Elza Soares e a mulher do fim do mundo, por Matê da Luz

por Matê da Luz

Parafraseando um amigo querido, é recorrente minha vontade de ouvir Elza Soares e ainda mais recorrente ainda minha dificuldade em conseguir lidar com os grunhidos, as alterações de voz e o desafinado proposital – entendo o estilo, aprecio a história mas, de verdade, meus ouvidos, nada apurados, têm preferência por menos arestas quando se trata de costume musical. 

Aprecio a história e não é pouco, não e, então, acabei me dispondo, disco após disco, a testar minha melodia interna e, surpresa, muito surpresa, felicidade enorme, este último “A Mulher do Fim do Mundo” mexeu com meu quadril. 

Música, ao meu sentir, tem relação com a alma, e a Elza vem colocando isso em pauta há tanto tempo e, então, entendo que o que me incomodava de fato era o que ela estava colocando pra fora ali, tão paralelo com o que eu, muito provavelmente, sentia. Um misto de dor física e da alma, sabe? 

 https://www.youtube.com/watch?v=KLw-JzqtVOg&feature=youtu.be

Nesse disco, parece que ela tá feliz, realizada, incansável – aos 80 anos, lançar qualquer coisa que não seja uma almofada na cabeça de quem torra a paciência é um feito e tanto, que dirá um disco todo ritmado, com a voz tão firme e tão forte, sabe?, isso me contou que ela tá assim, firme e forte também. Realizando. Realizando um disco que fala sobre a mulher, sobre tudo isso que é ser mulher e que ela viveu, ah, como viveu. 

E agora ela tá chamando a polícia, tá falando do corpo, da alma, tá convidando gente linda pra cantar junto, tá sensivelmente mais feliz. E eu também. Ô, Elza, tô tão feliz com nosso encontro. 

Mariana A. Nassif

15 Comentários

Deixe um comentário

O seu endereço de e-mail não será publicado. Campos obrigatórios são marcados com *

  1. “Deixem-me cantar até o fim”

    “Deixem-me cantar até o fim”.

    O verso síntese do poema e de toda uma vida.

    Na voz de Elza Soares. Voz temperada pelos tempos do fim do mundo.

    Quase choro.

    Não sei se de emoção ou de inveja.

  2. I did it my way

    E se Frank Sinatra cantasse sua canção testamento na voz de Elza Soares?

    Por certo não seria:

     

    “I planned each chartered course

    Each careful step along the by way

    And more, much more than this

    I did it my way”.

     

    Talvez, no meu mau inglês, seria algo assim:

     

    “Let me sing to the end

    I went beyond what they allowed me to

    They charge me “the price”

    More than I had to give

    And I gave more than they deserved

    And I gave all

    I did it as I could, but I did

    So now,

    Let me sing to the end”.

    1. Who else?
      Senão O Bardo.
      Um dos – atualmente poucos – motivos para visitar estas plagas.
      E pego emprestado da Diva e do Poeta: let me sing to The End.

  3. MINHA, MINHA, MEU, MINHA, MEU, MINHA

    A  sra que nao consegue escrever sobre nada sem escrever sobre si mesma, “minha vontade, minha dificuldade, meus ouvidos etc, etc, etc, senpre ao redor do próprio umbigo, 

     

    1. …essa é a SUA opinião,

      …essa é a SUA opinião, não? 

      Utilizo o espaço gentilmente concedido pros meus desabafos, impressões, registros e sensações e, então, como forma de me conectar com outros desabafos, impressões, registros e sensações. 

      Quem troca não pressupõe o próprio umbigo, mas os umbigos presentes nos arredores, veja bem 🙂 E, além disso, tem o GGN inteiro de notícias e informações jornalísticas pra navegar, acho justo que o espaço seja aproveitado como cada um bem entende, encontrando gente que se afina de acordo com o assunto central (aqui, sim, sem problema algum, aquelas que fazem parte do meu universo particular e que, de certa forma, podem tocar outros universos). 

      Acho que tudo bem, não? <3 

       

  4. “dificuldade em conseguir

    “dificuldade em conseguir lidar com os grunhidos, as alterações de voz e o desafinado proposital – entendo o estilo, aprecio a história mas, de verdade, meus ouvidos, nada apurados, têm preferência por menos arestas quando se trata de costume musical”:

    Eu adoro.  Da uma olhada nisso aqui, por exemplo:

    [video:https://www.youtube.com/watch?v=1Ql3klIR_cc%5D

    Ela abre com duas vozes simultaneas, uma cantada e uma soprada!  Repete o feito em “clara, clara” aos 54 segundos.

    Depois entra no que o proprio video chama de whistle (assobio) nas notas.  Nao, as notas assobio sao mais altas e o envelope e vibrato sao significantemente diferentes.

    As notas de Elza sao inspiradas e nao exhaladas, tecnica dificilima -o proprio Bobby McFerrin consegue umas 4 notas diferentes mas esta bem distante do controle que ela tem.

    Anyways, o album “Muilher do Fim do Mundo” eh o melhor da carreira de Elza Soares.  Long Live the Queen!

