Funcionários da Eletrobras denunciam contradições na tentativa de privatização

Cintia Alves
Cintia Alves é graduada em jornalismo (2012) e pós-graduada em Gestão de Mídias Digitais (2018). Certificada em treinamento executivo para jornalistas (2023) pela Craig Newmark Graduate School of Journalism, da CUNY (The City University of New York). É editora e atua no Jornal GGN desde 2014.
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Jornal GGN – A Associação dos Empregados de Furnas, de trabalhadores ligados à Eletrobras, lançou um artigo que usa notícias que saíram na grande mídia para criticar os estudos feitos pelo governo Temer para privatizar a estatal de energia, a maior da América Latina.
 
O texto aborda desde a morosidade e pouca transparência nos debates encampados pelo governo sobre o modelo de privatização que será adotado, até os possíveis impactos na tarifa e na matriz energética brasileira.
 
“Ninguém privatiza uma empresa desta relevância, presente em todos os estados da federação, da noite para o dia. O
processo careceria de uma discussão ampla para analisar os impactos. A liberalização do mercado de energia fez estragos na Califórnia, e promoveu “tarifaços” na Argentina e em Portugal”, diz o texto.
 
Um dos principais pontos abordados é a possibilidade de o governo abrir mão de ter peso decisivo em assuntos estratégicos, em detrimento do lucro dos acionistas.
 
“Outra bola dividida dentro do governo foi a polêmica adoção de Golden Share, que seria como um poder de veto do governo para algumas questões consideradas relevantes e estratégicas para o país. O poder de veto dividiu MME e Fazenda, segundo noticiou a Época. Logo em seguida, o Valor Econômico publicou que o governo efetivamente propôs o fim de todas as Golden Share que detêm hoje.” 
 
Os funcionários ainda chamam atenção para o aumento da tarifa de energia pela Aneel muito antes da privatização entrar em marcha oficialmente.
 
Leia o editorial completo abaixo.
 
Eletrobras: quantas contradições são necessárias para se fazer uma
“Privatização Frankenstein”?
 
Desde que o governo federal anunciou, no fim de agosto, que tinha interesse em
privatizar a Eletrobras, o assunto tomou a pauta das discussões a respeito de Energia
Elétrica no Brasil, o que é justificável, pois estamos falando da maior empresa do setor
na América Latina, com um terço da geração e metade da transmissão de um país de
dimensões continentais. Com o passar dos dias, o projeto de Privatização da holding se
revelou um verdadeiro Frankenstein.
 
Para os mais novos que desconhecem o romance, Frankenstein é um personagem
clássico da literatura suíça, que já ganhou inúmeras versões no cinema. Trata-se de um
monstro desengonçado, mal construído e mal-acabado, fruto de uma experiência
malsucedida do seu criador. O termo “Frankenstein” acabou por adjetivar tudo na vida
que se assemelhasse a essas características, e este é o caso da privatização da
Eletrobras. A seguir, vamos analisar pelas contradições noticiadas o que pode estar se
desenhando neste processo.
 
O prazo para finalização do modelo teve diversos anúncios e cronogramas. Em
informação noticiada pelo UOL em 17/09i, se falava em submeter o projeto à presidência
da República em setembro. Setembro passou e o anúncio aos quatro cantos era que de
outubro não passaria. O Globo noticiou, então, que em outubro já seria submetida ao
Congressoii. Outubro acabou e o projeto ainda não foi submetido ao Congresso, quase
três meses após o anúncio inicial. Nesse momento, o Extra acaba de noticiar mais uma
projeção para a próxima semanaiii
.
Mas por que tanta demora? A resposta é fácil e óbvia. Ninguém privatiza uma empresa
desta relevância, presente em todos os estados da federação, da noite para o dia. O
processo careceria de uma discussão ampla para analisar os impactos. A liberalização do
mercado de energia fez estragos na Califórnia, e promoveu “tarifaços” na Argentina e
em Portugal. Por isso, privatizar uma estatal deste porte e neste setor é estar na
contramão mundial da agenda de energia. Hoje alguns países optam pela reestatização 
de energia e saneamento, pois sabem que somente as agências reguladoras não são
suficientes para estabilizar mercados tão complexos.
 
