Bolsonaro se encontrou com Witzel e Toffoli antes de reportagem do Jornal Nacional

Presidente acusa governador do Rio de Janeiro de vazar informações de inquérito sigiloso sobre o caso Marielle; Witzel nega

Jornal GGN – Alguns dias antes de ir ao ar a reportagem do Jornal Nacional sobre a suposta ligação entre Jair Bolsonaro e suspeitos de terem assassinado a vereadora Marielle Franco, o presidente da República se encontrou com Wilson Witzel.

Bolsonaro acusa o governador do Rio de Janeiro de ter vazado, para a o jornal da TV Globo, informações de inquérito que segue em segredo de justiça. Na sua versão, ele conta:

“No dia 9 de outubro, às 21 horas, eu estava no Clube Naval do Rio de Janeiro quando o governador Witzel chegou para mim e disse: o processo está no Supremo”, disse. “Que processo? O que eu tenho a ver? E o Witzel disse que o porteiro citou meu nome. Ele sabia do processo que estava em segredo de Justiça”, completou.

As declarações de Bolsonaro foram feitas no noite de terça-feira (29), logo após ir ao ar a reportagem do Jornal Nacional, segundo a qual um dos acusados de dirigir o carro usado no assassinato de Marielle, Élcio Queiroz, esteve no condomínio de Bolsonaro no dia do crime. Segundo o porteiro, Élcio teria dito que iria até a casa do presidente, que na época era deputado federal.

A Folha de S.Paulo aponta, entretanto, incongruências no relato de Bolsonaro. Segundo o jornal, por volta das 21h do dia 9 de outubro, uma quarta-feira, o presidente da República estava, na verdade, em Brasília, mais exatamente Clube do Exército, em um evento que comemorava antecipadamente o aniversário de 67 anos do ministro Augusto Nardes, do Tribunal de Contas da União (TCU).

O governador Wilson Witzel também estava no local. Ele e Bolsonaro foram vistos conversando. “No salão envidraçado do Clube do Exército, em Brasília, uma pequena roda entre os convidados se desfez e o governador [Witzel] conversou a sós durante menos de dez minutos com o presidente Jair Bolsonaro (PSL), num canto que dava para o jardim”, relatam os jornalistas Talita Fernandes e Gustavo Uribe, da Folha.

“Embora o jantar em comemoração ao aniversário de Nardes não estivesse na agenda do presidente, a reportagem da Folha estava no local e presenciou o encontro”, prosseguem.

Os jornalistas contam que, Witzel e Bolsonaro, conversaram em separado, a uma distância de cerca de 100 metros, do lado de fora do salão. “O gesticular deles deixou transparecer que os ânimos estavam exaltados”, completam. Minutos depois da conversa, o presidente deixou a festa.

Relatos de pessoas ouvidas pela reportagem dizem que, a partir dessa conversa, Bolsonaro passou organizar sua reação um possível vazamento da informação de que o porteiro menciona seu nome nas investigações que apuram o assassinato da vereadora Marielle.

O presidente foi orientado a responder prontamente, assim que o vazamento ocorresse na imprensa. O que ele fez, ainda na madrugada do dia 29 de outubro, após a reportagem do Jornal Nacional, na saída do hotel em Riad, na Arábia Saudita. Em tom de indignação, o presidente desferiu ataques contra Witzel e a TV Globo, afirmando que caso se tratava de uma “patifaria” para derrubá-lo.

A reportagem da Folha destaca ainda que, apesar de Bolsonaro ter dito que encontrou Witzel no dia 9, no estado do Rio de Janeiro, os dois só se viram em território fluminense dois dias depois. No dia 11 de outubro (sexta-feira), eles participaram da cerimônia de Integração do Submarino Humaitá, em Itaguaí, há 90 Km de onde fica o Clube Naval.

Na ocasião, Bolsonaro fez um discurso onde declarou: “Trabalho para que, no futuro, quem porventura, de forma ética, moral e sem covardia, venha a assumir o destino da nação encontre a pátria numa situação muito melhor do que encontrei.” A passagem “de forma ética, moral e sem covardia” foi pronunciada olhando para Witzel.

Alguns dias depois, em 16 de outubro, Bolsonaro ainda recebeu 3 ministros do Supremo Tribunal Federal no Palácio do Planalto. Primeiro, Alexandre de Moraes e Dias Toffoli, em uma audiência, e depois, em separado, Gilmar Mendes.

Os encontros não estavam previstos na agenda oficial do Planalto. Só foram inseridos no final do dia, e o tema das conversas não foi divulgado. A reportagem do Jornal Nacional fala também que, no dia 17 de outubro, o presidente do Supremo, Dias Toffoli, teria recebido integrantes do Ministério Público Federal do Rio de Janeiro para tratar da menção de Bolsonaro na investigação sobre o assassinato de Marielle.

Alguns dias depois, no dia 19 (sábado), às vésperas do embarque para uma viagem de 12 dias para países da Ásia e do Oriente Médio, que termina nesta quinta-feira (31), o presidente se encontrou, entre 8h e 9h, com seu advogado Frederico Wassef e, por volta das 16h30, com o procurador-geral da República, Augusto Aras. Esses dois últimos compromissos não foram registrados na agenda oficial da Presidência.

Cronologia

9 de outubro
Bolsonaro e Witzel conversam em Brasília, no Clube do Exército, durante um jantar de comemoração ao aniversário do Augusto Nardes, do TCU.

11 de outubro
Bolsonaro e Witzel se encontram novamente, em agenda oficial pública, para a cerimônia de Integração do Submarino Humaitá, no Rio de Janeiro.

16 de outubro
Bolsonaro recebe o presidente do STF, ministro Dias Toffoli, e outros dois ministros da Corte, Alexandre de Moraes e Gilmar Mendes.

17 de outubro
Segundo reportagem do Jornal Nacional, Toffoli recebeu integrantes do Ministério Público Federal do Rio de Janeiro, órgão responsável pela investigação do caso Marielle. Nesse encontro, o ministro teria sido informado sobre a menção de Bolsonaro nas apurações do crime.

19 de outubro
Bolsonaro recebeu, pela manhã, seu advogado Frederico Wassef e, de tarde, o procurador-geral da República, Augusto Aras.

29 de outubro
Jornal Nacional divulga reportagem com o depoimento do porteiro do condomínio Vivendas da Barra, o mesmo onde mora o presidente da República, Jair Bolsonaro, e também Ronnie Lessa, um dos principais suspeitos de matar a vereadora Marielle Franco e o motorista Anderson Gomes.

O porteiro disse à Polícia Federal que, horas antes do crime, no dia 14 de março de 2018, outro suspeito de ter matado Marielle, Élcio de Queiroz, entrou no condomínio dizendo que iria para a casa do então deputado federal Jair Bolsonaro. Registros de presença da Câmara dos Deputados mostram, porém, que Bolsonaro estava em Brasília, naquele dia.

Ainda no dia 29 de outubro, Bolsonaro negou sua ligação com suspeitos da morte de Marielle e acusou Witzel e vazar informações inverídicas para a TV Globo.

Élcio Vieira de Queiroz (ex-policial militar), suspeito de envolvimento na morte de Marielle Franco, e o presidente Jair Bolsonaro. Foto: Reprodução/Facebook
Redação

1 Comentário

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  1. Fica a lição, imprensa livre só existe com governos democráticos. A Globo nasceu em uma didatura e irá morrer em um governo autoritário. Viva Bolzo!

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