Azeredo e o AI-5 digital

Por Marco Antonio L.

Do Terra

Azeredo: chamar projeto de AI-5 Digital é uma besteira histórica

24 de agosto de 2011  09h47

Deputado Eduardo Azeredo defende o PL 84/99 sobres crimes cibernéticos. Foto: Divulgação

Deputado Eduardo Azeredo defende o PL 84/99 sobre crimes cibernéticos
Foto: Divulgação

Laryssa Borges – Direto de Brasília

Analista de sistemas e ex-governador de Minas Gerais, o deputado federal Eduardo Azeredo (PSDB-MG) utiliza quase que diariamente ferramentas como o Skype, YouTube, Twitter e Facebook. Atualiza suas atividades parlamentares pela rede mundial de computadores, mas não se arrisca a baixar músicas na web. “Nunca baixei música, nem sei”, diz o político que, por mais um ano, está envolvido na relatoria do polêmico projeto que criminaliza práticas cometidas por meio da internet.

Para os críticos, ao estabelecer 12 novos crimes cibernéticos, Azeredo busca impor à sociedade um “AI-5 Digital”, referência ao ato institucional baixado em 1968 pelo general Arthur da Costa e Silva e que instituiu poder de exceção aos governantes para punir arbitrariamente os classificados como inimigos do regime. “Isso é uma besteira histórica”, rebate o deputado. “Acho que existe uma minimização por parte de alguns críticos dos prejuízos que existem com os crimes cibernéticos sob esse argumento de preservação da liberdade, quando na verdade a liberdade não está sendo atingida. O projeto busca garantir a liberdade das pessoas de usar o computador sem essa interferência indevida”, explica.

Diante dos recentes ataques de hackers e crackers a sites de governo, o deputado rejeita o que classifica de “purismo” contra os invasores. Parte deles, avalia o parlamentar, são incentivados quando invadem sites para fazer manifestos em prol de uma causa. “Os hackers que estão atacando e invadindo sites estão tirando do ar empresas que precisam desse site para funcionar, e o governo, que precisa dar essas informações para a população. Então não há de se falar nessa defesa, nesse purismo de hackers. Hackers são hackers, alguns de maneira autorizada podem até utilizar para o bem, mas o fato é que hackers são hackers, e os exemplos (de invasão de sites) têm se multiplicado”, diz.

Pelo projeto relatado pelo deputado Eduardo Azeredo, por exemplo, passa a ser crime a divulgação ou utilização indevida de informações e dados pessoais por hackers ou usuários comuns. A sanção não inclui, no entanto, segundo o deputado, a criminalização de cópias de vídeos ou músicas por usuários na internet. A penalização para cópias não autorizadas de músicas, prevista no rol de “violação dos direitos de autor”, já está incluída na Lei Anti-Pirataria, de 2003.

“A prática no Brasil é realmente que as pessoas baixem música sem pagar um dólar que o americano paga. É uma prática que se disseminou, mas que não é abordada por esse projeto. Nesse caso, tem outra lei que trata sobre música. É correto baixar música sem pagar direitos autorais pelo autor? Segundo a Lei de Pirataria não”, explica.

As críticas ao projeto sobre condutas autorizadas na internet incluem ainda o armazenamento pelo prazo de três anos de dados de endereçamento eletrônico de computadores, classificados pelos críticos como quebra de privacidade, e a adoção de penas de reclusão muito altas para delitos que não comportariam a mesma gravidade.

Calejado pelas críticas, que deverão ser novamente endossadas em mais uma rodada de debates nesta quarta-feira em um seminário na Câmara dos Deputados, Eduardo Azeredo rejeita a hipótese de a privacidade dos usuários estar em risco e minimiza a escolha de penalidades supostamente muito altas para os crimes. Ao Terra ele explica os principais pontos do polêmico projeto sobre crimes cibernéticos:

Terra – Uma das críticas ao projeto relatado pelo senhor é a necessidade de armazenamento de logs pelos provedores pelo período de três anos. Alguns críticos apontam isso como o risco de violação da privacidade. Qual sua opinião? 
Eduardo Azeredo – A definição do prazo de três anos foi em função de um levantamento junto dos próprios órgãos de investigação do Brasil que consideraram que, tendo em vista a morosidade conhecida de processos, três anos seria um prazo bom. É um prazo praticado pelas empresas, pelos provedores no caso de pedofilia. Alguns interpretam como se fosse informação de conteúdo. Não é. É apenas a mesma informação que existe no caso de telefone. Ou seja, o telefone ligou para qual telefone? Não o teor da conversa. Assim como as telefônicas já guardam hoje e só fornecem sob determinação judicial também se prevê no caso da internet que só se fornecerá por determinação judicial o IP do computador que estava ligado naquele momento. As autoridades policiais consideram fundamental que se tenha o IP, senão não tem como chegar à origem daquele ato criminoso.

