As regras para setor de serviços

Da Agência USP

País carece de regras para setor de serviços, aponta estudo

Beatriz Amendola / USP Online
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Comércio de serviços é responsável por cerca de 60% do Produto Interno Bruto (PIB)

O grupo Serviços e Desenvolvimento, da Faculdade de Direito (FD) da USP,estudou entre junho de 2008 e o início de 2010 como são feitas as negociações do setor de comércio de serviço no Brasil, relacionando-as ainda à questão do desenvolvimento.

Não tão conhecido como o comércio de bens, sempre em destaque na mídia em virtude de disputas e negociações internacionais, o comércio de serviços abrange uma parcela significativa da economia de diferentes países, como o Brasil – na qual é responsável por cerca de 60% do Produto Interno Bruto (PIB).

OintO interesse em pesquisar o tema partiu da lógica diferente do comércio de serviços que, ao contrário do comércio de bens, tem uma negociação que vai além do debate sobre tarifas e impostos. Envolve alterações na própria legislação do país, que podem ou não abrir o mercado de serviços a empresas privadas e estrangeiras. “[O comércio de serviços] é muito mais delicado e mais sensível. Quando se mexe com legislação, isso vai desde normas das mais simples até a Constituição. Obviamente, isso até interfere na questão da soberania do país”, afirma o professor Umberto Celli Junior, que é líder do grupo e já vem pesquisando o tema desde 2002.

Dentro desse universo, o grupo, composto por mais dois pesquisadores da FD e um mestrando, optou por delimitar a pesquisa aos campos dos serviços ambientais e financeiros, que foram identificados como setores essenciais ao desenvolvimento e, por isso, de grande sensibilidade social.

Serviços ambientais
A questão dos serviços ambientais atinge uma ampla gama de áreas, tais como captação de carbono, manejo de resíduos sólidos e a manutenção de plantações que não sejam lesivas ao ambiente. Contudo, as pesquisas focaram-se em dois cortes específicos, relacionados ao tema da infra-estrutura ambiental: o saneamento básico e a distribuição de água.

Segundo o professor da FD, essa opção deveu-se à fato de ser uma área que ainda precisa de muito investimentos no Brasil, onde menos de 50% da população tem acesso a esgoto tratado. E que, por isso, poderia tornar-se alvo de negociações comerciais na Organização Mundial de Comércio (OMC), uma vez que o Estado sozinho não pode arcar com todas as despesas necessárias.

Um dos primeiros obstáculos com que o grupo se deparou foi a ausência de leis claras a respeito de quem é responsável pelo saneamento – tanto os governos estaduais quanto os municipais podem se encarregar disso – o que compromete a qualidade dos serviços. “A Sabesp, que é uma empresa do estado de São Paulo, presta serviços para a cidade de São Paulo e para outras cidades da região metropolitana, mas não para algumas do ABC paulista. E esses municípios às vezes não tratam a água adequadamente e acabam poluindo o [rio] Tietê”, diz Celli, exemplificando a imprecisão que pode ocorrer.

O professor conta que durante as pesquisas foi encontrada uma lei federal, criada em 2007, que tenta organizar o saneamento, estabelecendo diretrizes a serem seguidas por estados e municípios. Contudo, até o término da pesquisa, em 2010, a norma não havia sido regulamentada. A criação, porém, não deixa de ser um sinal positivo: “o governo percebeu o déficit em matéria de saneamento”, constata.

Além disso, descobriu-se ainda que não há qualquer tipo de restrição à entrada de capital privado ou estrangeiro nesse setor. “Em grande parte dos municípios pesquisados, as empresas eram municipais. Mas nós descobrimos alguns municípios com empresas privadas nacionais, e alguns, poucos, que outorgaram as licenças para empresas controladas por estrangeiros”, conta Celli.

Para ele, a pesquisa indicou que é necessário mudar essa situação de “balbúrdia legislativa” caso o Brasil deseje assumir compromissos no exterior, criando-se um quadro normativo transparente, que regulamente não só as disputas entre estados e municípios pelo controle do saneamento como também a participação de empresas privadas e estrangeiras. “E essas regras têm que pensar na inclusão social e na universalização do acesso, que é o requisito básico. E aí que está a questão do desenvolvimento”, afirma.

Serviços financeiros
A segunda parte da pesquisa, relacionada à questão de serviços financeiros, tinha como objetivo estudar o funcionamento do sistema financeiro do Brasil e, em particular, a questão da concessão de créditos, dando continuidade a um estudo que Celli havia conduzido anteriormente, sobre as relações entre serviços financeiros e inclusão social.

Entretanto, a crise financeira global que eclodiu em 2008 fez com que o estudo tomasse outro rumo. “Os papers acabaram revelando o que foi feito e que não deveria ter sido feito lá nos EUA para que essa crise não eclodisse, os efeitos que ela causou no resto do mundo e as lições que se poderiam extrair para o Brasil”, conta o professor.

Continuação
Celli afirma que pretende dar continuidade às pesquisas sobre comércio de serviços e a relação com o desenvolvimento. Entretanto, ainda não definiu qual será a abordagem. “Não tenho muito claro qual vai ser o tema da próxima pesquisa. O que tem me preocupado é a celebração de acordos bilaterais, que contêm temas que vão muito além dos propostos na OMC.”

Os resultados completos da pesquisa podem ser encontrados na página do grupo dentro do site da FD.

http://www.usp.br/agen/?p=45290

Luis Nassif

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