Afinal, para quem estamos falando?

Recentemente, acompanhando as redes sociais, vi uma postagem recorrente entre os meus amigos, muitos deles militantes respeitados de partidos de esquerda e movimentos sociais: uma réplica de uma publicação do pastor Silas Malafaia, afirmando que o eleitor apóia o casamento gay se vota no candidato à prefeitura do Rio de Janeiro pelo PSOL, Marcelo Freixo. O discurso dessas pessoas sobre a postagem de Malafaia é o mesmo: “Obrigado, pastor! Assim, embora queira nos atrapalhar, você nos ajuda”.

A recorrência desse tipo de manifestação me preocupou, não porque discorde do fato de que a afirmação do Malafaia evoca uma característica extremamente positiva de Marcelo Freixo, primordial é quem quer governar sob os preceitos da luta por dignidade para as minorias e pelo cumprimento dos direitos humanos. Entretanto, causa estranheza porque mostra o quanto nós, correligionários na dita “esquerda”, temos a percepção de que o mundo vai compreender o que nós falamos e concordamos em nossas discussões internas.

Ora, se está claro para nós que, se Freixo vai atuar por mais dignidade para homossexuais, mulheres, negros, pela mobilidade urbana e outras tantas pautas que nos são caras, fica o questionamento sobre como isso reverbera na classe média que não está nas nossas rodas de discussão, assim como, e principalmente, na população mais pobre. Afinal, estamos falando de segmentos da sociedade cuja maior parte não tem acesso aos debates que ocorrem no âmbito da sociedade civil organizada e, sobretudo, das universidades.

O exemplo do prefeito de São Paulo, Fernando Haddad, do PT, é salutar. Afinal, mesmo muitíssimo bem avaliado pelos principais núcleos técnicos e formadores de opinião, como o ambiente universitário, arquitetos e urbanistas, movimentos sociais e de minorias, Haddad perdeu a eleição em primeiro turno para um representante da burguesia paulista que sequer compreende as demandas da periferia paulistana. Isso me ajuda a compreender a militância da qual faço parte como entravada por um problema que sempre me incomodou: falta de interlocução com o grande público.

Como faremos para convencer o trabalhador das 8h às 18h, aquele que sonha com uma vida melhor, que compra as promessas de prosperidade do pastor Malafaia, de que sua palavra contra Freixo é, na verdade, a favor. O pastiche das esquerdas soa, neste caso, como a insistência na festa de um navio de cruzeiro que está afundando. Afinal, atentar-se para a água no barco é preocupar-se, de fato, com o poder das palavras do pastor e de como, de alguma maneira, ela pode ser desconstruída.

Como conseguir a empatia do público menos identificado com a nossa causa para as nossas pautas? Não é incorrendo ao deboche e à empáfia contra uma das principais ameaças à nossa democracia.

Eis o desafio.

Redação

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