Dines, mestre do jornalismo, nossa maior referência

Lourdes Nassif
Redatora-chefe no GGN
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Dines foi responsável pela consolidação do JORNAL DO BRASIL como o mais importante veículo de comunicação da América Latina

do Jornal do Brasil

Dines, mestre do jornalismo, nossa maior referência

Jornalista inovador e obstinado, crítico da imprensa, escritor, professor e rebelde, morreu ontem em São Paulo, aos 86 anos, Alberto Dines, em decorrência de uma pneumonia. Ele estava internado no Hospital Albert Einstein, no Morumbi, na Zona Sul da capital paulista. Deixa viúva, a jornalista Norma Couri, e quatro filhos. O sepultamento de seu corpo está marcado para as 13h30 de amanhã, no cemitério de Embu das Artes.

Dines foi responsável pela consolidação do JORNAL DO BRASIL, onde trabalhou de 1962 a 1973, como o mais importante veículo de comunicação da América Latina, valendo-se de criativas estratégias para driblar o regime militar e denunciar a censura imposta à imprensa. 

Também foi crítico e analista da imprensa por décadas, lançando o “Observatório da Imprensa” e inspirando gerações de jornalistas e cidadãos na defesa da liberdade de expressão e da democracia. Pensava que “o leitor não é consumidor, mas cidadão. O jornalismo é serviço público, não espetáculo.”

Como na promulgação do Ato Institucional Nº 5 (AI-5), em 1968, quando coordenou a edição da primeira página do JORNAL DO BRASIL, valendo-se de termos da meteorologia para denunciar a mão forte da censura que chegava: “Tempo negro. Temperatura sufocante. O ar está irrespirável. O país está sendo varrido por fortes ventos…”.

Ou quando, mediante a proibição de noticiar no alto da capa do jornal a morte do presidente chileno Salvador, em 11 de setembro de 1973, decidiu eliminar a manchete e publicar o texto inteiro na capa.

Um jornalismo inovador e livre

Dines nasceu em 19 de fevereiro de 1932, no hospital da Beneficência Portuguesa, no bairro da Glória, filho de imigrantes vindos da Rússia. O pai chegou ao país como cidadão polonês e era ativista da comunidade judaica, desde a Polônia, onde atuava com organizações de refugiados e de apoio social.

Iniciou a carreira jornalística ainda na adolescência, no Ginásio Hebreu Brasileiro, antiga escola judaica com professores de esquerda. Motivados com a mobilização do Brasil contra o nazifascismo a partir de 1942, Dines e colegas criaram uma pequena publicação. O veículo já apresentava marcas características de sua carreira: a liberdade de pensamento e a contestação. “O jornalzinho era muito livre, os professores não interferiam. Até gozávamos de alguns deles”, recordou-se, em depoimento ao Centro de Cultura e Memória do Jornalismo, em 2008.

A trajetória profissional começou em 1952, na revista “A Cena Muda”, como crítico de cinema. Este passo foi dado um pouco por acaso, aos 18 anos. “Meu sonho era estudar cinema em Paris. Não consegui: naquela época, para ter bolsa de estudo você tinha que ter pistolão, e eu não tinha. Mas me dediquei ao negócio do cinema com muito afinco, estudava, ia a cineclubes. Aí um dia me convidaram para ser crítico de cinema da ‘A cena muda’, um veículo importante”.

O passo seguinte foi a recém-criada revista “Visão”, cobrindo teatro e cinema. Pouco depois, passou a fazer reportagens políticas. Em 1957, seguiu para a extinta revista “Manchete”, onde tem a oportunidade de desenvolver textos maiores e mais autorais. Em razão de uma doença de chefe, Nahum Sirotsky, assume um cargo de chefia e edição pela primeira vez, aos 26 anos. Também encontraria um problema recorrente de sua trajetória: tensões com os superiores hierárquicos. Segundo Dines, Adolpho Bloch, proprietário da revista, “não era um jornalista, ele queria era publicar foto bonita”. Embora entendesse que a parte gráfica das matérias era indispensável – um conhecimento que atribuía ao antigo interesse por cinema – Dines desejava priorizar os fatos históricos da época. Um exemplo da conturbada relação entre os dois é uma briga envolvendo a primeira ida do homem ao espaço, dos astronautas russos do Sputnik. O jornalista queria noticiar o acontecimento com destaque, o que Bloch não admitia, em razão da baixa qualidade da foto disponível. Da experiência na revista, Dines lembraria que a “contribuição de Bloch [ao jornalismo] foi puramente gráfica”

