Enquanto população de alunos aumenta, de estudantes parece diminuir

Patricia Faermann
Jornalista, pós-graduada em Estudos Internacionais pela Universidade do Chile, repórter de Política, Justiça e América Latina do GGN há 10 anos.
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Sugerido por Romulo Cabral de Sá

Da Carta Capital
 
Procuram-se estudantes
 
Além do mico-leão-dourado e do lobo-guará, outro mamífero tropical parece caminhar para a extinção
 
Por Thomaz Wood Jr.
 
Diz-se que uma espécie encontra-se ameaçada quando a população decresce a ponto de situá-la em condição de extinção. Tal processo é fruto da exploração econômica e do desenvolvimento material, e atinge aves e mamíferos em todo o planeta. Nos trópicos, esse pode ser o caso dos estudantes. Curiosamente, enquanto a população de alunos aumenta, a de estudantes parece diminuir. Paradoxo? Parece, mas talvez não seja.

Aluno é aquele que atende regularmente a um curso, de qualquer nível, duração ou especialidade, com a suposta finalidade de adquirir conhecimento ou ter direito a um título. Já o estudante é um ser autônomo, que busca uma nova competência e pretende exercê-la, para o seu benefício e da sociedade. O aluno recebe. O estudante busca. Quando o sistema funciona, todos os alunos tendem a se tornar estudantes. Quando o sistema falha, eles se divorciam. É o que parece ocorrer entre nós: enquanto o número de alunos nos ensinos fundamental, médio e superior cresce, assombram-nos sinais do desaparecimento de estudantes entre as massas discentes.

Alguns grupos de estudantes sobrevivem, aqui e acolá, preservados em escolas movidas por nobres ideais e boas práticas, verdadeiros santuários ecológicos. Sabe-se da existência de tais grupos nos mais diversos recantos do planeta: na Coreia do Sul, na Finlândia e até mesmo no Piauí. Entretanto, no mais das vezes, o que se veem são alunos, a agir como espectadores passivos de um processo no qual deveriam atuar como protagonistas, como agentes do aprendizado e do próprio destino.

Alunos entram e saem da sala de aula em bandos malemolentes, sentam-se nas carteiras escolares como no sofá de suas casas, diante da tevê, a aguardar que o show tenha início. Após 20 minutos, se tanto, vêm o tédio e o sono. Incapazes de se concentrar, eles espreguiçam e bocejam. Então, recorrem ao iPhone, à internet e às mídias sociais. Mergulhados nos fragmentos comunicativos do penico digital, lambuzam-se de interrogações, exclamações e interjeições. Ali o mundo gira e o tempo voa. Saem de cena deduções matemáticas, descobertas científicas, fatos históricos e o que mais o plantonista da lousa estiver recitando. Ocupam seu lugar o resultado do futebol, o programa de quinta-feira e a praia do fim de semana.

As razões para o aumento do número de alunos são conhecidas: a expansão dos ensinos fundamental, médio e superior, ocorrida aos trancos e barrancos, nas últimas décadas. A qualidade caminhando trôpega, na sombra da quantidade. Já o processo de extinção dos estudantes suscita muitas especulações e poucas certezas. Colegas professores, frustrados e desanimados, apontam para o espírito da época: para eles, o desaparecimento dos estudantes seria o fruto amargo de uma sociedade doente, que festeja o consumismo e o prazer raso e imediato, que despreza o conhecimento e celebra a ignorância, e que prefere a imagem à substância.

Especialistas de índole crítica advogam que os estudantes estão em extinção porque a própria escola tornou-se anacrônica, tentando ainda domesticar um público do século XXI com métodos e conteúdos do século XIX. Múltiplos grupos de interesse, em ação na educação e cercanias, garantem a fossilização, resistindo a mudanças, por ideologia de outra era ou pura preguiça. Aqui e acolá, disfarçam o conservadorismo com aulas-shows, tablets e pedagogia pop. Mudam para que tudo fique como está.

