Organizações questionam MP de São Paulo pela falta de investigação de abusos em protestos

Patricia Faermann
Jornalista, pós-graduada em Estudos Internacionais pela Universidade do Chile, repórter de Política, Justiça e América Latina do GGN há 10 anos.
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Do Justificando

Diversas organizações ligadas à defesa dos direitos humanos ingressaram, nesta quarta-feira (3), com representação questionando a omissão do MPSP (Ministério Público de São Paulo) diante da atuação violenta e desproporcional da Polícia Militar nos recentes protestos contra o aumento da tarifa.

Conectas, Artigo 19IBCCRIM (Instituto Brasileiro de Ciências Criminais), Comissão de Direitos Humanos do Sindicato dos Advogados de São PauloNúcleo de Direitos Humanos e Ouvidoria da Defensoria Públicapaulista avaliam que o MPSP falha em controlar e investigar as forças de segurança pública do Estado – função que lhe é atribuída pela Constituição Federal e por legislações estaduais. O Ministério Público tem 30 dias para responder publicamente às organizações.

Clique aqui para ler a íntegra da representação.

“A sociedade precisa saber que o Ministério Público tem a obrigação constitucional de investigar os abusos cometidos pela polícia, seja quais forem. E é consenso que o Ministério Público de São Paulo tem sido inerte quando se trata de violência policial em protestos”, afirma Rafael Custódio, coordenador do Programa Justiça da Conectas.

De acordo com o artigo 129 da Constituição, o órgão está encarregado de “exercer o controle externo da atividade policial”.

O documento apresentado pelas organizações também se baseia nas leis nacional e estadual,8625/93 e 734/93, respectivamente, que regulamentam, entre as funções do órgão, requisitar e acompanhar procedimento investigatório para responsabilização de agentes públicos.

A Lei Orgânica do MPSP ainda garante ao órgão o poder de requisitar à Secretaria de Segurança Pública a abertura de inquérito sobre a omissão ou fato ilícito cometidos pela polícia e demandar providências para corrigir ilegalidades ou abuso de poder, o que não tem sido observado.

Normas para o uso da força

Desde 2013, o governo do Estado de São Paulo, por meio da Polícia Militar, vem protagonizando uma série de capítulos de repressão, violência e ilegalidade em contextos de manifestações públicas.

Apesar de não haver uma legislação que regule a ação da polícia em protestos, existem regras e manuais nacionais, além de recomendações elaboradas por especialistas da ONU e OEA que orientam sobre como a polícia deve se comportar nestas situações.

Durante as grandes manifestações de junho 2013, a Conectas e o Núcleo de Direitos Humanos da Defensoria Pública encaminharam à SSP um documento reunindo estas recomendações e consolidando-as em seis regras principais. Veja aqui.

Diante da omissão daquele órgão, em abril de 2014 as entidades levaram o pedido ao Judiciário através de uma Ação Civil Pública, proposta pelo Núcleo de DH da Defensoria Pública, e de amicus curiae das entidades Conectas e Artigo 19. As ações buscavam preencher o vazio legislativo quanto à regulação da atividade policial, proibindo, inclusive, o uso de balas de borrachas em manifestações. O juiz de primeira instância acolheu o pedido em decisão liminar, porém a medida foi derrubada uma semana depois pelo Tribunal de Justiça do Estado, onde permanece parada.

Patricia Faermann

Jornalista, pós-graduada em Estudos Internacionais pela Universidade do Chile, repórter de Política, Justiça e América Latina do GGN há 10 anos.

6 Comentários

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  1. Está aí o que todo mundo queria, e agora, por que a grita?

    Quando deram ao MP o poder de investigar e não o poder-dever, haja vista que não há previsão legal ou constitucional que determine (inclusive para efeitos do processo penal) os limites e obrigações do MP no chamado poder de investigação, criaram esse monstro, copiando Sepúlveda Pertence (um dos que chocou o ovo da serpente em 1988).

    O monstro seletivo, que só investiga quem quer, e vaza o que quer.

