Carlos Imperial não era santo nem mau-caráter

“Carlos Imperial não era santo nem mau-caráter”, defende autor de biografia

Mauricio Stycer, repórter especial do iG

Lançada há pouco mais de dois meses, “Dez! Nota Dez”, a biografia de Carlos Imperial (1935-1992) escrita por Denilson Monteiro vem cumprindo uma carreira semelhante à do personagem retratado no livro: todo mundo conhece, mas evita falar muito. A “culpa” está longe de ser do livro – uma minuciosa pesquisa, fartamente documentada e bem escrita.

O problema, parece ser, é o mal-estar ainda causado pelo personagem que emerge desta biografia. Carlos Imperial foi, ao longo de quase 40 anos, uma espécie de médico e monstro do show-business brasileiro.
Descobriu, ajudou ou deu impulso à carreira de gente como Roberto Carlos, Tim Maia, Wilson Simonal, Erasmo Carlos, Elis Regina e todo um time de cantores bregas, menos votados. Compôs músicas de sucesso na Jovem Guarda. Produziu peças de teatro que marcaram época, como “Um Edifício Chamado 200”. Igualmente, produziu inúmeros filmes na fase de ouro da pornochanchada brasileira.

    

Ogro midiático. Amado ou odiado, Carlos Imperial soube como poucos como conseguir espaço os meios de comunicação. Na direita Imperial, sentado no colo de Clóvis Bornay / Reprodução

Ao mesmo tempo, Imperial usou e abusou de métodos escusos para promover seus artistas e projetos culturais. Inventou histórias, mentiu, armou falsas brigas, plantou notas na imprensa. Pessoalmente, o “Gordo”, como era chamado, cultivou uma imagem debochada, sempre cercado de muitas mulheres (a quem chamava de “as lebres do Imperial”), e de desprezo à moral reinante. Era um “ogro midiático”, na feliz expressão de Denilson Monteiro.

Tão amado quanto odiado, ou desprezado, Imperial morreu cedo, aos 56 anos. “Ao todo, cerca de cem pessoas compareceram ao enterro. Nem chegava perto da quantidade de gente que o Gordo ajudou”, anota Denilson Monteiro, com precisão, na biografia.

Nesta entrevista, o autor tenta explicar o seu trabalho. Fala das dificuldades que enfrentou para editar o livro (recusado por “quase todas” as editoras do país), critica a imprensa por não dar a atenção devida ao trabalho, reflete sobre Carlos Imperial, diz que evitou a “canonização” do personagem e afirma que o ex-prefeito Cesar Maia, com seus factóides, é uma figura que lembra um pouco o seu biografado.

                       

Cantor, ator, apresentador e produtor, Imperial era multimídia. “Gordo” (Imperial) dirigiu oito filmes, grande parte pornochanchadas / Reprodução

Quanto tempo demorou para fazer o livro?
Seis anos. Nesse período, participei da pesquisa dos livros “Vale tudo, o som e a fúria de Tim Maia”, de Nelson Motta, e de “Clara Nunes, guerreira da utopia”, de Vagner Fernandes.
 
Quantas pessoas exatamente você entrevistou?
Perdi a conta, mas acho que foi pra lá de 200. Tudo me interessava, amigos de colégio, de turma da praia, artistas, políticos, dirigentes esportivos, empregados… Todo mundo tinha algo de que eu precisava, não podia desperdiçar nenhuma fonte.
 
Há algum autor de biografias que te inspira? Que serve de modelo?
Eu tive dois escritores que li e nunca mais abandonei: Monteiro Lobato e Paulo Setúbal. E, claro, Ruy Castro e Fernando Morais são grandes referências. Hoje, as biografias são um sucesso graças a eles.
 
É correto dizer que você adotou um ponto de vista objetivo, mas com simpatia pelo seu personagem?
Participei de um debate sobre biografias em que estavam a Stela Caymmi, autora de uma biografia sobre seu avô, o Dorival Caymmi, e a Maria Célia Barbosa Reis da Silva, de “Antônio Fraga, personagem de si mesmo”. As duas (Stela já é óbvio) admitiram a simpatia por seus personagens. Mas, como no meu caso, não fizeram concessões, mostraram todos os lados.
Na minha opinião, a biografia do Caymmi não evita a “canonização” do personagem.

