Gilmar, Janot, Dallgnol e o jogo político, por Marcelo Auler

Por Marcelo Auler

Nesses tempos em que a intolerância grassa e muitos agem mais com o emocional do que com a razão, nada melhor do que um dia atrás do outro para que algumas máscaras caiam. Na quarta-feira, 16, o ministro Gilmar Mendes, sob os holofotes da tribuna do Supremo Tribunal Federal queixou-se da nomeação de Luis Inácio Lula da Silva para ministro por entendê-la como uma forma de obstar a Justiça.

Na avaliação do ministro, a nomeação de Lula para o primeiro escalão do governo ocorre “a pretexto, a dar sobrevida ao governo e dar algum conforto no foro privilegiado” ao ex-presidente. “É quase uma acusação de que esta Corte será complacente com malfeitos”, disse Mendes durante sua manifestação no julgamento de recursos ao rito do processo de impeachment da presidente Dilma Rousseff, como noticiou o jornal Valor Econômico, naquele mesmo dia, na reportagem Nomeação de Lula para ministério gera desconforto, diz Gilmar Mendes,

Dois dias depois, ao se manifestar nos processos movidos pelo PSDB e PPS contra a nomeação de Lula, Mendes, transformou em decisão o pré-julgamento que fizera. Como estivesse lendo o futuro numa bola de cristal, explicou: “Pairava cenário que indicava que, nos próximos desdobramentos, o ex-presidente poderia ser implicado em ulteriores investigações, preso preventivamente e processado criminalmente. A assunção de cargo de Ministro de Estado seria uma forma concreta de obstar essas consequências. As conversas interceptadas com autorização da 13ª Vara Federal de Curitiba apontam no sentido de que foi esse o propósito da nomeação”, expôs ao determinar a suspensão da posse de Lula e a remessa das investigações contra ele para o juiz Sérgio Moro. Medida inócua, pois na segunda-feira seguinte, Teori Zavascki avocou esses casos para análise do STF.

Não precisou muito tempo para a máscara cair. No sábado, (26/03),  O Estado de S. Paulo noticiou a reabertura “de duas ações de reparação de danos por improbidade administrativa contra os ex-ministros Pedro Malan (Fazenda), José Serra (Planejamento) e Pedro Parente (Casa Civil), Gustavo Jorge Laboissiére Loyola, Alkimar Andrade, Gustavo Henrique Barroso Franco e Francisco Lafaiete de Pádua Lopes (ex-presidentes e ex-diretores do Banco Central), no governo Fernando Henrique Cardoso (1995-2002)”.

Impetradas em 1995 e 1996, pelo então procurador-geral das República, Antônio Fernando Souza, estas ações estavam paralisadas desde 2002 (quando Mendes as avocou) e foram arquivadas em 2008 por decisão dele mesmo, pouco antes de assumir a presidência da Corte. Lembrem-se, Mendes ingressou no STF em 2002, nomeado por FHC, após ser seu Advogado Geral da União. Pelo jeito, o arquivamento – em uma decisão monocrática – foi indevido pois, agora, seus colegas do Supremo entenderam que as ações devem continuar. Passaram 14 anos paralisadas. Cabe perguntar, quem mesmo obstruiu a Justiça?

 

As duas ações propostas pelo ex-procurador-geral da República – hoje advogado de defesa de Eduardo Cunha – eram de ressarcimento de valores ao erário por Improbidade Administrativa. Cobrava-se o ressarcimento aos cofres públicos dos valores gastos pelo Banco Central com a ajuda aos bancos Econômico e Bamerindus, além de outros atos do Programa de Estímulo à Reestruturação e ao Fortalecimento do Sistema Financeiro Nacional – Proer. A ação da 22ª Vara Federal de Brasília (nº 95.00.20884-9)  chegou a ter uma sentença em que os réus foram condenados a ressarcirem o erário em R$ 202.965.000,00, corrigido monetariamente pelos índices do IPCA/IBGE, a contar da data do ajuizamento até a data do efetivo pagamento.

