A extinção do Ministério do Trabalho e a responsabilidade do Estado, por Fábio de Oliveira Ribeiro

A extinção do Ministério do Trabalho e a responsabilidade do Estado

por Fábio de Oliveira Ribeiro

Na entrevista que deu a AASP, a Ministra do TST Delaíde Miranda Arantes, disse que:

“Como primeira medida anunciada no campo do trabalho, o novo governo extinguiu o Ministério do Trabalho, o que vai ocasionar grande impacto na fiscalização da legislação nacional e do cumprimento das normas de segurança e higiene do trabalho, comprometendo o meio ambiente seguro garantido na CF e em normas internacionais, além de prejudicar a implementação da agenda de trabalho descente. Haverá prejuízos para se erradicar a exploração do trabalho infantil, compromisso nacional para ser cumprido até 2020, e no combate ao trabalho análogo ao de escravo. Todos esses são compromissos da nação brasileira com a OIT e com a Organização das Nações Unidas (ONU).

É fundamental que, em um país grandioso, mas com enorme desigualdade social, sejam priorizados investimentos em políticas públicas voltadas para os menos favorecidos, para os jovens, mulheres e crianças, no combate ao trabalho infantil e ao trabalho análogo ao de escravo, em pleno século XXI.” (Boletim da AASP nº 3076, p. 22) 

Essa entrevista fez-me lembrar de algo importante. Quando comecei o curso de Direito em 1985 uma controvérsia jurídica dividia a Justiça do Trabalho. As entidades sindicais dos trabalhadores defendiam a tese de que os suplentes de CIPA tinham estabilidade no emprego. Empresas e sindicatos patronais defendiam a tese oposta. A jurisprudência era vacilante, ora adotava uma tese ora acolhia a outra. Foi nesse contexto que o Delegado Regional do Trabalho em São Paulo baixou uma Portaria afirmando que, no entender da DRT e para fins de fiscalização, o suplente de CIPA tinha estabilidade no emprego.

A Portaria assinada por José Carlos Stein provocou uma reação virulenta dos empresários. A imprensa atacou ferozmente o Delegado Regional do Trabalho e ele foi demitido. Se não me falha a memória, a Portaria que serviu de pretexto para essa demissão foi revogada pelo Ministro do Trabalho. Durante o curto período de tempo em que esteve à frente da DRT/SP, Stein havia desafiado vários hábitos criminosos adotados pelo empresariado paulista:

https://www1.folha.uol.com.br/cotidiano/2016/09/1817844-mortes-dedicou-a-vida-aos-direitos-dos-trabalhadores.shtml

Tive a oportunidade de trabalhar com José Carlos Stein em duas oportunidades. Também defendi o ex-Delegado Regional do Trabalho de São Paulo em dois processos: um na OAB e o outro na Justiça do Trabalho. Mas não é disso que pretendo falar aqui. O que chamou minha atenção ao lembrar o ocorreu em 1985 durante a leitura da entrevista da Ministra do TST publicada no Boletim da AASP foi a semelhança entre a demissão do Delegado do Trabalho de São Paulo e a extinção do Ministério do Trabalho.

Nos dois casos, o que determinou a decisão governamental não foi a racionalidade e/ou a necessidade de conferir maior higidez à ação do Estado e sim o ódio que os empresários nutrem e manifestam na imprensa contra a legislação do trabalho e contra os órgãos encarregados de fiscalizar seu cumprimento. No episódio protagonizado por José Carlos Stein a retaliação atingiu apenas a pessoa da autoridade pública e seu ato. A extinção do Ministério do Trabalho é uma medida extrema que afeta de maneira negativa o funcionamento do Estado e o expõe à execração internacional. Não só isso.

Se o Estado dificultar e/ou deixar de cumprir sua missão institucional de fiscalizar as violações da legislação do trabalho, os abusos cometidos pelos empregadores poderão ser atribuídos à União. O art. 37, §6º, da CF/88 prescreve que:

“As pessoas jurídicas de direito público e as de direito privado prestadoras de serviços públicos responderão pelos danos que seus agentes, nessa qualidade, causarem a terceiros, assegurado o direito de regresso contra o responsável nos casos de dolo ou de culpa.”

A responsabilidade do Estado é objetiva. Ela pode decorrer da ação ou da inação estatal. A prova da execução defeituosa de uma atividade e/ou serviço é suficiente para acarretar sua responsabilização do órgão público, mas não para que ele exercite seu direito de regresso em relação à autoridade ou ao servidor que deu causa ao dano. Nesse caso a culpa ou o dolo deve ser demonstrado.

Jair Bolsonaro foi eleito com o apoio dos ruralistas, muitos deles acusados e penalizados em razão de manter escravos nos seus latifúndios. Ele extinguiu o Ministério do Trabalho para atender uma exigência política ilícita de seus apoiadores criminosos. Portanto, o dolo do presidente neste caso é evidente e específico. Se a União começar a ser responsabilizada em virtude de facilitar violações sistemáticas de direitos trabalhistas por falta de fiscalização adequada, Bolsonaro pode e deve responder com seu patrimônio pessoal pelas indenizações que forem outorgadas pela Justiça aos trabalhadores lesados.

 

 

Fábio de Oliveira Ribeiro

1 Comentário

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  1. Voltamos à afirmação de tornar o brasileiro cidadão de terceira.

    Voltamos à mesma afirmação do Estado, do Poder Judiciário e os órgãos de controle de tornar o brasileiro em um cidadão de terceira categoria.

    Barragens de lama, Juros bancários de 500% ao mês, e a extinção do Ministério do Trabalho.

    Tudo isso é a precarização para tornar o estado brasileiro em latifúndio de elites que juntamente com estados estrangeiros destroem a cidadania do povo brasileiro, tornado-os em meros escravos, sem direitos.

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