O Dia Internacional da Mulher Branca

Por Zaíra Pires

Mais um 8 de março se aproxima e recebemos aquela enxurrada de chorume em nossas existências femininas nos “homenageando” por sermos delicadas, amorosas, resilientes, submissas, mães, esposas, damas na sociedade e amantes ardentes entre quatro paredes.

Todo esse repentino amor tem hora pra começar e acabar, durando o tempo do mês de março, da semana do 8 ou só desse dia mesmo, de acordo com o tanto de baboseira que cada um consegue produzir.

Nesse sentido, as mulheres homenageadas são sempre as mesmas: brancas, jovens, magras, ocidentais, cristãs e cisgêneras.

E para não perder o costume, nós, as pretas neuróticas, recalcadas, mal amadas e que veem racismo em tudo, vamos direcionar nossa crítica destrutiva ao bode expiatório da vez: a Riachuelo e sua campanha pela Semana da Mulher Brasileira 2014 (leiam ironia nas minhas palavras, por favor).

Como podemos ver no vídeo, a mulher brasileira padrão, essa do comercial, corresponde exatamente ao padrão médio da brasileira, afinal, somos majoritariamente brancas, loiras, com traços faciais finos e tão magras e altas como sílfides mitológicas. Uai, não somos?

E então que a presença negra no comercial é de uma mão que serve. Um corpo sem cara, que não consome, não tem vontades, sequer existe, apenas serve. Uma sombra semivivente que só se presta a apoiar a existência da sua senhora.

Sim, porque a mulher que deve ser homenageada na semana da mulher é aquela branca que trabalha fora, independente, bem resolvida, que limpa a casa, cuida dos filhos, serve ao seu marido e sempre está com as unhas feitas e a depilação em dia. Essa é uma super mulher que consegue viver seus rompantes de modernidade sem deixar de lado suas obrigações femininas. Essa merece ser louvada e ganhar um desconto nas compras da semana por cumprir suas funções com tanto esmero.

A preta que sustenta a família com seu salário do subemprego, que enfrenta 5 horas de ônibus sujeita a abuso sexual, que vê seu filho ser morto pela polícia, que morre por complicações aborto inseguro, que está fadada ao serviço doméstico desde sempre como se isso fosse inerente à sua existência, que suporta as investidas sexuais do patrão e do filho do patrão para não perder o sustento dos seus, que é a principal vítima de negligência na saúde pública, que deixa seus filhos sozinhos em casa pra cuidar dos filhos da patroa branca, que é a maioria entre as trabalhadoras do sexo, que não completa os anos básicos de estudo porque precisa sair para trabalhar, que tem que se virar em quinze para viver e ainda manter o sorriso no rosto, essa não merece as homenagens desse dia.

Na verdade essa mulher é a serviçal que deve se alegrar por ter a honra de ver seus braços pretos aparecerem na televisão.

Afinal, o que a Riachuelo nos diz com esse filme, e o que muitas outras nos dirão nessa semana, é que mulher negra consumidora é paradoxo, e já que ela não existe, porque deveria ser representada numa propaganda? Quem disse que preta tem dinheiro? Quem disse que preta compra alguma coisa? Quem disse que preta entende de publicidade?

Pois estamos aqui, consumidoras, pensadoras, cidadãs, formadoras de opinião, dizendo que esse comercial não nos representa. Durmam com esse barulho!

http://www.geledes.org.br/areas-de-atuacao/questoes-de-genero/180-artigos-de-genero/23676-dia-internacional-da-mulher-branca-por-zaira-pires

Redação

14 Comentários

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  1. O texto é bom, mas peca por

    O texto é bom, mas peca por generalizar. Considera que a propaganda da Riachuelo tivesse o condão de expressar toda a realidade social.

    Ora, sabemos que publicitários, em geral, estão preocupados apenas em vender seus produtos, não em retratar de modo fidedigno a realidade. Sendo assim, se valem de estereótipos para atingir seu “público-alvo”.

