Déficit de reciclagem faz país perder R$4,6 bi/ano

Falta de foco dos gestores públicos, baixa gestão profissional entre cooperativas de catadores, e lobby das empresas responsáveis pela coleta e disposição final do lixo urbano, impedem desempenho da reciclagem no Brasil, ocasionando perdas na ordem de R$ 4,6 bilhões/ano.

O país gera diariamente mais de 140 mil toneladas de lixo domiciliar. Desse total, apenas 11% são reciclados, segundo o Compromisso Empresarial para Reciclagem (CEMPRE). Logo, o país consegue recuperar anualmente algo em torno de 5,7 mil de toneladas de resíduos.

A reciclagem é um mercado que tem muito a ser explorado, avalia José Nalini, autor de estudo sobre os entraves ao desenvolvimento dessa atividade, trabalho realizado para o programa de pós-graduação em Economia Política da PUC-São Paulo.

“As cifras calculadas pela não reciclagem (R$ 4,6 bilhões) para resíduos sólidos urbanos, pelo potencial de reciclagem dos resíduos industriais (US$ 1,0 bilhão), e principalmente pelo desperdício de alimentos (R$ 12 bilhões)”, afirma.

Em 2007, o mercado faturou R$ 32,5 bilhões, tendo crescido 2,6% em relação a 2006, e representando 1,4% do Produto Interno Bruto (PIB) brasileiro daquele ano. No fim de 2007, existiam 195,7 mil empregos formais no setor. A Região Sudeste concentrou a maior parte dos trabalhadores, 58,5%. O total de catadores de materiais que trabalham, sem registro, pelo país a fora, é estimado entre 500 mil e 1 milhão, segundo o Movimento Nacional de Catadores de Materiais Recicláveis (MNCR).

Nalini destaca que as iniciativas de reciclagem no país são isoladas. FIESP, SEBRAE e CEMPRE, são as entidades que mais organizam ações sobre a atividade. Em contrapartida, o poder público tem se mostrado “lento e ineficiente”, com trabalhos isolados.

O pesquisador aponta que o papel da sociedade é de extrema importância para o desempenho da reciclagem. E a falta de conscientização e organização individual está entre os principais entraves para o crescimento da recuperação de resíduos no país.

Leia a seguir trecho do trabalho de Nalini, com os 8 pontos que dificultam o país a alcançar níveis mais sustentáveis na reciclagem:

1. Falta de foco das prefeituras nos programas de coleta seletiva. Apesar do crescimento de 24% no número de municípios que implantaram a coleta seletiva, de 327 para 405, num total de cerca de 5.500 municípios brasileiros, representam somente 7%. Além disso, a escala e o orçamento ainda são muito pequenos, principalmente na cidade de São Paulo, que não chega a atingir 1% de todo o lixo gerado.

2. Grande quantidade de intermediário/atravessadores. A quantidade varia para cada tipo de material. Essa estrutura de mercado trava também o desenvolvimento do mercado de reciclagem, pois eleva os preços finais dos materiais para a indústria, e por outro lado, impede o avanço das cooperativas na cadeia produtiva.

3. Falta de gestão profissional nas cooperativas. Muitas não seguem os princípios do cooperativismo, pois geralmente são geridas por representantes de órgãos públicos ou instituições não governamentais, não permitindo, assim, o sistema de autogestão, e também pela falta de capacitação e informação dos cooperados.

4. Lobby das empresas responsáveis pela coleta e disposição dos resíduos. Os contratos de limpeza urbana são milionários, e os seus custos só tendem a crescer, principalmente, pelo esgotamento dos aterros sanitários existentes. Os novos aterros serão mais distantes e o custo de transporte também tendem à ser. Poucas empresas exercem grande influência sobre as Prefeituras, impondo resistência contra a reciclagem dos resíduos.

5. Maior pressão e atuação da sociedade na coleta seletiva e no consumo consciente. A muito a ser feito, como a Análise de Ciclo de Vida de cada produto novo, por exemplo. A sociedade precisa se conscientizar da importância do consumo consciente, da separação dos materiais recicláveis, e saber exercer pressão sobre as autoridades municipais.

6. Pouco interesse pelo lixo orgânico para geração de energia e adubo. O lixo orgânico, apesar de representar cerca de 60% de todos os resíduos urbanos gerados, muitas vezes é deixado de lado das discussões e estudos. Entretanto, há nele um grande potencial praticamente inexplorado, seja através das usinas de compostagem para fabricação do adubo, da incineração ou da utilização do gás metano para geração de energia elétrica, atualmente reciclamos somente cerca de 1,5%.

7. Infra-estrutura capitalista para o setor (negócio lucrativo/leis ambientais), como há em muitos países desenvolvidos (Europa, Estados Unidos e Japão), com a participação de todos os agentes públicos, privados e da sociedade.

8. Falta de uma Política Nacional de Gerenciamento de Resíduos Sólidos (PNRS). Essa regulamentação, em nível nacional, é imprescindível para se criar um novo paradigma de sustentabilidade ambiental.

*Após 19 anos, a Câmara dos deputados aprovou, em 11 de março, a proposta da PNRS. O documento aguarda, agora, aprovação no Senado, para depois ser sancionada pelo Presidente da República. O presidente do Grupo de Trabalho responsável pelo Projeto de Lei, deputado Arnaldo Jardim, acredita que a Política Nacional de Resíduos Sólidos deva ser sancionada ainda este ano.

Para acessar o trabalho de José Nalini, na íntegra, clique aqui.

Redação

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