A lei federal n.13.146/15 e a polêmica instaurada nas escolas particulares de Santa Catarina

A lei federal n.13.146/2015 trata-se da Lei Brasileira de Inclusão de Pessoas com Deficiência.

Dentre os vários direitos garantidos pela lei para a pessoa com deficiência, há o Art.28o parágrafo 1o que diz o seguinte:

§ 1o Às instituições privadas, de qualquer nível e modalidade de ensino, aplica-se obrigatoriamente o disposto nos incisos I, II, III, V, VII, VIII, IX, X, XI, XII, XIII, XIV, XV, XVI, XVII e XVIII do caput deste artigo, sendo vedada a cobrança de valores adicionais de qualquer natureza em suas mensalidades, anuidades e matrículas no cumprimento dessas determinações.

E o que diz estes incisos?

I – sistema educacional inclusivo em todos os níveis e modalidades, bem como o aprendizado ao longo de toda a vida;

II – aprimoramento dos sistemas educacionais, visando a garantir condições de acesso, permanência, participação e aprendizagem, por meio da oferta de serviços e de recursos de acessibilidade que eliminem as barreiras e promovam a inclusão plena;

III – projeto pedagógico que institucionalize o atendimento educacional especializado, assim como os demais serviços e adaptações razoáveis, para atender às características dos estudantes com deficiência e garantir o seu pleno acesso ao currículo em condições de igualdade, promovendo a conquista e o exercício de sua autonomia;

V – adoção de medidas individualizadas e coletivas em ambientes que maximizem o desenvolvimento acadêmico e social dos estudantes com deficiência, favorecendo o acesso, a permanência, a participação e a aprendizagem em instituições de ensino;

VII – planejamento de estudo de caso, de elaboração de plano de atendimento educacional especializado, de organização de recursos e serviços de acessibilidade e de disponibilização e usabilidade pedagógica de recursos de tecnologia assistiva;

VIII – participação dos estudantes com deficiência e de suas famílias nas diversas instâncias de atuação da comunidade escolar;

IX – adoção de medidas de apoio que favoreçam o desenvolvimento dos aspectos linguísticos, culturais, vocacionais e profissionais, levando-se em conta o talento, a criatividade, as habilidades e os interesses do estudante com deficiência;

X – adoção de práticas pedagógicas inclusivas pelos programas de formação inicial e continuada de professores e oferta de formação continuada para o atendimento educacional especializado;

XI – formação e disponibilização de professores para o atendimento educacional especializado, de tradutores e intérpretes da Libras, de guias intérpretes e de profissionais de apoio;

XII – oferta de ensino da Libras, do Sistema Braille e de uso de recursos de tecnologia assistiva, de forma a ampliar habilidades funcionais dos estudantes, promovendo sua autonomia e participação;

XIII – acesso à educação superior e à educação profissional e tecnológica em igualdade de oportunidades e condições com as demais pessoas;  

XIV – inclusão em conteúdos curriculares, em cursos de nível superior e de educação profissional técnica e tecnológica, de temas relacionados à pessoa com deficiência nos respectivos campos de conhecimento;

XV – acesso da pessoa com deficiência, em igualdade de condições, a jogos e a atividades recreativas, esportivas e de lazer, no sistema escolar;

XVI – acessibilidade para todos os estudantes, trabalhadores da educação e demais integrantes da comunidade escolar às edificações, aos ambientes e às atividades concernentes a todas as modalidades, etapas e níveis de ensino;

XVII – oferta de profissionais de apoio escolar;

XVIII – articulação intersetorial na implementação de políticas públicas.

As escolas particulares que até então se esquivavam em atender a lei federal n.7853/89  em função do Artigo 8o que deixava uma brecha para o não cumprimento ou mesmo para um questionamento judicial, agora com a nova lei e alteração deste mesmo artigo, não restam dúvidas de que não só as escolas não podem recusar, cancelar, suspender, cobrar adicional dos alunos com deficiência, como também, precisarão dar todo o apoio pedagógico necessário, caso contrário, constituirá crime punível com reclusão de 2 (dois) a 5 (cinco anos ) de multa.

Diante disso a CONFENEM – Confederação Nacional dos Estabelecimentos de Ensino – tomou um atitude drástica, ajuizou junto ao Supremo Tribunal Federal uma ADI na busca de uma declaração da inconstitucionalidade do parágrafo 1o do artigo 28 e artigo 30, caput, da Lei 13.146/2015.

Mas o mais incrível ainda estava por vir:

O Sinepe/SC – Sindicato das Escolas Particulares do Estado de Santa Catarina -, divulga Carta Aberta à Comunidade Escolar iniciando com o seguinte texto:

“O QUE É PRECISO SABER SOBRE EDUCAÇÃO INCLUSIVA – ESTATUTO DO DEFICIENTE

RECENTEMENTE SANSIONADA, A LEI 13.146/2015, PUBLICADA NO DIÁRIO OFICIAL DA UNIÃO DE 7 DE JULHO PASSADO, INSTITUIU A LEI BRASILEIRA DE INCLUSÃO DA PESSOA COM DEFICIÊNCIA (ESTATUTO DA PESSOA COM DEFICIÊNCIA). O ASSUNTO É COMPLEXO DEMAIS PARA SER TRATADO SUPERFICIALMENTE, NA BASE DO SENSACIONALISMO E DO “POLITICAMENTE CORRETO” COMO VEM OCORRENDO, HAJA VISTA A QUESTÃO HUMANA E O ASPECTO EMOCIONAL CENTRADO NOS SENTIMENTOS QUE NATURALMENTE ENVOLVEM TODOS NÓS QUE CONVIVEMOS COM PORTADORES DE NECESSIDADES ESPECIAIS, SEJA NA PRÓPRIA FAMÍLIA OU NA COMUNIDADE.”