    Por exemplo, homens em comercial de cerveja são sempre retratados como idiotas (os da Schin então, retratam os homens como verdadeiros imbecis). Crianças são sempre espertas, sagazes e inteligentes (assim, quando querem algum produto, devem ser atendidas).

    Enfim, vale a reflexão sobre a realidade social da mulher negra.

    1. Prezado, você está defendendo

      Prezado, você está defendendo o uso de estereótipos pelos publicitários? É para isso que eles estudam por anos e são pagos (os que mais se destacam) regiamente? Cuidado para você mesmo não se tornar um estereótipo: o daquele que sempre reclama de racismo quando negros reclamam de racismo. Quanto à generalização de que você acusa o texto, onde ela aparece nele? A todo o momento, a autora deixa claro que se refere ao anúncio da riachuelo (atenção, revisor, é com minúscula mesmo!).

  2. Crônica Mulherão Martha

    Crônica Mulherão Martha Medeiros

     

     

    O mulherão

    Peça para um homem descrever um mulherão.Ele imediatamente vai falar do tamanho dos seios,na medida da cintura,no volume dos lábios,nas pernas,bumbum e cor dos olhos.Ou vai dizer que mulherão tem que ser loira,1,80m,siliconada,sorriso colgate.Mulherões,dentro deste conceito,não existem muitas:Vera Fischer,Leticia Spiller,Malu Mader,Adriane Galisteu,Lumas e Brunas.Agora pergunte para uma mulher o que ela considera um mulherão e você vai descobrir que tem uma a cada esquina.

    Mulherão é aquela que pega dois ônibus por dia para ir ao trabalho e mais dois para voltar,e quando chega em casa encontra um tanque lotado de roupa e uma família morta de fome.Mulherão é aquela que vai de madrugada para a fila garantir matricula na escola e aquela aposentada que passa horas em pé na fila do banco para buscar uma pensão de 100 Reais.
    Mulherão é a empresária que administra dezenas de funcionários de segunda a sexta, e uma família todos os dias da semana.Mulherão é quem volta do supermercado segurando várias sacolas depois de ter pesquisado preços e feito malabarismo com o orçamento.Mulherão é aquela que se depila, que passa cremes, que se maquia, que faz dieta,que malha,que usa salto alto, meia-calça,ajeita o cabelo e se perfuma,mesmo sem nenhum convite para ser capa de revista.Mulherão é quem leva os filhos na escola,busca os filhos na escola,leva os filhos para a natação,busca os filhos na natação,leva os filhos para a cama,conta histórias,dá um beijo e apaga a luz.Mulherão é aquela mãe de adolescente que não dorme enquanto ele não chega, e que de manhã bem cedo já está de pé, esquentando o leite. 
    Mulherão é quem leciona em troca de um salário mínimo,é quem faz serviços voluntários,é quem colhe uva,é quem opera pacientes,é quem lava roupa pra fora,é quem bota a mesa,cozinha o feijão e à tarde trabalha atrás de um balcão.Mulherão é quem cria filhos sozinha, quem dá expediente de oito horas e enfrenta menopausa,TPM,menstruação.Mulherão é quem arruma os armários, coloca flores nos vasos,fecha a cortina para o sol não desbotar os móveis, mantém a geladeira cheia e os cinzeiros vazios.Mulherão é quem sabe onde cada coisa está, o que cada filho sente e qual o melhor remédio pra azia.

    LUMAS,BRUNAS,CARLAS,LUANAS E SHEILAS:Mulheres nota dez no quisito lindas de morrer, mas MULHERÃO É QUEM MATA UM LEÃO POR DIA

    Martha MedeirosAdicionar à minha coleçãoNa coleção de 101Mais Informação 

    O HOMÃO

    Alguns anos atrás, escrevi um texto chamado O Mulherão para o Dia Internacional da Mulher. Fez um razoável sucesso, tanto que até hoje esse texto é lido e publicado em diversos veículos de comunicação quando chega março.

    Pois cá estamos, novamente, na vizinhança desta data comemorativa, e desta vez minha homenagem vai para o homão, aquele que não tem dia algum no calendário para valorizar seus esforços.

