A tecnologia a serviço do ser humano? Por Édouard Pluvieux

Enviado por Alfeu

A tecnologia a serviço do ser humano?

Por Édouard Pluvieux

Traduzido por Carol Wojtyla, do Festival Marginal

“Está tudo acabado entre nós, espero que você seja feliz”, foi o SMS que Karine, 29 anos, recebeu depois de três meses de namoro com Johan, 27. Bom, pelo menos esse foi escrito corretamente… Ao contrário do torpedo recebido por Mélanie, 21. “Levar um fora por SMS já é difícil! Mas se para piorar vem em linguagem abreviada, cheia de carinhas idiotas e erros de português, daí fica insuportável”, disse a estudante de ciências sociais. Ah, que saudade do tempo das cartas escritas à pluma, assinadas com o próprio sangue do amado. Não, não estou brincando!

No último dia dos namorados, o site MocoSpace fez uma pesquisa com vinte mil de seus membros e descobriu que: 57% deles já deu um fora via celular, sendo a maioria apenas com um SMS. O rompimento por mensagem de texto é o exemplo mais frequente dos novos “nocautes virtuais”, e não é o único.

De patrões que demitem por e-mail, passando pelos amigos que “viram a cara” no Facebook, amigas grossas no Twitter e até a sua mãe que tem WhatsApp, as novas tecnologias viraram o canal ideal para as agressões verbais, acerto de contas e péssimas notícias de todos os tipos.

  

Agressões virtuais, sofrimento real

Mas por que utilizamos cada vez mais esses serviços para enviar coisas desagradáveis? Bom, para começar, porque enviamos “cada vez mais coisas”, e pronto.

“Recebemos um monte de e-mails e SMSs todos os dias, bons e ruins, mas os negativos são sempre os que a gente lembra mais”, explica a etnóloga Stefana Broadbent, especialista em questões digitais.

Mesmo que a escrita SMS e Twitter imponha uma nova norma sintática: ser breve, curto e de preferência em 140 caracteres, para ir “do curto ao grosso” é fácil. 

“Quando mandamos uma mensagem dizendo “tô chegando”, estamos sendo práticos, pois a mensagem é útil para quem envia e para quem recebe. Mas quando recebemos um “acabô” ou quando mudamos nosso status do Facebook de “namorando” para “solteiro” entramos em um nível de comunicação sem possibilidade de resposta, aí o choque é pior”. 

Sim, pois se o tapa na cara é virtual, a dor do destinatário é, evidentemente, bem real.

Um clique e o outro desaparece

A despersonalização das relações através desses novos meios de comunicação deixa as coisas bem mais fáceis quando temos que dar uma notícia ruim.

“É bem melhor, pelo menos a gente não tem que ver a cara da outra pessoa chorando”, confessa um internauta. E continua: ”É também mais rápido: a gente manda quando a gente tá a fim, pouco importa a hora que a pessoa vai ler”. E também, é mais definitivo. “Num término de namoro via SMS, não corre o risco de o outro dizer alguma coisa que  faça a gente mudar de ideia”, opina. Essa prática é o pior sintoma da falta de empatia que essas tecnologias provocam.

No trabalho também

Esse tipo de mau comportamento, tão velho quando a covardia humana, não está reservado apenas à esfera pessoal. Até os patrões entraram nessa. Lionel, 31 anos, conta: Depois de seis meses trabalhando numa pizzaria, seu patrão o demitiu com uma simples mensagem de texto: “A direção decidiu que você está demitido sem necessidade de cumprir aviso prévio”.

Do mesmo jeito, uma vendedora de loja foi demitida  ano passado com a mensagem: “Você não trabalha mais conosco”, enviada por seu chefe.

Desde então ela luta para conseguir seguro desemprego, pois a lei determina que o empregador que pretende demitir um empregado faça isso por uma carta registrada ou um documento em mãos. Nunca por SMS…

Ser excluído na rede social: levar um chute duas vezes

Depois de ter sido demitida (do modo clássico pelo menos) da empresa de cosméticos em que trabalhava, Laura, 32 anos, ficou chocada quando entrou no Facebook no dia seguinte: TODOS os seus colegas de trabalho tinham excluído seu perfil da lista de amigos.

“Foi como ser castigada duas vezes: além de ser demitida ainda fiquei com a impressão de ter uma doença contagiosa, rejeitada por meus colegas e totalmente banida. Por covardia, medo de serem os próximos demitidos, todos aqueles que um dia antes me diziam “não fique triste”, “vamos almoçar juntas qualquer dia” e “vamos nos falando”, me viraram – virtualmente – as costas. Mandei um email pra todos eles, dizendo o quanto tinha ficado magoada com essa atitude. Recebi apenas uma resposta, da estagiária, dizendo que meu ex-chefe estava falando mal de mim e que se eu quisesse ela podia ser minha amiga, mas num perfil fake”, contou.

Esse é o problema das redes sociais: tanto as boas quanto as más notícias, aquelas que gostaríamos de anunciar nós mesmos quando fosse a hora certa, escapam.

“Quando me separei de Pierre, imaginei que não veria mais alguns amigos”, conta Laure, 27 anos, “mas nunca pensei que 37 pessoas iriam me excluir imediatamente no Facebook!”.

Para os adolescentes, conectados o dia todo, é ainda pior. Virginie, 18 anos, estudante, conta: “Toda minha turma ficou sabendo que eu tinha sido trocada por outra antes de mim! Era só entrar no Facebook e ver que meu ex tinha, em apenas algumas horas, mudado o status de namorando para solteiro e, logo depois, namorando, mas com uma outra garota!”.

Então, uma geração que namora, leva fora, é insultada, ameaçada e até demitida dessa maneira é então normal? Pior é que a resposta é sim!

Um garoto contou no Facebook que a namorada tinha terminado com ele por meio de uma mensagem de texto e, pior,  mandou a mensagem usando o celular do novo namorado. Presta atenção na resposta que Hayley, 18 anos, deixou: “Te trair e te largar por SMS beleza, mas usando o celular do outro cara, isso não se faz. Que falta de respeito”.

Bom, cada geração com sua escala de valores então…

Tradução do texto original escrito por Édouard Pluvieux

Carol Wojtyla

37 anos. Mãe. Feminista. Louca dos gatos. Problematizo coisas. Assusto pessoas. Colunista do Festival Marginal.

Redação

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