Mais explicações das jogadas da Cultura com a FNAC, por Luis Nassif

Na última vez que cruzei com Pedro Herz, dono da Livraria Cultura, foi em um elevador do Circulo Italiano. Indaguei-lhe rapidamente das ameaças representadas pela Amazon e suas vendas virtuais. Minimizou. Disse que não vendiam nem mil e-books por mês.

E Pedro foi um dos pioneiros da informatização das livrarias, catalogando eletronicamente seus livros, criando sites para vendas e até apostando no epub, um programa concorrente para e-books.

Dois anos depois, tem-se o seguinte quadro, intrigando o mercado:

  1. A Cultura armou uma expansão fenomenal, financiado pelo BNDES (Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social).
  2. Quando o mercado reverteu, passou a enfrentar dificuldades. Os primeiros sinais foram a suspensão dos pagamentos para as editoras, que forneciam a ela livros consignados. Confiou em seu poder de mercado para obrigar as editoras a aceitar as condições impostas, acordos de pagamento a prazo que não estão sendo honrados.
  3. Deu início ao fechamento de lojas. Cada fechamento exige desembolsos no pagamento de direitos trabalhistas de trabalhadores dispensados, pendências fiscais e comerciais. Não constava que a Cultura tivesse caixa para esses movimentos.
  4. Ao mesmo tempo, surpreendentemente adquiriu as operações da francesa FNAC e do site Estante Virtual. De onde surgiram os recursos?
  5. No momento seguinte, passou a fechar todas as lojas da FNAC. Por que comprar para fechar?
  6. Em seguida, entra com pedido de recuperação judicial, congelando todos seus passivos, inclusive os trabalhistas.

Como explicar esses movimentos?

Um exercício de lógica levaria às seguintes hipótses.

  1. A Cultura e a FNAC entram em crise profunda.
  2. A FNAC decide sair do país. Trata-se de operação demorada, ruim para uma empresa de capital aberto, pelas pendências inevitáveis a qualquer fechamento de empresa. Teria que apurar o. montante das indenizações trabalhistas, pagar ou manter em aberto os questionamentos fiscais, pagar as multas de aluguéis, acertar pendências com fornecedores. É processo que levaria, no mínimo, um ano, prejudicando a precificação da empresa nas bolsas europeias.
  3. Monta-se, então, uma jogada simples. A FNAC faz um levantamento de seus passivos e acerta a venda de suas operações para a Livraria Cultura, incumbindo-a de conduzir o fechamento. Em vez da Cultura pagar, é a FNAC que paga a Cultura, tanto recursos para quitar o passivo quanto um plus pelo trabalho efetuado.
  4. Em vez de quitar os passivos da FNAC – que, agora, são seus -, a Cultura utiliza os recursos para adquirir a Estante Virtual e acertar pendências mais urgentes.
  5. Os trabalhadores despedidos da FNAC se somam aos despedidos da Cultura. Aí ela entra com pedido de recuperação judicial que congela todos os passivos.

O que os trabalhadores que não receberam seus direitos deverão fazer:

  1. Solicitar, via judicial, acesso ao contrato firmado entra FNAC e Cultura.
  2. No caso dos trabalhadores das lojas FNAC, pode-se invocar a responsabilidade solidária da empresa.
  3. No caso das demissoes da Cultura, bastará levantar as compras efetuadas pelo grupo, especialmente do site Estante Virtual, par caracterizar desvios de recursos.

 

Luis Nassif

6 Comentários

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  1. Tao the King

    Está lá há milhares de anos, quanto mais sofisticadas forem as artimanhas para dificultar os negócios, mais sofisticados ainda serão os subterfúgios para burlá-los.

    Não deu outra, com a atual legislação comercial-fiscal-tributária-trabalhista, só consegue lucrar os golpistas que se valem das falhas ou obscuridades, resumindo: Negócio honesto no Brasil não existe mais.

    Vamos para a reforma necessária pelo pior caminho possível, depois de destruir tudo de bom e honesto que foi construído em 500 anos de sacrifícios.

    A intelligentsia brasileira não escapa desta conta, infelizmente.

    1. Aproveitando

      “Não deu outra, com a atual legislação comercial-fiscal-tributária-trabalhista, só consegue lucrar os golpistas que se valem das falhas ou obscuridades, resumindo: Negócio honesto no Brasil não existe mais.”

      Como não bastasse, colega meu herdou imóvel de mãe falecida em interior. Onde estão escritura e registro? Não é de hoje que se protela ambos ante os custos notariais. A bomba explodiu. Sorte ter os trocentos recibos de aluguéis e impostos pagos a prefeitura. Adiantaram de porra alguma. Uma vez que o cartório não reconhece os documentos como garantia de propriedade ( que estão em nome da mãe) está correndo o risco do imóvel ser invadido (pq não?). E pague advogado para convencer um juiz, sabe-se lá como, a fazer com que o cartório emita escritura e registro.

      Agora, ouviu-se um A nesses debates todos alguma palavra sobre os problemas apresentados?

       

  2. grupos abril, la selva, cultura, fnac e livrarias de rede fecham

    mais do que abrem farmácias. Um país doente e com medo. Não seriam alguns deles também causadores disso?

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