  5. Elza começou a cantar numa

    Elza começou a cantar numa favela enquanto carregava a lata na cabeça, como era costume do seu tempo de menina. Assim foi descoberta como uma das mais impressionantes cantoras do Brasil. Aos 80, já com algum problema de saúde que a impede de se pôr em pé, mas e a voz? A voz prossegue como a de um pássaro encantado, encantando o mundo tal como fez lá atrás, com a lata d1água na cabeça. 

    Elza é única, MULHER DO FIM DO MUNDO. 

  6. PÔ! Finalmente ! Eu postei

    PÔ! Finalmente ! Eu postei sobre isso e fui ululantemente ignorado. É do jogo.

    Aproveite e ouça Do Cóccix Até O Pescoço …

     

      1. Agosto de 2015? Não faço a

        Agosto de 2015? Não faço a menor ideia didonde que eu tava que não li. 

        Assim, obrigado novamente por alardear que há sempre, sim, qualidades em meio as mediocridades Kids de Axés hiperpatrocinados alienantes.

        Valeu!

         

  7. “Já passou o tempo de sofrermos caladas. Está na hora de gritar”

    Com seu mais recente trabalho, Elza Soares ressurge como ícone imprescindível para uma geração de mulheres que, como ela, se assume feminista

    Por GRAZIELA SALOMÃO E LUCIANA BORGES

    A história da carioca Elza da Conceição Soares, um dos ícones da música brasileira, é marcada por muitas dores: mãe aos 13 anos, viúva aos 21, ela nasceu na favela Moça Bonita, em Padre Miguel, passou fome, perdeu três dos sete filhos que teve, foi julgada pela sociedade ao se relacionar com Mané Garrincha, um dos principais craques do futebol brasileiro. Não à toa se transformou em uma figura marcada pela coragem. “Sonhar é o grande poder da mulher”, diz ela.

    ÉPOCA – Como a senhora analisa a importância de uma data como o Dia das Mulheres?
    Elza Soares – Nem todo mundo sabe o por que desse dia. Precisamos ter consciência de que muitas mulheres morreram para que pudéssemos ficar vivas, termos liberdade de escolher e fazer o que quisermos.

    ÉPOCA – A senhora é feminista?
    Elza Soares – Sou feminista convicta. Vivo protegendo as mulheres e vejo que, às vezes, somos burras demais. Temos que pensar mais em nós mesmas e não nos doarmos tanto. Precisamos receber mais dos homens. No meu show, faço um alerta para as mulheres ficarem espertas. Já passou o tempo de sofrermos caladas. Está na hora de gritar. Mulher tem que gemer na hora certa. Gritar porque está doendo e gemer na hora certa.

    ÉPOCA – A senhora se considera uma das primeiras a defender o feminismo?
    Elza Soares – Sim. Me considero como sendo uma das primeiras artistas feministas do Brasil. Fui muito criticada por isso, por levantar essa bandeira, a dos gays, da negritude. Tudo isso, para muita gente não é bom. Tem que ter raça para não desistir.

    ÉPOCA – Quando a senhora percebeu que era uma feminista?
    Elza Soares – Foi desde muito nova. Eu era uma mulher cheia de filhos, que ainda tinha que trabalhar em uma fábrica de sabão para sustentá-los. Naquele momento percebi que estava sozinha, sem ninguém mais por mim, apenas Deus. Ali comecei a entender que eu era feminista. Na época, não se usava muito isso de se falar que era “feminista”. E, se alguém falasse, Deus me livre, era pedrada.

    ÉPOCA – Acha que está tendo uma mudança nessa questão do direito da mulher hoje?
    Elza Soares – Acho que a mulher está respirando um pouco mais do que antes. Até então, era difícil, quase impossível. Agora estamos com tudo na mão, mas isso não significa que estamos desfazendo de homem nenhum. O que acontece é que temos o nosso direito. Se eles têm o valor deles, por que não podemos ter o nosso? Nosso valor está aqui e não deixamos passar mais nada imune. As mulheres estão muito decididas.

    ÉPOCA – A senhora quis passar esse pensamento para a sua filha?
    Elza Soares – Convivendo comigo, minha filha sentia e percebia que teria que aprender a lutar pelo que quisesse. Nossa relação é boa, mas você sabe que mãe e filha às vezes entram em conflito. Tem sempre essa questão, há um pouco de competitividade. Mas sou uma mãe moderna. Completamente moderna.

    ÉPOCA – Beyoncé fez, recentemente, uma apresentação histórica no SuperBowl que gerou uma enorme discussão [a cantora se apresentou no maior evento esportivo dos EUA cantando uma música sobre preconceito racial e com bailarinas usando figurino inspirado no uniforme do grupo Panteras Negras]. Alguns comentários se referiam à atitude de Beyoncé, mas envolviam seu nome. Como se sente com isso?
    Elza Soares – Ela teve repercussão porque é americana. Mas o que eu faço sempre nos shows? Boto bailarino negro, falo sobre o preconceito contra a mulher negra. Faço isso desde cedo, estou sendo copiada de uma maneira gloriosa. Sou eu quem carrega essa bandeira há anos no Brasil, durante toda a minha trajetória. Não tem ninguém mais que fale de mulher, de negritude. E não falam porque é uma doença, uma doença chamada “medo”.