Terra – Mas não é possível rastrear o conteúdo? 
Azeredo – Com determinação judicial pode (rastrear o conteúdo), assim como pode gravar. O computador pode, por suspeita e se a Justiça autorizar, ser alvo de grampeamento. É melhor isso com a justiça do que fazer com hacker.

Terra – Qual seria o custo de armazenamento desses logs? 
Azeredo – O objetivo é você dar condições de enfrentamento dos crimes. O custo de armazenamento não é significativo. Até pequenos provedores têm condições hoje de gravar, já que está se falando de gravar apenas o IP. Não se fala em gravar conteúdo. Hoje, com os processos de miniaturização e com os chips com tanta capacidade, não é custo que seja tão significativo. É perfeitamente comportável dentro do benefício que traz, que é exatamente o combate aos crimes digitais.

Terra – Outra crítica que fazem ao projeto relatado pelo senhor é a severidade das penas. A pena de invasão de domicílio, por exemplo, é de um mês a dois anos, enquanto a de acesso não autorizado na Internet pode chegar a até três anos, mais multa. 
Azeredo – São prazos razoáveis e são compatíveis. O juiz sempre leva em consideração o mínimo e o máximo.

Terra – O projeto relatado pelo senhor fala em punição no caso de “obtenção, transferência ou fornecimento não autorizado de dados ou informação”. Isso inclui proibição em baixar músicas? 
Azeredo – Isso não inclui as músicas, porque as músicas utilizam o aparelho próprio da pessoa. O texto se refere a obter de forma fraudulenta, obter sem autorização das pessoas. A questão da música já está definida na Lei de Pirataria, que já existe há muitos anos. Essa é uma mentira que tem sido divulgada com o intuito de tumultuar e desinformar as pessoas sobre os reais objetivos do projeto de tipificação dos crimes cibernéticos.

Terra – O projeto prevê pena para utilização indevida de dados pessoais na web. Isso inclui o quê? 
Azeredo – Inclui o phishing, que é quando as pessoas mandam e-mails tentadores para conseguir a informação e depois praticar algum ilícito com essa informação. Não vale para música, vídeos. O objetivo do projeto é tipificar crimes para punir criminosos. Quem não está agindo de maneira criminosa não tem o que temer. O usuário comum não será criminalizado.

Terra – Por que então há tantas críticas ao projeto? 
Azeredo – Quem é contra o projeto são alguns mais teóricos que fazem realmente uma gritaria danada. Existem dois tipos de críticos: uns acreditam que não deve ter nenhuma legislação, que a atual legislação já atenderia, o que é contestado por quem pratica a Justiça no dia a dia, que são os juízes e desembargadores; a outra linha é de pessoas que querem contestar o projeto em si, que não concordam que tenha projeto. A essa altura, com tantas mudanças já feitas, eu só posso considerar que seria uma questão de vaidade política e de exploração política no projeto.

Terra – Por que não é melhor se aprovar primeiro o marco civil da Internet, prevendo os direitos e deveres do usuário, antes de se elencar que determinada atitude é crime? 
Azeredo – Quando criamos as penas da área de meio ambiente não se fez antes um marco civil do meio ambiente. Quando nós alteramos o Estatuto da Criança e do Adolescente com a questão da pedofilia na internet ninguém levantou que precisava primeiro de um marco civil. Este argumento foi colocado de apresentarmos um marco civil, aprovarmos o marco civil primeiro e depois fazermos o projeto. Só que se passaram três anos. Já disse que assino o marco civil embaixo. É uma dissertação sobre a internet, mas não é incompatível com o projeto.

Terra – O senhor já foi vítima de crimes cometidos por meio da Internet? 
Azeredo – Já tive cartão de crédito clonado. Toda hora a gente recebe phishing (dizendo) ‘você é lindo’. Eu sei que não sou lindo, então eu sei que aquilo é falso. Quase todo mundo hoje acaba sendo atingido também. Acho que existe uma minimização por parte de alguns críticos dos prejuízos que existem com os crimes cibernéticos sob esse argumento (de preservação da liberdade) quando na verdade a liberdade não está sendo atingida.

Terra – A Convenção de Budapeste, assinada para tentar frear os cibercrimes, poderia ajudar o Brasil? Ele não é signatário. 
Azeredo – Quando tem alguém que critica dizendo que é um tratado que não funciona, que é coisa dos americanos, é na mesma linha das críticas (ao projeto). A convenção é na verdade um guia e procura fazer essa troca de informações entre os países. É sabido que muitos dos crimes são cometidos fora do Brasil. A legislação brasileira é uma necessidade, a assinatura da Convenção de Budapeste é outra necessidade para facilitar o intercâmbio de informações com as polícias de outros países. O avanço no uso de tecnologias, que os provedores têm feito, é outra questão importante. Tenho consciência de que não é só o projeto que vai resolver, mas sem o projeto ficamos à mercê dos fatos.

Luis Nassif

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