Aquiles Rique Reis
Músico, integrante do grupo MPB4, dublador e crítico de música.
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Um cantor que sente as palavras

O paulistano André Mastro lançou “Sem Descanso” (independente), seu primeiro CD. Bom cantor, graças à sua voz nasalada e encorpada, além de afinada, percebe-se que cada interpretação sua tem um quê de intimidade com a letra, o que valoriza e acrescenta cumplicidade aos versos.

Sem Descanso conta com um repertório de grande qualidade, envolto em arranjos tão simples quanto criativos, calcados em formações instrumentais enxutas e bem tocadas.

Tudo começa com a música que dá título ao álbum: “Sem Descanso” (Guca Domenico e Irineu de Palmira). Percussões e violões iniciam. Ainda na introdução, um quarteto de cordas a eles se junta e, com uma forte levada, abrem a cortina por onde passa André Mastro para cantar emocionadamente. Lindo começo.

“Sacerdotisa do Vodu” (Carlos Castelo) surpreende ao se revelar um velho e bom samba de breque. Saxes tocam a introdução. Entra o canto de André. Com ele, cada um dos quatro saxofones dá um curto pitaco, num divertido colóquio musical. A percussão e o cavaquinho garantem as quebradas por onde a letra graceja. André deita e rola, dando mostras de que está apto a cantar qualquer música.

Para reforçar tal impressão, ele interpreta belamente “Prova de Carinho” (Adoniran Barbosa e Hervé Cordovil). Num andamento um pouco mais ligeiro, apenas com violão e acordeom alternando momentos ritmados com outros arritmos, André reverencia o clássico com sua voz de barítono.

“Circular 46” (Guca Domenico e Carlos Castelo) é mais um samba de breque. Violões de seis e de sete, tamborim, flauta e cavaquinho, sem nenhum alarde, reverenciam o mestre Moreira da Silva.

“Marinheira” (Fausto Nilo e Fernando Falcão) é um dos mais belos momentos do CD. Voz, percussão e violão bastaram para tal. À capella, André Mastro inicia. Logo, cantando em terças com Zeca Loureiro, a simplicidade dá a cara a tapa – e não tem para ninguém, ela dá mais lindeza à canção. Meu Deus!

Uma das grandes de Itamar Assumpção: “Isso Não Vai Ficar Assim”. Bandolim, percussão e violão dividem a tarefa de dar vida à obra. Instigante, engendrada em palavras que se perdem e se reencontram em difusas ideias, André a tudo agrega o seu poder de síntese interpretativa.
Outro samba de breque: “Menopausa Masculina” (Léo Nogueira e Márcio Policastro). Ao lado dos dois anteriores, pode-se dizer que são uma trinca de ouro do gênero nas mãos de um intérprete que sabe reverenciá-lo, merecendo dele a justa recompensa em forma de alegria.

“Pra Não Chorar” (Vitor Santana e Murilo Antunes). O acordeom de Toninho Ferragutti, somado a dois violões, junta ao canto a beleza que tem a música.

“Encrenca e Formosura” (Álvaro Cueva), música suingada, com arranjo de sopros e forte pegada rítmica.

Ao final, “As Rosas Não Falam” (Cartola). Um show! Fecho perfeito para um disco que nos traz um cantor amadurecido e consciente de sua força vocal e da importância de tudo o que cerca a feitura de um CD: bons arranjos, repertório e produção.

Aquiles Rique Reis

Músico, integrante do grupo MPB4, dublador e crítico de música.

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