Ainda assim, além do atraso no cronograma, que já seria previsível, o histórico do
processo de tentativa de privatização da Eletrobras colecionou uma série de
contradições que reforçam as características de Frankenstein. O governo anunciou em
setembro que o capital seria pulverizado com o teto máximo de 5% por acionistaiv. No
mês seguinte mudou de ideia e dobrou o teto para 10% por investidorv
.
Quando a privatização foi anunciada, um dos maiores ganhos propagados pelo governo
seria a melhor governança da empresa, aderindo ao Novo Mercado da Bolsa. Um
comunicado oficial publicado no portal do Ministério de Minas e Energia (MME) dizia
que “esse movimento permitirá à Eletrobras implementar os requisitos de governança
corporativa exigidos no Novo Mercado, equiparando todos os acionistas – públicos e
privados – com total transparência em sua gestão”vi. Pouco mais de um mês depois, o
próprio governo abre mão do que seria um dos maiores ganhos para a União ao anunciar
que não incluiria a Eletrobras no Novo Mercado antes de privatizarvii
.
Outra bola dividida dentro do governo foi a polêmica adoção de Golden Share, que seria
como um poder de veto do governo para algumas questões consideradas relevantes e
estratégicas para o país. O poder de veto dividiu MME e Fazenda, segundo noticiou a
Épocaviii. Logo em seguida, o Valor Econômico publicou que o governo efetivamente
propôs o fim de todas as Golden Share que detêm hojeix
.
É importante também considerar que ainda há uma grande divergência dentro do
governo sobre como será o rateio de um terço do valor das privatizações. Matéria do
Estadão mostrou que o clima interno na esfera governamental é de muita disputa em
relação ao assuntox. Recentemente foi divulgado um vídeo do presidente da Eletrobras,
Wilson Pinto Jr, dizendo ser importante para o país ter uma empresa estatal de energia
como a Eletrobras. O próprio executivo declarou que não privatizariaxi
.
Uma questão que também impacta fortemente a economia brasileira, atingindo a
inflação e a indústria, é o reajuste tarifário. Sobre este tema, a divergência foi entre o
MME e a ANEEL. Teoricamente, a análise da Agência deveria subsidiar a opinião do
Ministério. No entanto, no mesmo dia em que o Ministro de Minas e Energia, Fernando
Coelho, disse que a energia iria baratear em caso de privatização da Eletrobrasxii, a
ANEEL posicionou um reajuste de tarifa de até 16,7% e tratou a privatização como
“efeito perverso” para a tarifaxiii
.
As contradições fazem parte da existência humana. Elas aparecem e se resolvem quando
as discussões são ampliadas. Hoje, talvez pela necessidade de diminuir o déficit fiscal,
se discuta muito pouco os impactos da privatização da Eletrobras e as contradições e
divergências de ideias não são analisadas com o devido cuidado. O governo corre contra
o tempo e corre todos os riscos por tratar “a toque de caixa” uma mudança que pode
impactar na vida de todos os brasileiros. O tema é politicamente intragável e não custa 
lembrar que a crise energética de 2001 no Brasil foi preponderante para a quebra de
ciclo do PSDB na presidência da República. O próprio colapso energético californiano
ajudou a criar a roupa política de Arnold Schwarzenegger.
 
