo cenário para o qual nos empurrou a tecnologia também está debilitando as fontes tradicionais de financiamento dos meios. Estamos, portanto, em um momento paradóxico. Temos em nossas mãos as ferramentas de comunicação mais poderosas da história, mas somos obrigados a não nos esquecer das essências de nosso trabalho ao mesmo tempo em que temos que reinventá-lo tanto nos aspectos práticos como quando se trata do negócio jornalístico.

ÉPOCA – E como o El País tem se posicionado nesse novo cenário?

Lafuente – Estamos fazendo uma aposta muito forte para mudar as maneiras de se trabalhar na redação, de forma a conseguirmos nos adaptar aos novos ritmos que são impostos pelo mundo digital, mas sem, porém, perder o rigor e a credibilidade conquistados ao longo dos 35 anos de história do jornal. O mais importante para nós é fazer um bom jornalismo, independente do canal que utilizemos para chegar a nossos leitores.

ÉPOCA – Quando o jornalismo online deu sua volta por cima?

Lafuente – Creio que a verdadeira revolução do jornalismo começou quando os usuários ganharam ferramentas de publicação igualmente poderosas e tão importantes quanto as dos próprios veículos de comunicação. Basicamente, quando criaram-se os blogs e as redes sociais. Elas são fundamentais. A relevância e a influência que se conseguem hoje nas redes sociais são rapidamente propagadas pelo resto da cadeia informativa. As redes sociais ampliam as mensagens de tal maneira que elas acabam por intervir cada vez mais na agenda informativa de todos os grandes veículos. Por isso, as redações estão hoje obrigadas a trabalhar pensando nas redes sociais, e os jornalistas devem ter uma posição influente nelas.

ÉPOCA – Como isso tudo afeta o trabalho de informar a sociedade?

Lafuente – De várias formas. Isso tudo afeta na hora de construir as histórias, porque a web nos facilita muito o acesso à informação. Também afeta no desenvolvimento da informação, porque os leitores podem completá-la com seus comentários ou trazendo novos dados. E influencia também os modelos de negócio e a rentabilidade das grandes empresas de comunicação, o que supõe, ao final, a possbilidade de se continuar ou não fazendo jornalismo de qualidade. Não estamos mais diante de um avanço, já estamos submersos em uma revolução, e dentro de poucos anos nada será igual, nem no trabalho diário do comunicador e nem na indústria da comunicação.

Supõe-se, hoje, que os jornalistas, os bons comunicadores, deveriam ter duas qualidade básicas: critério e talento para informar. De posse dessas duas virtudes, o que lhes resta é explorá-las de maneira intensa e exaustiva na rede.

ÉPOCA – O 11 de setembro foi provavelmente a primeira grande cobertura online feita. Como o episódio afetou o jornalismo?

Lafuente – Tudo mudou. Os leitores, hoje, estão massiçamente na internet. A tecnologia é muito mais avançada, e, acima de tudo, os veículos finalmente colocaram seus melhores profissionais para trabalhar com o online. Mas também houve as coberturas da Guerra do Iraque, com a queda de Saddam Hussein, da Guerra do Afeganistão, os atentados de 11 de março de 2004 em Madrid e os atentados de Londres, Jogos Olímpicos, a campanha e a eleição de Obama, a cobertura da crise econômica mundial e o vazamento de documentos patrocinado pelo Wikileaks… Tudo contribuiu para mudar o jornalismo.

ÉPOCA – E hoje há também a questão da mobilidade. Como os veículos de comunicação devem se preparar e como deverão lidar com isso?

Lafuente – A mobilidade é um fenômeno muito importante. Devemos entender que a nossa obrigação enquanto comunicadores é fazer produtos jornalísticos que se adaptem aos diferentes tipos de consumo que cada dispositivo oferece. Temos que contar com a utilização intensa da tecnologia. Os jornalistas hoje estão obrigados a entender todas as possibilidades que lhes são oferecidas. Se não o fizerem, acabarão perdendo sua conexão com seus leitores.

Luis Nassif

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