Outros observadores apontam um fenômeno que pode ser causa-raiz do processo de extinção dos estudantes: trata-se da dificuldade que os jovens de hoje enfrentam para amadurecer e desenvolver-se intelectualmente. A permissividade criou uma geração mimada, infantilizada e egocêntrica, incapaz de sair da própria pele e de transcender o próprio umbigo. São crianças eternas, a tomarem o mundo ao redor como extensão delas próprias, que não conseguem perceber o outro, mergulhar em outros sistemas de pensamento e articular novas ideias. Repetem clichês. Tomam como argumentos o que copiam e colam de entradas da Wikipédia e do que mais encontram nas primeiras linhas do Google. E criticam seus mestres, incapazes de diverti-los e de fazê-los se sentir bem com eles próprios. Aprender cansa. Pensar dói.

 

Patricia Faermann

Jornalista, pós-graduada em Estudos Internacionais pela Universidade do Chile, repórter de Política, Justiça e América Latina do GGN há 10 anos.

18 Comentários

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  1. Colegas professores,

    Colegas professores, frustrados e desanimados, apontam para o espírito da época: para eles, o desaparecimento dos estudantes seria o fruto amargo de uma sociedade doente, que festeja o consumismo e o prazer raso e imediato, que despreza o conhecimento e celebra a ignorância, e que prefere a imagem à substância.

    Isso também se cultua, cultura de uma época.

    A própria ideologia liberal, ou mais especificamente o neoliberalismo

    O que se esperar de uma sociedade hedonista que insufla os jovens à superficialidade?

  2. Eu sabia! Eu sabia! Se um

    Eu sabia! Eu sabia! Se um doente não se recupera e morre, a culpa é dele, por ser fraco demais e doente – jamais do médico. Se um aluno não sai do estado de aluno pra entrar no de estudante, a culpa é dele por ser burro e egocêntrico, jamais do professor. Ah! Que saudades dos tempos d’antes, quando só os filhinhos da elite conseguiam botar o pé na escola! Que saudades da época em que a molecada sabia que crianças são para ser vistas e não ouvidas; quando sabiam calar a boca, obedecer e decorar a tabuada! Que saudades de quando se podia praticar a pedagogia da vara de marmelo, e não essa excescência da “pedagogia pop”! [suspiro]

    1. LouraMuitoBurra, nao se

      LouraMuitoBurra, nao se elogie assim com esse nick.  Voce eh mais burra ainda.

      O assunto do item NAO EH CULPA.  Eh tecnica de estudo e de aprendizado que ninguem tem.  Tecnica de ensino NAO eh suficiente.  Entendeu agora?  Sim, o problema exposto no item que voce nao parece ter lido EH o dos alunos.  “Nao basta ser aluno”, alias, eh o ponto central do item.

      Existe tecnica de ensinar e tambem tecnica de aprender, assunto que eu abordei extensamente antes de ontem.

  3. Na FGV, tinhamos os “mestres

    Na FGV, tinhamos os “mestres ” que chamavam os estudantes de alunos, e os que os tratavam como “estudantada “.

    Nos dois casos, falta de respeito. Agora vem essa conversa de alienação dos jovens. Santa paciência, Batman.

  4. Discurso tz bem intencionado, mas vazio e conservador

    Os problemas de que ele fala existem certamente. Mas o texto nao ajuda em nada a pensar o problema. 

    1. (Quando comeca a mencionar

      (Quando comeca a mencionar “especialistas” que dizem isso e aquilo, da pra dormir.  Eles mencionam o assunto e o expoem…  pelos sintomas, nao pelas causas.  Da um desaaaaanimo…

      Gostei, o ASSUNTO eh serio.  Mas nao foi muito bem enderecado.)

  5. Excelente texto.
     
    Uma pena a

    Excelente texto.

     

    Uma pena a nossa esquerda incentivar esta permissividade dos jovens. eu não canso de dizer que a nossa esquerda taxa de “conservadorismo” todo tipo de disciplina que incentive crescimento do PIB e lhe boicote a falta de coragem. A nossa esquerda nunca foi esquerda de verdade, são anarquistas enrustidos. Estivessemos num país de esquerda de verdade, como a China, veríamos o que é juventude aplicada aos estudos e Crescimento robusto do PIB.