A convite de Samuel Wainer, seguiu em 1959 para “Última Hora”, para editar o caderno cultural. Do autor de “Minha razão de viver”, lembrava-se como de alguém “muito coerente, que nunca teve uma vacilação”. Isso não impedia, entretanto, a existência de conflitos com a direção do jornal: Dines representava um novo jornalismo, ágil e não ideológico, enquanto Wainer alinhava-se ao getulismo, mesmo anos após a morte de Vargas. O resto da redação fazia piadas relacionadas a sua ascendência judaica, que o incomodavam. Da “UH” foi para o “Diário da Noite”, vespertino especializado na cobertura de polícia. No final da vida, diferenciou os crimes passionais e acidentes de trânsito que costumava cobrir na década de 1950 dos padrões contemporâneos de violência. “A favela virou ao que é hoje nos anos 80. Não estou romantizando o passado, mas o que havia então era a violência normal de uma grande cidade”. Passou ainda por “A Tribuna da Imprensa”, antes de assumir como editor-chefe no JORNAL DO BRASIL em janeiro de 1962.

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Lourdes Nassif

Redatora-chefe no GGN

3 Comentários

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  1. Dines….

    Eu gostava de Dines, seus programas e censo critico. O Brasil perde muito em não aproveitar mais tamanha cultura judaica, que habita nosso país. Mas não entendo a falta de humildade e mea culpa das nossas Elites. Elite que não se enxerga elite. Esquerda que não é esquerda. E se crê como tal. Dines de Jornal do Brasil, de Veja, de Folha de São Paulo,… Como a maioria dos Jornalistas afamados deste país, como Juca Kfouri, Nassif, entre tantos. A voz e letras por trás de Civitta’s, Marinho’s, Fria’s, Mesquita’s…Quando estas Famílias deixarm de ser a Imprensa Livre a restaurar o Brasil num caminho democrátco a ser seguido e tornaram-se golpistas, imprensa marron, grande mídia, manipuladores, entreguistas? Ou sempre foram? Creio que sempre foram. E quem ajudou a construir tudo isto, absurdamente exposto em nosso 2018? A outra face da mesma moeda? Sem nunca confrontar a sua outra face, se julga de maior valor? 88 anos desta farsa. Esperavamos Democracia? O Brasil é de muito fa´cil explicação.    

      

  2. Dines

    Sim, Dines foi uma figura importante do jornalismo, mas deve esclarecer que foi um dos que apoiou o golpe de 64. Embora com a saúde fragilizada, fez mea-culpa e apoiou de modo velado o golpe de 2016. Escrevia muito bem, mas sua análise não era lá profunda, mais parecia o velho jornalista que se escorava nas teorias positivistas, escola mestre da vida, e se olhar mais atentamente, seu pensamento era sínteses de manchetes e com um microscópio conseguimos vê-las com um punhado de frases interligadas umas nas outras, quase coladas com as manchetes que suscediam – que se aproxima muito mais do status quo do que uma crítica aprofundada da sociedade.

    Particularmente, assisti muito dos episódios do Observatorio da Imprensa principalmente na TV Cultura de São Paulo. Depois foram despezados do canal público paulistano, estabeleceu na TV Brasil. Há a importante reportagem com Zygmund Baumann e com a filha de Prestes. Infelizmente, quando esperaríamos uma crítica mais lúcida dos tempos que emergia a crise que culminaria na destituição da presidenta Dilma Roussef, colhiamos cada vez mais críticas mais afinadas com os velhos jornalões, enfim, sua paixão mal correspondida. O próprio sítio Observatório da Imprensa implodiria com a saída do jornalista Luciano Martins Costa que, com Dines, estabelecia a pluralidade, fluidez e relevância desse importante canal de idéias, mas também sinalizaria a gota d’água de divergências jamais superadas entre ambos. Enfim o OI calou-se, tornou-se irrelevante e produz muito pouco, algo mais próximo e afinidades de museus que da contemporaneidade. 

    1. Sobre o papel do OI

      De fato o Observatorio da Imprensa perdeu de ser um grande centro de pensamento nesses temos de fakenews e de ter pouco criticado o papel da imprensa no Brasil do PT. Ele passou a mão na cabeça da imprensa, como a um filho rebelde, que vive dando golpes, mas que la no fundo não o faz por mal. 

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