Veiculada nesse fim de semana por vários meios, a despedida da ex-presidente da Petrobras para o público interno da empresa foi sucinta. Na verdade, mais que sucinta, o adeus limitou-se a quatro linhas e é provável que o adjetivo mais apropriado para o texto seja “lacônico”.
Entre as razões que justificariam essa escolha de termos está o fato de que há uma referência superlativa e politicamente correta feita para agradecer aos colegas de empresa designando-os como personagens de uma guerra. E lacônicos eram os guerreiros mais reconhecidos da história ocidental, os espartanos, habitantes da Lacônia, que tinham a reputação de falar pouco.
Mesmo que espartana, a saudação final da ex-presidente contém uma fervorosa exortação aos colegas que permanecem, ao emitir sua última ordem como dirigente: “Continuem trabalhando firme pela Petrobras, por ela – pela Petrobras“, em seguida tratada como “nossa companhia“.
Daí surgem pelo menos dois aspectos que merecem reflexão e análise.
O primeiro é o que se refere à consciência de quem se despede de que está se afastando de um cenário de conflito bélico. A empresa que dirigia não está simplesmente inserida numa competição de mercado, mas em disputas de grande alcance que envolvem desde as finanças internacionais até as de território, por via de regra tratadas como temas de geopolítica. Ainda, por chamar os ex-colegas de “superguerreiros e superguerreiras”, pode-se entender que ela se considerava parte do “alto comando” da referida guerra, uma oficial-general de três estrelas como – a cobertura da imprensa fútil “revelou”, prenhe de detalhes irrelevantes – aquelas que estão tatuadas em seu antebraço (esquerdo!).
E nesse sentido merece reconhecimento público o seu laconismo. Ao contrário de outras tantas ex-figuras de proa do grupo que ocupa o governo federal há doze anos, “baixas” de uma guerra ainda maior pelo poder institucional do país, que, diante da derrota pessoal injusta ou justa, elevaram-se boquirrotos olhando por sobre o ombro, a vociferar denúncias ora procedentes, mas intempestivas, ora totalmente vazias, durante sua “retirada” (ou fuga…).
Maria da Graça Foster caiu como uma comandante digna, valente e leal, e, mais do que isso, humanamente sofrida, mas sem reações movidas pelo ressentimento ou pelo desejo de vingança; um exemplo para muitos homens públicos.
O lado menos luminoso dessa declaração de despedida aparece implícito na ênfase do recado motivacional para que os colegas, de quem diz ao final da mensagem que terá saudades, trabalhem firme “por ela – pela Petrobras”.
Por um lado pode-se justificar o discurso por força da noção de que para além dos governos permanece o Estado como entidade social e, nesse sentido, a empresa é mais permanente e mais longeva que aqueles, que estão submetidos à alternância democrática. Por outro, infelizmente, as entrelinhas sabem a uma doutrina corporativista exacerbada, como se a empresa pertencesse apenas ao grupo de burocratas e técnicos de altíssima capacitação que compõe seus quadros, redundando inelutavelmente numa visão elitista e, por isso, conservadora, sobre como e quem deveria dirigir os rumos da estatal.
Nesse sentido, mais que desejar na penúltima linha de sua mensagem de despedida que seus ex-colegas sigam “determinados e confiantes em prol da prosperidade de nossa companhia”, a ex-presidente poderia ter sido ainda mais leal e grata àqueles milhões de cidadãos que, de fato, possibilitaram, com seu voto nas eleições de 2010 para a presidência da república, sem detrimento aos seus inquestionáveis méritos e esforços pessoais, que ela chegasse profissionalmente até onde chegou.
Sem perder a concisão, a ex-presidente teria atingido o mais elevado, solene e admirável estilo espartano diante de uma aparente derrota que, contraditoriamente, tal como a Batalha das Termópilas para a história do Ocidente, pode mudar para sempre a direção de longo prazo da instituição que comandava, se tivesse dirigido aos ex-subalternos um pedido em prol da prosperidade do nosso país.
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