Como a carta é muito longa vou apresentar alguns pontos , mas o teor completo da carta poderá ser lido aqui.

 Visando fundamentar a total revolta contra a inclusão de crianças e adolescente com deficiência na escola particular, diz a carta:

“a)      alguém pode ser ministro do S.T.F. sem preencher os requisitos previstos no artigo 101 da Constituição da República?

b)      há condições de um autista ou alguém com idade mental reduzida e psicológica ser Presidente da República?

c)      é possível a um cego ser cirurgião ou piloto de avião?

d)      para um cardiopata ou vítima de câncer é suficiente o tratamento por um clínico geral ou posto de saúde de primeiro atendimento? Ou seriam apenas os encaminhadores aos especialistas?

e)      alguém sem braços ou sem pernas poderia jogar basquete ou futebol (nas paraolimpíadas são classificados ou agrupados conforme o tipo e grau de deficiência)? Por que simplesmente não inseri-los nos meios e disputas dos atletas que não têm limitação?

f)        uma clínica especializada em oftalmologia está obrigada também a atender patologias na área de cardiologia?

Continuando:

a)      há real inclusão social, carinho e amor ao deficiente, colocando-o numa escola comum, entre alunos comuns, simplesmente para satisfazer a um possível sentimento de culpa injustificável?

b)      pode, honestamente, uma escola comum certificar promoção, conclusão de nível ou grau de ensino, para quem foi impossível alcançar tal nível? Isso não seria uma enganação individual e coletiva? É bom lembrar que grande parte dessas escolas têm leigos como professores.

c)      escola regular é agência educacional e de ensino, que não se confunde com atendimento médico, físico ou mental, ou especializado, para os quais não está preparada e até lhe é proibido, pois não está autorizada a fazê-lo.”

E para finalizar :

“Nós não nos opomos à Lei 13.146/15, mas sim, à pretensão de fazer com que milhares de escolas comuns, PÚBLICAS e PRIVADAS, que não se propuseram a ministrar educação especial por falta de competência para fazê-lo, tenham obrigatoriamente que atender com garantia de sucesso os deficientes, de qualquer natureza, grau, variação ou profundidade.

Queremos ressaltar que somos favoráveis a políticas de inclusão na escola, desde que estas estejam devidamente estruturadas para oferecer esse serviço e que haja possibilidade de efetiva inclusão do aluno. Certamente surgirão na livre iniciativa escolas interessadas. Entendemos e defendemos que a política de inclusão, antes de tudo, deve zelar pelo interesse do educando portador de necessidade especial, cabendo ao gestor, de forma correta, analisar a possibilidade de um bom atendimento a este aluno na sua escola.”

“Não se inclui simplesmente colocando alguém no meio de uma maioria diferente, com que acabará não se interagindo e se integrando”

Esta carta foi entregue em cada escola particular catarinense com o seguinte mote:

Aos Diretores

Urge que a escola tenha o apoio da população.

É necessário esclarecer a comunidade sobre verdadeira inclusão e atendimento correto ao aluno portador de deficiência.

Valiosa é a participação dos pais nesse esclarecimento juntamente com todos os demais interessados no futuro da escola particular.

Evidentemente  o Sindepe/SC pretendia colocar os pais das escolas particulares  contra as crianças e adolescentes com deficiência, pois com a tal carta aberta buscava ter o apoio da população para garantir o futuro da escola particular.

O absurdo gritante fez com que pais de crianças e adolescentes com deficiência se manifestassem em torno da figueira da Praça XV de Novembro, em Florianópolis.  Além disso a OAB-SC  posicionou-se contra o Sindepe/SC e a 30ª Promotoria de Justiça de Defesa dos Direitos Humanos de Florianópolis cobrou retratação e o sindicato encaminhou nova carta visando esclarecer que a primeira dizia respeito apenas a apresentação das dificuldades que as escolas particulares encontram para cumprir a Lei Brasileira de Inclusão da Pessoa com Deficiência e desculpando-se quanto ao “eventual excesso da linguagem utilizada“.

A Carta Aberta Aberta à Comunidade Escolar do Sindepe/SC indignou o deputado estadual José Nei A. Ascari (PSD) que no dia 13/10/2015, protocolou na Assembleia Legislativa de Santa Catarina (Alesc) um projeto de lei n.0446/2015 (aqui)  que proíbe a cobrança de valores adicionais na matrícula ou mensalidade de estudantes com deficiência nas instituições privadas de ensino regular no Estado de Santa Catarina.  O descumprimento ao pagamento de multa de R$ 1.000,00 (mil reais) por infração, dobrada a cada reincidência. Os recursos das multas serão recolhidos em favor do Fundo Estadual de Educação (FEDUC).

Redação

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