A Zica do Zika: Tsunami Sanitária à Vista, já no recuo das águas…

“Não engravidem agora. Esse é o conselho mais sóbrio que pode ser dado” [Cláudio Maierovitch, do Ministério da Saúde].

A microcefalia é uma malformação congênita em que o cérebro do feto não se desenvolve como deveria, ficando menor do que o tamanho convencional. Além do risco de morte, em 90% dos casos traz sequelas graves para os bebês que sobrevivem, como retardo motor, psíquico e neurológico.

Até então, os casos suspeitos de microcefalia não passavam de 150 por ano no Brasil. Em 2015, já são mais de 1200 ocorrências em recém-nascidos de pelo menos 311 municípios em 13 estados brasileiros (atualizado em 28/nov) e continuam aumentando, principalmente na região Nordeste. A epidemia fez o Governo decretar emergência nacional.

“O que estamos vendo aqui são casos em que os bebês foram formados corretamente, mas houve uma infecção no período de gravidez. Um surto de microcefalia nessa proporção não é descrito em canto nenhum no mundo, independente do agente que causa. Agora, uma geração está prejudicada, com sequelas. É uma coisa muito séria. E a gente sabe dos problemas emocionais, sociais e econômicos que isso vai causar, da repercussão disso durante muito tempo e, para aquelas famílias, durante toda a vida da criança.” [Maria Angela Rocha, HUOC/PE].

O Ministério da Saúde confirmou nos últimos dias a relação da doença com a infecção de gestantes pelo zika vírus, algo inédito na pesquisa científica mundial. O seu vetor de contaminação é o Aedes aegypti, mesmo mosquito transmissor da dengue. Uma razão a mais para se preocupar, dada as dificuldades do país em conter sua proliferação.

“A única ferramenta efetiva para combater a doença é controlar o vetor. A gente tem sido derrotado constantemente. O mosquito tem ganhado a batalha há muitos anos” [Marco Aurélio Safadi, Santa Casa/SP].

Como agravante, é quase certo que os dados de contagio por zika estejam subestimados. Por ser uma doença nova e até então entendida como branda, não foi colocada na lista de notificações compulsórias do Ministério da Saúde. Isso sem falar que em 82% dos contaminados ela se desenvolve silenciosamente, sem apresentar qualquer sintoma, segundo estimativas do próprio MS (obs: há também suspeitas da relação do vírus com outras complicações neurológicas, como a síndrome de Guillain-Barré)..

O perigo maior é a infecção nos primeiros três meses de gravidez, período de formação do sistema nervoso do feto. Isso explicaria os surtos agora, com os partos em até seis meses depois do pico da epidemia de zika no Nordeste, entre abril e maio – hipótese avaliada por Joaquim Molina (OPAS). Por essa lógica, existe a possibilidade de redução do ritmo de crescimento dos casos de microcefalia em recém-nascidos, para voltarem com tudo no ano que vem, nesse mesmo período.

Para Valcler Rangel, da FioCruz, uma “tsunami sanitária à vista”, já naquela fase que antecede a onda, em que as águas do mar estão recuando

Isso se não tivermos uma ação forte, como nunca antes no país, com uma ampla articulação entre União, estados e municípios, campanhas de informação, e a mobilização de toda sociedade brasileira contra o mosquito Aedes aegypti (ainda mais com o verão e a época de chuvas chegando), mesmo que nem todas as hipóteses estejam comprovadas.

O que também assusta, além do vírus, é a surpresa, a descoberta só no momento do parto após meses de gestação, e a falta ainda hoje de um diagnóstico mais preciso para uma situação tão grave como esta. E tão nova, como outras que podem vir a surgir.

Enfim, a nossa fragilidade diante de uma ciência no mundo mais voltada a nos mostrar os avanços, sem se ater como deveria nos atrasos, nos focos que demandam mais investimentos em pesquisa, sobretudo os que ocorrem nas regiões mais pobres.

Que zica…

Redação

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