Boulos e o MTST pensam numa nova esquerda, por Antonio Martins e Inês Castilho

Cintia Alves
Cintia Alves é graduada em jornalismo (2012) e pós-graduada em Gestão de Mídias Digitais (2018). Certificada em treinamento executivo para jornalistas (2023) pela Craig Newmark Graduate School of Journalism, da CUNY (The City University of New York). É editora e atua no Jornal GGN desde 2014.
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Jornal GGN – Guilherme Boulos acredita que a esquerda brasileira precisa encerrar o ciclo encabeçado pelo PT e projetar um novo tempo, com novas estruturas e novas pautas. Ele diz que o espanhol Podemos é uma referência, mas não há como copiar a iniciativa dando apenas um contorno mais tupiniquim porque não vai funcionar. Isso porque o Podemos ganhou uma base sólida após o movimento dos “indignados”. Aqui no Brasil, o golpe no governo Dilma Rousseff foi dado, mas as reações ainda são “tímidas”. Embora exista uma turbulência provocada por secundaristas, alguns movimentos sociais nas ruas, feministas com novas bandeiras, enfim, vários grupos com suas demandas em ebulição, nada disso é suficiente para dar fôlego a uma nova esquerda. É preciso aguardar o tempo histórico, diz. 

Por Antonio Martins e Inês Castilho

Em Outras Palavras

Boulos e o MTST pensam numa nova esquerda

Cada um vê os outros a partir de sua própria métrica. Os jornais, acostumados à velha política, especulam que Guilherme Boulos não sai dos gabinetes. Articularia uma aliança entre dissidentes do PT e uma ala do PSOL, disse uma nota. Seria candidato à Presidência, garantiu outra. Principal referência do MTST – um movimento social que avança tanto pela rara capacidade de mobilização dos excluídos quanto pela busca ativa de alternativas à crise do país – caberia a Boulos, segundo esta lógica, ocupar o espaço que lhe cabe no mercado das opções eleitorais.

O Guilherme Boulos da vida real é um sujeito mais complexo. Em meados de novembro, ele visitou a redação de Outras Palavras para uma nova entrevista – a segunda, em doze meses. Do diálogo, que encerra nossa produção editorial em 2016, emergem algumas conclusões centrais.

1. O coordenador do MTST está convencido de que um ciclo na história da esquerda brasileira precisa ser fechado. Ele estendeu-se por quatro décadas e teve como guarda-chuvas o PT. Atravessou fases heroicas – por exemplo, as lutas operárias que desafiaram a ditadura, a partir do final dos anos 1970. Seus feitos no governo não são desprezíveis: a presença inédita de um número relevante de negros e pobres nas universidades é um deles. Mas o ciclo foi marcado pela crença de que avanços sociais duradouros poderiam ser alcançados sem a rua e sem conflito – por progressivo convencimento do Parlamento, da casta política, dos empresários. O golpe de 2016 e a brutalidade do governo Temer acabaram com a ilusão.

2. A retomada implicará invenção política. Nada ocupa nem pode ocupar, ainda, o papel que o PT desempenhou no ciclo que se fecha. Guilherme admira, por exemplo, a bravura de muitos parlamentares do PSOL; a desobediência transformadora dos secundaristas; o ressurgimento do feminismo; a radicalidade das ocupações de terra urbana promovidas pelo próprio MTST. Mas ele reconhece também que estes movimentos e organizações são incapazes de impulsionar um novo projeto de país, um novo período de enfrentamentos contra o poder conservador ou uma nova cultura política.

3. Quais as pistas? Boulos acompanha atentamente o Podemos espanhol. Sua experiência, avalia, é sinal de que há uma saída pela esquerda para o desencanto com a política, que se propaga por todo o mundo. Isso porque, segundo o coordenador do MTST, o Podemos articula o que podem ser duas vertentes para uma futura esquerda. Abre-se às novas práticas; aos que, para agir politicamente, dispensam comandos e diretivas. Mas sabe fazê-lo sem abrir mão de um projeto e estratégia política.