Por fim, em artigo publicado no jornal O Globo desta quarta-feira (15/11), o expresidente
da Eletrobras e atual presidente da Associação Comercial do Rio de Janeiro,
José Luiz Alquéres, intitulou o texto no qual condena o modelo divulgado pelo governo
e que, portanto, corrobora com o conceito de “privatização Frankenstein”, com a frase
“Para que a Eletrobras não vire um monstro”xiv
.
São muitas contradições para serem todas citadas e descritas em apenas um texto. O
discurso do governo fala em subsídios para energia fóssil, quando a direção mundial
aponta para as energias renováveis. O prêmio Nobel de Economia Oliver Hart critica
fortemente os processos de privatização para fazer caixa e o Brasil ignora essa diretriz.
Nesse Frankenstein desgovernado, o grande risco de andar tão acelerado na contramão
é que lá na frente teremos que pagar por uma troca de pneu com o carro andando. E
com tempo, necessariamente, essa conta vai chegar.
 
Rio de Janeiro, 15 de novembro de 2017
 
i http://m.blogs.ne10.uol.com.br/jamildo/2017/09/17/temer-deve-receber-modelode-privatizacao-da-eletrobras-em-setembro/
 
ii https://oglobo.globo.com/economia/regras-da-privatizacao-da-eletrobras-seraoenviadas-ao-congresso-neste-mes-diz-ministro-21902177
 
iii https://extra.globo.com/noticias/brasil/governo-enviara-projeto-de-privatizacao-daeletrobras-ao-congresso-na-proxima-semana-diz-eduardo-guardia-22072247.html
 
iv http://economia.estadao.com.br/noticias/geral,investidor-tera-teto-de-ate-5-paracompra-de-eletrobras,70001966341
 
v http://www.valor.com.br/empresas/5163284/investidor-individual-podera-comprarate-10-da-eletrobras-afirma-mme
 
vi http://www.mme.gov.br/web/guest/pagina-inicial/outras-noticas/-
/asset_publisher/32hLrOzMKwWb/content/comunica-1
vii http://agenciabrasil.ebc.com.br/economia/noticia/2017-10/privatizacao-daeletrobras-nao-esta-vinculada-entrada-no-novo-mercado-da
 
viii http://epocanegocios.globo.com/Empresa/noticia/2017/09/epoca-negocios-direitoa-veto-na-eletrobras-divide-ministerios.html
 
ix http://www.valor.com.br/empresas/5109590/governo-quer-fim-de-golden-share
 
 
x http://economia.estadao.com.br/noticias/geral,ainda-projeto-privatizacao-daeletrobras-tem-disputa-no-governo,70002048718
xi https://www.youtube.com/watch?v=Jlr0O4Dqjkw
xii https://oglobo.globo.com/economia/ministro-diz-que-conta-de-luz-pode-ficar-maisbarata-com-venda-da-eletrobras-21732917
 
xiii https://g1.globo.com/economia/seu-dinheiro/noticia/aneel-ve-efeito-perversopara-consumidor-em-proposta-do-governo-para-eletrobras.ghtml
xiv https://oglobo.globo.com/opiniao/para-que-eletrobras-nao-vire-um-monstro-
22069590
 
 
 
Cintia Alves

Cintia Alves é graduada em jornalismo (2012) e pós-graduada em Gestão de Mídias Digitais (2018). Certificada em treinamento executivo para jornalistas (2023) pela Craig Newmark Graduate School of Journalism, da CUNY (The City University of New York). É editora e atua no Jornal GGN desde 2014.

2 Comentários

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  1. Vamos parar com esta
    Vamos parar com esta choradeira ! Trabalho de serviço prestado pra uma destas distribuidoras da Eletrobras e vós digo que que a safadeza e grande.as propinas são diárias.privatizar simmmmmmm.

    1. Seu comentário é irrelevante
      Seu comentário é irrelevante para o tamanho do problema, pois não se pode beneficiar um grupo que quer roubar o país e dividir a conta com a população inteira devido a casos pontuais que não representa sequer a uma ínfima parte das 24.000 pessoas que trabalham na terça parte da matriz energética do Brasil.

      Esse país não vai para frente! Acorda que vamos pagar a conta mais uma vez.

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