Independentemente da discussão em torno dos valores a que os réus foram condenados, uma das motivações que levaram o ministro Mendes a avocar o caso para o STF, ele se apegou ainda a duas teses que há muito foram derrubadas pela jurisprudência do Supremo. A primeira de que  “atos de improbidade, enquanto crimes de responsabilidade, os Ministros de Estado estão sujeitos exclusivamente ao regime da Lei no 1.079, de 10 de abril de 1950, de modo que a apuração de atos de improbidade atribuídos a tais agentes, nos termos do art. 102, I, “c”, da Constituição, encontra-se sujeita à competência do Supremo Tribunal Federal”.

Ex-ministros e ex-diretores do Banco Central do governo FHC foram beneficiados por decisão do ministro Gilmar Mendes. Para eles, mesmo após saírem do governo, estava garantido o foro especial.(Fotos reproduções)

Ex-ministros e ex-diretores do Banco Central do governo FHC foram beneficiados por decisão do ministro Gilmar Mendes. Para eles, mesmo após saírem do governo, estava garantido o foro especial.(Fotos reproduções)

Outro argumento usado e que também já não encontra respaldo nas decisões de seus colegas da Corte é o de que o fato de os réus não estarem mais em função pública não desautorizaria o julgamento pelo STF. Na decisão, Mendes expôs: “Não há outro juízo competente para processar e julgar os reclamantes pela prática de crime de responsabilidade, já que os atos supostamente ilícitos a eles imputados referem-se à época em que ocupavam cargos de agentes políticos”.  Isso, como se sabe, há muito não é aceito pelo Supremo. A prática mostra que quando o réu perde a função pública ou o mandato que lhe garantia o foro especial, o processo é redistribuído. Exemplo mais recente e foi do ex-governador e ex-deputado, o tucano Eduardo Azeredo, que renunciou ao mandato na Câmara dos Deputados para não ser julgado pelo Senado no caso do Mensalão Mineiro. (ou Mensalão Tucano).

Janot e seu público interno – Justamente por todos estes precedentes do Supremo é que soa completamente estranha a tese defendida pelo Procurador Geral da República, Rodrigo Janot, que os ministro da corte devem autorizar o ex-presidente Lula a ser empossado como ministro da Casa Civil de Dilma, mas manter as ações contra o mesmo na 13ª Vara Federal de Curitiba, do juiz Sérgio Moro. Não existe qualquer precedente nesse sentido.

O parecer de Janot sobre o caso Lula é sem qualquer precedente. Pode ter sido feito para apaziguar seu público interno. Foto Reprodução

O parecer de Janot sobre o caso Lula é sem qualquer precedente. Pode ter sido feito para apaziguar seu público interno. Foto Reprodução

Em seu blog, hoje, Fernando Brito – que usa um endereço alternativo por conta dos ataques que tem sofrido – diz que Janot joga para a platéia: Lula será ministro, mas caso segue com Moro. Na verdade, mais do que jogar para o grande público – embora também o esteja fazendo – Janot está jogando para seu público interno, principalmente os procuradores da Força Tarefa da Lava Jato que em passado não muito longínquo tiveram uma queda de braço com o Procurador-geral. E ganharam.

Foro especial não é mais impunidade– Todos fala da questão do for especial como se fosse sinônimo de impunidade. Esta foi uma verdade em passado não muito distante. Antes, parlamentares, por exemplo, quando no exercício do mandato, só podiam ser processados com autorização de suas respectivas Casas Legislativas. Isto acabou através da Constituição de 1988. O próprio Janot, na sua argumentação sobre a posse de Lula, fala que os tribunais superiores demoram mais a julgar. É fasto, que em muitos casos, há quem sente em cima dos processos de políticos, como famosos antecessor do atual procurador-geral, Geraldo brindeiro, costumava engavetar os casos envolvendo políticos do governo. Também o processo do Mensalão, com todos os erros e possíveis anomalias, demonstrou que não é difícil ao Supremo, apreciar os casos com a agilidade necessária. Há ainda exemplos de parlamentares e pessoas que, mesmo com foro especial, acabaram sendo julgados e condenados. No caso de Lula, podem ter certeza, ninguém deixará o processo parado por 14 anos…