4. Teria chegado, então, a hora de um Podemos brasileiro? Ainda não, responde Boulos. Repetir a experiência espanhola a frio, por voluntarismo de um conjunto de ativistas e intelectuais, seria uma precipitação, talvez uma transposição mecânica. “É preciso ter paciência histórica” e o passo necessário agora é estimular a mobilização social. “Antes do Podemos, houve o grande movimento dos Indignados”, diz Boulos. Por esta etapa – frisa ele – o Brasil não passou. As maiorias assistiram como espectadoras ao golpe de Estado que reinstalou no poder o setor mais retrógrado das elites. Diante do ataque selvagem aos direitos sociais desencadeado em seguida, a resistência ainda é tímida.

5. Estimulá-la é o mais importante, no momento. Requer enfrentar a institucionalização generalizada, a captura dos militantes pelo Estado que marcou o final do período anterior. Implica retomar o “trabalho de base” – visto por Boulos como um “estar junto” da população, um “construir coletivamente” e não ato unilateral de convencer e “levar a verdade”.

6. Significa, então, que será preciso esperar anos? Não, pensa Boulos – especialmente porque vivemos num cenário muito instável, em que são frágeis as próprias bases da restauração conservadora. “O governo está espalhando barris de pólvora”, ao atacar frontalmente os direitos sociais ao mesmo tempo em que os serviços públicos estão entrando em colapso e a política econômica espalha desemprego e miséria, para benefício apenas da aristocracia financeira.

7. “2017 bem pode marcar uma retomada”, especula Boulos, com uma pitada de otimismo gramsciano. Ele conclui: “Precisamos estar bem atentos para que não seja apenas resistência. O segundo desafio é pensar a recomposição da esquerda brasileira; é, pensar um novo campo, uma nova referência de do ponto de vista político-estratégico. Nós do MST estamos empenhados nesta perspectiva”.

Fique com Boulos. Outras Palavras entra em recesso a partir deste 24/12. A partir do dia 27, acompanhe, no Facebook, nossa retrospectiva do ano. Voltamos em 9/1, esperando construir e narrar um ano melhor. Até lá, que venha o desfrute das festas. Tin-tim! (A.M.)

https://www.youtube.com/watch?v=Dgl3Z_lXR2k&feature=youtu.be width:700 height:394

Cintia Alves

Cintia Alves é graduada em jornalismo (2012) e pós-graduada em Gestão de Mídias Digitais (2018). Certificada em treinamento executivo para jornalistas (2023) pela Craig Newmark Graduate School of Journalism, da CUNY (The City University of New York). É editora e atua no Jornal GGN desde 2014.

19 Comentários

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  1. Não sei não. O Boulos caiu

    Não sei não. O Boulos caiu feito um patinho naquelas manifestações de junho 2013. Total falta de consciência do que aquilo representava.

  2. Ou seja, a esquerda

    Ou seja, a esquerda brasileira não tem condições nenhuma de lutar contra o golpe. Capitulou. O futuro é um grande PSOL, um partido bom de discursos mas que, se chegar ao governo (o que é por si só já bastante improvável), governará mais ainda à direita do que o próprio PT. Se essa esquerda tivesse um mínimo de consciência e compromisso com as classes desfavorecidas, estava lutando contra os ataques ao PT e em defesa do Lula, com todas as suas forças.

    Preferem, no entanto, tirar uma casquinha do golpe, aderindo ao seu discurso e à sua tese. Todos que tentarem se aproveitar do golpe vão se queimar. Os próprios golpistas já estão se queimando (vide PMDB do Rio de Janeiro, o próprio Temer que vai cair, etc), que dirá a esquerda que quiser se aproveitar. Ou se luta contra o golpe ou se luta contra o golpe; e faz parte do golpe a destruição do PT. Fazer coro aos golpistas e decretar, junto com a direita, o “fim de um ciclo”, é historicamente colaborar com o golpe. Quem quer realmente lutar contra o golpe precisa ter consciência disso e cair fora disso o mais rápido possível.

  3. Não perco mais meu tempo com

    Não perco mais meu tempo com esse cara e com o Stédile.

    São dois bundões, arregões, frouxos.

    Esses babacas diziam que iam fazer e acontecer, que iriam parar o país, que não ia ter golpe. Iriam bloquear estrada, fazer greve e o cacete.

    Fizeram o que ? Porra nenhuma !

    Botaram o galho dentro para os golpista.

    Falaram fino com Temer e o seu ministro da justiça

    Quando era o PT esse Boulos invadia prédios em SP. Por que não invadem agora ?