    Homão é aquele que tem assistido a ascensão feminina nas empresas, na política, na arte, no esporte e tem achado tudo mais do que justo. Nunca li um artigo de um homem reclamando por as mulheres estarem dominando o mundo (não acredito que escrevi isso!). Ao contrário: os inteligentes (e todo homão é inteligente) estão tendo muito prazer em compartilhar seus gabinetes conosco e não choram pelos cantos caso tenham uma chefe mulher (homão chora, mas chora por amor, não por motivos toscos).

    Homão gosta de mulher. Parece óbvio, mas há muitos homens (não homões) que só gostam de mulher para cama, mesa e banho. O homão gosta de mulher para cama, mesa, banho, escritório, livraria, cinema, restaurante, sala de parto, beira de praia, estrada, museu, palco, estádio. E, às vezes, pode nem gostar delas pra cama, mesa e banho, e ainda assim continuar um homão.

    Homão é aquele que encara parque no final de semana, faz um jantar delicioso, dá conselho, pede conselho, trabalha até tarde da noite, compensa no outro dia buscando os filhos na escola, dirige o carro, em outras vezes é co-piloto, não acha ruim ela ganhar mais do que ele, não acha nada ruim quando ela propõe uma noitada das arábias, recebe amor, dá amor, é bom de contabilidade e sabe direitinho o que significa fifty-fifty.

    Homão é aquele que compreende que TPM não é frescura e que reconhece que filhos geralmente sobrecarregam mais as mães do que os pais, então eles correm atrás do prejuízo, aliviando nossa carga com prazer. Homão acha um porre discutir a relação, mas discute. Homão não concorda com tudo o que a gente diz e faz, senão não seria um homão, e sim um panaca, mas escuta, argumenta e acrescenta idéias novas. Homão não fica dizendo que no tempo do pai dele é que era bom, o pai mandava e a mãe obedecia. Homão reconhece as vantagens de estar interagindo com seres do mesmo calibre e não depende de uma arma ou de um carro ultrapotente para provar que é um homão. O homão sabe que não há nada como ter uma grande mulher a seu lado.

    Martha Medeiros

    http://pensador.uol.com.br/cronica_mulherao_martha_medeiros/

     

  3. Oi, Charlie, tudo bem?Eu

    Oi, Charlie, tudo bem?

    Eu discordo de que houve generalização.

    Infelizmente a discriminação é tão enraizada que as pessoas/empresas podem nem perceber quando estão incorrendo nisto, quando escolhem certos biotipos para seus anúncios.

    Não é necessário fazer “sociologia” para se dar conta do acinte que é fazer uma propaganda para o Dia Internacional da Mulher, num país como o Brasil, com tantas etnias diferentes, colocando uma mulher branca sendo ajudada a se vestir por uma mulher negra. Só faltou o “final feliz”.

    No mínimo os publicitários estão “escolhendo” clientela para os produtos. Mulheres negras não usam lingeries?

    Qual seria o público-alvo a não ser mulheres brancas, loiras, ruivas, negras, morenas? Enfim, mulheres e só.

    E porque colocar somente a mão negra ajudando a mulher branca a se arrumar?

    Seria este o esteriótipo de que se valem pra vender seus produtos?

    Os publicitários ainda estão no tempo das mucamas e sinhazinhas?

    Seria esta a realidade social que eles buscam mostrar com este tipo de propaganda?

     

    Abração procê.

    Nilva

    1. Oi Nilva!
      Na verdade, eu nem

      Oi Nilva!

      Na verdade, eu nem assisti à peça comercial. Comentei apenas por achar que peça comercial não se presta a avaliar o todo de uma sociedade.

      Quanto à sua pergunta “Os publicitários ainda estão no tempo das mucamas e sinhazinhas?”, a resposta infelizmente é “Sim”.

      Para mim, publicidade é a mais baixa das profissões, pois lida com o subconsciente das pessoas para fazê-las consumir. Distorce valores da sociedade, cria novas necessidade inúteis, tudo pelo lucro. Publicitários são os maiores responsáveis por vivermos na situação atual, em que a pessoa vale por aquilo que tem, e não pelo que é.