Não se pode esquecer que Lula, neste caso, está fazendo justamente o caminho inverso que a maioria dos políticos fazem. Ele abre mão de ser julgado pela Justiça de Primeiro Grau, o que lhe garante, pelo menos, três instâncias acima para recorrer das decisões e, consequentemente, postergar qualquer sentença, para ver suas acusações apreciadas por um colegiado que é a última e mais alta instância do Judiciário.

Muitos dizem que ele quer a impunidade, como se o juiz Sérgio Moro fosse mais capaz juridicamente do que cada um dos onze ministros daquela corte. Na verdade, por tudo o que se tem visto nos últimos dias, a diferença entre Moro e a maioria dos ministros do Supremo, não é apenas o saber jurídico acumulado deles, dado o tempo de militância que acumulam na área jurídica. Há ainda a questão da sensatez, que parece estar faltando em alguns setores de Curitiba.

Nas explicações de Deltan, não se investiga outros políticos por conta da prescrição dos crimes. Esqueceu o parágrafo 5º  do art. 37 da Constituição. Reprodução

Nas explicações de Deltan, não se investiga outros políticos por conta da prescrição dos crimes. Esqueceu o parágrafo 5º do art. 37 da Constituição. Reprodução

O esquecimento de Deltan Dallagnol – Coincidentemente, no mesmo sábado 26 em que o Estadão publicava a notícia do desarquivamento de um processo que se iniciou em 1995, ou seja, 21 anos atrás, O Globo retransmitia, sem contestar nem questionar, as explicações do procurador chefe da Força Tarefa da Lava Jato, Deltan Dallagnol para justificar porque não são investigados casos envolvendo outros governos e outros partidos. Foi na reportagem: ‘Vivemos em um ambiente polarizado’, diz coordenador da Lava-Jato:

Essa crítica não tem o menor sentido para quem tem um mínimo de conhecimento jurídico. Não é viável investigar fatos tão antigos por duas razões. Em primeiro lugar, fatos praticados há mais de doze anos estão, na prática, prescritos, ou seja, é como se o crime fosse cancelado pelo decurso do tempo. Nosso sistema tem muitas brechas que devem ser fechadas, uma das quais é um sistema de prescrição leniente. Em segundo lugar, a investigação de fatos tão antigos não tem viabilidade prática, porque a guarda de documentos fiscais ou bancários não alcança tanto tempo. A lei exige que dados fiscais, por exemplo, sejam guardados só por cinco anos, o que libera as empresas de guardarem os documentos que embasam os lançamentos e colocaria empecilhos significativos à investigação. Dentro de um contexto de recursos humanos e financeiros limitados do Estado, devemos orientar os esforços investigativos sobre fatos que tragam um resultado útil para a sociedade”, disse.

O pensamento é perfeito para o estudante de Direito ou o leigo que vive com a cabeça no Código Penal e pensa apenas em prender, processar e condenar, preferencialmente a uma pena alta, para que o réu mofe nas cadeias ou, o que é mais comum, acabe sendo mandado para casa por falta de vaga no Sistema Penitenciário. Certamente, no momento da entrevista, o procurador esqueceu-se do artigo 37, parágrafo 5º da Constituição que reza:

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Luis Nassif

8 Comentários

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  1. “De Lei!”
    O empirismo mais simples eh mais que suficiente pra afirmar: tudo que essa oposição acusa nos outros eh exatamente o que ela própria faz (em grau muito mais elevado).

