Os pontos polêmicos da CPI dos Crimes Cibernéticos em debate

Para especialistas, propostas ferem os princípios de neutralidade da rede e liberdade de expressão
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Atualizado em 04 de maio, às 12h16
 
Jornal GGN – Parlamentares da Câmara dos Deputados estão próximos de estabelecer novas regras contra crimes praticados pela internet. A votação do relatório final, construído pela Comissão Parlamentar de Inquérito dos Crimes Cibernéticos daquela casa estava prevista para ocorrer na terça-feira (03), mas foi adiada para esta quarta-feira (04) porque ontem deputados exigiram se manifestar para expor sete destaques (novas emendas), para suprimir partes do texto. Os pontos deverão ser votados após a aprovação do relatório final. A sessão começou às 9h
 
No vídeo acima, você acompanha a íntegra do programa Brasilianas, exibido na última segunda-feira, que contou com a participação da coordenadora executiva do Intervozes, Ana Claudia Mielke, do professor do Departamento de Sociologia da UNIFESP, Henrique Parra, e da pesquisadora gestora do Centro de Tecnologia e Sociedade da FGV Direito Rio, Marília Maciel, que avaliaram as propostas da comissão parlamentar.
 
Os três foram unânimes em afirmar que o relatório final fere princípios do Marco Civil da Internet. 
 
A CPI entrega a terceira versão do parecer do relator deputado Esperidião Amin (PP-SC), após dez meses de trabalho. A comissão foi instaurada em julho passado com o intuito de reforçar leis contra crimes financeiros, a partir da repercussão da operação IB2K, da Polícia Federal, que desarticulou uma quadrilha suspeita de desviar mais de R$ 2 milhões de correntistas de vários bancos e usar o dinheiro para a compra de armas e drogas.
 
Mas o que os parlamentares da comissão propõem são medidas que vão além do combate aos crimes financeiros no ambiente web:
 
1. Alterar a Lei Carolina Dieckmann ampliando as ações que são consideradas criminosas, incluindo a invasão de smartphones, redes sociais e violação de mecanismos de segurança de sistemas, com pena de até dois anos de prisão. E, se o crime for praticado contra alguma autoridade do país, a pena de reclusão poderá dobrar;
 
2. Superpolícia. Investimento de 10% de verba do FISTEL (Fundo de Fiscalização das Telecomunicações) na Polícia Judiciária, que envolve a competência das Polícias Civis dos 27 entes federativos e da Polícia Federal. Hoje, por lei, os recursos deste Fundo são utilizados para manutenção e expansão da infraestrutura de comunicação no país. Entre 2001 e 2015 o FISTEL arrecadou R$ 63,5 bilhões;
 
3. Coloca sob a competência da Polícia Federal os crimes cibernéticos nos casos em que a infração tiver repercussão interestadual ou internacional, e se tiver indícios da atuação de associação criminosa em mais de um estado do país ou no exterior; 
 
4. Aplicação de multa e o confisco de aparelhos eletrônicos de quem for pego praticando crimes pelo computador;
 
5. O pacote de sugestões da CPI também responsabiliza o servidor que não retirar um conteúdo do ar em até 48 horas após o pedido de qualquer pessoa. Se a empresa que presta serviços digitais não remover o conteúdo será corresponsáveis a indenizar a pessoa ofendida;
 
6. O número que identifica o computador do usuário, chamado de IP, também passa a ser tratado como informação cadastral. Assim qualquer autoridade policial poderá pedir acesso a esse número, sem precisar de uma ordem judicial; 
 
7. Outra medida do relatório facilita o bloqueio, por ordem judicial, de qualquer serviço e aplicativos que forem considerados ilegais e motivem punição pela legislação brasileira com pena mínima igual ou superior a dois anos e que sejam de sites hospedados no exterior ou não que tenham representação no Brasil. 
  
Parte dessas medidas preocupa os especialistas entrevistados no programa Brasilianas. Corresponsabilizar os provedores por infrações cometidas pelos usuários, por exemplo, é uma maneira de facilitar a retirada de um conteúdo do ar, sem uma ordem judicial, já que essas empresas que trabalham no ambiente web, como Google e Facebook, acabarão se tornando sensores.
 
Essa preposta da CPI também abre porta para ferir a liberdade de expressão, como destaca a coordenadora executiva do Intervozes – Coletivo Brasil de Comunicação Social, Ana Claudia Mielke. “Políticos que sentirem a sua honra afetada com uma crítica que às vezes é da ordem da política podem simplesmente notificar esses provedores e eles serem obrigados a retirar em 48 horas esse conteúdo do ar”, diz.
 
O professor do Departamento de Ciências Sociais da Unifesp, Henrique Parra, complementa que uma das grandes vitórias do Marco Civil foi à inimputabilidade do intermediário, ou seja, dos provedores de internet por crimes praticados pelos usuários. 
 
“Isso cria uma insegurança jurídica muito grande para um conjunto de empresas, de iniciativas sociais que oferecem plataformas para permitir o direito à expressão”, destaca. 
 
Representatividade vulnerável
 
Outra crítica feita pelos especilistas ao trabalho feito pela Comissão Parlamentar de Inquérito é a verdadeira representatividade das decisões dos deputados frente à representatividade do Marco Civil da Internet.  
 
Fazendo uma breve comparação, os trabalhos da CPI foram concluídos em aproximadamente dez meses, após ouvir 103 especialistas em criminalística, direito digital e representantes da Polícia Federal, Agência Brasileira de Inteligência (Abin), CDC-Ciber do Exército, provedores de internet e servidores conectados.  
 
Já o Marco Civil da Internet (Lei 12.965/2014), com seus 32 artigos, demorou cerca de quatro anos para ser consolidado, contando com ampla participação popular. Só na primeira fase recebeu mais de oitocentas contribuições que serviram de base para a formulação da minuta do anteprojeto de lei. Não à toa foi chamado de “A Constituição da Internet” pelo então Ministro da Justiça Luiz Paulo Barreto. 
 
A pesquisadora e gestora do Centro de Tecnologia e Sociedade da FGV Direito Rio, Marília Maciel, corrobora a avaliação de que o relatório final da CPI dos crimes cibernéticos não contempla as contribuições de diversos setores da sociedade, contrariando o que ocorreu na construção do Marco Civil. 
 
“Fica claro que houve uma oitiva [na CPI discutida na Câmara dos Deputados muito mais atenta das preocupações do setor policial e do setor de investigação de crimes, que são preocupações extremamente legítimas, mas que devem ser ponderadas com os setores que falaram no sentido de investigar os crimes de maneira a proteger também os direitos individuais, principalmente a privacidade e a liberdade de expressão, que são especialmente tocados de maneira negativa pelo relatório”, pontua Marília. 
 
 
Redação

2 Comentários

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  1. Perigo!
    Mais poder ao
    Perigo!
    Mais poder ao judiciário para censura!
    Para “fechar” whatsapp, blogs, etc. por motivos em “segredo de justiça”.
    Super democrático!

  2. Tudo isso é somente para
    Tudo isso é somente para submeter a “internet” as instituições
    fortemente corporativistas há uma má intenção nisso tudo!

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