Gravidade da Covid-19 pode ter relação com sistema imunológico e coagulação sanguínea

Novas análises genéticas e de pacientes sugerem que casos graves de COVID-19 se devem ao excesso do sistema de complemento, um dos braços mais antigos do sistema imunológico, e coagulação do sangue excessiva

Scientific American Brasil

Um dos braços mais antigos do sistema imunológico, chamado sistema de complemento, pode influenciar a gravidade da COVID-19, de acordo com um novo estudo de pesquisadores do Centro Médico Irving da Universidade de Columbia.

Dentre outras descobertas ligando complemento a COVID-19, os pesquisadores descobriram que pessoas com degeneração macular relacionada a idade — uma condição causada pelo excesso de complemento — estão em um risco maior de desenvolver complicações graves e falecer por COVID-19.

A conexão com o complemento sugere que medicamentos existentes que inibem o sistema de complemento poderia ajudar a tratar pacientes com a condição mais grave.

O estudo foi publicado no dia 3 de agosto na Nature Medicine.

Os autores também encontraram evidências que a coagulação está ligada com a gravidade da COVID e que mutações em alguns genes de complemento e de coagulação estão associadas com a hospitalização de pacientes com COVID-19.

“Juntos, esses resultados fornecem ideias importantes na patofisiologia da COVID-19 e pintam o papel do complemento e dos caminhos de coagulação que determinam resultados clínicos de pacientes infectados com SARS-CoV-2”, diz Sagi Shapira, que liderou o estudo com Nicholas Tatonetti, ambos professores da Faculdade Vagelos de Médicos e Cirurgiões da Universidade de Columbia.

Descobertas culturas a partir de estudo de mimetismo do coronavírus

A ideia de investigar o papel da coagulação e complemento na COVID começa com uma pesquisa rápida do mimetismo viral entre todas as viroses na Terra — cerca de 7,000 ao todo.

“Viroses possuem proteínas que podem imitar certas proteínas de hospedeiros para enganar as células hospedeiras para ajudar o vírus a completar seu ciclo de vida”, diz Shapira. “Além das questões biológicas fundamentais que estávamos interessados em responder, baseado em nosso trabalho anterior e no trabalho de outros, nós suspeitávamos que identificar tais imitações poderia nos fornecer pistas sobre como as viroses causam a doença”.

A pesquisa descobriu que viroses por coronavírus são mestres da imitação, particularmente com proteínas envolvidas na coagulação e proteínas que produzem o complemento, um dos braços mais antigos no sistema imunológico humano.

Proteínas de complemento funcionam quase como anticorpos e ajudam a eliminar patógenos ao se grudarem com viroses e bactérias e as marcando para destruição. Complemento também pode melhorar a coagulação e a inflamação do corpo. “Sem checar, esses sistemas podem ser bastante prejudiciais”, diz Shapira.

“O novo coronavírus — ao imitar proteínas de complemento ou coagulação — pode levar ambos os sistemas a um estado hiperativo”.

Degeneração Macular associada com maior mortalidade de COVID

Se o complemento e a coagulação influenciam na gravidade da COVID-19, pessoas com complemento hiperativo pré-existente ou com problemas de coagulação devem ser mais suscetíveis ao vírus.

A equipe liderada por Shapira e Tatonetti observou pacientes com COVID-19 que degeneração macular, uma doença ocular causada pela ação excessiva do sistema de complemento, além de condições comuns de coagulação como trombose e hemorragia.

Dentre 11.000 pacientes com COVID que chegaram no centro Médico Irving da Universidade de Columbia com suspeita de COVID-19, os pesquisadores descobriram que mais de 25% desses com degeneração macular relacionada à idade faleceram, comparado com uma taxa de mortalidade média de 8.5%, e aproximadamente 20% precisou de intubação. As maiores taxas de mortalidade e intubação não poderiam ser explicadas pela diferença na idade ou gênero dos pacientes.

“O sistema de complemento é mais ativo na obesidade e diabetes”, diz Shapira, “e pode ajudar a explicar, pelo menos em parte, porque pessoas com essas condições também têm maior risco de mortalidade com COVID-19”.

Pessoas com um histórico de transtornos de coagulação também tinham maior risco de mortalidade pela infecção do novo coronavírus.

Caminhos ativos de complemento e coagulação

Os pesquisadores então examinaram como a atividade genética se diferenciava em pessoas infectadas com o coronavírus.

Essa análise revelou uma assinatura nos pacientes infectados com COVID indicando que o vírus engaja e induz uma ativação robusta dos sistemas de complemento e coagulação do corpo.

“Nós descobrimos que o complemento é um dos caminhos mais diferenciados nos pacientes infectados por SARS-CoV-2”, diz Tatonetti. “Como parte do sistema imunológico, espera-se que você veja o complemento ativado, mas parece em excesso do que você observaria em outras infecções como a gripe”.

Alguns genes de coagulação e do complemento estão associados com hospitalizações

Mais evidências ligaram a gravidade da COVID com a coagulação e com complemento, e são proveniente de uma análise genética de milhares de pacientes com COVID do Biobank do Reino Unido, que contém registros médicos e dados genéticos de meio milhão de pessoas.

Os autores descobriram que variantes de diversos genes que influenciam a atividade do complemento ou de coagulação estão associados com sintomas mais graves da COVID-19 que precisam de hospitalização.

“Essas variantes necessariamente irão determinar o resultado de alguém”, diz Shapira. “Mas essa descoberta é outra linha de evidência que os caminhos de complemento e coagulação participam na mortalidade associada com a COVID-19”.

Mirando a Coagulação e o Complemento

Médicos tratando pacientes com COVID-19 notaram problemas de coagulação desde o início da pandemia, e diversos ensaios clínicos estão sendo realizados para determinar a melhor maneira de utilizar tratamentos já existentes de anti-coagulação.

Inibidores de complemento são atualmente utilizados em doenças relativamente raras, mas pelo menos um ensaio clínico está testando a ideia com pacientes com COVID.

“Eu acredito que nossas descobertas fornecem uma fundamentação mais forte para a ideia que a coagulação e o complemento tem um papel na COVID-19”, diz Tatonetti, “e esperamos que inspire outros a avaliar essa hipótese e ver se é algo útil no combate da pandemia atual”.

Centro Médico Irving Universidade de Columbia

Publicado em 04/07/2020

Redação

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