Crescimento do garimpo ilegal na Amazônia atinge duramente áreas indígenas

Lourdes Nassif
Redatora-chefe no GGN
[email protected]

Das 255 aldeias Yanomami, 197 estão localizadas no noroeste de Roraima. / Leo Ramirez / AFP

Das 255 aldeias Yanomami, 197 estão localizadas no noroeste de Roraima. - Créditos: Leo Ramirez / AFP

do Brasil de Fato

Crescimento do garimpo ilegal na Amazônia atinge duramente áreas indígenas

Segundo mapa que reúne informações da prática em terras demarcadas e protegidas, são 453 pontos de garimpo no Brasil

por Bruna Caetano

O garimpo no Brasil não é ilegal, e o Departamento Nacional de Produção Mineral (DNPM) regula as atividades de extração em determinados locais, contudo, a mineração em áreas protegidas e reservas indígenas é proibida. Mas de acordo com o mapa Amazônia Saqueada, realizado pela Rede Amazônica de Informação Socioambiental Georreferenciada (RAISG)e pela InfoAmazônia, a região pan-amazônica é explorada em mais de 2.312 pontos de 245 áreas no Brasil, Bolívia, Colômbia, Equador, Peru e Venezuela, com extração de ouro, diamantes e coltan.

A pesquisa inédita compilou dados sobre a situação de mineração ilegal ao longo dos sete milhões de metros quadrados do território amazônico, e deu origem à ferramenta que permite o acesso ao conteúdo de forma interativa. A plataforma digital permite visualizar as informações sobre cada ponto de mineração disponível no mapa. Só no Brasil, de acordo com a RAISG, são 453 garimpos em 132 áreas.

Segundo Alicia Rolla, geógrafa do Instituto Socioambiental (ISA), que coordena a Raisg, um dos objetivos é trazer a visão da Pan-Amazônia como um organismo integral que unifica os países amazônicos. De acordo com ela, existe uma dificuldade de acompanhar o garimpo ilegal, que possui diversas implantações diferentes, e nem sempre é possível visualizá-las através de imagens de satélites. 

As informações obtidas sobre a exploração em áreas indígenas e de conservação são obtidas através das instituições que trabalham na Rede. Alguns países colaboraram com levantamentos por terceiros ou até por órgãos oficiais, que foram reunidos na pesquisa. Alicia acredita que o mapa possui um papel importante para a compreensão da dinâmica extrativista de minérios. “O garimpo está presente dos dois lados da fronteira, e os garimpeiros as atravessam inclusive para fugir de fiscalização. Outra coisa que conseguimos observar é que a prática ilegal possui uma proximidade com a legal”, afirma a geógrafa.

A prática do garimpo, de forma geral, tem importantes consequências ambientais. Quando acontece de forma ilícita e em áreas demarcadas e de preservação, o impacto é sentido com maior potência pelos indígenas e comunidades ribeirinhas que dependem dos recursos naturais. O uso do mercúrio para separar o ouro da areia contamina os rios, e, consequentemente, os peixes. Além disso, a extração de minérios provoca desmatamento para acessar o subsolo, e assoreamento dos rios, causando distúrbios ambientais como o aumento de mosquitos transmissores de doenças.

“Nossa terra está demarcada pelo governo federal desde 1992, mas não está sendo respeitada”, alega Dário Vitório Kopenawa Yanomami, vice-presidente da Hutukara Associação Yanomami, de Roraima. De acordo com ele, o garimpo é responsável pela contaminação dos rios e da terra Yanomami. “Várias doenças estão surgindo por conta da contaminação e de crimes ambientais feitos pelos garimpeiros”, denuncia Dario.

O povo Yanomami se organiza através da associação, por onde denunciam os abusos na área indígena, que possui cerca de 9.419.108 hectares. “A Hutukara recebe as denúncias e as encaminha para órgãos públicos como a Fundação Nacional do Índio (Funai), Polícia Federal (PF), Ministério Público Federal (MPF) e para o Exército Brasileiro, para que assumam suas responsabilidades” afirma. Dário conta que a associação não consegue acabar com o garimpo sozinha, já que a atividade é bem organizada. “Estamos fazendo o trabalho de denúncia, mostrando o sofrimento e as ameaças de morte que recebemos pela defesa do território”, diz.

“Nós temos três grupos Yanomami isolados, que não querem se aproximar dos não-índios. Eles estão correndo muito risco.” Ele conta que, no mês de julho, dois índios isolados foram mortos por garimpeiros. “Fizemos denúncia para a Procuradoria-Geral da República e Ministério da Justiça, e pedimos investigação sobre o garimpo ilegal, além de pedir investigação sobre as mortes para o MPF e Polícia Federal”. 

De acordo com a pesquisa da RAISG, a partir de 2010, novas balsas de extração de minérios começaram a chegar na terra Yanomami, e ao final de 2016, o sobrevoo já identificava 49 na região. No rio Uraricoera, no estado de Roraima, cerca de 40% do ouro coletado é dividido para os trabalhadores (cerca de 14 pessoas), e o resto pertence ao proprietário, que fica na cidade.

Governo Bolsonaro

A intensificação deve-se acirrar a partir de 2019, com o início do governo de Jair Bolsonaro. O presidente eleito fez declarações na quarta-feira (12) críticas à proteção do meio ambiente em um vídeo no seu Facebook. “No subsolo de Roraima existe uma tabela periódica. Níquel, urânio, ouro, nióbio. Tem que poder trabalhar sua terra (…) Cabem algumas hidrelétricas no Vale do Rio Poti. Com todo respeito ao meio ambiente, gerar energia para quem não tem.” Cerca de 46% da área do estado é território indígena. 