    Nem vou mencionar a impropriedade (e total arbitrariedade e desequilíbrio) de um órgão investigar e fazer uso processualmente do que investiga, essa discussão morreu junto com o que restava de bom senso em nossa sociedade.

    Agora querem o MP investigando a Polícia.

    Meus amigos, vai depender muito de quem está apanhando…e nesse caso, o MP nunca atacaria a PM que atacou os inimigos do “Rei” ou picolé de chuchu, para os mais íntimos.

    Detalhe: Personagens bem conhecidos do MP, defensores da “lei e ordem”(como no seriado) acabaram nas hostes dos governos tucanos…

    Problema? Nenhum, a não ser a hipocrisia que cimentou o caminho.

  2. O MP/SP está deveras ocupado

    O MP/SP está deveras ocupado em ir atrás do Lula, em conluio com o PSDB e o aparato midiático sensacionalista e criminoso para se preocupar com a ação da PM de Sao Paulo que é seu dever constitucional.

  3. O contexto simbólico

    Há alguns dias postei aqui mesmo no blog uma pequena crônica sobre a ação da polícia militar em Campinas, durante um desfile pré-carnavalesco de blocos, visando dispersar a multidão ao final do evento, fazendo uso abusivamente de recursos repressivos (gás lacrimogêneo, spray de pimenta, uso de cassetetes…).

    A ação violenta da Polícia Militar do Estado de São Paulo parece ter se tornado uma regra de procedimento.

    Isso não está definido em nenhum manual ou norma formal. Como esbocei nas breves observações que fiz naquela crônica, isso se consumou como um habitus condicionado por uma determinada maneira de conduzir a relação entre a instituição policial e a cidadania. Nesse sentido, isso vai mais além da polícia, e é legitimado por uma certa visão de mundo.

    A força policial de São Paulo — como, em geral, do país todo, mas, ao que parece isso tornou-se particularmente saliente em São Paulo — não se reconhece como agente em relação com um sujeito de direitos, qual seja, com cidadãos.

    Para ela realizar sua ação de intervenção, um princípio apriorista é mobilizado para justificar, legitimar e movê-la: a redução do cidadão à condição de inimigo.

    Nesse sentido, a ação da Polícia Militar é caracteristicamente uma ação de guerra, não uma ação de intervenção policial.

    Seu objetivo não é o de interferir pontualmente para cessar ou impedir uma infração ou contravenção cometida por um sujeito de direitos, mas a de instaurar, segundo seu critério exclusivo de entendimento, uma situação de subserviência a uma ordem e a uma autoridade que não são passíveis de questionamento cidadão. Ou seja, ela age fundamentalmente no sentido da supressão sumária dos direitos. E isso é feito por meio da violência ostensiva e intimidatória.

    Por trás da Polícia Militar existe, assim, uma ideologia autoritária (portanto, fundamentalmente antidemocrática) que a move. Essa ideologia parece que vem sendo deliberadamente estimulada, disseminada e tornada prática habitual pelos sucessivos governos estaduais paulistas.

    Nesse sentido, a Polícia não se expressa como instituição social, mas como força parassocial destinada a impor um regime de tutela sobre a cidadania urbana genérica; uma força militar em ação de guerra, cujo inimigo é qualquer contingente social que questione sua concepção arbitrária e intempestiva de ordem e autoridade.

    A polícia militar, ao abraçar acrítica e talvez inconscientemente (mas no contexto de um “caldo de cultura” autoritário) a reificação do autoritarismo como principium operandi, acaba se tornando, segundo sua própria lógica, uma instituição inimiga da sociedade.

    A sociedade tem o direito de se defender dos seu inimigos. Se o arbítrio dos meios acaba consagrado por quem deveria precisamente o impedir, então já nada resta de legitimidade a norma alguma. A sociedade, de sua parte, vem progressivamente percebendo isso e se conformando a esse contexto.

    As coisas tendem a piorar.

  4. é uma ação educativa,

    visa condicionar os paulistas a não reclamarem do governador!

    alguém consegue imaginar o auê que a imprensa faria, se a dilma mandasse a força de segurança nacional, baixar a borracha nos coxinhas?

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