    Enquanto isto vamos vendo a qualidade dos nossos profissionais caindo. São cada vez mais frequentes as notícias de médicos e enfermeiros que matam pacientes devido á “erros médicos”, predios que caem devido à “erros de cálculo de engenharia” e por aí vai.

    1. “Uma pena a nossa esquerda

      “Uma pena a nossa esquerda incentivar esta permissividade dos jovens”:

      Da pra ler pelo menos o titulo do item?  Xou repetir. Vou escrever bem devagarinho porque sei que voce nao le depressa:

      Enquanto população de alunos aumenta, de estudantes parece diminuir

      O item se endereca a um problema social DE ALUNOS, que nao aprenderam a ser ESTUDANTES ainda.  Assunto serio.  Nao tem a ver com “esquerda” nem sequer nos paises desenvolvidos, muito menos no Brasil.

      1. Se fosse um problema social

        Se fosse um problema social de alunos, ele estaria presente em todos os países indistintamente.

        Mas como o Sr. explica que na China não exista este problema? Desculpe a franqueza, Sr. Ivan. É porque ao contrário do que o Sr. diz, não é um problema social de alunos, mas um problema cultural de “Disciplina”. Países com disciplina severa, como China, Coréia do Sul, e outros tem desempenho elevado dos alunos por que lá acham normal exigirem dos alunos o melhor que eles podem dar.

        Mas aqui na nossa cultura é exatamente o contrário, por isto os resultados são diversos.

        1. “Mas como o Sr. explica que

          “Mas como o Sr. explica que na China não exista este problema?”:

          Ah, bom, entao o fato de voce culpar A ESQUERDA brasileira era so contrabando ideologico mesmo.  Entao ta.

    2. Esquerda e direita

      “Estivessemos num país de esquerda de verdade, como a China”

      Parece que fosse confunde os conceitos de esquerda e direita. Um país pode ser rotulado ou rotular-se “comunista” e não ser de esquerda. A China, p. ex., na minha visão não é “de esquerda”. Tá hoje  mais pra capitalismo de Estado do que outra coisa..

      Esquerda é sinônimo de inconformismo, busca de avanços que nos levem o mais próximo possível da igualdade social. É não aceitação das fórmulas prontas apresentadas como verdades únicas. Esquerda é a busca de soluções novas para velhos problemas, e do desmonte de estruturas viciadas. É o contrário de conservadorismo, de imobilidade social e política da negação da contesatação dos dogmas vigentes.  Esquerda é  a subversão de “verdades” e valores que foram estabelecidos com base no capital, na hierarquia, na exclusão social e econômica, na cristalização histórica. Estes últimos vêm a ser  os valores cultivados e que caracterizam a direita.

      1. Aqui no Brasil existe um pre

        Aqui no Brasil existe um pre conceito de que tudo o que leva o rótulo de esquerda é sempre bom, e tudo o que é de direita é sempre ruim. Ser progressista aqui parece ser sempre bom, e ser conservador sempre ruim.

        O único país que era comunista e conseguiu índices de crescimento do PIB da ordem próxima a dois dígitos (quase 10 %) foi a China, por que ela venceu esta barreira de preconceito. Os chineses pegaram o que funcionava no socialismo e reuniram ao que funcionava no capitalismo. A flexibilidade de reunir o melhor do progressismo ao melhor do conservadorismo. É a neo esquerda. Eles estão a ponto de tirar dos EUA a liderança econômica.

        Enquanto isto as esquerdas da maioria do mundo ainda estão com a cabeça na era pré muro de Berlim, tentando criar algo que já failu há décadas.

        A China deu certo por que o compromisso deles é com resultados, e não com conceitos ou pré conceitos.

  6. Difícil o aumento de
    Difícil o aumento de estudantes quando os alunos precisam se dividir entre trabalho e estudos, essa é a realidade brasileira onde as pessoas precisam se virar do jeito que pode e não há maneira de realizar uma formação saudável.
    Gostei de sua visão, porém muito ideológica esquecendo alguns fatores preponderantes.

  7. Enfim, tudo o que o autor

    Enfim, tudo o que o autor comentou se repetiu nos comentários: dispersão, falta de foco. Esquecem o essencial e ficam coando mosquitos.

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