Ler Marx continua sendo essencial para entender o mundo, por Luis Felipe Miguel

Cintia Alves
Cintia Alves é graduada em jornalismo (2012) e pós-graduada em Gestão de Mídias Digitais (2018). Certificada em treinamento executivo para jornalistas (2023) pela Craig Newmark Graduate School of Journalism, da CUNY (The City University of New York). É editora e atua no Jornal GGN desde 2014.
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Por Luis Felipe Miguel

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O aniversariante de hoje continua incrivelmente atual, na flor de seus 200 anos. Não acertou várias de suas previsões, é bem verdade. Afinal, ele foi um pensador, não um vidente. Também não escapou de ser um homem de sua época, com sua fé no desenvolvimento científico, às vezes caindo até num certo determinismo. Mas ninguém foi tão preciso, tão certeiro, na compreensão e na interpretação da sociedade capitalista. Muita coisa mudou de sua época para cá. Escrevi um esboço deste texto dentro de um avião, num tablet – aposto que ele iria curtir tanto um quanto o outro. Mas o domínio da forma mercadoria estrutura o nosso mundo ainda mais do que estruturava o dele. Exploração, alienação e fetichismo são o nosso dia a dia. Nossa história é movida pela luta entre os que dominam e os que são dominados. O que ele descreveu em suas obras, ensinando-nos a ir além das aparências para apreender o significado mais profundo dos fenômenos sociais, permanece presente, e por isso lê-las continua sendo essencial para entender o mundo. E também, como ele disse num aforismo famoso, para tentar transformá-lo.

O futuro com que ele sonhou (ou, para usar uma palavra que ele rejeitaria, a utopia que ele abraçou) parece inalcançável. Creio que poucos apostariam hoje na abolição do Estado, na superação definitiva de qualquer escassez, na harmonia perfeita entre indivíduo e coletividade. Mas os valores que organizam seu projeto – fim da exploração, ampliação da autonomia de todos e de cada um, humanização das relações sociais – continuam no centro de qualquer projeto emancipatório.

Marx foi a referência central de minha formação intelectual. Outras influências vieram depois, mas ele nunca deixou de estar presente. Em especial, sempre permaneceu como o ideal, inalcançável, de combinação entre rigor teórico, clareza de expressão, riqueza de estilo e erudição. A cada página de seus textos – na ironia feroz que dirige a seus adversários, nas referências literárias que encaixa sem nenhum artificialismo para ilustrar o que diz, na montanha de dados que incorpora a seus argumentos, na precisão cirúrgica com que vira de avesso o senso comum, na indignação que atravessa seu olhar sobre as iniquidades do mundo – se revela a paixão que dedicou a seu trabalho.

Há um aspecto da obra de Marx que é talvez o mais difícil de ser assumido hoje: sua confiança no futuro da humanidade, na capacidade de ação dos oprimidos. Creio que não devemos abandonar esse aspecto, por mais que nossas circunstâncias pareçam desoladoras. Não por algum determinismo, por uma visão teleológica qualquer de que “caminhamos” necessariamente para uma sociedade melhor. Mas por entender que o mundo social nunca “é”, sempre está se fazendo. As contradições da sociedade estão presentes, ativas; o trabalho de construção da passividade nunca está concluído e não é invulnerável. O sentimento de impossibilidade de transformação é também um produto da ideologia, ao qual devemos resistir.

Quem sabe, no terceiro centenário, comemoraremos a agudeza de seu diagnóstico sobre uma sociedade já morta.

Cintia Alves

Cintia Alves é graduada em jornalismo (2012) e pós-graduada em Gestão de Mídias Digitais (2018). Certificada em treinamento executivo para jornalistas (2023) pela Craig Newmark Graduate School of Journalism, da CUNY (The City University of New York). É editora e atua no Jornal GGN desde 2014.

6 Comentários

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  1. é fácil entendê-lo .
    O

    é fácil entendê-lo .

    O difícil. é aplicá-lo no mundo de hoje.

    Como a bíblia: E Deus tornou Eva rastejante como cobra.

      E Deus disse que todos que olhassem pra Sodoma e Gamorra se tornariam estátuas de sal.

            E Noé criou a arca.

        E Deus disse que toda mulher fosse submisssa ao homem.

           E fulano poi arrebatado.

             E sicrana tever ascensão aos céus.

             Foi mãe e continua virgem.

         Há mais de centenas de escritos como esse na bíblia.

        Marx faz parte dessa alucinação.

              Ou melhor dizendo : Pra o que se acreditava na época.

    1. Era fácil a aplicação do Comunismo no mundo de ontem?

      Sempre foi difícil aplicar o marxismo pois a sua aplicação acabaria com os privilégios dos parasitas sociais e com a escravidão assalariada. Foi e continua sendo difícil aplicar o marxismo mas não é impossível.

  2. Luta
    “Nossa história é movida pela luta entre os que dominam e os que são dominados.”
    Na realidade há uma luta de facções na disputa pelo poder. Os “dominados” não possuem força significativa para esta “luta”. Apenas o nosso sofrido voto eleitoral e que alimenta nossos sonhos.

  3. Pois é! E quantas vezes disseram que ele estava morto.

    Na penúltima foi o fim da história, e na última foi antes da crise de 2008.

  4. Quais foram as previsões históricas feitas por Marx?

    Luís Felipe, você poderia citar algumas previsões de Marx?

    Diz-se que Marx previu a derrocada do capitalismo e o triunfo do socialismo. Ora, se isso fosse uma previsão, porque Marx (e Engels) conclamaria(m) os Operários de todos os Países a unirem-se?

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