      Jamais me esqueço de uma entrevista com um grande publicitário a que assisti ainda na década de 90. Questionado sobre como podia fazer propaganda de cigarros, respondeu que a contratante queria que o “publico-alvo” fosse jovens a partir de 12 anos (!) de idade. Ele disse, fazendo pode de herói, que se recusou, e que só faria se fosse a partir de 16 anos.

      Ah bom!!!

      Enfim, é dessas pessoas que estamos falando. Por isso, não me deixo impressionar quando surgem essas aberrações.

      Grande abraço.

       

      1. Concordo com voce Charlie. A

        Concordo com voce Charlie. A publicidade brasileira é um dos responsáveis pelo emburrecimento da sociedade. Reproduz lugares-comuns e dissemina falta de cultura. Certo que a publicidade tem como unico objetivo vender o produto, mas já tivemos épocas melhores. Hoje as propagandas são imbecis e imbecilizantes.

        Lanço aqui a campanha contra as agências publicitárias. E convoco os Black Bloc a “depredar” um publcitário. É um “símbolo do capitalismo” ambulante.

        Quanto a essa propaganda específica, Nilva, é uma porcaria mesmo. Só que tem que se saber qual é o público alvo da Riachuelo. Se fosse da Magizne Luiza seria um equícvoco.

        Já os braços pretos acho que a intenção era criar constraste cromático com a moça branquela. Mas sua elocubração a partir disso não deixa de ser interessante. E antes que eu me esqueça, NÃO GOSTO de mulher magricela e esquálida

  4. Cômico-patético!

    Seria cômico se não fosse patético! Os autores do anúncio só conseguem enxergar a mulher negra aos pedaços e em papel servil, como se não fossem seres humanos inteiros e íntegros, participantes  da formação do povo brasileiro em infinitas capacidades e funções. Pergunto: é isso o que ensinam nos cursos de Publicidade e Propaganda, que são dos mais procurados pelos jovens brasileiros a cada vestibular?

    Outro lado ridículo da questão é: se as lojas riachuelo (com minúscula mesmo, revisor, por favor!) dependessem de seu ideal excludente de cliente para se manter, estariam à beira da falência. Quem duvidar disso deve entrar em uma dessas lojas e observar quem está lá comprando.

  5. A realidade social brasileira

    “O texto é bom, mas peca por generalizar. Considera que a propaganda da Riachuelo tivesse o condão de expressar toda a realidade social.”

    1. Falta dinheiro no bolso dos pobres médicos brasileiros…

      Alguma negra entre os médicos? Já viu alguma médica casada com pobre, negro, etc? Não há ofensa maior para esta classe trabalhista ver um cubano com “cara de pedreiro” ou “empregada” realizando um trabalho digno somente de pessoas com sangue azul. Onde se viu alguém achar pouco ganhar uma bolsa de 10 mil reais? Em que um médico é para a sociedade mais importante que os lixeiros acima?

  6. Comercial idiota!

    Comercial idiota! Publicitários sempre conseguem me surpreender na sua bestialidade infinita.

    Só um adendo importante, nem a modelo do comercial é loira, nem são as loiras o modelo ideal desse mundo. O modelo ideal é a mulher branca, na conta dos publicitários e empresas anunciantes. Não é necessário distinguir cor dos olhos ou cabelos, é a cor da pele o que conta nessa ordenação de mundo.

  7. A carne mais barata do mercado é a carne (fêmea) negra.

    Às vezes, é uma pequena parte que explica o todo. Principalmente se esta parte estiver em consonância com as outras partes que formam o todo.

    É o caso. Seja na propaganda de cerveja, de carro, de comida, de produtos de limpeza, higiene, e até quando é supostamente para “homenagear”, a propaganda repercute o imaginário machista que é transversal a todo o mundo do consumo, das artes e da ciência, etc.

    Falar da dupla clivagem de gênero das mulheres negras é chover no molhado.

    A peça é um lixo, e as meninas têm razão.

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