    ÉPOCA – Os artistas têm medo de levantar uma bandeira?
    Elza Soares – Tem. Eu sempre falo o que sinto, não consigo esconder nada. Artista tem que se posicionar. Só pegar no microfone e cantar bonitinho, ganhar dinheiro, não é o nosso papel. Sempre fui muito julgada e criticada. É por isso que o Brasil ainda me deve muito. Me deve respeito.

    ÉPOCA – E como é ser ícone feminista dessa nova geração de mulheres que vai às ruas para reivindicar melhores condições sociais? Há meninas de 16 anos cantando suas músicas…
    Elza Soares – Sinto uma emoção enorme. Toda vez acabo o show com lágrimas nos olhos. É muito lindo de se ver. Só em falar nisso fico com os olhos cheios de lágrimas [emocionada, fica em silêncio por alguns minutos].

    ÉPOCA – A senhora se sente um pouco responsável por elas?
    Elza Soares – Me sinto sim. E a sensação é de “ai meu Deus, o que eu estou fazendo com essas mulheres”. Tem cada situação por aí. Tem mãe carregando filho pequeno pelas mãos e pensando no que eu falo. Precisamos seguir. Isso não me amedronta não.

    ÉPOCA – A Mulher do Fim do Mundo é seu primeiro trabalho só de inéditas e tem um viés totalmente feminista. Por que?
    Elza Soares – Quando o [produtor musical Guilherme] Kastrup me ligou, convidando para participar do novo disco, não sabia que eram apenas inéditas. Ele veio aqui em casa e ficamos sentados no chão escolhendo as músicas. Logo de cara foram 50 na primeira seleção e, dessas, tiramos 11. Não tive nenhuma dúvida sobre essa lista final. Logo escolhi a faixa Pra Fuder. Ela é forte à beça. Outra muito forte éBenedita [que mostra a história de uma transexual que não desiste, mesmo trazendo no corpo as marcas da violência que sofre]. Adoro essa música porque é muito intensa e fala de tudo que está relacionado à mulher. Quando escutei pela primeira vez, pensei: “quero gravar. Vou gravar Benedita porque ela faz parte da minha negritude”.

    ÉPOCA – Tem algo que a senhora queria muito ter feito e não fez ainda?
    Elza Soares – Não. O que eu queria era gravar um disco de inéditas, algo que acabei de fazer. Eu sou inquieta, tenho vontade de algo assim, mas não sei do que. Prefiro não ficar nessa ansiedade. Deixo acontecer, não fico esperando pelo amanhã. O que vale é o hoje, então seja feliz hoje. My name is now. Eu sou o agora.

    ÉPOCA – Tem medo de alguma coisa?
    Elza Soares – Não tenho medo de nada não. Só tenho medo de rato. Do resto, não.

    ÉPOCA – Há rumores de que a senhora pode ser o enredo da Mocidade Independente de Padre Miguel no ano que vem.
    Elza Soares – Ao mesmo tempo que eu gosto da ideia, fico assustada. Tem que ser um enredo muito bem feito, de uma beleza e uma criatividade maravilhosas. Não pode ser qualquer coisa não. Tem que ser feito com muita verdade. E é lógico que eu estarei na avenida.

    ÉPOCA – Olhando para trás, a senhora sentiu que amou e foi amada?
    Elza Soares – Muito. Fui muito bem amada e amei bastante. Essas coisas acontecem quando a gente quer buscar o amor verdadeiro. Ele[Mané Garrincha, com quem foi casada por 16 anos]… Com as perninhas tortas dele, foi o grande amor da minha vida. E nem todo mundo encontra esse amor. Eu encontrei.

    ÉPOCA – A senhora tem a noção de que é uma artista atemporal?
    Elza Soares – Tenho completa noção disso. E sei que é para poucas.

    ÉPOCA – Faria tudo de novo e da mesma forma?
    Elza Soares – Se tivesse a oportunidade, sim, faria tudo de novo. Mas queria fazer com a cabeça de hoje. Seria muito melhor. Eu me doei muito para o outro. A gente é criada para ser assim, mas temos que mudar. Precisamos ser criadas para a liberdade. O mundo é grande demais para não sermos quem a gente é.

    http://epoca.globo.com/vida/noticia/2016/03/elza-soares-ja-passou-o-tempo-de-sofrermos-caladas-esta-na-hora-de-gritar.html

  8. Créditos
    Só acho que faltou colocar os créditos no texto.
    Produtor: Guilherme Kastrup, que aliás tem um disco autoral incrível. Música brasileira de qualidade.
    Direção artística: Rômulo Fróes e Celso Sim
    Músicos: o próprio Kastrup na bateria, Marcelo Cabral, Kiko dinucci, Rodrigo Campos, Felipe Roseno, e o naipe do Bixiga 70.

Você pode fazer o Jornal GGN ser cada vez melhor.

Apoie e faça parte desta caminhada para que ele se torne um veículo cada vez mais respeitado e forte.

Seja um apoiador