Especialista do Unicef explica sobre como manter os direitos da criança e do adolescente na agenda eleitoral

Por Ana Luísa Vieira, do Promenino, com Cidade Escola Aprendiz, da Rede de noticias do Centro de Referências em Educação Integral

Crédito: Valter Campanato/Agência Brasil

“Os desafios que ainda persistem precisam ser superados para que a igualdade de direitos seja uma realidade para todas as crianças e adolescentes do Brasil.” Com essa premissa, o Fundo das Nações Unidas para a Infância (Unicef) lançou a “Agenda pela infância: 2015-2018”.

O documento, de 40 páginas, é dividido em sete compromissos. São problemas centrais do Brasil, acompanhados de contextualização e propostas para enfrentá-los em escala federal, estadual e municipal. O material, dirigido aos candidatos a presidente, senadores, governadores e deputados, tem o objetivo de manter os direitos de garotas e garotos brasileiros na pauta política dos próximos anos — e ir além.

“A campanha que fizemos não é para dizer em quem você deve votar. Mas, depois de escolher em quem votar, você pode enviar esse material para o candidato e cobrá-lo sobre esses compromissos”, explica o coordenador do Programa Cidadania dos Adolescentes do Unicef no Brasil, Mario Volpi. “É preciso que o eleitor paute a agenda de seu candidato, e não ser pautado por ele. O cidadão tem o poder do voto e, também, o poder de ajudar a construir a agenda política”, ressalta.

Em entrevista ao Promenino, Volpi conta que o material foi elaborado a partir de demandas da sociedade na esfera política. “Existem temas que já são tradicionais na discussão de direitos da infância no Brasil. Mas há alguns que, se o Brasil der um ou dois passos a mais, vão fazer uma grande diferença na vida de crianças e de adolescentes”, assegura Volpi. “A partir das aprendizagens que o país teve, principalmente na área da política pública, a ideia do documento é ajudar a consolidar uma mudança na situação da infância e da adolescência de forma mais decisiva, mais definitiva.”

Volpi detalha, ponto a ponto, as sete propostas. Confira:

Compromisso 1 – Eliminar as mortes evitáveis de crianças menores de 1 ano de idade e reduzir a mortalidade infantil indígena.

“A mortalidade infantil caiu de forma bastante consistente. O Brasil foi um dos quatro países do mundo que mais reduziram esse índice nos últimos 20 anos. Contudo, um tema muito grave chama a atenção: a situação das crianças indígenas. Uma criança indígena tem três vezes mais riscos de morrer antes de completar um ano de idade do que na média do país. Nós não podemos deixar de estender às crianças indígenas a proteção dada às demais crianças.”

Compromisso 2 – Garantir que cada criança e cada adolescente de 4 a 17 anos tenham acesso a escolas públicas inclusivas e de qualidade, aprendendo na idade certa os conhecimentos correspondentes a cada ciclo de vida.

“Temos 98,5% de crianças de 6 a 14 anos matriculadas na escola, o que representa um grande avanço. Porém, como o Brasil fez uma importante mudança na legislação e transformou em obrigatória a educação entre os 4 e os 17 anos, precisamos incluir dois grupos: o de 4 a 5 anos e o de 15 a 17. Nesses dois grupos estão os maiores números de exclusão escolar. É preciso continuar fortalecendo e qualificando a Educação Fundamental, mas é preciso fazer um esforço na educação dos adolescentes e das crianças.”

Compromisso 3 – Reduzir as altas taxas de homicídios contra crianças e adolescentes.

“Esse é outro tema grave que o país tem a enfrentar. A cada hora, um adolescente é assassinado no Brasil. É um numero inaceitável. Não existe guerra no mundo que mate tantos adolescentes. O Brasil é o segundo país no mundo nesse índice de homicídios. Fica atrás somente da Nigéria.”

Compromisso 4 – Garantir o acesso à Justiça para todas as crianças e adolescentes.

“No documento, também focamos no Sistema de Garantia de Direitos da Infância. Temos um sistema de Justiça com varas de infância e da juventude e Ministério Público atuante, mas o Unicef quer dar ênfase ao papel do conselho tutelar e da defensoria pública, duas instituições do Sistema de Garantia que precisam ser fortalecidas.”

Compromisso 5 – Assegurar que adolescentes e jovens participem da vida democrática do país. Garantir que eles possam opinar, avaliar e se envolver nas decisões relativas às políticas públicas de garantia de seus direitos.

“A população está, gradativamente, envelhecendo. É muito importante oferecer a uma população de quase 21 milhões de adolescentes mecanismos de participação. Se quisermos uma democracia mais forte e pessoas mais conscientes, que participem da vida política do país, é necessário que esse envolvimento comece na adolescência. É nessa fase da vida em que se dá esse processo mais forte de apropriação da vida pública, da ampliação da interação e das redes de relacionamento. É importante o país investir na participação. Mas ele tem feito um movimento contrário: em vez de ampliar a participação, ela tem se reduzido. Dados do Tribunal Superior Eleitoral mostram que, na eleição passada, em 2012, quase 46% dos adolescentes de 16 e 17 anos se cadastraram para votar. Nesta eleição, são menos de 16%. É uma queda muito grande. Não podemos continuar desacreditando, fechando os canais de participação e fazer o jovem desacreditar na política. A queda acontece porque há mais interesse na participação das eleições municipais, mais próximas da vida desse adolescente, do que na eleição nacional.”

Compromisso 6 – Reduzir o número de cesáreas desnecessárias, com campanhas de sensibilização dos pais, das famílias e dos profissionais de saúde.

“A mortalidade materna e a prematuridade estão associadas ao maior número de cesáreas no país. Há um número alto e desnecessário. É preciso fortalecer a ideia do parto humanizado, especialmente priorizar o parto normal. A operação cesariana, quando necessária, salva vidas. Quando não é necessária, deixa mãe e a criança vulneráveis. É necessário dirimir esse tipo de intervenção.”

Compromisso 7 – Garantir a atenção humanizada e especializada para adolescentes e jovens nos serviços de saúde, com ênfase na prevenção da gravidez na adolescência, das DSTs [Doenças Sexualmente Transmissíveis], do HIV/Aids e das hepatites virais.

“Avançamos bastante na saúde da criança, na redução da mortalidade infantil, mas o sistema de saúde ainda não conseguiu dar uma atenção especializada ao adolescente. Cria-se uma espécie de vácuo entre a infância e a fase adulta, resultado da pouca especialização dos profissionais de atendimento aos adolescentes. Temos aí dois fenômenos preocupantes: o da gravidez na adolescência e as DSTs, especialmente a epidemia da Aids e a infecção por HIV, que aumenta nessa fase da vida em função da falta da prevenção.” 

Contestar para conquistar
Assumir os direitos da criança como prioridade do governo. Essa é a proposta da Rede Nacional da Primeira Infância (RNPI), composta por 157 entidades, que encaminhou uma carta aos candidatos à Presidência. São três as ações indicadas: “plena implementação do Plano Nacional pela Primeira Infância (PNPI); criação do Orçamento Criança, com recursos que assegurem o cumprimento das metas dos diferentes planos setoriais e do PNPI; construção de um Pacto Federativo entre a União, os estados, o Distrito Federal e os municípios para o atendimento pleno e integral dos direitos da criança na Primeira Infância”.

Redação

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