O assassinato de Ambrósio, líder Guarani Kaiowá

Sugerido por hugo1

Do Brasil de Fato

A morte de Ambrósio Kaiowá

Liderança Guarani Kaiowá do acampamento Guyraroká foi assassinado a facadas em sua própria aldeia, a caminho de casa

Ruy Sposati

do Cimi

Ambrósio Vilhalva foi assassinado a facadas às 20h30 da noite de 1º dezembro, em sua própria aldeia, a caminho de casa. Sua morte é triste e complexa. Propomos aqui três apontamentos para refl etir e para tentar compreender a morte de Ambrósio – e seus últimos anos de vida. O primeiro está relacionado à terra.

Guyraroká é um território retomado pelos Kaiowá. Em 1990, um grupo de 30 famílias que viviam confi nadas na reserva Tey’kue, em Caarapó, conseguiu ocupar 60 hectares de uma das fazendas. Dali foram expulsos e permaneceram por quatro anos na beira da estrada, até que conseguiram voltar para a área.

Estudos antropológicos confirmaram a tradicionalidade do Guyraroká: 12 mil hectares foram identificados como terras originariamente ocupadas por aquelas famílias. Em 2009, o Ministério da Justiça publicou uma portaria declaratória, reconhecendo a área como efetivamente indígena.

O segundo apontamento está relacionado aos impactos do processo histórico imposto aos Guarani Kaiowá de perda de território e do confi namento nas reservas. Estas experiências foram traumáticas, transformaram abruptamente seus modos de viver. Diminuíram e alteraram profundamente a qualidade e o sentido da vida destas pessoas.

Nesse contexto, bem como o aumento da taxa de suicídios, o uso compulsivo de bebidas alcoólicas proliferou com bastante força, atingindo centenas de Kaiowá desde então. Para suportar as tentativas de disciplinamento por parte do Estado e do capital, embriagar-se ou se matar transformaram-se em saídas. E Ambrósio bebia muito.

O terceiro apontamento tenta dar cabo do elemento mais trágico e grotesco da história: Ambrósio, segundo informações preliminares, teria sido assassinado por indígenas – e não por pis toleiros. No último período, a liderança vinha sendo alertada pela comunidade sobre os problemas que o uso compulsivo de bebidas alcoólicas traziam. Ambrósio vinha se tornando cada vez mais hostil com os indígenas da aldeia. As memórias dão conta de que antes ele não era assim. Ambrósio era um bom yvyra’ja (aprendiz e auxiliar) do pai, seu Papito, tekoa’ruvixa (ou ñanderu, o rezador tradicional Kaiowá) da comunidade.

Em 2008, Ambrósio foi um dos protagonistas do longa de fi cção Terra Vermelha, co-produção italiana e brasileira sobre a tragédia Kaiowá. Bastante elogiado, o fi lme teve cinco nominações (entre elas, para o Festival de Veneza) e duas premiações. Ambrósio viajou bastante em função das agendas extensas de divulgação do fi lme.

Após a exposição e a circulação do Kaiowá em festivais, espaços políticos e outras esferas, em diversos países, ele teria fi cado assim, avesso, conforme indígenas que conviveram com Vilhalva.

Sob severas privações em seu tekoha (terra) diminuto, a circulação de Ambrósio pelas extensas arenas por onde Terra Vermelha o levou teria acentuado as dissociações causadas pela invasão das terras Guarani Kaiowá, alçando Vilhalva a uma imagem difusa de si próprio.

Outros atores do fi lme também têm sofrido problemas semelhantes. Os produtores de Terra Vermelha possivelmente desconhecem esse fato, e muito menos anteviram os efeitos que a velocidade estonteante com que Ambrósio foi solapado provisoriamente de seu universo social causariam.

Redação

4 Comentários

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  1. Deus me livre, que ninguém

    Deus me livre, que ninguém resolve esta tragédia que acomete os indios brasileiros. Porcaria de país e de governos que só se importam com que tem título de eleitor. Quando o ministério da integração racial vai ficar sob o comando de um indígena, para ao menos olhar a causa indígena com mais respeito?

    1. Concordo com o que disse. Não

      Concordo com o que disse. Não consigo lembrar de quando a questão índigena esteve tão mal conduzida. Está um desastre de opinião pública que chega a sensibilizar amigos tucanos,

      Afinal, existe o direito difuso a não se viver numa sociedade que trate de modo tão mesquinho uma questão dessas.

      Países capitalistas centrais, como Austrália e Canadá, andaram nas últimas décadas promovendo benefícios incondicionais e maiores garus de autonomia. Nos EUA as reservas podem ter suas próprias forças policiais.

      Eu não lembro agora, mas você é tão enfática assim quando direitos de outras minorias são negociados politicamente?

  2. ….. minha teoria sobre a

    ….. minha teoria sobre a terra indigena remonta o ano de 1500.

    ocorre q ao chegarem os portugueses trouxeram consigo, de sua cultura, o q chamavam de ESCRITURA DE PROPRIEDADE.  e juntamente usavam-se carimbos para atestar o ato. enfim, os cartorios.

    nao deu outra: os indios nao conheciam tal expediente e os portugueses foram emitindo escrituras carimbadas e se tornando donos de tudo sem pedir anuencia e sem dar nada em troca aos verdadeiros donos da terra. as Bandeiras foram um caso patente do fato – ao expandir os limites do país iam lançando escrituras de propriedade, matando quem se opunha e escravizando os mansos.

    os portugueses partiram do principio q quem habitava a terra era inferior a eles. discriminados portanto veio a apropriaçao indebita. nao havia senado, nao havia STF para embargos infringentes. nao havia a quem recorrer.

    o q vemos hoje eh um retrato do erro cometido ha quinhentos anos.  

  3. Só o Lula fez pelos índios.

    O texto é perfeito, moro na região a onde ocorrem suicídios freqüentes de índios ou assassinatos por causa da cachaça. O PSDB não fez nada pelos índios aqui Gunter. O único que fez algo foi o Lula, que pagou pela área do Panambizinho aos pequenos produtores que ali viviam, dando a terra a seus legítimos donos. É por essa ação do governo na hera Lula que os ânimos se exaltaram no MS, pela primeira vez produtores rurais perderam suas terras (mesmo que pagas pelo governo), daí se percebeu que sim os índios tinham direitos e poderiam realmente ganhar suas terras de volta. O governo atual esta fazendo o que todos faziam antes do PT. O governo tem que voltar seus olhos para as questões indígenas.

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