A derrota trabalhista no Reino Unido tem um lado bom, por Rodrigo Nunes

Para professor da PUC-RJ, não existe mais espaço político ou econômico para retomar políticas adotadas 15 anos atrás

Foto: Reprodução/Agência Brasil

Jornal GGN – Grande parte das análises sobre a derrota do Partido Trabalhista (Labour) tem como base o impasse da esquerda frente ao avanço da extrema direita, e a possibilidade de aprender com a experiência britânica pode ser comprometida pela falta de atenção aos detalhes.

Em artigo publicado no jornal El País, Rodrigo Guimarães Nunes – professor de filosofia moderna e contemporânea na Pontifícia Universidade Católica do Rio de Janeiro (PUC-Rio) – explica que existem vários pontos a serem avaliados, como a distorção produzida pelo sistema distrital britânico, a coalizão formada em torno da candidatura de Jeremy Corbyn e o próprio Corbyn, visto como alguém sem carisma e traquejo.

A queda do trabalhismo não é o único ponto a ser explicado: mesmo com o desgaste de 10 anos no poder, os Conservadores saltaram de aproximadamente 36% nas vitórias de 2010 e 2015 para 42% em 2017 e 44% em 2019 –– sendo as duas eleições dominadas pelo Brexit.

Segundo Nunes, tais eleições funcionaram como referendos sobre o referendo de 2016, e as tentativas de transformar a discussão em debates sobre desigualdade econômica e justiça social por parte dos trabalhistas falharam, uma vez que tanto bilionários como comunidades “deixadas para trás” em períodos de desindustrialização acabaram por apoiar o Brexit.

O articulista pontua que a desilusão com a esquerda britânica não é recente, e ganhou força com as duas décadas de hegemonia do governo Tony Blair – que criaram as condições para a crise financeira de 2008 e a piora social que impulsionou o movimento Brexit. “Se “buscar o centro” significa voltar às políticas de 15 anos atrás, está claro que não existe mais espaço econômico ou político para tanto”, pontua o professor da PUC.

Mas o quadro também tem um lado positivo: o esforço em fugir à oposição entre “realismo” e “utopia”, a partir da noção de que aquilo que aparentava ser “realista” antes da crise de 2008 deixou de sê-lo já que a realidade simplesmente mudou. Uma alternativa é enfrentar as disparidades de frente, reduzindo a força do poder econômico e dando às pessoas mais controle sobre a economia e o Estado.

E esse debate passa pela crise climática crescente – continuar como antes é algo surreal, tanto que a base mais mobilizada pela esquerda são os millenials que chegaram à maioridade após 2008 com grandes dívidas educacionais , sem perspectivas de emprego e com um mundo cada vez mais inóspito à frente.

Redação

3 Comentários

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  1. Não esqueçam das manipulações efetuadas pela Cambridge Analitics.
    A empresa fechou, mas a operação continua atuante. Ocorreu no Brexit, na eleição de Trump e na de Bolsonaro.
    Isso é muito sério e não vejo esta discussão por aqui.

    1. Bem lembrado.
      Até onde sei, houve ampla discussão sobre isso na GB, logo após o referendo.
      Parece-me que o resultado desta eleição, revelando um apoio ao brexit maior até do que o obtido no referendo, deixa claro que o efeito das manipulações da Cambridge Analítica sobre o resultado do referendo foram bastante superestimado.

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