Antes de Arkham, por Lg Razz

Por Lg Razz

Às vezes sinto que não tenho poder de escolha sobre quem eu sou.

Não escolhi minha aparência; meus genes a montaram.

Não escolhi o ventre que me conceberia; foi o destino que o sorteou.

Não escolhi meu temperamento; a vida que me temperou. (Ouch, isso foi bem gay.)

Eu não escolhi. Estou aqui porque estou aqui.

Quando pesquisamos muito a fundo, encontramos esse problema: o de nos depararmos com a chama da vida porém sem saber daonde veio a faísca que a acendeu. E nesse tresvariar perdemos tempo precioso. Tudo precisa ter um motivo? Uma razão de ser? Por que não sentir e ponto? Sentir é muito mais gostoso do que explicar. Gastar tempo onde só se tem o vazio – pra quê? Pra que ser o cientista se você pode ser o aventureiro?

“Você filosofa demais, Luís. Credo!”

E era uma vez minha ex-namorada.
A Luísa estava certa. E sem um “a” mais, sem esse “a” mais ao final do meu primeiro nome, calo-me.

– você só pode tá de brincadeira.

O dia que vocês me virem ouvindo vozes das minhas ex’s e assentindo com elas, peço que tomem as devidas providências. Então antes que eles possam ter a chance de me levar pro hospício, faça-me o favor de meter uma bala na minha testa. Esquizofrenia eu aceito de bom grado. Agora ser pau-mandado pros fantasmas do passado? Não, obrigado.

Um bom homem não escuta murmurinho de ex. Bem, se eu disser que não a tenho ouvido, estarei mentindo. Tem havido um diálogo, admito. E largue a droga do telefone, prometo ir praonde tenho que ir, que seja pra Arkham, sei lá, apenas me deixe terminar o monólogo. Sou bom em monólogos e não gosto de ser interrompido. E o médico disse o que tinha que dizer: “não contrariem o Luís”.

Enfim.

Sim, eu filosofo.

Todo bom homem, no auge de sua simplicidade, tem em si a vontade de protagonizar num filme. É. Aquela ideia absurda de que ele é peça fundamental no tabuleiro. O problema é que poucos tem o que é preciso pra desempenhar o papel. Estou falando algo destoante?

“Credo, Luís.”

(Cruiz crédo, né, meu bem.)

A vontade nós temos. Já poder de escolha, não. Concretizamos nossas vontades. Já o desejo de poder escolher, não.

“Filosofa demais.”

(Não gostou, só me bloquear. Pera, você já não fez isso?)

Por mais frustrante, debil-itante, irritante, e desgastante que pareça, é preciso olhar o lado bom. Ok, ter a lâmpada e não ter o gênio é uma bosta. E se fosse pelo lado bom, eu já teria pirado de vez. E se não fosse pelo lado bom, iria pelo lado ruim mesmo.

“Luís!”

(Pelo amor de Deus, cala essa maldita boca!)

“…”

(Grato. E sim, eu filosofo.)

Como eu ia falando…

A consolação é que temos pra hoje, e a consolação é a de termos o lado bom.

Eu não posso mudar meu cenário, muito menos acrescer zeros à minha conta bancária. Mas eu posso pensar.

Faz bem pensar. Pra mim faz.

Não pensar no que já pensaram. Não pensar o que normalmente pensam. Tudo que é ideia que provém de uma informação já padronizada e mastigada me soa como algo irritante. É tudo do mesmo e nada se inova. É como se estivéssemos emburrecendo por não haver muito mais o que pensar. E quando pensamos não estamos pensando no sentido literal. Estamos pensando mecanicamente, como robozinhos, escravos do cotidiano. A maioria consente caladamente.

Já eu, não.

O escape é justamente pensar. Me sujeitar aos estereótipos soa como uma ideia preguiçosa e catatônica a longo prazo. Animais não saberiam fazer essa distinção. Então seres humanos que podem e não a fazem são o que? Um saco de merda? Gosto de pensar que sim.

Cada um com seu meio de romantizar seu dia-a-dia. Eu com o meu. Daí eu gostar de pensar que sou rodeado por bestas ambulantes que estão mais pra sacos de merda do que pra gente. E adivinha quem é o herói no meio de tanta massa acefálica? O Gabriel, eu mesmo, o pensador. Não, não o que rima. Eu sou o que escreve e nunca é lido. Sou o Pensador às vessas. Lembra de mim? É claro que não; meus textos eu devo tá publicando na porra de um mural no meio da porra das areias da porra do Saara, porque não tenho tido muitos leitores. Aliás nenhum leitor mesmo. Nenhum. Acho que até os revisores de conteúdo do Facebook cansaram de mim. Antes era novidade, agora é encheção de saco.

No meio da droga de um deserto, ninguém por perto. Mas eu ainda posso ouvir uma voz.

“Você filosofa demais, Luís. Credo!”

E eu respondo: – vc só pode tá de brincadeira

Agora… pra que lado fica o hospício mesmo?

Luísa, você vem também.

 

Redação

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