Ao longo do trabalho, procurei evitar o início de um processo de canonização de Carlos Imperial. Quis mostrar que ele também tinha o seu lado obscuro. Se o resultado final leva a tê-lo como uma figura simpática, é porque ele realmente era assim. Conversei com diversas pessoas que o conheceram. Em muitos momentos temi que batessem com o telefone na minha cara. Mas, na maioria das vezes, não foi assim. O Aderbal Freire Filho falou com muito carinho dele, sorriu várias vezes ao recordar a época em que dirigiu peças produzidas pelo Imperial. Claro, caiu uma lágrima quando lembrou a briga que tiveram, mas, apesar do incidente, o saldo foi positivo. A famosa “absolvição do morto”? Acho que não. O Gordo acaba realmente seduzindo as pessoas, mesmo depois de morto.

Imperial fez uma série de coisas moralmente condenáveis (mentiras, armações variadas) para conseguir espaço na mídia e promover o seu trabalho. Você não faz nenhum julgamento sobre essas práticas dele. É isso?
A minha proposta nunca foi julgar, foi contar o que aconteceu, deixo o julgamento para o leitor ou para o “Quem tem medo da verdade?”.

Ao relatar objetivamente várias situações absurdas (as falsas brigas, as armações, as notas plantadas na imprensa), não pode dar a impressão que você concorda com os métodos do Imperial?
É natural essa simpatia pelo biografado, você convive diariamente com a vida dele, fica sabendo o que ele comia, vestia, suas alegrias, tristezas, tudo. No que me diz respeito, procurei não dar uma imagem de santo ao Imperial e nem de mau-caráter, mostrei os dois lados. Não emiti uma opinião porque minha proposta não era analisar Carlos Imperial, era contar o que aconteceu durante os 56 anos dele. Mas posso te dizer isto aqui e agora: concordo com muita coisa que o Gordo aprontou. Várias jogadas do Imperial são uma grande demonstração de inteligência, de saber aproveitar os meios que tinha em mãos.

Imperial iria nadar de braçada nos dias de hoje?
Muito artista que hoje está aí numa posição mais confortável deve isto às “armações imperialescas”. Ele sabia promover um produto como ninguém e isto é admirável. Eu fico imaginando o que ele não estaria aprontando atualmente tendo a internet a seu alcance. Tem aquela frase que ele disse para o Erasmo: “Quando você estiver em alguma situação difícil, seja qual for, pare e pense: ‘O que faria Carlos Imperial nesta hora?’. Tenho certeza de que você vai tomar a decisão certa”. Se o pessoal fizesse isso, talvez o negócio andasse melhor.
 
Você vê alguém usando métodos semelhantes ao do Imperial hoje no esforço de promover trabalhos na mídia?
Bem, no Rio de Janeiro tem o ex-prefeito César Maia, um homem que criava seus famosos factóides, como usar casaco no verão e dizer que caso o seu candidato à sucessão não obtivesse determinado índice nas pesquisas, andaria nu pela cidade. Mas não tem jeito, o Imperial foi muito além disso.

Ricardo Calil escreveu outro dia no blog dele que o seu livro ainda não teve a repercussão que merecia. A que você atribui isso?
Você há de convir que existem alguns  profissionais nos meios de comunicação com uma mentalidade bem obtusa. “Imperial morreu há 16 anos, não vai atingir o nosso público alvo”, diz um produtor de programa de TV. Aí você recebe um e-mail de um leitor de 20 anos dizendo que adorou o personagem e pedindo pra te encontrar e receber uma dedicatória. “Não posso falar deste livro no meu jornal, já saiu uma matéria em um concorrente”, alega um editor, esquecendo que nem todo mundo lê todos os jornais e que o escritor tem muitas informações que ainda podem ser dadas. Mas apesar disso, parafraseando o Lulu Santos, existe “gente fina, elegante e sincera” (o Calil, por exemplo) que fala do livro. Tem havido sim, uma boa divulgação, com matérias em revistas e jornais e entrevistas em rádios. Recebi elogios do Joaquim Ferreira dos Santos, Washington Olivetto, Moysés Fuks, meu mestre José Louzeiro, um cara rigorosíssimo, o crítico Mauro Ferreira e outros notáveis. Até apareci na TV, mostrando que falo bem e não sou de se jogar fora.