    Para mim são dois merdões oportunistas que só  faziam graças quando o PT era governo.

    Parei com esses caras, não quero nem ouvir a voz desses merdas, cagões, medrosos, frouxos.

    Fazer uma nova esquerda é o cacete ! A esquerda é essa mesmo. Tem que botar o povo nas ruas e peitar, golpistas, diretita e coxinha. Tem que passar como um trator por cima desses putos.

    Sai fora zé mané !!

    Esses aí só engana otários com esse papo furado.

    Se cagaram todo de medo dos gospistas.

    Que saldade da esquerda do passado que enfrentava os milicos

    Esses aí são  uns otários de esquerda.

     

    1. Assino em baixo

      O Stédile chegou a declarar que o MST tinha assentamentos as margens de todas as rodovias federais, e que se houvesse golpe pararia o país. Amarelou bonito. Outro que arrotou muita valentia foi o Ciro Gomes, que também fugiu da raia.

      1. Pior somos nós…

        … que também ficamos aqui indignados e não passamos disso.

        Digitamos centenas de milhares de caracteres mas não temos coragem de iniciar uma violenta reação física para fazer o expurgo necessário na sociedade brasileira.

        Enquanto isso, vamos digitando eternamente indignados…

    2. Quer o que? Ataque

      Quer o que? Ataque kamikase.

      Se nem a presidente que era comadante chefe das Forças Armadas, e o seu ministro da justiça nada fizeram, sairam correndo do Planalto. Era só o japonês da Federal bater o pé.

      Se a presidente lutasse por seu mandato, creio eu, teria muito apoio. Nem ela se defendeu.

      Se o Boulos ou qualquer outro tentarem alguma coisa, pega prisão perpetua. É estado de exceção.

  4. Mais um partido de esquerda?

    Numa passagem da entrevista, Boulos diz que não teve tempo de parar para pensar, depois de consumado o golpe.

    É porrada atrás de porrada. PEC 241 que virou 55, reforma da Previdência, da CLT…

    Caramba! Ele não esperava isso? E fala agora em um novo partido de esquerda nos moldes do Podemos?

    Diz que o PT já esgotou seu prazo de validade e ao mesmo tempo defende como plataforma para o novo partido as mesmas bandeiras do PT.

    Não vou aqui esmiuçar as bandeiras, mas todas elas voltadas para os direitos sociais de forma abragente que o PT fez, e por conta disso, está sendo destruído. Só falta o trofeu Lula.

    Historicamente, pergunta que faltou ser feita ao Boulos pelos entrevistadores – por sinal muito fracos : quando no Brasil um movimento de esquerda tomou o poder no ao ponto de virar o jogo? Era Vargas, será?

    Um dos erros do PT, entre outros vários, o partido não se alinhou com nenhuma força política externa para se sustentar no poder.

    Para realizar o que realizou, e isso foi o suficiente para a direita derrubar Dilma, porque a direita sempre esteve com as elites, os grandes empresários, a grande mídia, os banqueiros, as multinacionais estrangeiras e as interferências dos EUA para a manutenção do país em estado de subdesenvolvimento eterno para saquear as nossas riquezas.

    Ah, mas a quem o PT deveria procurar?

    Aos EUA com certeza não, porque esse já era e continua sendo o grande padrinho dos fascistas e entreguistas que vivem aqui.

    Com certeza também não seria ao Podemos da Espanha, que não apita nada na geopolítica mundial.

    Pelo nosso tamanho, pelas nossas riquezas naturais, população, não existe no mundo país que não seja livre e soberano, mas o Brasil é exceção a regra, por incompetência nossa.

    O alinhamente teria que ser automático com a nação Russa.

    Não tem outra solução.

    Curto e grosso.

    Caso contrário vão ficar mais cinquenta anos batendo cabeças.

  5. Não estamos precisando de novas esquerdas, precisamos de uma….

    Não estamos precisando de novas esquerdas, precisamos de uma e somente uma boa esquerda.

    Qual é análise teórica que eles estão fazendo?

    Qual seria a diferença desta “nova esquerda” de uma velha esquerda?

    Vão ir no caminho dos aborrecidinhos dos “indignados” para cinco anos depois fazer o podemos para depois descobrir que não podem nada?