No vídeo, defendeu que os índios não devem ser “pré-históricos” e precisam se integrar à sociedade, além de criticar o Acordo de Paris, que possui medidas redução e mitigação de impactos das mudanças climáticas. Bolsonaro já havia afirmado que, se depender dele, não haverá mais demarcações de terras para indígenas, e reiterou a decisão durante um encontro com parlamentares do DEM também na quarta-feira (12). 

Para 2019, o povo Yanomami prepara sua resistência às ameaças de Bolsonaro contra os indígenas. “Nossas lideranças tradicionais, guerreiros da floresta, já estão sabendo sobre o governo eleito”, afirma Dário. “Estamos nos organizando e vamos nos posicionar para cobrar nossos direitos que estão na Constituição. Ele precisa respeitar as áreas demarcadas, não pode quebrar o protocolo e enfrentar as autoridades anteriores que fizeram as demarcações”, conclui.

A Funai, que foi retirada o Ministério da Justiça e passará a integrar a pasta da Mulher, Família e Direitos Humanos, ainda não tem um nome para a presidência. De acordo com declaração da futura ministra Damares Alves, essa será a última decisão tomada pela equipe de transição. 

Edição: Mauro Ramos

 

 

Lourdes Nassif

Redatora-chefe no GGN

5 Comentários

Deixe um comentário

O seu endereço de e-mail não será publicado. Campos obrigatórios são marcados com *

  1. Música para a revolução II

    Música contra a devastação do planeta. Música para romper com a hipnose da destruição e do consumo inútil. 

     

    Democracy Now! – 

    Climate Strike: Heeding Call of Greta Thunberg, Polish Students Walk Out of Class

     

    [video:https://www.youtube.com/watch?v=KKEwALN3t3s%5D

    https://www.youtube.com/watch?v=KKEwALN3t3s 

     

     

    Lauryn Hill – Everything is everything  

     

    [video:https://www.youtube.com/watch?v=i3_dOWYHS7I%5D

    https://www.youtube.com/watch?v=i3_dOWYHS7I 

     

     

     

    Sampa/SP, 15/12/2018 – 12:30 – alterado às 12:34  (em luto). 

     

     

    1. Artista de verdade para um mundo que clama por uma revolução

      Deusa. Lauryn Hill, linda, elegante, talentosa, estilosa, artista de verdade que não precisa usar seu corpo como objeto para  consumo. 

      Ela sim significa uma mulher poderosa. Não surpreende que o mundo esteja tão atoladinho em merda da extrema-direita e o mundo da cultura e do entretenimento esteja tão insosso, mais pasteurizado que jamais se pensou que seria possível. 

      Repito: o que vivemos não é uma crise política mundial, é uma crise cultural e estrutural. A revolução está chegando, pelas mãos da/os jovens que resgatam o que a música tem de indispensável para a humanidade: sensibilidade para traduzir o mundo e para inspirar a transformação. 

       

      [video:https://www.youtube.com/watch?v=tejiR8andPM%5D

      https://www.youtube.com/watch?v=tejiR8andPM 

       

      E aqui, apresentada por outro gênio, David Bowie. 

       

      [video:https://www.youtube.com/watch?v=8CEfVpWQAV4%5D

      https://www.youtube.com/watch?v=8CEfVpWQAV4 

       

      Sampa/SP, 15/12/2018 – 13:23 – alterado às 13:28  (em luto). 

       

  2. Sou do garimpo
    Sou garimpeiro já alguns anos, hoje não temos área legal pra trabalhar, estou com minha balsa parada já um ano e não consigo área legazida pra extração de DI. Muita burocracia, muito caro a licença até parece que nos garimpeiros do Brasil não extraímos di, somente os estrangeiros tem facilidades. Os índios estão nos procurando para trabalhar nas terras deles porque estão passando dificuldades, pagam os 10% pra eles, por isso o crescimento de garimpos inlegais. Se o governo facilitace pra nós não trabalharemos de forma inlegais.

  3. MINERAÇÃO ILEGAL

    As mudanças promovidas pelo governo recem empossado caracteriza-se pela falta de critério, ao aglutinar órgãos que realizam atividades sem nenhuma correlação. FUNAI será integrada no Ministério da Mulher, Familia e Direitos Humanos !!! São dispares e não possuem áreas tangenciais que justifiquem essa aglutinação estúpida e inconsequente, feita por pessoas que não têm a menor noção de administração. E com uma ministra folclórica, ligada a seitas evangélicas, que durante suas alucinações têm visões de Jesus Cristo em cima do pé de goiaba !!!  Acho que o “bagulho” não era de boa qualidade. 

    A avaliar pelas medidas que vêm sendo anunciadas, a Amazonia será devastada para dar lugar à soja, milho e pastos. Grandes áreas devastadas nos últimos 2 anos são monitoradas por organismos internacionais, que tentam alertar o governo brasileiro sobre as consequencias de suas atividades libertinas, permitindo a destruição da floresta para extração de madeira e também para implantação de grandes projetos agropastoris. 

    Com uma agenda submissa aos interesses de mafiosos grupos financeiros internacionais, acredito que teremos pela frente imensos problemas, de todo tipo, que poderão desembocar em conflitos de proporções inimagináveis. Tomara que eu esteja errado, mas não se consegue antever dias melhores para o Brasil.  

Você pode fazer o Jornal GGN ser cada vez melhor.

Apoie e faça parte desta caminhada para que ele se torne um veículo cada vez mais respeitado e forte.

Seja um apoiador