Você acha que a imprensa e as editoras, de um modo geral, temem falar de um cara como o Imperial justamente por causa do perfil dele?
Não. Acredito que o grande problema seja o desconhecimento do personagem, ou a crença de que uma história como a dele não tem um grande alcance perante o publico por já ter um certo tempo. Isto é uma grande bobagem, uma vez que todos aqueles que ouvem suas histórias ficam fascinados e procuram conhecê-lo melhor. Dentre as muitas besteiras que me disseram, uma delas foi que meu livro era destinado apenas para o pessoal da geração do Imperial. No dia seguinte, o DJ e fotógrafo Maurício Valladares me manda um e-mail dizendo que, ao voltar de Brasília, encontrou no avião um casal de jovens lendo meu livro. O problema é que tem um pessoal que acha cultura um bem de consumo com prazo de validade.
Você encontrou dificuldades para publicar o livro? Por que nenhuma grande editora se interessou?
Dificuldades? Incontáveis. Bem, as grande editoras não devem ter acreditado no personagem, ou no autor. Falta de conhecimento? Talvez. É complicado você ligar para uma editora e dizer: “Meu nome é Denilson Monteiro, sou o pesquisador da biografia do Tim Maia que o Nelson Motta escreveu e queria saber sobre a possibilidade de publicar meu livro aí com vocês” e ouvir: “Tim Maia? Não conheço esse livro. Mande seu material pelo correio que daqui a três meses te daremos uma resposta”. Aí a Matrix se interessou, comprou a idéia, estamos juntos. Mas tenho um recado às livrarias: não demorem tanto com a reposição, se o livro se esgota rapidamente, é sinal de que ele é um sucesso.

Quantas editoras você tentou antes da Matrix?
Quase todas. Teve uma que nem tentei, vi que não valeria a pena, certamente meu nariz aquilino não se enquadraria no perfil dela. Lembra da história do Roberto Carlos peregrinando atrás de uma gravadora para o seu primeiro disco? Foi bem parecido. Aquelas passagens da caitutuagem (a divulgação feita pelo próprio artista), também estão sendo feitas por mim.

http://ultimosegundo.ig.com.br/mauricio_stycer/2009/01/13/carlos+imperial+nao+era+santo+nem+mau+carater+defende+autor+3310992.html

 

Carlos Imperial, o inventor do bordão “Dez! Nota Dez!”

por Edmundo Leite

Seção: Memória

Música

17.fevereiro.2010 14:09:11

Ontem teve apuração do carnaval de  São Paulo e logo mais  acontecerá a do Rio.  Mesmo   quem não curte  o desfile das escolas de samba costuma parar para ver. Tem gente até  que acha mais emocionante que os próprios desfiles.  Outros, tão chato quanto.

Aquilo que deveria ser apenas um  procedimento burocrático para verificar qual foi a melhor escola  virou um ícone tão marcante da festa quanto o mestre-salas e a porta-bandeira.  A leitura das notas,  sobretudo a da máxima,  está tão incoporporada à coreografia do carnaval que  é  difícil imaginar que alguém tenha inventado algo que hoje  parece tão natural.

Mas nem  sempre foi assim.  O bordão  “Dez! Nota Dez”!  anunciado com entonação grandiloquente  surgiu no carnaval de 1984, junto com a inauguração do sambódromo carioca.

Seu criador foi  o  polêmico e controvertido Carlos Imperial,  na época vereador no Rio e  designado pelo governo de Leonel Brizola para comandar a Comissão de Carnaval dos primeiros desfiles no local idealizado por Oscar Niemeyer.

O biógrafo Denilson Monteiro descreve como foi em seu livro, não por acaso entitulado “Dez! Nota Dez! Eu Sou Carlos Imperial”:

“… Na Quarta-feira de Cinzas, por volta das 17h, Imperial, guiado pelo leal Russão, se dirigiu ao Maracanãzinho, onde seria realizada a apuração do Carnaval de 1984. As notas seriam lidas por ele, que pontualmente às  18 horas deu início ao trabalho. O ginásio Gilberto Cardoso ficava bem próximo do morro da Mangueira. Por isso, os torcedores da Estação Primeira se encontravam em número muito maior que as demais. A escola já iniciou o primeiro quesito com nota máxima, o que fez com que Imperial optasse por improvisar uma mudança na  forma como estava conduzindo a apuração.  Decidido a mexer com a platéia, anunciou com sua garganta privilegiada:

– Estação Primeira de Mangueira: dez! Nota dez!

Os mangueirenses entraram em êxtase. Percebendo que a maneira diferente de anunciar o resultado havia agradado, Imperial repetiu a fórmula com as notas máximas das demais agremiações. Simultaneamente, por toda a cidade o que se ouvia naquele cair de tarde era um novo bordão que se alastrava como um vírus. Em todos os lugares as pessoas procuravam imitar a voz radiofônica de Carlos Imperial:

– Dez! Nota dez!

A apuração terminou com a Portela  de Imperial e seu enredo “Conto de Areia” campeã do desfile de domingo e Mangueira como a campeã de segunda. O Gordo deixou o Maracanâzinho como coadjuvante que por alguns minutos roubou a cena, algo que sempre o agradava bastante. Na rua, as pessoas o reconheciam e gritavam:

– Lá vai o “Dez! Nota Dez”.  …”

O bordão foi um dos últimos legados de Imperial, um cara que tem no currículo várias outras criações marcantes da cultura brasileira ao longo dos anos e que morreria no fim de 1992.