  2. Imagino:

    Alguns dos que fazem parte desse jogo têm alguma “sujidade” e estão sendo chatageados por isso.

    Outros são “idealistas” ingênuos.

    Só pode ser!

    O ordenamento jurídico está aí, escrito, e não é cumprido por qual razão?

    Quem tem informação detém poder!

  3. Já ultrapassou todos os limites.

    As vêzes me parece que estamos secando gelo, ou qualquer outra coisa inútil. Pois quanto mais se deixa claro as ilegalidades e má fé, mas os que a fazem perdem a vergonha. Um procuradoro geral resolveu reeditar a constituição para satisfazer o seu publico interno ou quiça para  satisfazer seus donos. Decretar que um ministro não tem foro privilegiado é ir contra o que está escrito. Neste caso ou temos má fé ou ignorância jurídica. Ambas as opções são terríveis.

    Mas todos estes erros legais estão sendo feitos a luz do dia,  propositadamente, e de forma  a manipular toda a opinião publica e vão continuar fazendo tudo isto pois não se tem um CNJ para enquadrá-los.

  4. Pelo que se lê no artigo, ou

    Pelo que se lê no artigo, ou o procurador Dallagnol ignora a posibilidade de reabrir os processos antigos contra ministros e funcionários do (des)governo FHC por razões puramente partidárias ou desconhece a lei. Em ambos os casos seu posicionamento deslustra sua atuação como membro do MPF.

  5. Desculpa absurda do Procurador…

    A prescrição penal não atinge apenas 12 anos. Vai até 20 anos, segundo o Código Penal. E há inúmeras causas interruptivas. 

    A obrigação de guarda de documentos é até quando ocorrer a prescrição tributária. O prazo é de 5 anos, mas não necessariamente ela coincide com esse prazo. E se houver processo fiscalizatório em curso, o contribuinte jamais pode descartar os documentos. Além disso, em caso de fraudes, o prazo só começa a correr quando descoberta. Portanto, ainda que inexistente o documento, haverá como responsabilizar o contribuinte. 

    Por fim, como entendimento corrente – ainda – dos Tribunais superiores, além do que apregoa o próprio MPF e MPs Estaduais, a ação de improbidade administrativa relativa a danos ao erário é imprescritível. O STF apreciou caso diverso, de dano civil, o que presume-se, permanece a interpretação de impescritibilidade dos danos causados por ações administrativas ilícitas.

    Muita argumentação frágil. Acho que o Procurador sabe que não terá contraditório em suas entrevistas a veículos da velha mídia.

  6.  
    Somente rindo, para se

     

    Somente rindo, para se levar a sério um STF que acolhe como sumidades meia dúzia de juizes de merda. Tome-se como exemplo o arrogante juiz, de merda, segundo Saulo Ramos, um tal de celso de melo o decano de merda. Ou ainda, examine-se os feitos do trapaceiro gilmar mendes, o chefe de jagunços em Diamantino, interior de Goiais. O cabra que, como previsto pelo jurista Dalmo Dalare, quando de sua indicação pelo prícipe da roubalheira nacional FHC, se aprovada sua indicação pelo Senado, seria a completa desmoralização daquela Corte. Não deu outra. Fudêu!…

    Vamos ficar nestes dois merdas de juizes desonestos. Não por falta do que não presta na casa, pois, é insignificante o que se pode aproveitar naquela mixórdia.  Aliás, se querem tirar algum proveito, reduzindo o enorme prejuizo do país para manter “aquilo”, utilize-se como instrumento reverso de educação, para os estudantes de Direito aprenderem, o que não deverão repetir na vida profissional.

    Orlando

  7. Nassif Ressonancia!!!!!

    Nassif

    Ressonaciaaaaaaaa!!!!!!

    A Dilma tem a caneta, os militares estão doidos para entrar em cena e colocar ordem na camarilha!!!

    Presidenta, prenda os golpistas !!!

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