Aquiles Rique Reis
Músico, integrante do grupo MPB4, dublador e crítico de música.
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Sua excelência o saxofone

Em seu novo CD, Leo Gandelman homenageia os saxofonistas nordestinos que adicionaram brasilidade ao som do instrumento. Com um repertório requintado, nasceu Ventos do Norte (Azul Music). Lá estão Netinho (Pedro Silveira Neto), Severino Araujo, Duda (José Ursicino da Silva), Zumba (José Gonçalves), Ratinho (Severino Rangel), com duas composições, Luiz Americano, também com duas músicas, K-Ximbinho (Sebastião Barros), com três, e Moacir Santos, com duas, sendo que uma delas em parceria com Vinícius de Moraes.

Com arranjos do próprio Leo e de Henrique Cazes, os grandes mestres têm seus trabalhos interpretados por instrumentos e instrumentistas de alta linhagem – mas quem brilha mesmo é o saxofone. Residindo nele a força de cada criação, nada mais justo, portanto, que ele protagonize. Leo Galdelman se entrega a soprar seus saxes como quem faz do sopro vida, música, história.

Ao ouvi-lo, percebe-se que o álbum é rastreamento do som do saxofone brasileiro desde o início do século passado. Didático, sem se preocupar com cronologia nem estilo, suas treze faixas mesclam o choro ao frevo e ao choro-canção. Tudo sempre exalando modernidades harmônicas e interpretativas – novos horizontes a músicas (algumas) quase seculares.

“Saxofone Porque Choras” (Ratinho) tem Leo Gandelman tocando sozinho um naipe de saxes: tenor, alto e barítono. E é este último quem sola a melodia. A bateria (Rafael Barata) segura o ritmo. O cavaquinho (Henrique Cazes) dá o molho brasileiro. O CD começa quente.

“Perplexo” (K-Ximbinho) tem Leo no sax tenor. O acordeom (Marcelo Caldi) toca a introdução. O tenor logo chega com o violão (Lula Galvão) e o baixo (Alberto Continentino). O cavaquinho e a bateria a todos amparam e aos ouvintes não desprotegem.

“Vamos para Caxangá” (Ratinho) tem Leo e Serginho Trombone num bom diálogo musical: Leo no sax alto e Serginho no trombone eufônio (uma espécie de tuba pequena, cujo som mais se assemelha a esta do que ao sax). O violão de sete cordas (Rogério Caetano) dá show.

Uma entusiástica interpretação de “Espinha de Bacalhau” (Severino Araujo) ganha ainda mais sabor depois que se lê no encarte o que escreve Henrique Cazes sobre o choro famoso: Severino o compôs com a intenção de “responder” a um choro complicado, composto por um colega integrante da Orquestra Tabajara. Polêmica benfazeja. Aplauso em audição aberta.

Em “Amphibious” (Moacir Santos), Leo, no sax barítono, inicia a música só com a bateria. Com seu sopro sólido, ele contribui para tornar a composição ainda mais requintada.

“Cara Lisa” (Duda) tem arranjo para saxes feito pelo mastro Spok. Ele e Leo alternam-se, cabendo ao primeiro solar no barítono e o segundo, no alto. O frevo é quente, dá vontade de cair no passo. Porém resisto. Ouvir Ventos do Norte se impõe a qualquer tipo de desatenção.

Leo Gandelman tem o saxofone como missão de vida. Faz dele um companheiro de emoções. Nele refaz energias, o coração pulsa, a alma sorri.

Aquiles Rique Reis

Músico, integrante do grupo MPB4, dublador e crítico de música.

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