Amado e odiado com a mesma intensidade, Imperial foi  – além de autoentitulado “Rei da Pilantragem”  – pioneiro na propagação do rock no Brasil, descobridor e mentor de Roberto Carlos e outros artistas como Erasmo e Wilson Simonal, compositor  de vários sucessos (”Vem Quente que eu estou fervendo” e A Praça”) e um grande fanfarrão daqueles que rareiam nos dias de hoje.  No carnaval, por vários anos participava  do tradicional desfiles de   fantasias luxuosas cujo símbolo era Clovis Bornay só para debochar dos concorrentes.

Imperial também tem outras obras – e atitudes –  menos nobres no currículo.  Mas aí só lendo a  biografia escrita por  Denilson Monteiro (agora debruçado sobre Ronaldo Bôscoli) para saber

http://blogs.estadao.com.br/edmundo-leite/2010/02/17/carlos-imperial-o-inventor-do-bordao-dez-nota-dez/

 

 

Carlos Imperial (Carlos Eduardo Corte Imperial), compositor, nasceu em Cachoeira do Itapemirim ES em 24/11/1935 e faleceu no Rio de Janeiro RJ em 4/11/1992. Desde cedo se interessou por música, colecionando discos importados. Mais tarde, já no Rio de Janeiro, conheceu Johnny Alf, de quem se tornou aluno de piano. Participou de clubes de jazz com sessões aos domingos à tarde.
No inicio da década de 1950 fez sua primeira composição Menina, e estreou como ator no programa Câmara Um, de Jaci Campos, na TV Tupi, do Rio de Janeiro. Passando depois a assistente daquele produtor, fez quadros de rock no programa Meio dia.
Em 1958, comandando o programa Clube do Rock, na TV Continental, do Rio de Janeiro, foi o descobridor do cantor Roberto Carlos, que estreou em disco em 1959 com duas músicas suas, João e Maria e Fora do tom, gravadas na Philips. No ano seguinte Roberto Carlos gravou mais duas músicas de sua autoria, Brotinho sem juízo e Canção do amor nenhum.
Nessa época, apresentava os programas Festa de Brotos, na TV Tupi, e Os Brotos Comandam, na TV Continental e Radio Guanabara, onde surgiram diversos ídolos da jovem guarda, como Eduardo Araújo, e Renato e seus Blue Caps. A partir da afirmação do movimento, compôs musicas de sucesso como Goiabão e Vem quente que eu estou fervendo (ambas com Eduardo Araújo), gravadas respectivamente por Eduardo Araajo e Erasmo Carlos.
Também nessa fase alcançou grande êxito com Mamãe passou açúcar em mim, gravada por Wilson Simonal, e com A praça, que, gravada por Ronnie Von e por Wilson Simonal, se tornou um de seus maiores sucessos como compositor. Compôs também em parceria com Ataulfo Alves, pouco antes da morte deste, três sambas, dos quais Você passa, eu acho graça, foi o de maior popularidade.
A partir da década de 1970 dedicou-se ao jornalismo, à produção de filmes e à política, sendo o vereador mais votado do Rio de Janeiro em 1984.

Obras: Brotinho sem juízo, 1960; Canção do amor nenhum, 1960; Fora do tom, 1959; Goiabão (c/Eduardo Araújo), 1967; João e Maria, 1959; Mamãe passou açúcar em mim, s.d.; Menina, s.d.; A praça, 1967; Vem quente que eu estou fervendo (c/Eduardo Araújo), s.d.; Você passa e eu acho graça (c/Ataulfo Alves), 1971.

Fonte: Enciclopédia da música Brasileira – Art Editora PubliFolha

http://cifrantiga2.blogspot.com/2007/06/carlos-imperial.html

 

Vídeos, composições de Carlos Imperial:

  1. A praça por Ronnie Von. Festa de niver da TV Record. Em 1967.
  2. A diva do samba, Clara Nunes, cantando “Você passa eu acho graça”, de Ataulfo Alves e Carlos Imperial.
  3. Trecho do filme “Na Onda do Iê-Iê-Iê”, de 1966, dirigido por Aurelio Teixeira.
    Wilson Simonal canta música “Mamãe passou açúcar em mim” de Carlos Imperial
  4. Nalva Aguiar interpreta “Pode vir quente que eu estou fervendo”. Mais conhecida pela gravação de Erasmo Carlos, a quem muitos atribuem erradamente como autor da canção.
  5. Ankito e Anilza Leoni cantam o rock “Você é de Morte” de Carlos Imperial em um número musical do filme “Vai Que é Mole” (1960), da Herbert Richers

 

Redação

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