    Fragmentação serve principalmente para massagem de EGOS e para fragmentar a luta contra as oligarquias. Por outro lado juntar o Boulos com o PSOL é uma boa, mais rápido eles se destróem.

  6. Permitam-me concordar: essa é a esquerda que a direita gosta

    Muita teoria, muita vaidade e pouco povo. Com certeza essa nova esquerda será lançada em “encontros empolgantes” como aqueles patéticos do “não vai ter golpe”. Claro que num teatro confortável para, no máximo, dois mil lugares. 

    A diferença entre LULA e esses caras é que o primeiro tem um oceano de amor ao povo e os demais um oceano de vaidade.

    1. Uau. Olha quem fala. Cadê o

      Uau. Olha quem fala. Cadê o povo petista? Por favor, Lula amorteceu qualquer capacidade de reação dos seus partidários e do PT. Em todas as manifestações contra o golpe, pouco se viu dos petistas. O grosso mesmo foi essa turma do MTST e demais movimentos da mesma ordem.

  7. O que falta no Boulos e seu movimento?

    Tudo.

    Olhei e anotei os primeiros momentos da fala do Boulos:

    Primeiro ele compara a luta contra os tratados imperialistas de Livre Comércio com a expulsão dos imigrantes nos USA???? Como que os tratados de Livre Comércio beneficiassem os países do terceiro mundo.

    Segundo ele diz que Trump, Berlusconi e Dória é o mesmo fenômeno???? Esquecendo que Dória é simplesmente um fantasma que foi colocado num partido de direita para fazer o governo ultra-liberal do PSDB

    Terceiro ele fala que Sanders trabalha sobre a mesma lógica de negação da política? Aí está o terceiro e maior absurdo.

    Parei por aí de analisar ponto a ponto, pois era uma besteira após a outra que não tive mais vontade, mas depois quando perguntado a onde vão desaguar as manifestações sem partidos e sem nada que as organize, no lugar de falar algo ele simplesmente fala em mais manifestações.

    Nunca vi alguém mais confuso  ou que quer confundir como o Boulos, depois falam em nova esquerda, prefiro a velha e caquética esquerda.

  8. Verdade seja dita…

    Muitos só eram valentes nos  governos do PT!….

    Nova esquerda?…Que nova esquerda?…Vai estudar Boulos, pra parar de querer reinventar a roda!…

  9. Até vir o tempo histórico, o

    Até vir o tempo histórico, o pré-sal acabou.

    E até parece que essa turmada ciranda vai mover uma palha para recuperá-lo. Vão querer ge rar energia através de turbinas que giram a vapor de cigarro de maconha.

    Precisamos fazer algo agora.

    Se depender desses bostas, os golpistas vão liquidar o país e passar 38 anos no poder, como os golpistas de 64.

    Depois, vão assumir o poder e abaixar as calças para os Estados Unidos como o “Syririca”, lá na Grécia, abaixa para a Alemanha, traindo TODA sua plataforma. 

    A troskada tacou fogo no país e criou essa onda conservadora !!! Atroskada destruiu o futuro do Brasil, abriu mão do pré-sal para a educação, e do pré-sall para qualquer coisa, abriu mão de direitos trabalhistas, abriu mão da saúde e educação, tudo por 20 CENTAVOS !!!

    Que esses trastes nos tirem do Buraco que nos meteram.

  10. Desencontros na centro-esquerda

    O que mais me preocupa é a atual baixa comunicação entre os grupos e líderes da centro-esquerda. Ciro faz comentários impertinentes contra Lula, lançado intempestivamente como candidato pelo PT. E o PSOL?Sem palavras, são uns deslumbrados que acham que a esquerda autêntica vai iniciar seu ciclo de pureza agora, com eles.

    Temo que a gente acorde em janeiro de 2019 em um pesadelo ainda maior porque a direita vai ser articular e terá a seu favor a legitimidade de uma eleição vencida nas urnas.

    1. Custo a aceitar essa crítica

      Custo a aceitar essa crítica à pureza. Afinal, o PT nasceu defendendo estas práticas. O PSOL não faz nada muito diferente. O problema é que no percurso, o PT resolveu adotar as práticas que condenava na direita e passar à conciliação. Não sei se alguém já escreveu sobre isso mas penso que está aí o elemento que levou ao que vivemos neste momento.

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