A pandemia e a história do Brasil, por Fábio de Oliveira Ribeiro

Enquanto o fervor religioso de alguns pastores evangélicos menospreza a ciência, convém resgatar a importância da Companhia de Jesus na História do Brasil

Malafaia e outros pastores da mesma laia, tem feito tudo que podem [e o que não devem] para interromper a quarentena. Eles acreditam no poder curativo da fé e usam a internet para proclamar que o isolamento social é prejudicial. As igrejas deles devem ser reabertas porque apenas os fiéis que participarem dos cultos e pagarem o dízimo ficarão imunes do COVID-19.

É evidente que esses pastores fanáticos estão mais preocupados com o espaço político que conquistaram. O que eles querem na verdade é reunir multidões para pregar em favor do Capitão Corona. O desprezo que alguns deles nutrem pela ciência é evidente. O fervor religioso deles tem uma natureza diferente daquela que orientava as ações dos jesuítas. Portanto, nesse momento convém resgatar a importância que a Companhia de Jesus desempenhou na História do Brasil.

“Porque os jesuítas cultivaram as ciências com um zêlo utilíssimo. Descuidosos aparentemente da medicina, fizeram-se os médicos mais e prontos da natureza. Desinteressados – dir-se-ia – dos fatos da natureza, foram botânicos exímios, grandes plantadores, os mestres da genética vegetal no aclimar as espécies exóticas e melhorá-las em novo ‘habitat’.” (Espírito da Sociedade Colonial, Pedro Calmon, Companhia Editora Nacional, São Paulo, 1935, p. 122)

“Dos índios aprenderam o emprego de infinitas ervas medicinais, cujas virtudes ensinaram aos outros jesuítas, dos 180 colégios, dos 90 seminários, das 160 residências, quantos havia, espalhados pelo mundo no fim do século XVII”. (Espírito da Sociedade Colonial, Pedro Calmon, Companhia Editora Nacional, São Paulo, 1935, p. 122/123)

Apesar das evidências científicas, Jair Bolsonaro e os amigos dele têm defendido o uso da hidroxicloroquina no tratamento dos pacientes da pandemia. Esse medicamento é ineficaz e já causou vários óbitos.

Ao fazer o juramento de Hipócrates, dentre outras declarações voluntárias solenes os médicos afirmam que “A saúde e o bem-estar de meu paciente serão as minhas primeiras preocupações” e “ Guardarei o máximo respeito pela vida humana”. É evidente que os médicos não podem usar seus pacientes como cobaias sem ferir esses juramentos. Em hipótese alguma eles devem permitir que considerações políticas ou mercantis condicionem os tratamentos prescritos aos pacientes.

Bolsonaro e seus capangas tentaram obrigar o Ministro da Saúde a receitar hidroxicloroquina às vítimas do COVID-10. Mandetta fez bem ao não se deixar influenciar por um presidente canastrão ignorante que despreza a vida humana. Os ideólogos do bolsonarismo desejam usar os brasileiros como cobaias para garantir os lucros do fabricante daquele medicamento. Algo semelhante já ocorreu no Brasil imperial.

“Pessoas esclarecidas compreendem o perigo que as águas estagnadas podem causar a população. Experiências anteriores haviam sido dolorosas; a varíola assolara a cidade em 1820. Em anos anteriores (1825, 1828, 1834, 1836) outras enfermidades de caráter epidêmico varreram a urbe. A escarlatina fez numerosas vítimas em 1837, em 1842-1843 e voltariam ainda em 1849. A cidade não dispõe ainda do serviço de esgotos. As águas da chuva concentram-se nas ruas esburacadas. Os recursos médicos são escassos. O Instituto Vacínico, reformado em 1845, é mal aparelhado e insuficiente para atender à população da cidade e das províncias. O anunciante de certo colégio para meninos, situado na Tijuca, ‘a 2 léguas da capital […] offerece a par da instrucção o gozo de um ar puro, excellente abrigo contra as molestias que ora afligem a cidade’ (JC – 11/3/1847). A propósito, no começo de 1847 noticia-se a ‘creação do Nosocomio Homeopático, uma casa de saúde para tratamento de escravos enfermos’, localizada ‘no princípio do morro do Castello, com entrada pela ladeira n. 4’. Dispõe de ‘grande chacara’ e os enfermos, visitados diariamente ‘por hum professor omeopático’ contribuem com 60 réis mensais (JC -2/1/1847). Vê-se como a homeopatia é acreditada e sua terapêutica usada até no tratamento dos doentes mentais. É provável que, neste caso, também o escravo fosse utilizado para algum novo tratamento em experiência.” (O Rio Antigo nos Anúncios dos Jornais, Delso Renault, Livraria José Olympio Editora, Rio de Janeiro, 1969, p. 212/213)

Nos últimos dias, o Parlamento brasileiro rapidamente aprovou um Projeto de Lei determinando o pagamento emergencial de uma quantia aos trabalhadores informar afetados economicamente pela pandemia. Após alguma resistência, Bolsonaro promulgou a nova Lei, mas o cumprimento dela está sendo protelado pelo Ministro da Economia.

Sempre que se manifesta, Paulo Guedes demonstram um desprezo doentio pelos pobres. Quando entra num avião ele os reconhece pelo cheiro. Segundo eles os pobres existem apenas para trabalhar e para divertir os ricos.

O critério que Paulo Guedes usou para tratar os banqueiros (liberação imediata de 1,2 trilhões de reais sem exigência de qualquer contrapartida) é obviamente diferente daquele que ele pretende usar em relação aos beneficiários da renda emergencial (retenção do pagamento sob alegação da inexistência de recursos). Sendo assim, o Ministro da Economia já fez tudo o que é necessário para merecer a reprimenda enunciada pelo visconde de Albuquerque:

“Antonio Francisco de Paula e Holanda Cavalcanti de Albuquerque, visconde de Albuquerque, que foi senador de 1830 a 1863, e um dos estadistas do Império que sobraçou maior número de pastas ministeriais, era temido no Senado pela franqueza com que julgava, incisivamente, os homens e os fatos.
Certa vez, em 1848, acabava um dos membros do govêrno de dar, da tribuna, informações sôbre a grave situação do país, quando o visconde se ergueu:
Senhor presidente! – começou – O país vai mal, e o estado não melhorará enquanto não se enforcar algum ministro. Tenho dito.
E sentou-se.” (O Brasil Anedótico, Humberto de Campos, Livraria José Olympio Editora, Rio de Janeiro, 1936, p.199/200)

De tudo que foi exposto até aqui podemos concluir que os pastores evangélicos não conseguirão desempenhar um papel histórico tão positivo e relevante quanto os jesuítas. As deficiências éticas que Bolsonaro tentou explorar apoiando o uso de hidroxicloroquina estão deixando de existir. A situação geral do Brasil vai melhorar apenas depois que Paulo Guedes for enforcado.

Os cientistas garantiram que o COVID-19 não foi criado em laboratório. A natureza criou o vírus. Portanto, devemos admitir a hipótese de que a natureza também pode ter criado uma cura para a doença que ele provoca. Não seria o caso dos cientistas começarem a fazer o mesmo que os jesuítas? Talvez os índios tenham conhecimento de alguma planta medicinal que ainda não foi estudada e que mereça ser objeto de atenção científica.

Fábio de Oliveira Ribeiro

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